Textos

Francisco Dandão

Esse ano está passando muito rápido. Não sei se essa é a sensação geral. Pelo menos é a minha percepção. De repente, não mais que de repente, a pedra no “caminho” (primeiro eu escrevi “campinho”, mas depois percebi meu erro) já foi transposta. Ainda ontem era janeiro, agora já é novembro.

E então, o Fluminense, meu para sempre glorioso Tricolor das Laranjeiras, que começou esse Ano da Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo como campeão da Libertadores da América, candidato, por questão de lógica, a ganhar tudo, eis que se transformou na maior draga da paróquia.

Depois de passar várias rodadas na zona do rebaixamento, ganhou umazinha aqui e ali, conseguiu dar uma respirada, mas continua perigosamente flertando com o descenso. Às vezes vence jogos contra adversários bem difíceis, outras vezes entrega o ouro para os mais fracos.

Não sei bem porque isso tem acontecido. Afinal, o elenco que conquistou a Libertadores de 2023 recebeu alguns reforços considerados de peso. Sim, eu sei, reforço de peso nem sempre significa melhoria do time. Mas acho que todos os tricolores entendiam que a tendência era melhorar.

Tem um amigo meu flamenguista que de vez em quando, semana sim outra também, enche o meu saco com as teorias mais mirabolantes para explicar a queda de rendimento do Fluminense. Teorias que eu escuto desconfiado, mas que depois me ponho a pensar se ele pode ter razão.

Uma das teorias dele é a de que baixou no Tricolor a síndrome de Robin Hood, aquele aventureiro inglês que, reza a lenda, roubava dos ricos para distribuir para os pobres. Isso, por assim dizer, explicaria porque o Fluminense ganha do Flamengo e perde para o Atlético Goianiense. Hein?

A outra linha teórica do “urubuzento” do meu amigo é a de que o Fluminense teria feito um pacto com um bruxo sul-africano (mas não necessariamente algum dono de redes sociais, viu?) para ganhar a Libertadores do ano passado, mas depois atrair para si sete anos de azar.

E tem outra: a de que a direção do Tricolor teria sido muito ingênua em acreditar na música popular de que “panela velha é que faz comida boa”. Tudo em referência aos reforços entrados na casa dos 30 e tantos anos, em detrimento da rapaziada que desponta nas categorias de base lá de Xerém.

São teorias que carecem de provas. Na falta de contra argumentação, eu acabo acreditando numas coisas e noutras não. Na minha fé inabalável, eu sempre penso que o próximo jogo vai ser o ponto da virada. E que amanhã, depois do sino badalar a meia-noite, pode acontecer tudo, inclusive nada!

– Outubro de 2024 –


Francisco Dandão

O ideal de todo torcedor de futebol é que o seu time do coração vença dando espetáculo. Da mesma forma, o desejo desse mesmo torcedor é o de que todos os jogadores dos respectivos elencos ostentem a mais refinada técnica, do tipo que trata a bola com a intimidade de uma antiga amante.

No mundo real, porém, tudo isso fica no campo da utopia. Nem sempre as vitórias acontecem adornadas pelo manto do espetacular. Da mesma forma, num elenco de, digamos, 30 jogadores, nem vinte por cento prima pela fineza com aquela que antigamente a gente chamava de “deusa branca”.

Essas divagações me ocorrem por conta da história que eu fiquei sabendo, por esses dias, de dois centroavantes que vestiram em tempos idos a camisa do Brasil, ambos artilheiros: Leônidas da Silva, que jogou nas décadas de 1930 e 1940, e Leônidas da Selva, que jogou na década de 1950.

O Leônidas da Silva foi o homem que inventou a bicicleta no futebol, lance de dificílimo exercício e que somente os verdadeiros virtuoses conseguem executar. Defendeu o país na Copa de 1938 e jogava tanto que ganhou o apelido de “Diamante Negro”, marcando gols de todas as formas.

O Leônidas da Selva, cujo nome de batismo era Manoel Pereira, artilheiro nos clubes que defendeu, chegou a jogar pelo Brasil em torneios sul-americanos (Taça Oswaldo Cruz e Taça do Atlântico), mas era tão atrapalhado com a bola que só a dominava apontando-lhe um revólver.

Um gostava de receber a bola nos pés, fazia jogadas de estilo, matava a esfera no peito, cabeceava com perfeição, jogava de cabeça erguida e descobria os mais improváveis espaços. O outro só gostava de bola dividida, de preferência mais perto do zagueiro. Os dois, entretanto, artilheiros natos.

Falei até aqui do geral, mas já chego no particular e meto o futebol acreano na conversa, que na aldeia de Galvez, Chico Mendes, Plácido de Castro e outros menos votados também teve os “espelhos”, de face torta ou lisa, dos Leônidas: o craque e o grosso, mas ambos com apurado faro de gol.

Nesse âmbito regional, eu lembro de pelo menos dois centroavantes que tratavam a bola com o maior esmero: Touca, artilheiro nas décadas de 1940 a 1960, que dava bicicletas como o Leônidas da Silva; e Ayrton Baú que, também como o Leônidas da Silva, cabeceava com absoluta precisão.

Quanto aos centroavantes da aldeia que, apesar de artilheiros, chutavam mais o capim do que a bola, aí a lista se estende: Bruno Couro Velho (Rio Branco), Madureira (Andirá), Salvador (Independência), Bebé (Atlético), Walter Prado (Juventus)… É isso aí. O sol nasceu foi pra todos!

– Outubro de 2024 –


Francisco Dandão

Ando me deliciando por esses dias com a leitura de um livrinho (porque de poucas páginas e não por algum juízo de valor) de crônicas intitulado “Ode a Mauro Shampoo e outras histórias da várzea”, de autoria do escritor/professor/pesquisador/filósofo e muito mais Luiz Antonio Simas.

A “várzea”, como todo mundo sabe (ou deveria saber), de acordo com os melhores dicionários do gênero (ou pelos ensinamentos do santo Google, que agora ninguém mais se dá ao trabalho de manusear folhas de papel), é uma extensão de terra plana, com certa frequência às margens dos rios.

Para efeitos do jargão futebolístico, porém, a várzea é qualquer terreno baldio, de preferência onde não existe grama, onde cabeças-de-bagre de toda a espécie batem a sua bolinha nos finais de semana. Sim, claro, cabeças-de-bagre formam a maioria, mas eventualmente também alguém bom de bola.

É no futebol de várzea, aliás, que se pode encontrar as melhores histórias. Aqueles relatos que não vão sair nos jornais, muito menos na televisão, mas que vão atravessar a semana seguinte aos “clássicos” sendo discutidos e, no mais das vezes, rendendo sonoras gargalhadas e que tais.

Voltando, porém, ao suposto fio condutor dessas mal traçadas de hoje, que é o livro do Luiz Antonio Simas, veja-se que o “herói” que empresta seu nome ao título (o Mauro Shampoo), foi centroavante do pernambucano Íbis, time tido e havido como o pior do mundo, como atestam as estatísticas.

O Mauro Shampoo, segundo o hilariante relato do Luiz Antonio, nos dez anos que comandou o ataque do Íbis jamais saiu de campo com uma vitória. Nem umazinha. Foi peia pra caramba. E mais ainda: nesses mesmos dez anos, Shampoo, que também era cabeleireiro, marcou apenas um gol.

Este gol único do “craque” Shampoo, de acordo com o autor do livro, causou uma alegria tão intensa que “fez a comemoração do gol de Jairzinho, no lendário Brasil e Inglaterra da Copa de 1970, parecer algo tão vibrante quanto uma procissão de Corpus Christi no interior de Minas Gerais.” Kkk.

Mas o Shampoo é apenas o primeiro personagem do Simas. A escalação do Vila de Cava de Nova Iguaçu é impagável. A saber: Elizângela; Camunga, Carlinhos Nem Fudendo, Mão Branca e Tornado; Jorge Macaco, Capiroto e Corno Manso; Curupira, Abecedário e Aderaldo Miquimba.

Pode isso, Arnaldo? Sei não. O que eu sei é que os campos de várzea estão cada vez mais rareando, mediante uma gama de fatores, entre os quais a especulação imobiliária predatória e a ganância das construtoras. Noves fora tudo isso, pelo menos há quem eternize a várzea em forma de literatura!

– Outubro de 2024 –


Francisco Dandão

É saudável praticar esportes? É sim! Creio que ninguém duvida disso. Quer dizer, talvez até exista quem duvide. Mas não creio que sejam muitos. Com tudo o que chega para a gente, via mídia, bem como pelos conselhos dos cardiologistas, praticar esportes torna a nossa vida bem mais saudável.

Alguns esportes, porém, quando praticados de maneira profissional, num nível elevado de competividade, às vezes causam danos que podem perdurar por toda a existência de quem os pratica. É o caso da maioria dos esportes que exigem contato físico mais, digamos, de natureza brutal.

Fico pensando nisso por conta da morte, nessa quinta-feira (24), do ex-boxeador Adilson Rodrigues dos Santos, mais conhecido como Maguila, vítima de encefalopatia traumática, por conta de tanta pancada que recebeu na região da cabeça durante os anos em que trocou socos dentro dos ringues.

Os estudos sobre a encefalopatia traumática são relativamente recentes. Como os sintomas da doença são parecidos com os do mal de Alzheimer, principalmente com relação à perda da memória recente, muita gente do mundo dos esportes foi diagnosticada de forma equivocada.

Enquanto escrevo, me lembro de outros dois atletas que foram diagnosticados com essa doença, embora a causa da morte não tenha sido a tal encefalopatia: o ex-zagueiro Bellini, que morreu de “parada cardíaca”; e o ex-boxeador Eder Jofre, que foi vitimado por conta de uma pneumonia.

O Bellini, para quem não sabe, numa carreira que durou de 1946 a 1969, período em que jogou por Itapirense-SP, Sanjoanense-SP, Vasco da Gama, São Paulo e Atlético Paranaense, foi o capitão do Brasil na Copa do Mundo de 1958, o cara que ergueu a taça Jules Rimet sobre a cabeça.

Zagueiro viril e que fazia da força física a sua arma maior, Bellini se notabilizou pela capacidade de mandar a bola para longe da sua área através de cabeçadas. E tudo isso numa época em que as bolas eram extremamente pesadas, principalmente quando os jogos se realizavam debaixo de chuva.

Quanto ao Eder Jofre, conhecido pelo apelido de “Galo de Ouro”, também para quem não sabe, este foi o maior boxeador peso-galo de todos os tempos no mundo. Durante a sua carreira, entre 1960 e 1974, ele lutou 81 vezes, vencendo 75 (52 por nocaute), empatando quatro e perdendo duas.

Bellini nasceu em Itapira-SP, em junho de 1930, e morreu em São Paulo-SP, em março de 2014. Eder Jofre nasceu em São Paulo-SP, em março de 1936, e morreu em Embu das Artes-SP, em outubro de 2022. Maguila nasceu em Aracaju-SP, no dia 12 de junho de 1958. Que descansem em paz!

– Outubro de 2024 –


Francisco Dandão

Estive em boa parte do domingo passado batendo pernas pelos corredores e salas do Museu do Amanhã, situado ali na Praça Mauá, na eternamente aprazível Cidade Maravilhosa. Batendo pernas e me detendo em frente a cada uma das muitas peças ali dispostas para a apreciação pública.

O Museu do Amanhã, inaugurado em dezembro de 2015, no ensejo da realização das Olimpíadas de 2016, é um espaço lindo e cheio de aspectos curiosos, debruçado sobre o Oceano Atlântico. Ponto de visita obrigatório para turistas de todas as partes do mundo que aterrissam no Rio de Janeiro.

Eu já havia ido várias vezes ao Museu do Amanhã. Mas dessa vez eu fui por um motivo especial: contemplar a exposição Encantes, do artista plástico acreano Fernando França, antigo morador da Rua João Donato, bairro do Ipase, em Rio Branco, e que hoje reside na também bela Fortaleza.

Usando a temática amazônica, os quadros (e painéis) do Fernando França estão repletos de mitos e lendas dessa parte mais a oeste do país. As águas dos rios caudalosos (ainda que isso esteja acabando) se misturam com pajés e botos voadores. Uma profusão de cores despertando os sentidos!

O Fernando, aliás, é um artista que já rompeu as fronteiras do Brasil. Anualmente ele passa meses na Europa, participando de exposições e ministrando clínicas de pintura. Oportunidade em que aproveita para degustar os mais finos vinhos que são produzidas naquela parte do mundo.

Mas tudo isso que eu disse até aqui é de conhecimento geral. Quem acompanha os personagens da cena artística acreana deve saber do sucesso do Fernando. O que eu acho que poucos sabem é que antes dessa projeção toda, quando adolescente, ele pensou em jogar futebol na posição de goleiro.

É que de estatura avantajada (o homem tem quase dois metros), um dia, em mil novecentos e lá vai pedrinha, ele e o seu vizinho Carlão, que depois virou campeão olímpico de voleibol, foram tentar uma vaguinha no juvenil do Rio Branco, cujo estádio fica bem próximo de onde eles moravam.

Segundo a galera que presenciou o dia em que o Fernando e o Carlão fizeram o teste, ambos foram aprovados. Mas, como o Carlão era mais velho, o técnico optou por este como titular. Fernando, porém, por não aceitar ser reserva, guardou o Conga na mochila, foi embora e nunca mais voltou.

Foi daí que ele, Fernando França, resolveu apostar nas artes plásticas. E deu certo. O homem migrou para o Ceará, fez um mestrado em Literatura Brasileira e passou a pintar o sete. Voa de vez em quando para o outro lado do mundo e agorinha chegou ao Museu do Amanhã. A ele toda a glória!

– Outubro de 2024 –


Francisco Dandão

Todo ano é a mesma coisa. Quando agosto se encaminha para os seus estertores a fumaça toma conta dos céus da Amazônia. Antes dos caminhos se encherem das flores da primavera, é certo que o fogo destruidor, de origem criminosa ou ateado pela ignorância, se espalha pela flora ressequida.

Se um inglês, numa certa noite, dormisse em Londres e acordasse em Rio Branco, nessa época do ano, só saberia que não estava em casa quando tentasse respirar com mais força. Antes de dar uma inspirada mais profunda no ar, certamente ele imaginaria que estava no meio do fog londrino.

Esse mesmo inglês, acostumado às histórias da Távola Redonda, apertaria os olhos achando que a qualquer hora o mago Merlin sairia do meio do nada aconselhando o rei Arthur a buscar sua espada na lagoa encantada para tosquiar os carneiros antes de os lobos tentarem tirar as peles destes.

E não tem aviso de ecologista ou defensor da natureza que dê jeito. Todo mundo está cansado de saber que o planeta agoniza com os modelos de desenvolvimento ora vigentes. Todo mundo sabe, mas, de verdade mesmo, quase ninguém quer saber das consequências. O que conta é o aqui e agora.

Existem, inclusive (ou principalmente), aqueles que negam tudo. Para estes, o mais importante é a peneira e não sol. No discurso negacionista, aquecimento global é coisa de comunista. E logo, daqui a pouquinho, quando a chuva chegar, a fumaça irá embora. E todos respirarão bem até o outro ano.

Nessa história de negar o que não pode ser negado, eu lembro de uns políticos do passado não muito distante da terra de Galvez que garantiam que no espaço territorial acreano não existiam queimadas. No argumento deles, a fumaça que a cada ano antecedia a primavera vinha toda da Bolívia.

É claro que eu não acreditava. Mas, quando eu me lembrava que os comerciantes de Cobija sempre queriam me vender uísque e perfume made in Paraguai, eu tratava logo de dar razão aos políticos. Melhor culpar mesmo os bolivianos, que trocaram um pedaço do reino deles por um pangaré.

Mas, voltando ao fio da meada, a fumaça afeta a tudo e a todos. No caso do Acre, até o futebol foi afetado. Por conta desse flagelo os torneios das divisões de base foram suspensos até que o ar melhore. Se isso demorar, penso eu, o jeito vai ser distribuir máscaras de oxigênio para os jogadores.

Falar nisso, e para arrematar esse papo furado de hoje, eu lembrei que antigamente não se suspendia o futebol por causa das fumaças de agosto/setembro. Jogava-se com fumaça e tudo. Fato que servia como desculpa perfeita para os frangos que os goleiros levavam. Gol da fumaça!

– Setembro de 2024 –


Francisco Dandão

Por esses dias eu me peguei lembrando o quanto jogadores negros contribuíram para as mais expressivas conquistas futebolísticas do país, apesar de todo o preconceito racial existente desde sempre nessa antiga Terra dos Papagaios, onde um dia aportaram as naus de um certo Pedro Cabral.

Pra início de conversa, só pra dar um start com um argumento definitivo, o maior de todos, o rei do mundo nesse quesito esportivo, de nome Edson Arantes do Nascimento, Pelé para íntimos e nem tanto, foi um atleta negro. Perfeito em todos os fundamentos, jamais se verá alguém igual a ele.

Pelé, à parte, porém, criatura que todos sabem estar numa prateleira superior à dos demais mortais, nessas de lembranças eu consegui escalar, posição por posição, quatro seleções do Brasil formadas por atletas negros de categoria excepcional, equipes que eu nominarei nas linhas que seguem.

Primeiro time: Nelson da Conceição (titular da seleção no Campeonato Sul-Americano de 1923); Djalma Santos (Copas de 1958 e 1962), Domingos da Guia (Copa de 1938,), Zózimo (Copas de 1958 e 1962) e Everaldo (Copa de 1970); Fausto (Copa de 1930), Didi (Copas de 1954, 1958 e 1962) e Moacyr (Copa de 1958); Jairzinho (Copas de 1966, 1970 e 1974), Leônidas da Silva (Copas de 1934 e 1938) e Edu (Copa de 1970).

Segundo time: Barbosa (Copa do Mundo de 1950); Fidélis (Copa de 1966), Luís Pereira (Copa de 1974), Joel Camargo (Copa de 1970) e Marco Antônio (Copas de 1970 e 1974); Denilson (Copa de 1966), Mengálvio (Copa de 1962) e Paulo Cézar “Caju” (Copas de 1970 e 1974); Jair da Costa (Copa de 1962), Jorge Mendonça (Copa de 1978) e Paraná (Copa de 1966).

Terceiro time: Dida (Copas do Mundo de 1998, 2002 e 2006); Carlos Alberto Torres (Copa de 1970), Aldair (Copas de 1990, 1994 e 1998), Márcio Santos (Copa de 1994) e Júnior (Copas de 1982 e 1986); César Sampaio (Copa de 1998), Toninho Cerezzo (Copas de 1978 e 1982) e Valdo (Copas de 1986 e 1990); Paulo Isidoro (Copa de 1982), Coutinho (Copa de 1962) e Denilson (Copas de 1998 e 2002).

Quarto time: Veludo (Copa do Mundo de 1954); Josimar (Copa de 1986), Brito (Copas de 1966 e 1970), Luisinho (Copa de 1982) e Rodrigues Neto (Copa de 1978); Vampeta (Copa de 2002), Rivaldo (Copas de 1998 e 2002) e Júlio Baptista (Copa de 2010); Müller (Copa de 1986, 1990 e 1994), Flávio Minuano (Copa de 1966) e Romeu Cambalhota (Copa América de 1975).

É muita gente boa, né não? Ora se é!

– Setembro de 2024 –


Francisco Dandão

Escrevi na crônica passada sobre os negros do futebol do Brasil. Foi uma oportunidade para lembrar várias das criaturas afrodescendentes (como quer o vocabulário politicamente correto em evidência nestes tempos de calor abrasante) que jogaram o fino da bola com a camisa da nossa seleção.

Aí, atento como só ele sabe ser, o meu irmão mais novo Toinho Bil, leitor dos meus textos antes mesmo de eu produzi-los, me cutucou para que eu saísse do mundo geral e entrasse na seara particular, escrevendo algo similar com relação aos jogadores negros que atuaram no futebol acreano.

Topei o desafio e passei a pensar nos nomes para formar uma equipe só de gente dessa raça que jogou no Acre, nominando-os posição por posição, do goleiro ao ponta-esquerda. Nem precisei fazer esforço para lembrar de um primeiro time, cuja escalação divido com vocês no parágrafo seguinte.

Vamos lá. Agrícola (Independência); Ivo Neves (Rio Branco), Mozarino (Rio Branco), Paulão (Atlético Acreano) e Escurinho (Juventus); Pitu (Atlético), Gilson (Vasco da Gama) e Bidu (Vasco da Gama); Santarém (Vasco da Gama), Bebé (Independência) e Júlio César (Vasco da Gama).

Ou então, no caso da escalação de uma segunda equipe: Pituba (Andirá); Azeitona (Amapá), Luís Carlos (Rio Branco), Chicão (Rio Branco) e Duda (Rio Branco); Merica (Rio Branco), Borges (Floresta) e Jangito (Independência); Ruy Macaco (Atlético), Dodô (Andirá) e Nelson (Atlético).

Usei como referência para cada jogador apenas um time. Aquele que, pelo meu entendimento, mais se identifica com o dito cujo. Alguns desses atletas, porém, defenderam múltiplas equipes. Caso, por exemplo, do Paulão, que além do Atlético também defendeu o Juventus e o Independência.

Outros que vestiram várias camisas foram o Chicão (Vasco da Gama, Juventus e Atlético), o Merica (Independência, Juventus e Vasco da Gama), o Ruy Macaco (Independência, Rio Branco e Andirá), o Nelson (Independência), o Duda (Atlético), o Bidu (Atlético) e o Bebé (Atlético).

No futebol acreano do passado, cujas partidas eram disputadas no desde sempre combalido Stadium José de Melo, esses caras todos fizeram a alegria de pessoas das origens mais variadas. Torcedores que, certamente, guardam na memória os lances de efeito, as sarrafadas e os gols de placa.

É claro que tanto nessa crônica quanto na passada eu citei nem dez por cento dos atletas negros que brilharam nos gramados nacionais ou regionais. Fui citando os jogadores que foram emergindo do meu pensamento imediato. Mas uma coisa eu digo: sem os craques negros não haveria futebol brasileiro!

– Setembro de 2024 –


Francisco Dandão

Falam por aí que a ordem dos fatores não altera o produto da soma. Trata-se de um enunciado matemático denominado “propriedade comutativa”. Diz-se que isso é uma verdade absoluta. Não me agrada nada o que se pareça com absolutismos. Absolutos me cheiram à degeneração!

Também não sou dado a acreditar em coincidências, acasos e congêneres. No meu entendimento, cada vez menos confiável, as coisas são como são por conta de uma história que vem lá do começo dos tempos, desde que Deus soprou no barro e os protozoários resolveram andar pelo mundo.

Então, sendo assim, ainda que a propriedade comutativa tenha pouco a ver com os protozoários dessa minha crônica de pé quebrado, me sinto à vontade para dizer que as queimadas, os buracos na atmosfera e o fogo que agora pretende nos assar vivos não tem nada a ver com alguma coincidência.

As imagens que nos alcançam neste instante da história do Brasil, via transmissão dos satélites que giram em volta do planeta sem cessar, são as mais tristes e horripilantes possíveis. A impressão que me passa é a de que a qualquer momento o fogo estará mais perto de mim do que eu gostaria.

No meu entendimento, a vida no planeta está por um fio, embora uns carinhas idiotas ainda digam que é tudo alarmismo. E que nada disso está acontecendo. E que esse fogo que a televisão tem mostrado é propaganda eleitoral dos comunistas para conquistarem ou se perpetuarem no poder.

No dizer desses sujeitos que negam tudo, inclusive a própria existência, depois da primeira chuva, quando as flores da primavera derem o ar da sua graça, todos voltaremos a respirar ar puro e esquecidos trataremos somente de comentar qual o artista que melhor se apresentou no Rock in Rio.

Falar nisso, pelo que eu observei, a maior preocupação do pessoal da organização do Rock in Rio, neste final de semana, aqui na zona oeste da capital carioca, é justamente com a hidratação da galera. Por esses dias, configura-se de suma importância dividir a água entre o fogo e os roqueiros.

Mas, querem saber qual é o cúmulo da ironia (eu ia dizer “coincidência”, mas lembrei que eu escrevi no começo deste texto, que não acredito nisso)? Pois eu lhes digo já. O cúmulo da ironia nesses tempos “ardentes” é que o líder do campeonato brasileiro se chama “Botafogo”.

Eu hein! Tô fora! Nem de fogo eu gosto. Pra mim, churrasco só da churrasqueira elétrica. Que os bombeiros tratem logo de apagar o fogaréu. No meu raciocínio, com tudo o que a gente tá vendo por aí, não é hora de um time chamado Botafogo conquistar o campeonato brasileiro. Não é mesmo!

– Setembro de 2024 –


Francisco Dandão

Desde muito tempo que me intriga um verso do cancioneiro popular brasileiro. A frase que diz que “os ventos do Norte não movem moinhos”. Já fiz até pesquisas sobre isso. Mas as minhas pesquisas não deram em nada. Continuo sem saber se os ventos são fracos ou se os moinhos são pesados.

Antes, porém, que alguém diga que eu ando mergulhando fundo na vida de Dom Quixote de La Mancha, cavaleiro que combatia justamente moinhos de vento, eu explico que o verso me aflorou à mente por conta do sucesso dos times do Norte do país no Campeonato Brasileiro da Série D.

No calor das tardes amazônicas, cujo sol costuma fritar ovo no asfalto e pirar as cabeças dos exploradores incautos (desde, inclusive, que um certo Aguirre provocou a “cólera dos deuses”), Manauara, Porto Velho e Manaus, que na primeira fase faziam parte do Grupo A1, já estão nas oitavas de final.

Dos quatro clubes do referido grupo que passaram para a segunda fase, apenas o Princesa do Solimões, clube da simpática cidade de Manacapuru, onde, aliás, costumam aportar políticos derrotados no Acre para ouvir o tristíssimo e lamentoso “choro do surubim”, não conseguiu seguir em frente.

Agora, depois de Manauara, Porto Velho e Manaus eliminarem, respectivamente, Tocantinópolis-TO, River-PI e Maranhão-MA, na esperança de que pelo menos um deles consiga a ascensão para a série C, eu já estou pensando na possibilidade de pedir aos céus um ventinho mais forte.

O Manauara, aliás, é preciso que se diga, tem feito até aqui uma campanha irrepreensível. Até o momento em que escrevo, final de tarde de sexta-feira (9 de agosto), com um olho na tela e outro no mar de Copacabana, são 16 as partidas jogadas pelo time, com 11 vitórias e cinco empates.

O time do Manauara é forte. Defende com extrema dedicação e ataca com precisão. E jogando em casa, então, pelo menos até agora, não deixa nada pra ninguém. Na segunda fase, por exemplo, depois de empatar fora com o Tocantinópolis, tascou uma goleada de cinco no incauto visitante.

O próximo compromisso do Manauara não vai ser fácil. Quem vem pela frente na sequência é o pernambucano Retrô. Provavelmente, se não sair faísca é bem capaz de “feder a chifre queimado”. Um combate, realmente, de dois candidatíssimos ao acesso. Sorte do Manauara que decide em casa.

Os outros dois times do Norte remanescentes nessa série D, o Porto Velho e o Manaus, jogam nessas oitavas de final contra, respectivamente, Itabaiana-SE e Iguatu-CE. O Porto Velho decide em casa. O Manaus decide fora. Eu acho que não vai ter moinho que aguente tanto vento. Oxalá!

– Agosto de 2024 –


Francisco Dandão

Depois de um friozinho esperto, daqueles de fazer a gente sempre remelar os olhos para encontrar um chocolate quente pela manhã e uma sopinha na hora do jantar, eis que o sol volta a castigar os cocos dos transeuntes incautos na sempre bela (e perigosa) cidade do Rio de Janeiro.

Enquanto isso, que eu nunca fui mesmo de queimar o tronco (nem a cabeça ou os membros) nas areias escaldantes das beiradas dos sete mares, de dentro do meu escritório, devidamente resfriado por um ar condicionado de última geração, eu fico pensando nas mais diferentes abobrinhas.

Então, puxa daqui e dali, com a vela já esticada para a navegação de praxe do fim de semana, me vi com algumas janelas do computador abertas à minha frente, relativas às tabelas de classificação das séries A, B, C e D dos campeonatos brasileiros de 2024, outro ano da Graça de Jesus Cristo.

Minha curiosidade, em princípio, foi a de verificar quantos times do Norte do Brasil apareciam no game. E aí eu vi que na série D não sobrou sequer umzinho para brigar pelo acesso à série C do próximo ano. Necas de pitibiriba. Foi todo mundo para o espaço. Caíram todos nas oitavas de final.

Enquanto isso, na série C permanece apenas o glorioso Clube do Remo, que só passou para a segunda fase agarrado num fiapo de cabelo. Com uma campanha de oito vitórias em 19 rodadas, o Clube do Remo vai precisar de muita chuva, açaí com farinha, tacacá e maniçoba para subir a ladeira.

Já na série B, os dois nortistas, o paraense Paysandu e o amazonense Amazonas, se não são, a essa altura, candidatos ao pódio ou a ficar entre os quatro primeiros, pelo menos também não têm sido frequentadores habituais da zona da confusão, aquela que apresenta o cadafalso aos desafortunados.

Na série A nem se fale. Sei lá quanto tempo faz que um time do Norte não faz parte da elite do futebol brasileiro. Se esse texto tivesse a pretensão de ser uma comédia antiga, e seu eu tivesse o talento daqueles antigos dramaturgos saxões, poderia até se chamar “sonho de uma noite de verão”.

Menos mal que, no caso da série A, para fugir aos eventos de praxe, na falta de um time do Norte na categoria dos emergentes, tem um nordestino na cabeça. O Leão do Pici, que a verve criativa dos cabeças chatas adaptou para “Laion”, popularmente conhecido como Fortaleza, anda rugindo alto.

É isso, por hoje, galerinha que me segue desde que na Terra era pleno abril e desde que nas bancas de revista brilhava um sol que não era astro nem rei. Fiquem por aí que eu vou ali, consultar o meu horóscopo. Eu sou de libra. Signo do equilíbrio. Desde que eu não cometa alguma linha mal traçada!

– Agosto de 2024 –


Francisco Dandão

O futebol está cheio de histórias pitorescas. Histórias que a maioria de nós jamais fica sabendo. O que acontece dentro de campo, aquilo que é visto pelos frequentadores dos estádios, é só a ponta do iceberg. Um tantinho assim. Quase nada mesmo, em relação aos fatos dos famosos bastidores.

A gente só sabe dessas histórias quando algum personagem indiscreto dá com a língua nos dentes. Naturalmente, quem resolve relatar um fato “escondido” muitas vezes dá uma enfeitada na narrativa, acrescenta tintas e pincéis. Motivo pelo qual as criaturas atingidas tratam logo de desmentir.

Por esses dias, nesse sentido dessas historinhas, eu fiquei sabendo do caso de um ex-jogador, então titular de um time grande do Rio de Janeiro (se não digo o nome é porque não tenho certeza do fato) no início do século XXI, que ao tentar fazer um crediário lhe exigiram um comprovante de residência.

Aí, de acordo com a lenda, ele foi em casa, que aliás era muito longe da loja onde ele queria fazer o crediário, e fez uma selfie, junto com a mulher e os dois filhos, em frente à sua residência. Na volta à loja, como o vendedor não aceitou a foto como comprovante, quase que os dois saem na porrada.

Numa outra ocasião, sempre de acordo com a lenda, esse mesmo jogador viajou em excursão do seu time para a África do Sul. Viagem longa, sem escalas, tempo infinito de voo e em horas idas da madrugada. E como o sujeito morria de medo de avião, não pregou os olhos nem por um minuto.

Eis que, então, logo depois de a delegação descer no aeroporto de Joanesburgo, um repórter de televisão se dirigiu ao dito cujo perguntando-lhe se ele poderia conceder uma entrevista. Apesar do cansaço e do sono, não querendo ser descortês, o jogador atrapalhado resolveu atender ao pedido.

A primeira pergunta foi sobre o que ele sabia do futebol do país africano. Como o sujeito não sabia nada, deu uma de Rolando Lero, se desfazendo em elogios e dizendo que tinha consciência do valor do adversário e que, certamente, o seu time ia precisar suar sangue para vencer.

Nada fora do normal do que a maioria dos craques costuma responder nas entrevistas. Tudo tranquilo até essa hora. Mas aí, eis que na segunda pergunta o bicho pegou. É que o repórter enveredou pelo caminho da política, indagando o que o jogador “pouco letrado” achava do apartheid.

Resposta da criatura. “Não tenho muitas informações sobre esse cara. Mas, já que você está perguntando, imagino que ele deve ser o cracaço do time local que nós vamos enfrentar. Então, se for o caso, a gente faz marcação individual nele. Basta não deixar ele andar em campo. A gente anula ele!”

– Agosto de 2024 –


Francisco Dandão

Um dia desses eu recebi um texto do amigo José Renato Santiago, escritor de vários temas e detentor do maior acervo sobre esportes do mundo, inclusive com registro no Guiness Book e tudo, discorrendo sobre um craque com nome de fruta que despontou no futebol cearense na década de 1970.

O craque da narrativa do José Renato se chamava Raimundo Constâncio Neto, nascido em Fortaleza, no ano de 1960, mas todo mundo no âmbito do futebol só o conhecia pelo singelo apelido de Tangerina. O apelido pegou tanto que se alguém o chamasse pelo nome, ele sequer atendia.

Jogando por vários anos pelo Guarany de Sobral, ao lado de outros dois virtuoses de nome Teco-Teco e Birungueta, tudo de acordo com o Zé Renato, o goleador Tangerina quando não era aprovado em algum teste feito num clube grande, ouvia o pessoal dizendo que dele só restava o “bagaço”.

Mas, como uma prosa puxa a outra e deixando o Tangerina de lado, eu fui lendo o texto do Zé Renato e tentando me lembrar dos craques do futebol acreano que também tinham uma fruta como apelido. Casos de dois Goiaba (um meia e outro atacante), do César “Limão” e do Abacate.

Goiaba, como eu disse no parágrafo anterior, eram dois. Um meia do Vasco da Gama, descoberto pelo presidente Almada Brito numa pelada na praia da Base (Copabase, diziam os moradores do lugar), sujeito que jogava muito, e um atacante do juvenil do Rio Branco, que não sabia nada de bola.

O Goiaba do Vasco era daquelas criaturas que jogava de cabeça erguida, bom de drible e que descobria espaços mínimos para municiar os colegas de ataque. Já o Goiaba do juvenil do Estrelão, mais conhecido por ser funcionário do cine Rio Branco, perdia gols até com o goleiro amarrado.

Enquanto isso, o Abacate era um ponteiro-direito, morador do bairro da Seis de Agosto, que despontou como promessa de craque no juvenil do Rio Branco, aí pelos primeiros anos da década de 1970. Driblava como poucos, infernizava os laterais e buscava incessantemente a linha de fundo.

O Abacate, aliás, foi uma promessa de craque que não se cumpriu. Não tenho conhecimento dos motivos pelos quais ele não se tornou titular do Rio Branco. Minha suspeita é a de que ele enfrentou concorrência muito pesada com jogadores oriundos de outros estados e não quis seguir insistindo.

Já o César “Limão”, de grande habilidade e velocidade, esse brilhou com as camisas do Juventus e do Independência, nos anos das décadas de 1980/1990. Passou até um tempo no futebol europeu. Provavelmente, daria um bom trio atacante esse formado por Abacate, Goiaba e César “Limão”!

– Agosto de 2024 –


Francisco Dandão

Na próxima sexta-feira (19 de julho), completam-se 49 anos do primeiro jogo do extinto Copão da Amazônia, torneio que envolvia times dos estados do Acre, Amapá, Rondônia e Roraima. No caso, as quatro unidades federativas onde o futebol não havia atingido o estágio do profissionalismo.

As quatro equipes que participaram daquela primeira edição, realizada em Porto Velho-RO, foram o Atlético Clube Juventus (representante do Acre), o Baré Esporte Clube (por Roraima), o Esporte Clube Macapá (pelo Amapá) e o Ferroviário Atlético Clube (representante de Rondônia).

Foi uma competição marcada por inúmeras confusões e grandes polêmicas. Tantas que os dois primeiros jogos, entre, respectivamente, Juventus e Baré (2 a 1 para os acreanos) e Ferroviário e Macapá (2 a 2), foram anulados, sob a alegação de que havia jogadores irregulares na parada.

Quem estava irregular no jogo do Ferroviário contra o Macapá, eu não lembro. No jogo do Juventus contra o Baré, quem não podia estar em campo era o goleador Julião, atacante de rara habilidade, que havia trocado, por aqueles dias, o futebol profissional do Amazonas pelo amadorismo do Acre.

As anulações ensejaram a marcação de novos confrontos. E então, o Juventus, sem o Julião, não foi além de um empate contra o Baré (1 a 1). O Macapá, por sua vez, que contava no seu elenco com jogadores que depois ficaram famosos no futebol brasileiro, goleou o Ferroviário por 3 gols a 0.

E assim, no final das contas, os amapaenses, que também venceram o Juventus (1 a 0) e o Baré (3 a 2), somaram seis pontos (três vitórias) e levaram para casa o título histórico do I Copão da Amazônia. O Ferroviário ficou em segundo, o Juventus foi o terceiro e o Baré ficou em último lugar.

Independentemente dos imbróglios que permearam a maioria das edições do Copão da Amazônia, o certo é que a competição causava um verdadeiro frenesi nos torcedores dos estados envolvidos, todos querendo provar que o melhor futebol era praticado nas suas respectivas localidades.

O Copão da Amazônia, que sempre foi uma grande festa do futebol amador do Norte e proporcionou inúmeras emoções a todos os envolvidos, teve sua última edição em 2003. O estado do Amapá foi o líder dos títulos (sete no total), seguido do Acre (cinco), Rondônia (quatro) e Roraima (um).

E para que essas memórias não pequem pela omissão, cumpre finalizar dizendo que os dois maiores responsáveis pela criação desse torneio foram os então presidentes das federações do Acre e de Rondônia, respectivamente major Adel Derze e jornalista Vinícius Abrahão Coutinho Danin. Ave!

– Julho de 2024 –


Francisco Dandão

Me escreve o amigo Dário Lopes, antigo sindicalista e funcionário do arquivo da Universidade Federal do Acre (Ufac), querendo saber detalhes da visita do Flamengo-RJ ao Acre, em 1966. Como o meu conhecimento do fato não era tamanho, corri aos alfarrábios para fornecer a informação precisa.

E aí, para além dos resultados do time carioca nos gramados seringueiros (2 a 1 contra a seleção acreana e 2 a 2 contra o Juventus), descobri alguns fatos interessantes que passarei a socializar aqui com a minha meia dúzia de três ou quatro leitores (projeção otimista essa minha).

. O maior responsável pela visita do Flamengo ao Acre foi o então presidente da Federação Acreana de Desportos, deputado José Chaar Filho. O rubro-negro havia jogado em Porto Velho (vitória de 5 a 1 contra a seleção de Rondônia) e topou em dar uma esticada para o lado mais a Oeste do país.

. No jogo em Porto Velho aconteceu um fato deveras insólito. É que o árbitro do jogo, senhor Manoel Messias, resolveu, lá pelas tantas, expulsar o meia rubro-negro Carlinhos Violino, por reclamação. Mas aí a galera se rebelou e passou a gritar “fica, fica”. O árbitro, então, teve que voltar atrás.

. Nos dois jogos em Rio Branco, os três gols marcados pelos acreanos (um da seleção e dois do Juventus) foram todos de falta. E todos marcados pelo amapaense Jangito, funcionário do Banco do Brasil, e um dos maiores craques entre os oriundos de outros estados que já pisaram o solo do Acre.

. Em ambos os jogos, dois atletas do Acre encheram os olhos dos visitantes: o goleiro Zé Augusto que, de acordo com relatos da época, pegou demais; e o meia Dadão que, segundo consta nas crônicas, escondeu a bola. Não por acaso, um e outro depois foram jogar em times do Rio de Janeiro.

. No segundo jogo, o Flamengo estava perdendo até os minutos finais. Deveria mesmo ter perdido. Não fosse um gol de mão, feito pelo atacante César Maluco, depois da cobrança de um escanteio inexistente, eles teriam saído do Acre amargando uma derrota, o que faria deles chacota nacional.

. Para efeito de registro, a seleção acreana, dirigida pelo treinador José Aníbal Tinoco, jogou com Zé Augusto; Carlos Mendes, Mozarino, Campos Pereira e Escurinho; Romeu (Dadão) e Zé Augusto Passada Larga (Zé Mello) (Tião Lustosa); Jangito, João Carneiro, Ayrton Baú e Touca (Nemetala).

. Igualmente para efeito de registro, o Juventus mandou a campo Zé Augusto; Carlos Mendes, Pedro Louro, Mozarino e Campos Pereira (Escurinho); Dadão e José Augusto Passada Larga (Tião Lustosa); Nemetala (Ayrton Baú), Jangito, João Carneiro e Touca. Técnico: José Aníbal Tinoco.

– Julho de 2024 –


Francisco Dandão

Por esses dias eu li na internet matéria curiosa, alusiva a jogadores conhecidos pelo nome de animais, sendo uns do próprio sobrenome e outros por conta de apelidos. Juntando todos num só balaio, a gente tem o desfilar de uma verdadeira e vasta fauna, digna das melhores antologias do gênero.

Na série A, entre outros, tem o “Ganso” (Paulo Henrique, do Fluminense), o “Gatito” (Roberto Fernandez, do Botafogo), o Rafael “Ratão” (Rafael Rogério, do Bahia), o “Mosquito” (Gustavo Silva, do Corinthians) e o Wellington “Rato” (Welington Soares, do São Paulo).

E nas demais séries, também entre outros, se pode encontrar o “Jacaré” (Francisco Vítor, do América-MG), o “Urso” (Emerson Lima, do Brusque), o Wesley “Pomba” (Wesley da Conceição, do Coritiba), o “Pardal” (Pablo de Silva, do Manauara) e o Alex “Galo” (Alex da Cruz, do Jacuipense).

Aí, como uma coisa puxa a outra e assim por diante, numa sequência quase infinita, eu fiquei dialogando com os meus botões por alguns minutos e nós fomos (eu e os tais botões) nos lembrando de antigos jogadores do futebol acreano que se notabilizaram por também terem animais no apelido.

E então, sempre a partir do meu diálogo com os botões, chegamos ao seguinte time de nomes de animais, posição por posição, escalado no antigo sistema quatro-dois-quatro: Ratinho; Pintão, Gato, Curica e Zé Pinto; Pixilinga e Pintinho; Zé da Porca, Danilo Galo, Catita e Maurício Bacurau.

Ratinho, aliás, foram dois goleiros chamados dessa maneira: um do Andirá (cujo nome era Raimundo) e outro (o Edvaldo Souza) do juvenil do Vasco. Ambos que defendiam os chutes dos inimigos na década de 1970, época em que, por não existirem luvas, eles lambuzavam as mãos com breu.

Pintão, Curica, Pintinho e Maurício Bacurau gastaram a bola no Atlético. Gato surgiu no Náuas. Pixilinga e Zé da Porca defenderam o Andirá. Zé Pinto e Catita castigaram a deusa no São Francisco. E Danilo Galo foi artilheiro tanto do Atlético quanto do Vasco e do Rio Branco.

Mas além desses onze citados, eu lembro de vários outros jogadores do futebol acreano que atendiam pelo apelido (ou sobrenome) de animais. Casos de Zé “Galinha” (Vasco), Jorge “Jacaré” (Rio Branco e Juventus), Edson “Urubu” (Andirá), “Barata” (São Francisco) e “Pipira” (Rio Branco).

O treinador desse time bem que poderia ser o Olavo Pontes, misto de radialista e estudioso das táticas do futebol, que costumava mandar seus jogadores “aquecer o calção” e que atendia pelo singelo apelido de “Papagaio da Noite”. É isso aí. Uma fauna. Bom elenco e bom treinador!

– Julho de 2024 –


Francisco Dandão

Todas as semanas, desde a segunda rodada do Campeonato Brasileiro da Série D, no dia 4 de maio deste ano, eu vinha renovando as minhas esperanças de que o Rio Branco e o Humaitá, os dois representantes do Acre na competição, começariam as suas escaladas rumo ao topo da classificação.

Por tentar ser um eterno e incorrigível otimista, eu achava naquele momento que as derrotas de ambos na primeira rodada (o Humaitá perdeu em casa para o Porto Velho e o Rio Branco perdeu fora para o Manauara) era somente um acidente de percurso. Nada que não pudesse ser consertado.

Mas aí, os dias foram passando, as rodadas se sucedendo, e os dois times foram ficando para trás, ocupando as últimas posições na tabela de classificação. O Rio Branco até ainda venceu uma aqui e empatou outra acolá. O Humaitá, entretanto, desceu ladeira abaixo até o fundo do buraco.

Nesse momento em que escrevo, noite de sexta-feira, o Rio Branco é o penúltimo do Grupo A1, com 11 dos 33 pontos disputados. Já o Humaitá, o suprassumo da incompetência, a este não coube sequer um pontinho. Vai sair do game com o dedo enfiado no nariz (isso para não dizer coisa pior).

Uma rápida olhada nos números dá bem a dimensão da tragédia. São 11 os jogos disputados pelo Humaitá, são 11 as derrotas, com apenas três gols marcados e 26 sofridos. Um arremedo de time de futebol que, nitidamente, não veio jogar a Série D deste ano com o intuito de competir.

Esse desempenho desastroso torna o Humaitá o pior time das quatro divisões do futebol brasileiro em 2024. Ninguém é pior do que o Humaitá. Ninguém! Todos os outros “lanternas” das suas respectivas competições (ou grupos), em algum momento conseguiram somar os seus pontinhos.

Mas o Humaitá é o atual vice-campeão acreano (bem como também o foi no ano passado). E até uns meses atrás jogava muita bola. Como é que tão rápido assim o time se transmuta de vinho em vinagre? Resposta simples: o time vice-campeão foi desmontado e restou apenas um elenco meia boca.

E por qual motivo, o clube opta por montar um time forte para disputar o campeonato estadual e não mantém os mesmos jogadores para jogar a Série D? Outra resposta simples, para a qual não é necessário consultar a bola de cristal. É que o certame estadual dá vaga para a Copa do Brasil. Só isso!

Pois é isso, meus caros amigos. No mais, só quero lembrar que neste sábado (6 de julho), os dois piores times do Grupo A1 do Campeonato Brasileiro da Série D, Rio Branco e Humaitá, estarão frente a frente. E eu nem vou arriscar um placar. O meu palpite é que ambos vão ser derrotados!

– Julho de 2024 –


Francisco Dandão

Por esses dias eu estava revisitando papéis aqui dos meus mais do que bagunçados arquivos e me deparei com uma entrevista que eu fiz com o saudoso árbitro José Ribamar Pinheiro de Almeida, o mais sarcástico e sincero dos homens do apito do futebol acreano, falecido em janeiro de 2017.

Lá pelas tantas, no meio da nossa conversa, testemunhada pelo meu afilhado Manoel Façanha, que registrava a cena com a sua admirável capacidade de fotografar detalhes, eu perguntei ao Ribamar quais os jogadores mais chatos com quem ele tivera o desprazer de trabalhar.

Sem hesitar, ele nomeou os três camaradas que considerava piores, aqueles que tentavam de todas as maneiras atrapalhar as ações da arbitragem em favor de si. No dizer do José Ribamar, os três sujeitos eram o volante Emilson Brasil, o meia-armador Dadão e o atacante Bruno Couro Velho.

Segundo o José Ribamar, o Emilson não parava de falar o jogo inteiro. Era um conversador, sempre querendo embotar o raciocínio do árbitro. Contava piadas sem graça e ria sozinho, na ideia de distrair Sua Senhoria, para que este errasse as marcações, tanto faz se para um ou outro lado.

Já o Dadão, era o cara que pedia faltas ao seu favor, onde absolutamente não existia nada; pedia impedimentos dos adversários, quando os caras estavam pelo menos meio metro atrás dos defensores; e caía em campo ao menor toque, se imaginasse uma vantagem qualquer que fosse.

Mas ninguém, sempre no dizer do entrevistado José Ribamar, superava em termos de chatice o Bruno Couro Velho, um centroavante oriundo de Brasiléia, a vida inteira a serviço do Rio Branco, sem qualquer intimidade com a bola, e que cometia muito mais faltas do que fazia gols.

O problema do Bruno Couro Velho é que ele amava uma pescaria, atividade à qual se dedicava, aos sábados e domingos, sempre que estava de folga das jornadas esportivas. Acontece que em épocas de campeonato, para desgosto dele, havia muitos jogos do Rio Branco nos finais de semana.

Como não podia faltar ao jogo, dado que o Rio Branco lhe dava casa, comida e roupa lavada, o Couro Velho já entrava em campo com a intenção de ser expulso. Aí, ele fazia todo tipo de provocação aos árbitros, bem como batia sem dó nos adversários. Às vezes dava certo e ele era expulso mesmo.

Até que em dia, sabedor da malandragem do Bruno, depois de duas entradas violentas dele nos adversários e vários palavrões dirigidos ao árbitro, Ribamar saiu-se com essa: – Couro Velho, eu sei o que tu queres fazer. Mas tu hoje podes até ficar nu em campo que eu não vou te expulsar!

– Junho de 2024 –


Francisco Dandão

No tempo em que eu era estudante de Letras, na Universidade Federal do Acre (Ufac), em mil novecentos e lá vai pedrinhas, aprendi que as palavras são vivas. E, assim sendo, ao longo do tempo inclemente elas podem migrar de um sentido a outro, se moldando às gírias que vão surgindo.

Antigamente, por exemplo, em se tratando de futebol, o vocábulo “zona”, seguido da palavra “agrião”, “zona do agrião”, se aplicava à grande área de cada time. Assim, quando o técnico queria mandar um jogador cruzar para a área inimiga, ele dizia para o sujeito jogar a bola na “zona do agrião”.

No mundo líquido pós-moderno, porém, onde nenhuma forma permanece igual por minuto algum, mais ou menos como Heráclito descobriu ser o rio em que os seus contemporâneos se banhavam, não existe mais “zona do agrião”. Zona agora só a do terror, do medo, ou da confusão.

Indesejada, os times fogem da zona como o diabo foge da cruz (ou o vampiro foge da luz do sol). Quem está na zona, quer sair o mais rápido possível; quem está fora dela, move céus e terras para não entrar. Mas o certo é que, dadas as diversas circunstâncias, alguém vai ter que estar por lá.

No momento em que escrevo, meio da manhã de um sábado (29 de junho), com um sol ardente se derramando pelas cabeças dos transeuntes de Copacabana, olhando pela janela para os braços abertos do Cristo Redentor, três gigantes do futebol brasileiro se encontram nessa incômoda situação.

Corinthians, Grêmio e Fluminense, clubes da maior tradição, detentores de glórias mil, ocupam, respectivamente, o 18º, 19º e 20º lugar num campeonato em que os quatro últimos serão rebaixados ao fim de 38 rodadas. Uma classificação incompatível para a grandeza de cada um deles.

O caso do Fluminense, meu querido Tricolor das Laranjeiras, é o mais enigmático. Afinal, poucos meses atrás o time se sagrou campeão da América, derrotando o tradicionalíssimo argentino Boca Juniors. Momento de êxtase que em nada indicava a draga que sucederia o expressivo título.

O que teria mudado de lá pra cá? O que estaria travando as pernas dos craques do tricolor? Desaprender a jogar bola, eu garanto que não foi. Falta de vontade de vencer, eu garanto que não é. Questões de bastidores, tumultuando o ambiente, eu acho pouco provável. Então o que poderia ser?

Sinceramente, eu não sei. Provavelmente, nunca saberei. O que sei é que existem por aí várias teorias tentando decifrar o mistério, desde o envelhecimento do elenco até à teimosia do técnico recém demitido. Tudo especulação. Enquanto isso a esfinge segue devorando as minhas esperanças.

– Junho de 2024 –


Francisco Dandão

Nas décadas de 1970 e 1980, os dirigentes do Atlético Acreano, liderados pelo então promotor Adauto Frota, sempre montaram bons times. Eles levavam para as hostes celestes uma dúzia de ótimos boleiros do futebol local e completavam o elenco com algumas peças trazidas de fora do estado.

Numa das formações de 1980, por exemplo, o time botava em campo Ilzomar; Pintão, Jaime, Lécio e Bento Zero Hora; Targino, Gilmar, Paulinho Pontes e Pintinho; Adriano e Nirval. Todos experientes e íntimos da deusa bola, sob o comando enérgico e competente do treinador Gualter Craveiro.

Eis que, sabedores que esse grupo jogava muito, apesar de não haver conquistado o título estadual daquele ano (o campeão foi o Juventus) dirigentes do futebol peruano convidaram o Atlético para um torneio internacional, com a participação de dois times lá deles e um outro boliviano.

O Atlético fez, como se dizia antigamente, “barba, cabelo e bigode”, vencendo com facilidade o torneio promovido pelos peruanos. Tão fácil que o goleiro Ilzomar praticamente não teve trabalho, permanecendo em campo mais como espectador privilegiado, sequer sujando o uniforme de jogo.

Até aí, tudo como nos melhores roteiros desses filmes de Hollywood que passam inúmeras vezes nas sessões da tarde da televisão brasileira. Só festa depois dos jogos. Comemorações efusivas entre os membros das delegações dos três países, regadas a muitos litros de cerveja cusquenha.

Acontece que, na manhã do dia marcado para a volta do Galo, já com o dever cumprido, um grupo de jogadores, acompanhado do professor Gualter, saiu às compras na zona franca dos “patrícios”. Afinal, era véspera de Ano Novo e todo mundo queria levar pra casa umas lembrancinhas.

No meio do grupo o lateral Zero Hora, que era conhecido por se apropriar indevidamente do que não lhe pertencia. E então, para fazer jus à fama, na primeira oportunidade o dito cujo surrupiou do balcão de uma loja um carrinho de brinquedo, miniatura de um carro de polícia, movido à pilha.

Depois, quando o grupo já havia saído da loja e andado alguns quarteirões, o Zero Hora mostrou o brinquedo para a turma, afirmando que havia comprado por um bom dinheiro. O Gualter, que era policial militar, ficou doido pelo carro e fez proposta de compra ao lateral atleticano.

Não houve, porém, acordo quanto ao preço. Mas aí, a essa altura, agentes policiais já estavam à caça do gatuno. Percebendo a movimentação, Zero Hora disse para o Gualter: – Como o senhor é um cara legal, eu vou lhe dar o carrinho de presente -. O Gualter aceitou e quase foi parar no xilindró!

– Junho de 2024 –


Francisco Dandão

Se este texto fosse uma daquelas mensagens de felicitações que eram lidas nas décadas de 1960 e 1970 na Rádio Difusora Acreana, eu deveria começar dizendo que “os passarinhos amanheceram nesse sábado cantando com mais alegria pela passagem do aniversário do Manoel Façanha”.

Mas, como o texto não é uma antiga mensagem radiofônica, vou enveredar por outro caminho discursivo para dissertar um pouquinho sobre essa criatura que eu tive o prazer de conhecer nos primeiros anos deste século XXI e da qual eu tive a honra de ser padrinho de casamento, em 2009.

Primeiro falo das origens, que apesar de ter crescido em Rio Branco, o certo é que ele nasceu em Xapuri, no dia 22 de junho de 1970 (ôpa, sem querer, querendo, entreguei a idade do homem!). Conterrâneo, portanto, de muita gente boa, como Adib Jatene, Chico Mendes e Cláudio Porfiro.

Depois veio o namoro com o futebol, em cujo esporte ele deu os primeiros chutes num campinho ao lado da sede da Fundação do Bem-Estar Social, no bairro Estação Experimental, em 1984. Baixinho, ágil e veloz, ele jogou ao lado de craques como, citando dois, Cézar Limão e Rei Artur.

Nesse aspecto, ressalte-se que ele chegou até a fazer testes na base do Rio Branco. Mas, apesar de aprovado, não ficou muito tempo por conta da impossibilidade de pagar o transporte todos os dias para se dirigir ao treino. Foi quando ele entendeu que o caminho da ascensão passava pela escola.

E então, seguindo o rumo natural das coisas, e não contente em ser um homem de uma única formação, o Façanha cursou logo duas faculdades: História, na Universidade Federal do Acre (Ufac), e Jornalismo, no Instituto de Ensino Superior do Acre (Iesacre). Formações que se complementam.

Na crônica esportiva, ele ingressou no ano de 1996, a convite do parceiro dele Raimundo Fernandes, que era repórter do jornal O Rio Branco, mas precisava se licenciar para disputar uma vaga na Câmara Municipal da capital Acreana. Era pra ser uma interinidade. Era para ser, mas não foi.

Não satisfeito em escrever matérias, pouco tempo depois o meu inquieto afilhado entendeu que deveria desenvolver a arte da fotografia. E daí, pela sua capacidade de aprender o que lhe dá na telha, ele hoje ostenta a marca der ser um dos melhores repórteres fotográficos do Norte do país.

Fora tudo isso, ainda tem mais duas coisas que eu preciso dizer sobre ele, antes que acabe esse meu latifúndio de internet de cada semana: o cara também publica livros e possui o maior acervo de documentos esportivos que se tem notícia sobre o futebol acreano. Vida longa ao Façanha, portanto!

– Junho de 2024 –


Francisco Dandão

Uns meses atrás encontrei o amigo de adolescência, Emerson Carneiro, transitando pelas infovias. Há muito tempo não nos falamos presencialmente. Estamos distanciados no espaço. Ele mora no Acre e eu passo uma temporada no Rio de Janeiro. Milhares de quilômetros entre nós.

Mas aí, como não existe distância que a tecnologia pós-moderna não possa fazer virar pó, passamos a trocar mensagens diárias. Das saudações de praxe, nos primeiros dias do contato, acabamos enveredando pelas reminiscências. Causos em que as lembranças de um e outro se completam.

Algumas vezes falamos sobre as presepadas do nosso tempo de imberbes ginasianos no Colégio dos Padres, naquele prédio ali da avenida Epaminondas Jácome que hoje virou museu, onde, ressalte-se, aprendemos a torcer fervorosamente pelo sempre glorioso Atlético Clube Juventus.

Das presepadas, uma que me ficou gravada na memória foi a do dia em que um gaiato (como ele já partiu para o além, vou me reservar ao direito de não declinar o nome do dito cujo) aproveitou a hora do recreio para esconder boa parte das bolsas nas quais carregávamos o material escolar.

Deu uma confusão danada. A segunda parte do dia foi dedicada a procurar as bolsas “sequestradas”. Não sei como o sujeito conseguiu fazer aquilo. Cada bolsa estava escondida num lugar diferente. Naturalmente, o mesmo camarada que as escondeu foi quem encontrou a maioria delas.

Outras vezes falamos de personagens nossos contemporâneos que o correr da vida tratou de levar para locais incertos e não sabidos. Personagens como um amarelinho chamado Marlon. E outro, um certo Raimundo, da cabeça enterrada entre os ombros, que chamávamos de mago Moloque.

O Marlon, que além da tez amarela da pele era bem magrinho, quando queria impor a sua vontade, ante o olhar furioso da turba, saía-se com a seguinte expressão: – Foi o padre quem deu essa ordem! Alguma objeção? Essa frase era a senha para todo mundo baixar a crista e obedecer ao Marlon.

Enquanto isso, o Moloque se notabilizou pelas ideias comunistas que vivia pregando, em tempos de ditadura militar. O Moloque jamais dividia a merenda que levava de casa, mas afirmava que somente um regime onde não existisse a propriedade privada seria capaz de salvar a humanidade da fome.

Sim, pra não dizer que eu não gosto de falar de flores, havia as peladas depois das aulas de educação física. O Emerson era atacante, como o irmão dele, Edson Carneiro. Eu era meio campo, do tipo que preferia mais desarmar do que construir. Nem eu nem ele levamos a carreira adiante. Felizmente!

– Junho de 2024 –


Francisco Dandão

Existe um debate atualmente no futebol mundial sobre a forma de um time fazer a transição da defesa para o ataque. Um bom número de teóricos defende que o certo é sair tocando a bola de pé em pé, no tique-taque! Outro grupo acha que o certo é jogar em profundidade, via lançamento longo.

Sair jogando desde a defesa tem uma vantagem, digamos, elementar: controlar a bola, fazendo com que o adversário simplesmente corra de um lado para o outro, feito aqueles caras que ficam no meio da rodinha de bobo antes dos treinamentos. Correr sem pegar na bola é mesmo muito irritante.

Em compensação, se o time que optar por esse modelo não tiver gente muito qualificada para exercitá-lo, a vaca vai para o brejo mais rápido do que aquele herói das histórias em quadrinhos gritava “shazam”. Se o adversário roubar a bola perto da área dos caras do tique-taque, “adeus, tia Chica”.

Do ponto de vista do lançamento longo, tipo quarenta ou cinquenta metros, com a bola viajando por cima das cabeças dos contendores, a maior vantagem é que só dois caras, em princípio, precisam sair correndo: aquele que foi lançado e outro para tentar aproveitar um eventual cruzamento.

Por outro lado, já que nada nessa vida pode ser perfeito, se o sujeito encarregado de fazer o tal lançamento não for expert nessa arte de chutar com precisão, do tipo que sabe a força a ser imprimida na bola, levando em conta a voz do vento, vai sempre devolver a posse dessa bola ao inimigo.

É importante, em se tratando desse tema de mandar a bola para longe, não confundir “lançamento longo” com “chutão”. No primeiro, a direção da pelota (como dizem portenhos, andinos e assemelhados) deve ser perfeita (ou quase). Já no “chutão”, o que menos conta é o rumo para onde a bola vai.

Enquanto escrevo, vou lembrando de jogadores do passado do futebol acreano que foram adeptos de uma e outra coisa. Euzébio e Passada Larga faziam parte do time dos caras que mandavam a bola onde queriam. Deca e Lécio, por sua vez, eram daqueles que chutavam para onde o nariz apontasse.

Euzébio e Passada Larga, jogadores de meio-campo, respectivamente do Atlético e do Andirá, invariavelmente metiam a bola nas costas (ôpa!) dos laterais adversários. Já o Deca, no Independência e no Juventus, e o Lécio, em vários times, para eles qualquer bola havia que ir parar dentro do mato.

É isso, caríssimos leitores dessas para sempre mal traçadas. O debate continua. Toques curtos, desde a própria área, ou lançamentos em profundidade? Qual a sua preferência? Para mim, que nunca tenho certeza absoluta disso ou daquilo, o que importa é que o meu time saia vencedor!

– Maio de 2024 –


Francisco Dandão

Apreciei por esses dias uma publicação, em rede social, de autoria do jornalista amapaense Franselmo George, o popular Magrão da História, sobre o antigo craque (bota craque nisso), também do Amapá, João do Carmo Tavares, conhecido nas lides esportivas, no seu tempo de bola, como Jangito.

Em breves linhas o Franselmo George traça a trajetória do Jangito desde as primeiras peladas, num campinho que ficava na vetusta praça Veiga Cabral, em frente à Prelazia de Macapá. Um adolescente prodígio, revela o autor do texto, que se dividia na sua paixão entre o futebol e o basquetebol.

Diferenciado no trato com a bola nos pés, não demorou muito e o Jangito estava vestindo a camisa de um time federado. No caso, o Juventus (lá da cidade deles e não o do Acre). E um pouco depois, em 1961, aos 20 anos (ele nasceu em junho de 1941), o craque se mudou para o Cea Clube.

Quando chegou o ano de 1963, o Clube do Remo, de Belém, foi fazer um amistoso em Macapá. Para os remistas, a vitória seria fácil. Afinal de contas, o Remo era um time profissional. E a turma do Amapá estava longe de alcançar este estágio no futebol. Puro engano: o Remo apanhou de 4 a 2.

Jangito brilhou naquele dia, marcando três dos quatro gols da sua equipe. E aí, a história não poderia continuar de outra maneira que não fosse a contratação dele pelo Remo. Primeiro, claro, havia que passar num teste. Ele não hesitou. Foi ao Baenão e marcou dois gols no treino. Contratado!

Acontece que, antes de assinar contrato, Jangito avisou à cartolagem remista que havia prestado um concurso para o Banco do Brasil e que não continuaria jogando se fosse aprovado. Dito e feito: ele foi aprovado e deixou o Remo para trás, sendo designado para trabalhar em Rio Branco, no Acre.

Aí, então, começou a história dele no futebol acreano, defendendo três clubes, de 1965 a 1970: Rio Branco, por um ano e meio; depois, a convite do dirigente Capitão Maia, Jangito foi para o Grêmio Atlético Sampaio, onde foi campeão estadual de 1967; em seguida, ele migrou para o Independência.

No Independência, pelo qual também se sagrou campeão acreano, provavelmente Jangito tenha vivido o seu período de maior brilho, formando num elenco que alinhava, entre outros virtuoses, João Carneiro, Escapulário, Palheta, Chico Alab, Jorge Floresta…, isso sob o comando de Alício Santos.

Pra finalizar, devo dizer que entre os muitos jogadores do futebol acreano que eu vi em ação, da segunda metade da década de 1960 pra cá, o amapaense Jangito figura entre os três maiores. Os outros dois dessa minha lista seleta são Touca e Dadão. Todos eles, verdadeiramente fora de série!

– Maio de 2024 –


Francisco Dandão

Fiquei sabendo num noticiário qualquer, desses que falam menos de desgraças e mais de amenidades, que vários jogadores de futebol da década de 1990 estiveram nessa semana que recém passou em Willemstad, capital da aprazível ilha de Curaçao, antiga colônia holandesa na região do Caribe.

Muita gente boa, pelo que eu vi no vídeo e depois na internet, foi retocar o bronzeado sob o sol do lugar. Casos, pelo lado dos brasileiros, de Ricardo Rocha, Paulo Sérgio, Bebeto, Gonçalves etc. E casos, pelo lado dos gringos, de Valderrama, Asprilla, Goycochea, Seedorf etc. Tudo gente fina!

(Que me perdoem os ufanistas de toda a espécie, mas não há lugar melhor para retocar o bronzeado do que o Caribe. Eu sei disso por experiência própria, uma vez que já estive em dois lugares da região, no caso Curaçao e República Dominicana, e voltei ao Brasil igual a pão torrado).

O motivo da reunião dessa galera no citado paraíso caribenho, bronzeado à parte, foi a disputa de um torneio de futebol para “celebrar o poder transformador do esporte”. Traduzindo: mostrar à sociedade que muita coisa boa pode surgir a partir da prática saudável e orientada do futebol.

Eu acho que foi uma boa ideia dos organizadores. Para um país que não tem tradição no futebol, qualquer iniciativa que venha despertar a atenção dos jovens para o referido esporte (ou qualquer outro) é sempre bem recebida. Sempre é melhor uma bola nos pés do que uma pistola nas mãos.

Independentemente, porém, dos objetivos do evento, o certo é que não poderia haver lugar melhor para celebrar alguma coisa do que um desses recantos caribenhos. Principalmente se a reunião acontecer no primeiro semestre, quando não há risco de nenhum furacão passar varrendo as praias.

Quer dizer: supõe-se que não haja risco. Do jeito que as forças da natureza andam inquietas, dando o troco na insanidade das ações humanas, a exemplo da tragédia que se abate sobre os gaúchos por esses tempos, não se pode garantir nada. Não se pode garantir nada, nem saber se vai piorar.

Sim, tudo pode piorar. Não falo isso por catastrofismo ou me imaginando alguma “Cassandra” pós-moderna, portador de más notícias. Nada disso. É que o modelo de desenvolvimento pelo qual nós humanos e racionais (hein?) escolhemos é o da depredação. E o futuro que se arrebente.

Em tempo: fui para a apresentação da Madonna, sábado passado. Conforme prometido na crônica anterior, estou avisando a vocês que voltei pra casa são e salvo. Experiência única, mas que não pretendo repetir. Muita gente maluca. E a Madonna nem cantou. Não foi um show musical. Só teatro.

– Maio de 2024 –


Francisco Dandão

Escrevo na manhã de sábado, algumas horas antes do show da diva Madonna, nas areias de Copacabana, pertinho do lugar onde eu armei a minha rede, desde outubro de 2022. O bairro está numa agitação como nunca se viu antes por aqui. Nem quando é carnaval, nem quando é Réveillon.

Tudo é festa nas imediações do Copacabana Palace, local onde a comitiva da artista está hospedada. Uma multidão se aglomera em frente do hotel, esperando que ela ponha pelo menos uma pontinha do nariz na janela. A maioria fantasiada e cantando os sucessos que tornaram a cantora famosa.

Eu, da minha parte, devo confessar baixinho aqui (pra ninguém ouvir) que não sou, nem nunca fui, fã da Madonna. Nem dela nem da maioria das grandes estrelas internacionais incensados pela mídia. Madonna, Michael Jackson, Bob Marley, tudo gente boa. Mas nenhum fez a minha cabeça.

Em matéria das minhas preferências, essas três criaturas citadas aí no parágrafo anterior estão em desvantagem com gente como os Beatles (aqueles quatro cabeludos ingleses de Liverpool – lembram-se deles?), como Fred Mercury, como Bob Dylan, como Stevie Wonder etc. e coisa tal.

Na minha juventude, inclusive, virei fã de um instrumentista inglês chamado Rick Wakeman. Esse cara tocava rodeado de teclados e criava sinfonias alusivas a temas como viagens sonoras ao centro da terra, às aventuras do rei Arthur e os cavaleiros da távola redonda e por aí afora.

Independentemente das minhas preferências musicais internacionais, porém, é certo que serei uma das milhões de pessoas que estarão na noite deste sábado vendo a performance da Madonna. Bem de longe do palco, é claro, que vai ser impossível chegar a alguns metros da deusa platinada.

Por precaução, não poderei fazer registros do evento, uma vez que deixarei em casa o celular e a câmera fotográfica. Aliás, para não correr riscos desnecessários, minha intenção é ir ao show vestindo somente uma tanga de banho, uma camiseta surrada e um par de velhas chinelas havaianas.

Dizem que vai ter um exército de policiais fazendo a segurança dos espectadores, munidos de armas de choque, bombas de gás lacrimogênio, balas de borracha, além de milhares de câmeras para flagrar os malandros de toda a espécie. Embora seja um espetáculo, a operação policial é de guerra.

É por aí a perspectiva do fim de semana. Fora isso, a mim só resta torcer para o Rio Branco e o Humaitá se darem bem na segunda rodada do Campeonato Brasileiro da Série D. E se eu sobreviver, na próxima crônica conto como foi a minha saga no show da Madonna em Copacabana!

– Maio de 2024 –


Francisco Dandão

O time tricolor do Acre provou, nessa quinta-feira que recém passou, que é feito do mais puro aço. Tem uma história de altos e baixos, ora com campanhas pífias, outra hora com vitórias retumbantes. Mas, como é de bom aço, pode até envergar, entretanto jamais vai quebrar ou, sequer, rachar.

Falo do Independência, que se sagrou campeão estadual de 2024 com todos os méritos. Foram dez os jogos disputados, contra adversários que, em vários momentos, impuseram inúmeras dificuldades. Dez jogos dos quais o time venceu cinco, empatou quatro e perdeu apenas uma única vez.

É somente o terceiro título do Tricolor do Marinho Monte em trinta e seis campeonatos disputados na era do futebol profissional do Acre. Antes desse momento apoteótico, o Independência vencera os campeonatos de 1993 e 1998. Vinte e cinco longuíssimos anos se passaram desde então.

Para se ter ideia, fazia tanto tempo que o Independência não levantava o caneco do campeonato acreano que na última vez ainda se jogava no estádio José de Melo, onde existia um lugar chamado Vietnã e onde havia mangueiras cujos galhos eram arrancados para se tornarem bandeiras.

Não vi esse Independência de hoje em ação, dado que, como já disse em outra ocasião, não moro no Acre neste momento. Coincidentemente (ou não), por esses tempos que correm moro no Rio de Janeiro, justo o estado de onde saíram os atletas que conduziram o tricolor ao alto do pódio.

Então, como não vi o time em ação, não posso garantir o quanto que esses caras jogam. Mas eu sei que tem uns moleques muito bons de bola aqui em terras cariocas. E não é de hoje não. Aliás, tem um monte de carioca que foi para o Acre, ao longo do time, que tratava a “deusa” com grande respeito.

Enquanto escrevo, lembro os nomes de alguns. Casos do Paulão, do Guedes, do Bené, do Nirval (esses importados pelo Atlético, na primeira metade da década de 1970). Ou, mudando de um distrito para outro da capital, casos do Niltinho e do Guga, levados pelo Juventus, nos anos 1980.

O Independência, naquela época de virtuoses da bola, preferia pegar gente do Norte do país. O goleiro Ilzomar saiu de Belém direto para o Marinho Monte. Já os meias Saúba e Augusto, bem como os atacantes Valdir Silva e Júlio Cesar, fizeram a ponte aérea entre Manaus e Rio Branco.

Mas, voltando ao fio da meada, o start para a produção dessas linhas da hora, o que importa é que o Independência, com a sua atual legião carioca, voltou aos tempos de glória e, ao conquistar o título de 2024, se credenciou para ter um calendário cheio no próximo ano. Cheio de jogos e de money.

Glória eterna ao Tricolor de Aço!

– Abril de 2024 –


Francisco Dandão

Todos os anos, em abril, ante a proximidade dos dias 19 e 22, eu me ponho a refletir sobre o significado de duas datas comemorativas: o Dia do Índio (ou “povos originários”, dependendo do lado que vem o discurso) e o que se convencionou chamar nas escolas dia do Descobrimento do Brasil.

Nas minhas reflexões fico pensando nos motivos pelos quais se criou o Dia do Índio. Seria uma atitude dos ditos civilizados para se penitenciar pelo genocídio contra a nação indígena desde sempre, seja na base de lâminas afiadas, seja na base de pólvora, seja na contaminação por vírus?

Ou seria porque, em algum momento desses quinhentos e tantos anos, se chegou à conclusão de que eles, os índios (digo, os tais “povos originários”) é que são (sempre foram) os verdadeiros donos dessa antiga Terra dos Papagaios, Vera Cruz, Santa Cruz, Brasil ou o raio que os pariu?

Da mesma forma, me pego a refletir (me esquivei do gerúndio, tão vendo só?) que papo furado é esse de descoberta, de acaso, culpa do vento que repentinamente parou de soprar na vela dos mal cheirosos portugueses, esses ditos pás que vieram fundar e tomar conta do pão nosso de cada dia?

E por conta dessas reflexões, seja por isso ou por aquilo, cada vez tenho mais certeza de que a história oficial é uma grande falácia, sabe-se lá por quais razões. Toda errada, mas a maioria de nós não se dá conta e vai tocando o barco (nau, caravela, iate ou canoa) para bem depois de além-mar.

O ato fundador da posse portuguesa por aqui, de acordo com os livros escolares, foi a celebração de uma missa, levada a efeito por um certo frei Henrique de Coimbra, no dia 26 de abril de 1500, quatro dias depois que os portugueses já andavam distribuindo espelhinhos para a galera nativa.

Maior conversa fiada. O ato fundador foi, na verdade, uma pelada, jogada numa das praias de Porto Seguro, entre o time da casa e os visitantes. Documento encontrado na Torre do Tombo, em Portugal, fala expressamente desse fato. E fala também que os portugueses levaram uma senhora goleada.

A missa foi o segundo ato. E os portugueses só não divulgaram a história verdadeira com medo de serem alvo de gozação na volta para as bandas do Alfama, primeiro bairro de Lisboa, onde a turma do bacalhau costumava gastar as tardes ouvindo fados e enxugando garrafões de vinho.

A pelada, essa instituição genuinamente brasileira, começou ali, no dia 23 de abril, 24 horas depois da chegada dos invasores. O nome dado a esse primeiro confronto, aliás, se justifica porque os atletas do time anfitrião se recusaram terminantemente a vestir os uniformes doados pelos portugueses!

– Abril de 2024 –


Francisco Dandão

Antigamente, quando o calendário do futebol brasileiro era mais, digamos, ameno, era rotineiro os grandes clubes de futebol saírem fazendo amistosos pelo Brasil ou pelo exterior, para faturar uns quantos “níqueis”. Havia situações em que os tais clubes excursionavam por mais de mês.

Os jogos não valiam pontos ou títulos, por isso eram chamados de amistosos. No mais das vezes, porém, quando a bola corria nos gramados, o que deveria ser um jogo meia boca se transformava numa verdadeira guerra, com os atletas de ambos os lados disputando os lances na maior disposição.

O empenho dos jogadores anfitriões era justificado porque eles viam ali a sua grande oportunidade para mostrar o que sabiam, entendendo que se jogassem bem talvez despertassem o interesse dos dirigentes visitantes e, quem sabe, poderia pintar um convite para seguir junto com a delegação.

Os jogadores visitantes, por seu lado, profissionais que eram, com todo o cartaz que carregavam, ídolos de milhões de torcedores, não admitiam em hipótese nenhuma sofrer algum tipo de revés para os times do interior, grande parte destes, inclusive, ainda jogando em pleno regime amador.

Então, nesse caso, com os “craques”, de lado a lado, cobertos de argumentos convincentes, não raro todos tratavam de suar sangue para sair de campo vencedores. Sendo assim, numa época em que os árbitros só podiam usar os próprios olhos e os bandeirinhas, valia de tudo um pouco.

Valia de uma boa malandragem até baixar a porrada nos jogadores mais habilidosos dos respectivos adversários. Dedada na bunda, areia nos olhos dos defensores “inimigos”, cotoveladas, bicudas nas canelas, xingamentos em voz baixa, ameaças de morte. Valia até jogar só na bola!

Enquanto escrevo, me vem à memória duas situações nessa onda do vale tudo, ambas no vetusto estádio José de Melo. Uma delas, em 1966, num empate entre Juventus e Flamengo do Rio de Janeiro. A outra, em 1971, numa vitória do Juventus sobre o igualmente carioca São Cristóvão.

Na primeira situação, o Juventus batia o Mengão por 2 a 1, já no apagar das luzes. Aí, num escanteio contra o Juventus, o atacante Almir, do Flamengo, segurou o goleiro Zé Augusto pelo calção, o impedindo de saltar. O atacante César Maluco, então, subiu sozinho e fez o gol com a mão: 2 a 2.

Na outra situação, o ponteiro-esquerdo Nilson, do Juventus, barbarizava pra cima do lateral-direito Triel, do São Cristóvão. Aí alguém no banco visitante disse para o Triel botar ordem na casa. Na próxima dividida, o lateral tirou o Nilson de campo com uma patada no tornozelo!

– Abril de 2024 –


Francisco Dandão

O Rio de Janeiro, local do meu atual exílio voluntário, amanheceu nesta sexta-feira (22 de março de 2024), sob uma densa cortina d’água descendo do céu. Como o outono começou há dois dias no hemisfério sul, não sei se seria certo dizer que sejam as “águas de março fechando o verão”.

Todos os anos, por essa época, qualquer chuvisco me faz lembrar a música do maestro Tom Jobim. “(…) o passo, (…) a ponte, (…) o sapo), (…) a rã, (…) um resto de mato na luz da manhã, (…) as águas de março fechando o verão, (…) a promessa de vida no teu coração (…)”. Grande maestro!

Independente, porém, do que seja apropriado dizer, nesse sentido das águas e das estações do ano na metade de baixo do planetinha azul, o que eu sei mesmo é que neste finalzinho de março três importantes figuras do esporte acreano fazem aniversário: Auzemir (25), Ismael (26) e Elísio (27).

O Auzemir, que eu chamo de Félix desde os tempos em que jogamos juntos no infantil do Independência, sob o comando do radialista Campos Pereira, em mil novecentos e lá vai pedrada, nasceu na capital acreana, em 1957. Está completando, portanto, muito bem vividos 67 aninhos de vida!

Além do infantil do Independência, no futebol de campo ele defendeu as cores do time juvenil do Vasco da Gama, o Almirante da Fazendinha. Mas depois, o homem se apaixonou pelo futebol de salão e passou para a história como um dos melhores goleiros/dirigentes acreanos da citada modalidade.

O Ismael, volante desde quase sempre, é um paulista que trocou o futebol do interior do seu estado pelo futebol acreano, em 2003. Foi uma passagem vencedora pelo Estrelão, marcada por idas e vindas para times de diversos estados. Passagem essa que chegou ao seu final no ano de 2013.

Depois do Rio Branco, Ismael, que nasceu em 1979, vestiu apenas outra camisa no Acre: a do Atlético, em 2014. Cessada a vida como atleta, ele ensaiou uma carreira como treinador no próprio Galo, convidado pelo então presidente Edson Izidorio. Mas foi uma experiência rápida e pontual.

Enquanto isso, o Elísio, que nasceu em Brasiléia, em 1949, para além do excelente ponteiro-esquerdo que foi no Rio Branco (1965) e no Juventus (de 1966 a 1973), pode-se dizer que também foi uma figuraça das artes acreanas, dada a sua condição de integrante do conjunto Os Bárbaros.

Durante a segunda metade da década de 1960 e nos primeiros anos da década de 1970, Elísio dava um duplo show nos finais de semana. Na parte da tarde (sábado ou domingo), no gramado do estádio José de Melo, com a bola nos pés. Durante a noite, nos salões de baile, com a guitarra nas mãos!

Vida longa aos três personagens!

– Março de 2024 –


Francisco Dandão

É um engano dizer que cronista esportivo não tem um time da sua preferência, aquele pelo qual o coração bate mais forte quando entra em campo e pelo qual sofre na derrota. O cronista não costuma confessar por qual time torce para que as suas análises não sejam consideradas suspeitas.

Eu, por exemplo, sou juventino no Acre desde criança. Dois motivos, provavelmente, me fizeram ser torcedor do Juventus. Primeiro que eu estudava no Colégio dos Padres, em 1967, local onde clube foi fundado, um ano antes. E segundo porque o rubro-negro da águia já nasceu vencedor.

E além de nascer vencedor, o time toda a vida formou grandes esquadrões, sempre levando para o Ninho da Águia ótimos jogadores, tanto quem já jogava no estado quanto oriundos de outras paragens. Era sempre um prazer, principalmente na época do amadorismo, ver o Juventus jogar.

Vou lembrando, enquanto cometo essas mal traçadas, o nome de alguns jogadores de outras paragens que o Juventus trouxe para suas fileiras. Casos do paraense Julião, do amapaense Antônio da Loteca, do rondoniense Neórico, dos cariocas Siqueira, Niltinho e Guga… e sei lá quantos mais.

E sem falar, mas já falando, da proposta de “criar craque em casa”, praticada desde os primeiros anos de fundação. Aí a lista se estenderia por linhas infinitas. Cito alguns, lembrados igualmente enquanto escrevo: Antônio Júlio, Sabino, Antônio Maria, Mauro, Normando, Paulinho etc.

Para o meu desgosto, porém, há muito tempo que o Juventus não entra em campo, nem com jogadores oriundos, nem com craques nativos. Por conta de decisões equivocadas de alguns dos seus dirigentes, ao longo da história, o clube entrou numa espiral descendente, quase um poço sem fundo.

E assim, pela ausência do meu clube do coração nas competições oficiais, eu agora torço para que em cada partida saiam muitos gols, tanto faz se para um lado ou muito pelo contrário. Gol é a essência do futebol, e quando o time da gente não está em campo, que qualquer um goleie o outro.

Nesse sentido (embora eu não me encontre de corpo presente no Florestão, acompanho tudo à distância), o campeonato acreano deste ano não tem me deixado muito satisfeito, devido à baixa quantidade de gols até aqui (escrevo na sexta-feira, 15 de março, e pode ser que no sábado tudo mude).

Veja-se que em dez partidas foram marcados somente 17 gols (né isso, Façanha?). Média de menos de dois gols por jogo. E ainda teve três zero a zero. Tem coisa mais chata do um jogo zero a zero? Os artilheiros estão em modo econômico. Ou é isso ou é a chuva que está dando uma de zagueirão!

– Março de 2024


Francisco Dandão

Sexta-feira, 8 de março, quase fim de verão no hemisfério sul. Muita chuva desce do céu. Como em todo ano, por essa época, vários rios saltam dos respectivos leitos e levam tudo o que encontram pela frente. Quase nada do que eles (os rios) arrastam chega ao mar. Talvez só a água mesmo.

Entretanto, como nem só de água (ou de pão, como no provérbio) vive o homem, apesar dos inúmeros pesares (guerras, fome dengue, psicopatas e babacas etc.), ainda existe o que comemorar no planeta azul (será que essa ainda é a cor?). Caso, por exemplo, do Dia Internacional da(s) Mulher(es).

Como esse meu latifúndio literário aqui de todas as semanas, cortesia do meu afilhado Manoel Façanha Tavares Neto, é dedicado ao esporte, me ocorre enquanto escrevo o nome de duas mulheres que foram pioneiras no exercício de funções no futebol acreano: Nazaré Santos e Cláudia Malheiro.

Nazaré Santos, amazonense de Boca do Acre, que migrou para Rio Branco aos 12 anos, em 1951, foi a primeira massagista que se tem notícia de um time de futebol masculino do Brasil. Ela assumiu o posto de massagista do Atlético em 1974, convidada pela diretora Flora Diógenes.

Tudo começou em 1972, quando ela precisou se submeter a um tratamento de saúde no Rio de Janeiro. Como o tratamento não tinha o caráter intensivo, nas horas vagas Nazaré resolveu fazer um curso de massagem, com quatro habilitações: esportiva, terapêutica, estética e estética facial.

Nazaré Santos permaneceu como massagista do Galo por seis anos. E, de acordo com ela, foi uma convivência pra lá de saudável, do mais profundo respeito. “Os jogadores evitavam até falar palavrões na minha frente. Eles sempre me trataram muito bem”, disse a profissional numa antiga entrevista.

No que diz respeito a Cláudia Malheiro, uma carioca que migrou para o Acre na última década do século XX, o começo da sua carreira no futebol acreano se deu em 1999, como auxiliar de treinador no Vasco, depois de se formar em Educação Física na Universidade Federal do Acre (Ufac).

Já no primeiro ano de trabalho, nessa condição de auxiliar do professor Ulisses Torres, Cláudia se sagrou campeã estadual pelo Almirante da Fazendinha. Depois disso, ela assumiu na vaga do titular, numa competição nacional, uma vez que Ulisses precisou cumprir uma suspensão.

Cláudia Malheiro permaneceu no futebol até 2012, treinando o Andirá em duas oportunidades (2000 e 2007) e coordenando as categorias de base do Rio Branco (entre 2010 e 2012). Em 2007, inclusive, contra todos os palpites, levou o pequeno Andirá ao vice-campeonato estadual. Exclamação!

– Março de 2024 –


Francisco Dandão

Eu já contei, neste meu latifúndio literário, umas quantas vezes, que em anos remotos, quando o futebol acreano era recheado de artistas da bola e o principal programa da cidade nos fins de semana era ver os jogos do campeonato, valia tudo para entrar no vetusto Stadium José de Melo.

Nesse sentido de “valer tudo”, levando-se em conta que boa parte dos torcedores, principalmente os mais jovens, não tinha dinheiro suficiente para comprar o respectivo ingresso, prevalecia a iniciativa de “furar o jogo”. Por “furar o jogo” entenda-se “entrar nas dependências do estádio sem pagar”.

As maneiras de “furar o jogo” eram as mais diversas possíveis. Tinha menino que se disfarçava de vendedor de picolé, “quêbe” ou banana frita (ambulantes entravam sem pagar). Outros, quando eram amigos de algum jogador, entravam junto com ele (jogador), carregando as chuteiras deste.

Mas o que mais prevalecia, nessa onda de “furar o jogo” era pular o muro em algum ponto onde não estavam postados os vigilantes. Sim, havia vigilantes do lado de dentro do estádio para prevenir a entrada dos “furões”. Havia, porém, pontos cegos no muro, onde não ficava ninguém vigiando.

Um dos pontos cegos, talvez o principal deles, era o lado do muro que dava para a Avenida Marechal Deodoro. Dois fatores faziam do referido lado um local sem vigilância. Primeiro porque os furões precisavam passar pelo fundo de quintais. E depois por ser uma parte onde havia muito capim alto.

Eis que, então, de acordo com o relato do nobre causídico Jorge Carlos, o popularíssimo Piaba, lá pelas tantas, deu-se que um menino de nome Uchoa, que um tempo depois viria a ser lateral-esquerdo do Independência, resolveu que por ali era o local melhor para “furar o jogo”.

Esgueirando-se pelo lado da casa de um morador, solitário para não chamar a atenção, num dia de clássico Juventus e Atlético, o Uchoa subiu no muro, olhou para todos os lados e, não vendo ninguém por perto, preparou o salto para dentro do terreno do estádio, o fazendo com o melhor dos estilos.

Para azar do Uchoa, justamente no local do salto, naquela semana, por conta de uma tempestade que havia desabado inclemente sobre Rio Branco, a tampa de uma fossa havia sido arrebentada, formando uma “piscina” de dejetos. Resultado: o Uchoa mergulhou direto no nauseabundo local.

Não fosse a intervenção de um senhor de nome Arady, que apareceu sabe-se lá de onde, sempre de acordo com o relato do doutor Jorge Carlos, o Independência teria perdido o seu futuro lateral. Palavra final do Jorge Carlos: “O Uchoa teve que passar três dias de molho na água sanitária.”

– Fevereiro de 2024 –


Francisco Dandão

Recebi com pesar, no meio da manhã de terça-feira, a informação do falecimento do Hermínio, meia do Juventus no início da década de 1970. Quem primeiro me falou do infausto acontecimento foi o Mário Jorge “Gaguinho”, amigo do falecido. Depois, vários sites noticiaram o fato.

O Hermínio, que era irmão do Dadão, que partiu para o além em 2018, era tão habilidoso, eu diria, quanto o irmão famoso. A diferença entre eles era de estilo. Enquanto o Dadão era mais voluntarioso, jogando sempre na vertical, o Hermínio era mais cerebral, preferindo servir aos companheiros.

Outra diferença crucial: enquanto o Dadão permaneceu vários anos em campo, deliciando os olhos de todos os que tiveram a ventura de vê-lo em ação, o Hermínio pendurou as chuteiras de forma absolutamente precoce, optando por uma sólida carreira de bancário, no Acre e em outros estados.

Que eu tenha lembrança, o Hermínio só jogou bola entre os anos de 1970 e 1975. Primeiro nos juvenis (1970 e 1971) e depois no time principal do Juventus (1972 a 1975). Na base, foi campeão sempre. O Juventus era imbatível nessa categoria. No time de cima foi campeão estadual em 1975.

Em ambas as categorias, ele jogou ao lado de gente de ótima qualidade técnica. Vejam essa escalação do juvenil do Juventus, em 1970: Filogônio; Salvador, Mustafa, Zé Maria e Toinho; Mauro, Hermínio e Piririca; Juca, Curu e Carlitinho. Os outros times não eram páreo para essa galera aí.

Enquanto isso, nos quatro anos em que ele jogou no time principal, vejam só quem eram alguns dos seus companheiros, além de Dadão, o irmão já citado neste texto: Deca, Mustafa, Pope, Pingo Zaire, Antônio Maria, Edson Carneiro, Elísio, Nilson, Carlos Mendes, Laureano, Eliézio etc.

Além da rapidez de raciocínio, que o fazia antever os lances com absoluta precisão, provavelmente o que mais tornava o futebol de Hermínio peculiar era a capacidade de driblar quase sem sair do lugar, em espaços mínimos. Característica que o fez ser também um craque no futebol de salão.

Aliás, segundo um dia me contou o falecido centroavante Eliézio Mansour, Hermínio e ele (Eliézio) fizeram parte de um time de futebol de salão que se exibia todos os finais de semana numa quadra que existia em frente ao Palácio Rio Branco. Time que passou mais de dois anos invicto.

Esse time, cujos jogos só aconteciam depois da missa noturna celebrada na Catedral de Nossa Senhora de Nazaré, além de Eliézio e Hermínio, contava com os goleiros Milton e Arnaldo e com os jogadores de linha Dadão, Antônio Maria e Elísio. Era muita qualidade num lugar só!

– Fevereiro de 2024


Francisco Dandão

Já escrevi várias vezes sobre os apelidos no futebol acreano. Até já escalei três ou quatro equipes só de apelidos, misturando tempos e elencos. O resultado, via de regra, diverte todos os que tomam conhecimento dos textos. Quando digo “todos”, é claro que eu estou me incluindo no grupo.

Uma coisa, porém, em se tratando deste tema, eu ainda não havia parado para pensar. A de qual seria a origem de cada apelido. Agora que o faço, me dou conta de que a maioria deles (apelidos) não consigo explicar. Devem ser do conhecimento apenas dos mais chegados aos “apelidados”.

A origem de alguns dos tais apelidos, entretanto, vou lembrando enquanto escrevo. Casos de Amenu, Cabeça de Martelo, Dadão, Escapulário, Escurinho, Macaxeira, Padreco, Papelim, Puxa Faca, Tranca Rua, Vaisquerê e Zero Hora.

Vejamos, então, a que se referem os ditos apelidos citados acima.

Amenu – Ponteiro do Andirá chamado Raumildo. Herdou o apelido de um personagem de uma novela de rádio denominada “O Egípcio”.

Cabeça de Martelo – Segundo apelido do fantástico lateral-esquerdo Duda. Referia-se ao formato da parte superior da anatomia do dito cujo.

Dadão – Meia atacante que se chamava Eduardo. Os pais, quando ele era criança, o chamavam de Dadinho. Como ele era um menino robusto, o irmão Elzo um dia disse: – Isso não é um Dadinho, isso é um Dadão. Pegou!

Escapulário – Meia do Independência. O apelido veio por conta de um amuleto religioso que ele usava pendurado no pescoço.

Escurinho – Zagueiro do Juventus e outros clubes nas décadas de 1950/1960, chamado Adalberto. Ganhou o apelido por conta da cor da pele.

Macaxeira – Atacante Agnaldo, que jogou no Vasco da Gama. A tez da pele, igual à cor do tubérculo, determinou o apelido.

Padreco – Volante paranaense que jogou no Rio Branco no início da década de 1970. Dizem que estudou num seminário na adolescência.

Papelim – Meia que jogou em vários clubes. Era tão branco e magrinho que lembrava um papel de enrolar fumo.

Puxa Faca – Zagueiro do Atlético. O apelido seria autoexplicativo.

Tranca Rua – Goleiro do Floresta. Conta-se que ele era sempre o último a chegar em casa depois das saídas noturnas.

Vaisquerê – Atacante lendário do futebol xapuriense, vendia galinhas na infância e as oferecia aos clientes com a frase: – E aí, hoje vais querer?

Zero Hora – Lateral do Rio Branco. Apelidado pela negritude da pele.

É isso. Acabou o meu espaço. Outro dia eu conto mais. Ririri!

– Fevereiro de 2024 –


Francisco Dandão

Ando por esses dias mexendo em arquivos antigos de matérias que eu fiz ao longo dos anos. Não tenho todas, que eu sou meio desorganizado. Mas tenho várias e disponibilizo-as na internet, num arquivo aberto, no endereço memoriasdofutebolacreano.com, na medida em que as vou encontrando.

É divertido rever matérias antigas. Tem muita coisa interessante, principalmente no que diz respeito às histórias dos diversos personagens. Se a gente fosse juntar num livro essas histórias, certamente sairia uma coletânea plena de graça. Os casos pitorescos se sucedem, um após o outro.

Casos como o que me foi contado pelo ex-centroavante Vaisquerê, no verão de 2002, quando o visitei na sua cidade natal, Xapuri, outrora havida como a belíssima “Princesinha do Acre”. Na oportunidade, sentamos num banco de frente para o rio e o Vaisquerê foi desfiando as suas memórias.

A história aconteceu em meados da década de 1970, quando a seleção de Xapuri, que contava com um timaço, desde o goleiro Rubinho Santana (talvez o melhor do município em todos os tempos), passando pelo meia Pirruchinha, até o ótimo atacante Mirim, excursionou a Sena Madureira.

Só o deslocamento entre as cidades já dava um volume grosso, tais as dificuldades da estrada que não possuía um único centímetro de asfalto. Foram horas intermináveis de viagem para vencer os pouco mais de 300 km que separam as referidas localidades. E isso sem comer absolutamente nada.

Consta que até havia umas biroscas ao longo do percurso. Mas com valores tão abusivos que chegava a dar dor de barriga quando se perguntava o preço. Um ovo cozido, com pão, manteiga e café, por exemplo, custava mais do que um rodízio de carnes nobres num restaurante de Rio Branco.

A seleção de Xapuri era temida. O time era ajustadinho. Todo mundo sabia jogar bola. Tanto que passou anos invicta em seu estádio. E por ser assim, vivia sendo convidada para amistosos com times da capital e seleções de cidades vizinhas. Ganhar da seleção de Xapuri era uma grande façanha.

Mas havia uma determinação: não golear ninguém quando jogasse fora de casa, para não acirrar os ânimos. Então, seguindo o combinado, nesse jogo em Sena os xapurienses fizeram um a zero no início do primeiro tempo e recuaram para segurar o resultado. Ficaram só tocando a bola.

Apesar disso, porém, segundo o relato do Vaisquerê, os torcedores de Sena, lá pelas tantas, começaram a jogar pedras no pessoal de Xapuri e mostrar facas na cintura. Aí, faltando cinco minutos para o fim do jogo, veio a ordem: – Deixa os caras virarem! Dito e feito. Jogo perdido e a pele intacta.

– Fevereiro de 2024 –


Francisco Dandão

O futebol está cheio de historinhas pitorescas. Aquelas narrativas que não saem na mídia e que só circulam entre as criaturas que estavam mais próximas do fato. Com o tempo, nessa de passar de boca em boca (ouvido em ouvido), às vezes acabam ganhando contornos de lenda ou de folclore.

Por estes dias, eu fiquei sabendo de uma dessas historinhas. No caso, envolvendo uma das maiores duplas de zaga do glorioso Ceará Sporting Club, o famoso Vozão de Porangabussu: Pedro Basílio e Artur Pai d’égua. Dois zagueiros que botavam fogo pelas narinas e batiam até no vento.

Pedro Basílio teve uma carreira longeva, permanecendo em campo de 1969 e 1988, vestindo as camisas de grandes clubes brasileiros, como o gaúcho Internacional (1972) e o carioca Botafogo (1973). Mas os seus melhores dias foram mesmo nos rivais Fortaleza e Ceará (ídolo em ambos).

Artur Pai d’égua (Ribeiro do Carmo), que inclusive virou treinador e chegou a trabalhar no acreano Rio Branco, jogou de 1965 a 1984. Vestiu inúmeras camisas desde o início no Calouros do Ar (CE). Migrou do Nordeste para o Sudeste (Botafogo) e passou pelo Norte (Fast Clube-AM).

Tanto Pedro Basílio quanto Artur Pai d’égua, assim como um grande contingente de jogadores do futebol brasileiro, gostavam de enxugar umas geladas. Escreveu, não leu, de testa, meia dúzia desse néctar dos deuses descia pelas goelas. Eram ótimos jogadores e, talvez, melhores farristas.

Acontece que a sua condição de atletas de times grandes não lhes permitia saírem tomando todas assim tão abertamente. Se os torcedores os vissem, ia ser um Deus nos acuda. Seriam logo acusados de cachaceiros, irresponsáveis e quaisquer coisas desse nível. Tinham que beber na surdina.

Deu-se, então, que um dia, às vésperas da decisão do campeonato cearense de 1978, em plena concentração, a dupla dinâmica, com a garganta berrando por uma gelada, pediu ao técnico Moésio Gomes que os liberassem para tomar “só meia dúzia” do líquido preciso. Só pra lavar o peritônio.

Mesmo a contragosto, sabendo o quanto era absurdo aquele pedido, mas entendendo que sem “tomar uma” os seus zagueiros corriam o risco de não jogar toda a bola que sabiam/podiam, o técnico os liberou, mas os advertindo que eles não poderiam ser vistos por absolutamente ninguém.

Quando chegaram ao boteco, os zagueirões tomaram um susto. O local estava lotado. Aí eles chamaram o dono de lado e explicaram a situação. O homem logo deu um jeito, alojando a dupla dentro de um velho guarda-roupa. Perfeito. Eles tomaram todas e no outro dia o Ceará foi campeão!

– Janeiro de 2024 –


Francisco Dandão

Eu sempre fui contra essa ideia de comparar tempos. Isso porque, de modo geral, a gente sempre acha que o passado foi melhor do que o presente. A síndrome da nostalgia. Na verdade, nada se repete. É tudo diferente. E, sendo assim, não pode existir comparação possível entre o que foi e o que é.

Entretanto, se me permitem, eu continuo achando que aquele time do Brasil que venceu a Copa de 1970 foi muito superior a todas as outras formações que representaram o país em torneios internacionais. Aquela seleção tanto vencia quanto convencia. Era um show a cada partida jogada.

Mário Jorge Lobo Zagallo, recém falecido, no papel de treinador da seleção de 1970, conseguiu vagas num mesmo time para uma gama de jogadores fora de série, os chamados “camisas 10” em seus clubes de origem. Como o 10 do time era Pelé, outros números foram dados aos demais.

E a estratégia do “Velho Lobo” deu tão certo que aquela seleção simplesmente atropelou os seis adversários que cruzaram o seu caminho. Na estreia foi logo 4 a 1 contra a Tchecoslováquia, seguindo-se 1 a 0 na Inglaterra, 3 a 2 na Romênia, 4 a 2 no Peru, 3 a 1 no Uruguai e 4 a 1 na Itália.

Relembrando os nomes daquela seleção, os titulares formavam com Félix; Carlos Alberto Torres, Brito, Wilson Piazza e Everaldo; Clodoaldo, Gerson e Rivelino; Jairzinho, Pelé e Tostão. E entre os reservas, ninguém deixava “a peteca cair” quando eram chamados para substituir um titular.

Desses onze titulares, quatro já partiram para os campos celestiais. Casos do capitão Carlos Alberto Torres (25 de outubro de 2016), Everaldo Marques da Silva (28 de outubro de 1974), Félix Venerando (24 de agosto de 2012) e Pelé/Edson Arantes do Nascimento (29 de dezembro de 2022).

Entre os que, graças a Deus, permanecem entre nós, um fez aniversário nesta semana, no dia 11. Ninguém menos do que o célebre Canhotinha de Ouro, Gerson de Oliveira Nunes, o homem dos lançamentos precisos, de 40/50 metros. O cara lançava como se o fizesse com as mãos!

Gerson, que nasceu em Niterói, em 1941, começou o seu caso de amor com a bola na Praia de Icaraí. Daí para o campo, inicialmente num time chamado Canto do Rio, foi um pulo. E depois, ainda adolescente, para o Flamengo, convidado por um técnico de nome Modesto Bria, foi outro pulo.

Aí o mundo se abriu e ele, até o final da carreira, em 1974, vestiu mais três camisas de times de futebol: Botafogo, São Paulo e Fluminense. Pela seleção principal do Brasil, Gerson entrou em campo 85 vezes, marcando 19 gols. Grande “canhota”: um dos maiores gênios do futebol brasileiro!

– Janeiro de 2024 –


Francisco Dandão

Estamos a viver (me liberei momentaneamente do gerúndio, tão condenado, porém às vezes absolutamente necessário) os dias derradeiros de 2023. E assim, como na próxima semana o meu editor Manoel Façanha entra em recesso, esta é a última crônica deste ano de tanta confusão e calor.

Se eu fosse bom de profecias, usaria o espaço para dizer coisas como: “O Fluminense, tricolor mais lindo do planeta, vai ser campeão mundial lá nos campos da Ásia”. Ou então: “Os dois representantes do futebol acreano na Série D vão mudar de patamar em 2024”. Coisas assim, do meu desejo.

Como eu não nasci adivinho, muito menos fui batizado no rio Jordão, como aquele famoso Homem lá de Nazaré, em vez de um exercício de profecias, vou aproveitar esse meu latifúndio semanal para transcrever a escalação de um time que eu recebi por esses dias, via WhatsApp.

Goleiro: Mão de boneca de pano – Aquele que não segura nem bebê. Não pode dar uma criança pra ele que ele deixa escapar.

Lateral-direito: Caxumba – Aquele que quando desce é um perigo.

Zagueiro central: Sopa de Gesso – Mais duro do que salame de colônia. Não acompanha nem novela.

Quarto-zagueiro: IML – Só vai no corpo.

Lateral-esquerdo: Cão castrado – Jogador do tipo que não cruza mais.

Primeiro volante: Refrigerante de dois litros – Quando passa do meio, perde o gás.

Segundo volante: Caçamba – Só toca pra trás.

Terceiro volante: Jagunço – Aquele que mata, mas sempre em favor dos adversários.

Meia: Soldado de Guerra – Aquele que vai, mas nunca é possível garantir que ele vai voltar.

Primeiro atacante: Vitamina C – Aquele que não faz mal a ninguém.

Segundo atacante: Triatleta – Aquele que corre, pedala e nada.

Reserva para o meio campo: Camisinha – O cara que é ruim, que ninguém gosta, mas tem que colocar.

Não sei se existe algum time perdido nos cafundós do mundo que reúna doze atletas com essas “qualidades”. Mas sei que, se a gente olhar bem, dá pra encontrar um ou mais desses em várias equipes, até nas divisões de elite, seja do Brasil ou das melhores ligas árabes, europeias ou caribenhas.

É isso, criaturas queridas que acompanharam as minhas viagens literárias no ano que ora finda. Sigamos em frente. Hasta la vista, baby!

– Dezembro de 2023 –


Francisco Dandão

Copacabana, bairro do Rio de Janeiro, local em que atualmente eu armo a minha rede, ultimamente está mais para subúrbio da Faixa de Gaza, onde israelenses e palestinos se aniquilam, do que para Princesinha do Mar, como foi denominada por um poeta num dia de céu azul e mar calmo.

Nos finais de tarde de sábados e domingos, hordas de bandidos percorrem as ruas do local, tocando o terror. Atacam sempre em bando. Jogam as vítimas no chão e levam tudo o que encontram. Quem estiver transitando numa hora dessas pode ser atacado. Ninguém está seguro.

Já passei duas vezes por uma situação de perigo. Para minha sorte, em ambas as vezes havia por perto uma porta de loja aberta para eu me refugiar. Posso dizer que ainda estou com a integridade física e do bolso incólume por pouco. Tenho certeza que o meu anjo da guarda está trabalhando em dobro.

O negócio tá tão feio que, por esses dias, uma vez que a polícia carioca não está dando conta de proteger os cidadãos de bem, uma turma de rapazes do bairro, adeptos das artes marciais, se uniu para combater a marginalia. Agora tem dois times nas ruas: o dos marginais e o dos combatentes.

Apesar de tudo isso que eu disse nos parágrafos anteriores, é preciso, por um critério de coerência histórica, a gente compreender que a violência não é uma questão localizada e nem um fenômeno do tempo presente. A história da humanidade está recheada de barbáries e crimes hediondos.

Agorinha mesmo, além do conflito entre israelenses e palestinos, aos quais eu me referi no início desta crônica, russos e ucranianos teimam em promover a extinção das fronteiras e das vidas uns dos outros. Há quase dois anos os caras se matam. E nem sinal de um acordo para um tratado de paz.

A violência, que fique bem claro, não tem tempo nem lugar. Até nos espaços onde a maioria das pessoas vai para se divertir, ninguém garante que tudo vai correr dentro da mais perfeita harmonia. Pelo contrário. Ao menor descontentamento, alguém parte para meter a porrada no desafeto.

Penso nisso ao lembrar das cenas de selvageria que tem se tornado cada vez mais frequentes em jogos de futebol. Dois momentos desses aconteceram em semanas recentes. Primeiro, antes do jogo entre Brasil e Argentina. Segundo, no rebaixamento do Santos à Série B do Brasileirão.

Na derrota do Brasil para a Argentina, eu fui testemunha ocular. O conflito foi bem perto de onde eu estava. ePrmaneci no meu lugar, mas mentalmente preparando uma rota de fuga, caso evoluísse para o meu lado. E no rebaixamento do Santos, vários carros foram incendiados. Ave, César!

– Dezembro de 2023 –


Francisco Dandão

Dezembro chegou. É época de balanços e comemorações. As comemorações são aquelas de praxe. Algumas mais suntuosas, outras nem tanto, mas sempre tem. Tanto faz se com vinho importado ou com aquele uísque clandestino, fabricado em destilarias caseiras, mas tem sim senhor.

Do ponto de vista dos balanços, quem perdeu muito trata de descobrir onde foi que errou e de redefinir as ações, sob pena de não o fazendo tudo se repetir no próximo ano. E repetições, convenhamos, quando acontecem na vida sempre deixam no ar um cheirinho de farsa. Ou de falta de ideias.

E ainda do ponto de vista dos balanços, é preciso entender que mesmo os vitoriosos não podem dormir sobre os louros do triunfo. Esses também precisam buscar meios que os façam permanecer vencedores, melhorando o próprio desempenho. Não fazendo isso, serão atropelados no tempo que virá.

Essas reflexões me ocorrem quando me volto para o futebol e vejo as tabelas de classificação. Existe muita gente, a essa hora, amargando a decepção do rebaixamento. E existem outros que estão surfando na onda do sucesso, chegando no lugar mais alto do pódio ou muito perto deste.

Na Série C do Campeonato Brasileiro, por exemplo, provavelmente, os dirigentes de Manaus (AM), América (RN), Altos (PI) e Pouso Alegre (MG), rebaixados para a Série D do ano vindouro, se mantém, a essa altura, traçando os planos para subirem novamente a ladeira no momento seguinte.

Enquanto isso, na mesma série, tudo se resume em alegria para dirigentes, jogadores e torcedores de Amazonas (AM), Brusque (SC), Paysandu (PA) e Operário (PR). Para esses, fruto da própria competência e capacidade de trabalho, Papai Noel se adiantou no calendário gregoriano.

No que diz respeito à Série B, quais clubes não gostariam de estar agorinha nos lugares de Vitória (BA), Juventude (RS), Criciúma (SC) e Atlético (GO), que lograram subir para a divisão de elite, depois de campanhas do mais alto gabarito? Quem não gostaria de estar no lugar deles?

Enquanto isso, na Série A, América (MG), Coritiba (PR) e Goiás (GO), rebaixados prematuramente, já traçam planos para recomeçar. Bahia (BA), Vasco (RJ) e Santos (SP) esperneiam. Já Palmeiras (SP), Botafogo (RJ), Atlético (MG) e Flamengo (RJ) transitam em céu de brigadeiro.

Para alento dos que hoje sofrem, em futebol (assim como na vida) nada permanece igual no minuto seguinte. A tristeza de hoje, dependendo das ações dos envolvidos, pode se transformar na alegria de amanhã. E vice-versa. Cada alvorecer pode trazer muitas surpresas. Que venham novos dias!

– Dezembro de 2023 –


Francisco Dandão

Não raras vezes (ou seria melhor dizer “quase sempre”?), a vida imita a arte (e vice-versa). Fiquei pensando nessa parada ao lembrar de um conto/crônica do escritor mineiro Fernando Sabino (1923 – 2004), com o título “O homem nu”, publicado em livro no já distante ano de 1960.

No texto do Fernando Sabino, um sujeito, cedo da manhã, tira toda a roupa para tomar um banho antes de sair para o trabalho. Mas eis que a mulher dele lhe toma a frente e entra no banheiro primeiro. E então, a criatura decide preparar um café assim mesmo do jeito em que veio ao mundo.

Antes, porém, ele resolve pegar o pão, que todos os dias o padeiro deixava do lado de fora do apartamento. Nu do jeito que estava, ele abre a porta, olha para todos os lados e, não vendo nenhum vizinho por perto ou sinal de movimentação no elevador, dá dois passos para pegar o tal pão.

Mal ele sai do apartamento, um vento faz a porta bater às suas costas. A porta é dessas que só abre por dentro, e o sujeito fica nu em pleno corredor. Como a mulher está dentro do banheiro, não adiantam os apelos reiterados dele para ela lhe abrir a porta. Aí, é lógico, bate nele um grande desespero.

Então, como a vida imita a arte (ou vice-versa), um dia desses aconteceu com o ex-craque do futebol acreano Neivo (campeão do Copão da Amazônia, vestindo a camisa do Rio Branco, em 1984, em Macapá) quase a mesma coisa narrada no conto/crônica do escritor mineiro Fernando Sabino.

Com o Neivo, que nos seus tempos de craque driblava até o vento, o fato insólito deu-se quando ele, sozinho em casa, resolveu levar um saco de lixo para o depósito na calçada, aí por volta das cinco horas da manhã, levando-se em conta que o caminhão coletor costuma passar às 5h30.

Tal como no texto do Fernando Sabino, a porta bateu deixando o Neivo do lado de fora. Diferentemente, porém, do personagem de ficção, o Neivo, por sorte, não costuma sair de casa pelado. As vestes eram sumárias (no caso uma daquelas cuecas supermacho), mas o Neivo não estava despido.

De qualquer forma, de cueca supermacho o Neivo não poderia ir pra lugar algum. E o pior é que o ex-craque precisava, aí por volta das seis horas, ir ao mercado, fazer as compras do fim de semana. E como o dia já estava amanhecendo, logo começaria a passar um monte de gente pela rua.

A solução foi o ex-craque se esgueirar até aos fundos da casa do vizinho, bater na porta e explicar a situação. Compreensivo, o homem emprestou para o Neivo uma bermuda e uma camiseta. Final feliz, com o Neivo prometendo a si mesmo jamais dar um passo fora de casa só de cueca!

– Novembro de 2023 –


Francisco Dandão

Estamos a atravessar um mês de novembro de calor intenso. É primavera, mas a temperatura que desidrata os nossos corpos mais parece a daqueles dias de verão em que a impressão da gente é a de que existe um sol para cada cabeça. Não existem sombra e água fresca para todo mundo.

Dizem os entendidos (e eu acredito) que esse calor todo é consequência das agressões perpetradas pelos humanos contra a natureza desde há muito tempo. E dizem também que se não forem tomadas providências urgentes para reverter a questão, tudo vai ficar pior.

Eu conheço um sujeito, meu vizinho aqui onde antigamente o vento costumava fazer a curva (atualmente esse vento está recolhido dentro de uma geladeira), negacionista do bigode até o dedão do pé, que diz que tudo isso é papo furado, e que o calor é só uma tentativa de namoro do sol com a Terra.

Opiniões a favor e contra à parte, que apesar de ter tudo a ver com isso eu posso fazer muito pouco, e voltando para o mote dessas para sempre mal traçadas, o que eu quero lembrar mesmo nessas garatujas de hoje é que novembro sempre foi um mês pródigo em dar craques para o futebol acreano.

Foi em novembro que nasceram o lateral/volante/atacante Jorge Cubu (dia 4, em 1968), o atacante Dim (dia 5, em 1967), o também atacante Rui Macaco (dia 13, em 1948), o zagueiro Asfury (dia 19, em 1948), o também zagueiro Diego (dia 25, em 1988) e o ponteiro Babá (dia 30, em 1976).

Asfury e Rui Macaco já não se encontram entre nós. Partiram para outra dimensão, onde, certamente, caso haja uma bola de futebol, estão deliciando plateias com a sua arte. Asfury foi um zagueiro que dificilmente cometia uma infração. E Rui Macaco foi um goleador do tipo implacável!

Jorge Cubu foi um daqueles jogadores raros que a mídia esportiva denomina “coringa”. Um daqueles caras que faz a alegria de qualquer treinador. Pau pra toda obra. Defendia e atacava com a mesma eficiência. Eu cheguei a vê-lo atuar como lateral, zagueiro, volante e atacante de referência.

Dim e Babá, de características físicas semelhantes (baixinhos e troncudos) e modos de jogar idênticos (velozes e dribladores), foram daqueles sujeitos que deixavam sem dormir os adversários nas vésperas dos jogos. Não tinham medo de cara feia e jogavam sempre em sentido vertical.

De todos esses, o único que ainda está em atividade é o Diego, que foi até capitão do Humaitá nesta temporada de 2023. Zagueiro do tipo “xerife”, daqueles que se a bola passar, o adversário fica. E que só pede documentos depois de bater. É isso. Novembro deu vários craques para o futebol acreano!

– Novembro de 2023 –


Francisco Dandão

Muito provavelmente, uma pessoa que não tem hoje mais de 40 anos jamais ouviu falar de um cantor chamado Ronnie Von. Mas ele foi um artista famoso, principalmente nos já distantes anos das décadas de 1960 e 1970, que fez parte de um movimento musical conhecido como Jovem Guarda.

Por conta do sucesso do artista, muitos garotos do interior do Brasil daquela época foram batizados como o nome do dito cujo. Batizados ou apelidados. Se os cabelos de um menino fossem compridos e puxando para tons mais claros, todo mundo já achava que era a cara do Ronnie Von.

O Acre, nessa onda de homônimos, por exemplo, teve muita gente apelidada dessa forma. Eu mesmo conheci meia dúzia de três ou quatro, sendo o mais famoso deles o professor de educação física, ex-parlamentar, ex-empresário e tantas outras coisas José Edmar Santiago de Melo.

Diferentemente da grafia do artista da música brasileira, o apelido do personagem acreano era escrito com as duas palavras se unindo em apenas uma: Ronivon. E, segundo consta nas crônicas, quem primeiro o chamou assim foi um locutor esportivo, ao ver o jovem cabeludo entrar em campo.

Atacante de pouca intimidade com a bola, Ronivon marcou raros gols e não teve uma carreira longeva dentro das quatro linhas (jogou tão somente no extinto Internacional e no Atlético), ficando mais conhecido da galera pelos episódios inusitados em que vez por outra se via envolvido.

Um desses episódios me foi contado pela própria criatura, numa rodada de cerveja, em um final de semana, quando saboreávamos uma panela generosa de rabada afogada em tucupi. No caso, uma expulsão quando ele jogava pelo Saci do Ipase (Internacional), antes mesmo de entrar em campo.

Na época em que a história aconteceu, aí pelos primeiros anos da década de 1970, o futebol acreano era jogado em rodadas duplas. Por não haver iluminação artificial, a preliminar era marcada para às 14 horas, num sol daqueles de bronzear jacaré e rachar a cabeça dos mais sensíveis.

O Internacional, nesse dia, faria a preliminar contra um time chamado Alvorada. Por malandragem, para não fazer o aquecimento mais demorado sob o sol, o Ronivon chegou atrasado, quando o time já estava todo arrumado. Aí ele vestiu-se às pressas e ensaiou uns exercícios fora do campo.

Nisso, um jogador reserva do time adversário passou por trás do Ronivon e deu-lhe uma “dedada”. O homem virou uma fera e partiu pra dar porrada no gaiato. O árbitro Antônio Soares, por desconhecer a presepada, quando viu a briga não contou conversa: expulsou na hora o Ronivon!

– Novembro de 2023 –


Francisco Dandão

Por esses dias ando a me deliciar com a leitura do livro “Minha bola, minha vida”, biografia do maior lateral-esquerdo do futebol brasileiro, Nilton Santos. O sujeito jogava tanto que depois de ajudar o Brasil a ganhar duas Copas do Mundo (1958 e 1962) ganhou o apelido de Enciclopédia!

Sem maiores pretensões literárias, o livro conta de forma linear a vida do cracaço, falecido aos 88 anos, no dia 27 de novembro de 2013, desde que ele começou a jogar peladas na Ilha do Governador, bairro do Rio de Janeiro, onde nasceu e passou a infância, até pendurar as chuteiras, no ano de 1965.

São muitas as passagens curiosas narradas no livro, principalmente aquelas envolvendo o gênio Garrincha, companheiro de Nilton Santos por muitos anos, tanto na seleção quanto no Botafogo. Nilton Santos, aliás, atuou como uma espécie de conselheiro do Garrincha em várias situações.

De acordo com a narrativa, foi o próprio Nilton Santos quem sugeriu aos cartolas botafoguenses a contratação do Garrincha. Isso depois de tentar marcar o “homem das pernas tortas” em um treino e não conseguir sequer saber por qual lugar ele (Garrincha) passava ou, pelo menos, ver a bola.

Diabruras e peraltices do Garrincha à parte, porém, que estas nós já estamos cansados de saber, outra coisa que chamou a minha atenção no livro foi uma lista feita por Nilton Santos dos zagueiros mais violentos que ele viu jogar no futebol brasileiro. Gente que só jogava no corpo do adversário.

Segundo o Nilton, teve um ano que o Flamengo foi campeão carioca não pelos gols que fez, mas pelos que não levava. É que os atacantes tinham medo de entrar na área do rubro-negro e topar pela frente com um trio de zagueiros formado por Tomires, Pavão e Jadir. Todos batiam com vontade!

Uma criatura que não tinha medo era o Garrincha. E não tinha medo porque era difícil um batedor desses acertá-lo. O marcador dele, via de regra, não sabia o que fazer. Se fosse de forma brusca, tomava o drible. Se ficasse cercando, pra ir só na boa, não conseguia saber pra que lado ele iria sair.

Conta-se, inclusive, que um grande estímulo para o Garrincha jogar mais do que de costume, era dizer-lhe antes do jogo que o lateral encarregado de o marcar havia espalhado na véspera que iria pará-lo de qualquer maneira, nem que precisasse “baixar a porrada”. Isso e umas doses de cana ajudava!

Num jogo amistoso no Acre, entre Rio Branco e Juventus, as crônicas explicam que foi isso mesmo o que aconteceu. Vestindo a camisa do Juventus, o Garrincha ficou sabendo que o lateral do Rio Branco ia quebrá-lo no primeiro lance. Adivinhem: o lateral batedor até hoje procura o gênio!

– Outubro de 2023


Francisco Dandão

O futebol, eu não me canso de dizer, não se resume aos minutos jogados (os 90 e mais os acréscimos), aqueles que todo mundo vê. Absolutamente não. O futebol é muito mais do que isso. É também o que antecede a partida, aquilo que se convencionou chamar de “bastidores”.

A propósito disso aí que eu disse no primeiro parágrafo, eu estava lembrando por esses dias de uma situação ocorrida com a Seleção Acreana de Juniores de 1979, que disputou o Campeonato Brasileiro da categoria, com sede na bela Boa Vista, capital do acolhedor estado de Roraima.

A referida seleção acreana, dirigida pelos saudosos Airton Baú (atacante lendário do futebol estadual) e Campos Pereira (ex-zagueiro e radialista dos mais importantes da história do Acre), saiu de Rio Branco cheia de expectativas de fazer boa figura e atropelar os seus adversários.

Todo mundo acreditava naquela seleção acreana. Afinal, nela pontificavam vários garotos muito talentosos, a maioria deles, apesar da pouca idade, já fazendo parte dos elencos principais dos respectivos clubes. Com tanta gente boa, os meninos saíram do Acre com ares de favoritos.

Na posição de goleiro, por exemplo, disputavam a titularidade ninguém menos do que Normando e Klowsbey. Com qualquer um dos dois, a meta acreana estaria bem guardada. Enquanto isso, para a zaga estavam disponíveis, entre outros, os ótimos Moisés, Jaime, Lécio, Cleber e Markito!

Sem falar (mas já falando) dos atacantes Roberto Ferraz, Ademir Pereira (o famoso Gorão), Neto e Litro, bem como dos meias/volantes Carioca, Edson Izidório, Gilmar, Viete e Gerson. Tudo figurinha carimbada nas listas da galera que frequentava o “Vietnã” do vetusto “José de Melo”.

Quando a bola rolou, porém, nada saiu como estava previsto e a seleção acreana apenas empatou com os seus dois primeiros adversários: 0 a 0 com a seleção amazonense e 1 a 1 com a seleção de Roraima. Fato que transformou de vida ou morte o terceiro jogo, contra a seleção do Amapá.

Sabendo da situação da turma do Acre, eis que na manhã do jogo contra o Amapá, apareceu um sujeito na concentração da seleção acreana se dizendo de profissão macumbeiro e garantindo que sabia como acabar com o “azar” que amarrava as pernas dos jovens craques e os impedia de vencer.

Airton Baú e Campos Pereira se reuniram, fizeram uma vaquinha e resolveram contratar o sujeito. Serviço feito, os meninos foram para o jogo. Mas a exibição foi pior do que as anteriores e levaram um pau de 3 a 0 do Amapá. Só uns dias depois foi descoberto que o macumbeiro era amapaense!

– Outubro de 2023 –


Francisco Dandão

O aquecimento global é um fato incontestável. Toda a agressão que a humanidade tem perpetrado contra o meio ambiente é a raiz do problema. Dessa forma, as estações do ano perderam as suas características. E assim, a gente não sabe com que roupa deve sair para um dia inteiro fora de casa.

Eu, por exemplo, não acerto nunca. Aliás, pra falar a verdade, eu erro sempre. Quando eu saio de casa com uma blusa leve, podem crer que mais tarde vai fazer um frio de círculo polar ártico (ou antártico, tanto faz). Mas se eu sair de casaco pesado, depois fará um calor de fritar ovo no asfalto.

Um amigo meu aqui no Rio, o Matucão, que eu já citei em outra crônica, pra não ser surpreendido pela variação climática, só sai de casa com uma mochila com tudo dentro. Da capa impermeável, passando pelo guarda-chuva, a uma tanga. Esta para o caso dele resolver dar um mergulho no mar.

Eu costumo me divertir com as precauções do Matucão. Mas só no começo do dia. Com o passar das horas, quando ele me vê sem saber o que fazer com uma chuva que cai repentinamente, no lugar de um sol de minutos atrás, aí quem se diverte é ele. “Um homem prevenido vale por dez”, diz ele.

Mas, mudando de pau pra cacete (como se dizia antigamente), o aquecimento que eu quero falar nesse texto de hoje não é, necessariamente, o global. O aquecimento que me interessa, pra efeito do preenchimento do meu latifúndio literário, é aquele dos atletas alguns minutos antes dos jogos.

Aquele aquecimento necessário para que os craques alonguem a musculatura e não corram muitos riscos de sofrerem distensões musculares. E para que, ao serem chamados pelo treinador para substituir alguém, já entrem em campo prontos para disparar rumo à linha de fundo inimiga.

Ao longo do tempo, com o avanço dos estudos de fisiologia, mudaram muito os métodos de aquecimento. Antigamente, no mais das vezes, uma corridinha de dois ou três minutos sem sair do lugar, mais alguns polichinelos, já era suficiente para deixar os sujeitos aptos para o combate.

Agora, não. Agora quase tudo é computadorizado. Os atletas vão fazendo a sua ginástica e as suas reações vão sendo armazenadas num computador. Dessa forma, o professor consegue saber quem precisa fazer maior ou menor esforço para que seja considerado devidamente aquecido.

Toda essa conversa me fez lembrar de um antigo treinador do futebol acreano chamado Olavo Pontes que, às vezes, mandava um atleta aquecer, mas depois mudava de ideia sobre quem deveria entrar. Aí, ante a revolta do preterido, dizia o seguinte: – Eu mandei aquecer só mesmo o calção!

– Outubro de 2023 –


Francisco Dandão

Os vários anos como espectador, além das inúmeras entrevistas que já fiz com ex-jogadores de futebol, me ensinaram que existem três maneiras de um zagueiro marcar um atacante. Primeira: por antecipação. Segunda: por espera do momento certo para dar o bote. Terceira: atropelando o inimigo.

Na maneira por antecipação, o tal inimigo não pode pegar na bola. O defensor tem que estar ligadíssimo, antevendo o momento do passe, para chegar na frente, seja como for, dando um biquinho na bola para a lateral, ou dominando-a para sair jogando da forma o mais elegante possível.

No caso da espera para dar o bote, o zagueiro fica com o olho fixo na bola e nos movimentos do atacante. Quando a bola escapa por alguns centímetros, o zagueiro vai lá e a rouba. Aqui, tal como na antecipação, as opções do zagueiro são tocar a bola para a lateral ou sair jogando limpo.

Já no que diz respeito ao atropelo do adversário, esse é um jeito mais usado pelo zagueiro que não tem muita paciência para esperar dar o bote ou recurso para ler o lance e proceder a antecipação. Matar a jogada, sem se preocupar com um eventual cartão. É canela pra um lado e bola pra outro.

Em meados de 2015, numa tarde em que entrevistei o ex-zagueiro amazonense Palheta (falecido de Covid em 2020), que brilhou nas décadas de 1960 e 1970, no futebol acreano, com as camisas do GAS e do Independência, ele me disse que o método dele era o do atropelamento.

“Quando eu tava com a bola nos pés, saía jogando na boa, tocando com categoria. Mas, quando o atacante vinha na minha direção, eu não contava conversa, chegava junto mesmo… A questão é que eu entrava sempre pra ganhar o lance… Eu era duro sem a bola”, disse o Palheta.

Palheta, inclusive, naquela oportunidade da nossa entrevista, fez um breve comentário ao que ele considerava um ponto fraco de um zagueiro lendário do futebol acreano chamado Mozarino. De acordo com ele (Palheta), Mozarino preferia dar espaço para o adversário, andando para trás.

Cheguei a ver o Mozarino em ação, nos últimos anos dele dentro das quatro linhas. Vi e posso afirmar que isso de “dar espaço ao adversário” era apenas o jeito dele de tomar a bola sem fazer falta. Mozarino era um jogador “clássico”, lindo de ver jogar. Irmão do Deca, que batia mais do que martelo.

Todas essas maneiras de marcar, quando executadas à perfeição, são uteis aos clubes dos respectivos defensores. Da minha parte, eu prefiro os zagueiros que antecipam ou dão espaço. Inclusive porque eles não correm o risco de desfalcar os seus times por levarem cartões. É a minha preferência!

– Setembro de 2023


Francisco Dandão

Não é a primeira vez (e espero que esteja longe de ser a última) que eu escrevo uma crônica saudando o início da primavera no hemisfério sul. Pra mim, essa estação, que começou nesse 22 de setembro, é a mais bonita de se ver, tantas as flores que vicejam pelas beiradas dos caminhos e pelos jardins.

Num exercício livre de imaginação, fico pensando que Deus criou o mundo a partir da primavera. Caso em que primeiro vieram os aromas dos campos, bosques e florestas profundas. Tudo isso creio que foi criado no dia inaugural. Só depois, nos dias seguintes, é que surgiram as outras estações.

Pra respaldar o meu raciocínio, eu tenho um amigo, o Rinaldinho Cosson, xapuriense dos melhores, bebedor de cerveja tanto quanto os gregos consumiam o vinho nas festas da primavera, que diz que setembro é o mês dos bonitos. Isso porque tanto eu como ele nascemos neste mês/estação!

Além da nossa data de nascimento, outro detalhe me aproxima do Rinaldinho: o de que nós não nos demos bem na tentativa de jogar futebol. Ele, de acordo com o Joraí Salim, tentou ser goleiro. Mas desistiu quando levou uma bolada no pescoço. Eu desisti porque vi cedo que não levava jeito.

Mas não se diga que a primavera é uma estação em que não nascem craques de bola. Pelo contrário. Alguns cliques no computador me trazem imediatamente dois nomes de atletas do passado que nasceram no início da primavera: Ronaldinho Gaúcho (22) e Clodoaldo (29). Ambos de setembro.

Se a gente aprofundar a pesquisa, então, aparecerão nomes em profusão. Aí, claro, vocês vão me dizer que nascem supercraques em todas as estações do ano. Sim, é verdade. Concordo em gênero, número e grau. Mas as outras estações não são assim tão charmosas quanto a primavera!

E então, pra não dizer que eu vou apenas falar das flores nessa crônica, e lembrando que a primavera se estende até o dia 22 de dezembro, destaco que foram vários os jogadores acreanos que nasceram nessa estação. Casos, só pra citar meia dúzia de três ou quatro, do Casquinha e do Antônio Maria.

O Casquinha, que nasceu no dia 9 de outubro, foi um dos maiores jogadores de futebol de salão/futsal que o Acre já viu em suas quadras. Ele também jogou futebol de campo, no time principal do Atlético e em seleções de juniores. Mas foi com a bola pesada que ele deslumbrou os torcedores!

E o Antônio Maria, lateral do Juventus nas antigas, que nasceu no dia 17 de outubro, esse jogava tanto que recebeu o apelido de “príncipe”. Não sei quem o apelidou, mas, como tive o prazer de vê-lo em ação, posso testemunhar que o cara jogava uma bola de pura realeza. Salve a primavera!

– Setembro de 2023 –


Francisco Dandão

Um dia desses eu publiquei numa rede social uma fotografia de três craques do passado do futebol acreano. Mais precisamente uma fotografia onde apareciam com a camisa do Independência, campeão estadual de 1970, os excepcionais atacantes Aldemir Lopes e Jangito e o goleiro Illimani.

Naturalmente, uma fotografia como essa desperta as melhores recordações dos torcedores mais antigos, sujeitos já de algum tempo entrados na terceira idade, que gastaram (talvez esse não seja o verbo mais exato) muitas das suas tardes de corpo presente no Stadium José de Melo.

Cabe esclarecer a essa altura da crônica que durante as décadas de 1960 e 1970 era praxe ser jogada uma partida do campeonato de juvenis como preliminar do jogo principal. Os campeonatos dos adultos e dos juvenis eram jogados no mesmo período de tempo. Rodada dupla: juvenis e adultos.

Como não existiam refletores que permitissem jogos noturnos, na maioria das vezes os juvenis faziam a preliminar sob um sol de fritar ovo no asfalto. Mas nenhum atleta dessa categoria menor reclamava das condições ambientais. Jogar a preliminar era a oportunidade de ser visto pela galera.

Fiz uma digressão nos dois parágrafos anteriores, mas volto para o fio da meada, que foi a publicação da foto dos craques do Independência numa rede social. Fato esse que ensejou a intervenção de alguém, perguntando por onde andaria um juvenil da época conhecido pelo nome de “Dibleta”.

Eu fui contemporâneo do Dibleta, em 1972, como integrante do elenco juvenil do Rio Branco. Eu, volante; ele, atacante de referência. Nem eu nem ele jamais conseguimos a titularidade. Na posição em que a gente jogava havia uns meninos mais velhos que eram os donos das camisas 5 e 9.

Mas o que eu quero dizer mesmo é que o Dibleta (que eu também não sei por onde anda) jogava pra caramba. Cara de extrema habilidade, driblador fantástico, ele fazia o que bem entendia com a bola. E que talvez não tenha crescido no futebol por falta de paciência de esperar sua vez.

Aliás, o Dibleta fazia parte de um trio que se apresentou junto para treinar nos juvenis do Rio Branco. Calçando sandálias de dedo e com tênis Ki-chutes numa mochila, todos oriundos do bairro do Papoco, chegaram ao “José de Melo” as promessas de craques “Mica, Dibleta e Baladeira”.

O Mica e o Baladeira jogavam, respectivamente, nas extremas direita e esquerda. O Dibleta era homem de área. A questão, para azar do trio, na busca de despontar para o futebol acreano, é que o ataque juvenil do Estrelão de 1972 era formado por Guino, Abacate e Zé Garça. Não dava mesmo!

– Setembro de 2023 –


Francisco Dandão

Durante muitos anos o futebol brasileiro viveu praticamente sem intercâmbio entre as diversas unidades federativas. Raros e esporádicos eram os torneios que confrontavam times de estados diferentes.

E, via de regra, um torcedor das regiões mais remotas só tinha a oportunidade de ver em ação, de corpo presente, um jogador dos locais onde o futebol era mais expressivo quando um time empreendia um giro pelo país.

Quando chegou o ano de 1959, para diminuir esse distanciamento futebolístico, a Confederação Brasileira de Desportos (CBD) criou a Taça Brasil, reunindo clubes de 16 estados brasileiros, campeões do ano de 1958.

Participaram dessa primeira edição ABC (RN), Atlético MG, Atlético PR, Auto Esporte (PB), Bahia (BA), Ceará (CE), CSA (AL), Ferroviário (MA), Grêmio (RS), Hercílio Luz (SC), Manufatora (RJ), Rio Branco (ES), Santos (SP), Sport (PE), Tuna Luso (PA) e Vasco da Gama (DF).

Essa primeira Taça Brasil foi disputada em três fases, sendo que na primeira etapa os times foram divididos em quatro grupos (Norte, Nordeste, Leste e Sul) e todos os jogos se realizaram no sistema “mata-mata”.

Na fase segunda, os vencedores do Nordeste e do Norte disputaram uma vaga para a etapa seguinte, o mesmo acontecendo com os vencedores dos grupos Leste e Sul. A terceira fase foi disputada entre os campeões das zonas Norte e Sul e os representantes de São Paulo e do Distrito Federal.

A decisão foi disputada por Bahia e Santos, sendo necessárias três partidas para que o time baiano fosse declarado campeão. No primeiro jogo, realizado na Vila Belmiro (Santos), no dia 10 de dezembro de 1959, vitória do Bahia por 3 a 2. No segundo confronto, realizado na Fonte Nova (Salvador), no dia 30 de dezembro de 1959, vitória do Santos por 2 a 0.

Ante uma vitória de cada lado, foi necessária a realização de uma terceira partida. E então, no dia 29 de março de 1960, mediante um público de 20 mil pessoas, no Maracanã (Rio de Janeiro), o Bahia bateu o Santos por 3 a 1, com gols de Vicente, Leo e Alencar (Coutinho fez o gol do Santos).

A Taça Brasil durou de 1959 a 1968. Paralelamente, a CBD criou, em 1967, outro torneio, denominado Roberto Gomes Pedrosa, que durou apenas um ano. Em 1968, foi criada a Taça de Prata, que durou até 1970. No ano seguinte, a entidade criou o Campeonato Nacional de Clubes.

Tudo isso, porém ainda era insuficiente para contemplar todos os estados brasileiros. Foi aí que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), em 1989, criou a Copa do Brasil, torneio que abrange todos os estados. Por conta disso, a competição é denominada como a “mais democrática do país”.

– Setembro de 2023 –


Francisco Dandão

Tenho visto por aí, nas mais diferentes rodas de discussões efêmeras sobre futebol, gente que defende apaixonadamente o uso do VAR (Árbitro Assistente de Vídeo) e criaturas que se descabelam cada vez que o referido sistema tecnológico “entra em campo” pra definir o que “pode não ter sido”.

A turma que defende o uso da ferramenta explica que não existe mais gol roubado, aquela bola que quica em cima da linha, mas não entra, e que é dada como se tivesse ultrapassado a linha fatal. Fato que acontecia frequentemente, inclusive em Copas do Mundo, se não me falha a memória.

Já a galera que abomina o uso da tecnologia argumenta que era mais interessante para o futebol quando existia a dúvida, quando cada um via uma coisa e não se convencia com o ponto de vista dos adversários, principalmente se o erro do juiz beneficiasse o seu time do coração.

Independentemente de quem venha a ter razão, o certo é que o tempo não anda para trás e a tecnologia veio para ficar. E, sendo assim, não tem choro nem vela. Um centímetro a mais para lá ou para cá pode determinar a ascensão de uns às nuvens ou o mergulho de outros ao fundo do abismo.

Eu fiquei perdido nesses devaneios e não pude deixar de lembrar de uma excursão do sempre glorioso Flamengo carioca ao Acre, na década de 1960, oportunidade em que depois de vencer o Rio Branco por 2 a 1, na primeira partida, sobreveio o empate com o Juventus no jogo de despedida.

Segundo os registros hemerográficos da época, não fosse um gol roubado, no finalzinho do segundo tempo do jogo, o Flamengo teria sofrido um inesperado revés para os amadores do Acre e, nesse caso, teria sido objeto de profunda gozação dos torcedores adversários espalhados pelo país.

A jogada irregular teria acontecido depois de um escanteio que o atacante Almir, do time carioca, ganhou no grito. Um jogador chamado Rodrigues, do Flamengo, tocou a bola pela linha de fundo, mas, ante os protestos do Almir, o árbitro Sebastião Araújo assinalou o tiro de canto.

O escanteio inexistente não teria maiores consequências se depois da cobrança o atacante Almir não tivesse segurado o calção do goleiro Zé Augusto, o impedindo de saltar. Pra completar, César Maluco, outro atacante do Mengão, vendo que não alcançaria a bola de cabeça, fez o gol com a mão.

Em tempo de VAR, isso não pode mais acontecer. Por último, só pra efeito de registro, o Juventus daquela jornada épica formou da seguinte maneira: Zé Augusto; Carlos Mendes, Pedro Louro, Mozarino e Campos Pereira; Dadão e Passada Larga; Nemetala, Jangito, João Carneiro e Touca.

– Agosto de 2023 –


Francisco Dandão

Um domingo desses fui a uma feira livre numa praça próxima ao endereço onde atualmente eu amarro o meu burro, na chamada Cidade Maravilhosa (cada vez mais, apesar dos pesares de praxe). E aí, enquanto ia enchendo a sacola de compras, bati o olho num belo feixe de macaxeiras.

Como eu sou um adepto desse tipo de alimento, não pensei duas vezes em perguntar o preço ao feirante. Num lapso de memória do local onde eu estava, porém, esqueci que por aqui a galera chama “macaxeira” por “aipim”. Só me lembrei alguns segundos depois, ante o estranhamento do vendedor.

Resolvido o impasse da minha compra, e passando de um ponto a outro, fiquei refletindo o quanto o Brasil é gigante e o tanto que é diversa a maneira de como determinadas coisas (ou situações) são chamadas (entendidas) em cada recanto ou “biboca”, de norte a sul, leste a oeste.

Em se tratando de futebol, então, são tantas as diferenças que muita coisa que se diz ali, não pode ser compreendida aqui ou alhures. Para testar, resolvi chegar à minha sala de trabalho, na segunda-feira subsequente, e falar para os meus colegas de algumas expressões específicas do Acre.

Dito e feito, eu cheguei para uma criatura que a gente chama de “Matucão”, ponteiro arisco oriundo de Nova Iguaçu, e disse que dei show no fim de semana numa pelada na praia, quando fiz dois gols, depois de driblar adversários dando “banhos de cuia” e “xagões” (é assim que se escreve?).

Pra completar, falei para o carinha que o meu aquecimento antes da pelada foi dar mil “pancadinhas”. O meu colega pirou e ficou me olhando com cara de cachorro quando cai do caminhão de mudanças. Não entendeu nada. Necas de pitibiriba. “Banhos de cuia”? “Xagões”? “Pancadinhas”?

Depois de um instante tratei de fazer a devida “tradução. Mas não sem antes reafirmar todas as palavras ditas por mim antes, separando bem as sílabas, fazendo suspense e ar de surpresa, como quem estranha o fato de o sujeito não entender nada do que eu tinha dito, sendo tudo tão claro. Rsrs.

E aí, quando eu “traduzi” “xagão” por “drible da vaca”; “banho de cuia” por “lençol”; e “pancadinha” por “embaixada”, o Matucão sorriu e disse: “Mano, lá no Acre vocês falam outra língua, tudo errado. Talvez seja por isso que um time de vocês ainda não chegou à série A. Tô fora.”

É isso. Agora, quando eu vou à feira, tenho o cuidado em não perguntar mais o preço da macaxeira. Também não me refiro mais, pelo menos quando converso com o amigo Matucão, ao drible da vaca como “xagão”, lençol como “banho de cuia” e embaixada como “pancadinha”!

– Agosto de 2023 –


Francisco Dandão

Na profusão de datas disso e daquilo (tem data de tudo e mais um pouco), teremos neste domingo (13) o Dia dos Pais. A comemoração foi proposta, originalmente, pelos Estados Unidos, na primeira década do Século XX, e desembarcou por aqui pelos trópicos no ano de 1953.

A proximidade da comemoração, numa associação de ideias totalmente livre, me fez lembrar o clássico dos anos românticos do futebol acreano denominado “Pai e Filho”, jogado entre o Rio Branco Football Club, o Estrelão, e o Atlético Clube Juventus, conhecido como Clube do Povo.

A denominação de “Pai e Filho” foi originada pelo fato de que a maioria dos integrantes do elenco do Rio Branco se transferiu para o Juventus, quando da fundação deste último, em 1966. Mais ou menos, biologicamente falando, como se um tivesse sido gerado pelo DNA do outro.

As crônicas da época dão conta de que o Juventus só não levou para o Ninho da Águia dois dos então jogadores do Rio Branco: o zagueiro Campos Pereira, por ser considerado já em final de carreira, e o meia Dadão, que estava com 16 anos e era considerado muito inexperiente para a mudança.

Pouco tempo depois, porém, tanto o Campos Pereira quanto o Dadão também foram levados para o clube recém fundado. O primeiro ainda teve tempo de contribuir para o sucesso do time juventino. E o segundo se tornou um dos principais jogadores (talvez o maior) a passar pelo rubro-negro.

Ao longo dos 23 anos seguintes (de 1966 a 1988), quando o futebol acreano viveu a sua grande fase amadorística, foram muitos os confrontos entre “Pai e Filho”, a maioria com prevalência do “filho”. Prova disso é a diferença de títulos entre um e outro: nove do Juventus e seis do Rio Branco.

Depois disso veio o profissionalismo e apesar de o Juventus praticamente não ter disputado muitos campeonatos, ainda conseguiu levar pra casa cinco títulos (1989, 1990, 1995, 1996 e 2009). Mas aí, quem passou a ser o maior vencedor foi o Rio Branco, com 18 títulos em 35 possíveis.

Com o longo afastamento do Juventus dos gramados, os torcedores acreanos ficaram privados das emoções proporcionadas pelos confrontos entre “Pai e Filho”. Dizem as boas línguas que o Juventus vai voltar qualquer dia desses. Eu tenho minhas dúvidas, mas não deixo de ter alguma esperança.

De qualquer forma, como a história não pode ser apagada, ficam pelo menos as lembranças, ainda mais vivas num dia de comemoração como este 13 de agosto, aqui pertinho da gente, dos dias em que o “pai” Rio Branco e o “filho” Juventusmediam forças no lendário Stadium José de Melo!

– Agosto de 2023 –


Francisco Dandão

Devo confessar que a data de aniversário do Independência, nesse 2 de agosto, estava passando despercebida por este que vos escreve. Mas aí, como eu sou um leitor assíduo do meu querido editor Manoel Façanha, refresquei a memória e, então, eis-me a chegar aqui para dar uns pitacos.

Como o Façanha bem lembrou, são 77 anos desde que o Tricolor de Aço veio à luz, para a alegria de incontáveis criaturas que se apaixonaram perdidamente pelo chamado Clube do Marinho Monte. Inúmeras páginas memoráveis e turbilhões de incontidas emoções. Muita história mesmo!

É verdade que o Independência nem conquistou tantos títulos estaduais (ou territoriais). Nesses anos todos o time subiu ao degrau mais alto do pódio apenas 11 vezes (nove na época do futebol amador e duas no regime profissional). Mas isso em nada diminuiu a paixão dos seus adeptos.

No meu entendimento, essa paixão toda pelo clube se deu por conta dos grandes esquadrões montados pelos seus dirigentes (Adalberto Aragão, Darci Pastor, Eugênio Mansour, Orlando Sabino etc.) na primeira metade da década de 1970, quando o time conquistou os títulos de 1970, 1972 e 1974.

O time de 1970 tinha como titulares os seguintes nomes: Illimani; Chico Alab, Palheta, Flávio e Otávio; Escapulário, Aldemir Lopes e Jangito; Bico-Bico, Bebé e João Carneiro. Havia ainda dois reservas de alto luxo, que sempre entravam para “descansar” algum titular: Ociraldo e Jorge Floresta.

Dois anos mais tarde, em 1972, após perder o bicampeonato, para o Rio Branco, a formação titular do Independência era a seguinte: Illimani; Chico Alab, Jorge Floresta, Flávio e Melquíades; Eró, Escapulário e Aldemir Lopes; Bico-Bico, Bebé e Tonho. Um reserva de alto nível: Manoel!

Em 1973, novamente o Rio Branco atravessou a caminhada do Tricolor. Mas aí veio 1974 trazendo outro título. Formação base: Zé Augusto; Chico Alab, Deca, Palheta e Flávio; Escapulário, Aldemir Lopes e Augusto; Bico-Bico, Rui Macaco e Júlio César. Um reserva de luxo: Tonho!

No que diz respeito a treinadores, em que pese a passagem de muita gente boa no comando da equipe (cite-se Paulo Roberto, Gilmar Sales, José Ribamar, Elden Fuzarca), creio que dois se destacaram: Alício Santos e Walter Félix de Souza (este popularmente conhecido pelo apelido de Té).

Alício Santos, ao introduzir o famoso “tripé de meia cancha” como inovação tática (antes de se jogava no esquema 4-2-4), tirou o time, em 1970, de um jejum de sete anos. E o professor Walter Félix, em se tratando de estratégia, sacava tanto “coelho da cartola” que era chamado de “feiticeiro”.

Vida longa ao Tricolor de Aço!

– Agosto de 2023 –


Francisco Dandão

Eu estava um dia desses me lembrando em como os dirigentes do futebol amador do mundo eram (ainda são?) criativos para gratificar os atletas. E essa criatividade valia tanto para pagamento a favor quanto contra (suborno, no popular). Eu diria que a criatividade dos caras não tinha limites.

No caso da “gratificação negativa”, eu me recordo de histórias dando conta de sujeitos que foram “comprados” por coisas que variavam entre a promessa de um emprego (público ou privado, tanto faz), um par de chuteiras usadas, ou um “vale-açougue” para comprar carne por um ano inteiro.

Da mesma forma, para renovar o compromisso de defender um clube por mais uma temporada, dependendo da esperteza do atleta, o prêmio podia variar desde milheiros de tijolos a dentaduras seminovas e fuscas zerinho, passando por bicicletas Monark, fardos de jabá e garrafas de cana.

O suborno mais curioso, porém, que eu um dia ouvi falar foi um que saiu das mãos do saudoso desportista Martins Bruzugu: duas pepetas e três sacos de carambola. Tudo isso para um goleiro deixar passar um chute do meio do campo do Tião Catega, filho do Bruzugu. O Tião pode confirmar.

No que diz respeito ao pagamento mais estranho pelos bons serviços prestados à causa do futebol, creio que nada supera o que ganhavam os artilheiros xapurienses Julinho Figueiredo e Pipiúna, quando os dois, ainda adolescentes, defendiam um time boliviano em um campeonato lá deles.

Julinho no começo da carreira era goleiro do América de Xapuri. Aí um dia, num jogo em Cobija, capital do Departamento de Pando, resolveu ir para a linha, depois do seu time estar perdendo por três a zero. Fez dupla de ataque com Pipiúna e o América virou o jogo para quatro a três.

Depois disso, não teve saída. Os bolivianos não poderiam mesmo deixar os dois craques xapurienses irem embora pra casa assim sem mais nem menos. E daí para a assinatura de um contrato de prestação de serviços futebolísticos, foi só questão de alguns minutos para estabelecer as bases.

Como os dirigentes do clube boliviano não possuíam fundos em espécie suficientes para pagar os dois craques, ficou acertado que cada um deles ganharia um barril de gasolina (produto abundante em “la banda”) por partida. E mais um barril por cada gol marcado. Negócio fechado!

Julinho e Pipiúna só não abriram um posto de combustível em Xapuri, com o pagamento dos bolivianos, porque não tinham vocação para o comércio. Mas, disse-me um dia o Julinho, tinham até clientes cativos para a gasolina que levavam pra casa depois dos jogos. Um ótimo negócio!

– Julho de 2023 –


Fim da primeira fase

Francisco Dandão

Neste fim de semana acaba a primeira fase do Campeonato Brasileiro da Série D. Dos 64 times que iniciaram a disputa, somente a metade segue em frente. O restante vai refletir o que deu errado para a eliminação precoce. Como se diz no popular, esse restante vai tratar de lamber as feridas.

É certo que algumas eliminações não são nada surpreendentes. Clubes que disputam o campeonato estadual com um elenco e a Série D com outro (inferior, no caso), esses entram no torneio nacional só mesmo para cumprir tabela. Não vou nominar nenhum, mas todo mundo sabe quais são eles.

Independentemente do demérito de alguns, porém, deve-se louvar o esforço daqueles que entram na competição almejando galgar degraus no mapa do futebol brasileiro. Não é fácil montar um elenco competitivo, mas alguns dirigentes fazem das tripas coração para o sucesso do seu clube.

A respeito desses, quero destacar quatro times que realizaram uma primeira fase de excelência, atropelando a maioria dos adversários que apareceram pela frente: o cearense Ferroviário, o amazonense Nacional, a carioca Portuguesa e o distrital Ceilândia. Todos esses fizeram bonito!

O Ferroviário, ou “Ferrim” para os íntimos, foi o time que fez mais pontos nesta primeira fase. Até antes da rodada final, foram dez vitórias e três empates em 13 partidas jogadas. Quase uma “barbada” (usando a linguagem do turfe) para quem gosta de fazer uma fé em casa de apostas.

Depois do Ferroviário, quem fez mais sucesso foi a Portuguesa carioca, que venceu oito das 13 partidas jogadas. Lá pelas tantas, perdeu umazinha. Mas nada que pudesse ameaçar a passagem do time para a fase seguinte e, por conseguinte, seguir almejando uma vaga na próxima Série C.

Na sequência dos melhores pontuadores, vieram o Nacional e o Ceilândia. Ambos fizeram 27 pontos, sendo que o Nacional chegou a perder duas vezes. Em compensação, venceu oito. O Ceilândia está invicto, mas venceu menos do que o Nacional. Costuma empatar muito esse Ceilândia.

Naturalmente, nada garante que as excelentes campanhas que esses times citados realizaram na primeira fase os conduzam para uma ascensão. Nos confrontos seguintes, os chamados “mata-mata”, qualquer descuido pode ser fatal. Mas eles passam uma boa confiança para os seus torcedores.

Da minha parte, como eu sou uma criatura oriunda do extremo Norte do país, vou torcer para que o Nacional tenha sucesso na sua empreitada. Lá atrás, no início da competição, eu torcia pelos acreanos Humaitá e São Francisco. Uma torcida que não passou de um sonho numa noite de verão!

– Julho de 2023 –


O campeão acreano de 1975

Francisco Dandão

Escrevi na crônica passada sobre o super time do Independência, campeão acreano de 1974. O texto foi muito bem recebido pelos torcedores do Tricolor de Aço, pelas lembranças de um tempo em que a citada equipe dava um show a cada jogo.

Como não existe, porém, unanimidade nessa vida, ainda mais em se tratando de futebol, recebi uma mensagem do amigo Toinho Bil, juventino desde antigamente, afirmando que o Juventus, campeão de 1975, era melhor do que o Independência de 1974.

Aí eu corri aos arquivos para conferir o Juventus do referido ano, cujo time titular formava com Xepa (ou Milton – eles revezavam); Mauro, Mustafa, Maurício e Antônio Maria; Emilson, Carlinhos Bonamigo e Dadão; Julião, Walter Prado e Pitola.

Mas, além desses, que o elenco do Clube da Águia era cheio de caras da bola bem redondinha, havia ainda à disposição do treinador Aníbal Tinoco, entre outros, os laterais Otávio e Assis, os meias Pingo Zaire e Hermínio, e o atacante Carlitinho.

O Xepa, de tanto que pegava, chegou a ser profissional no futebol amazonense. E só voltou para o Acre por conta da promessa de um elevado cargo no serviço público. E o Milton passou mais de mil minutos sem levar um golzinho sequer.

Os laterais Mauro e Antônio Maria eram daqueles sujeitos que tanto defendiam quanto atacavam. E, por incrível que pareça, apesar de defensores, só jogavam na bola, sem precisar apelar ou dar pontapés nos ponteiros adversários.

Os zagueiros Mustafa e Maurício não contavam conversa. O Mustafa até que ainda exibia boa técnica. Tinha um físico de gladiador romano, mas sabia tratar a bola quando era preciso. Já o Maurício, este fazia da virilidade a sua maior virtude.

Quanto ao meio de campo do Juventus, com Emilson, Carlinhos Bonamigo e Dadão, era uma covardia para os times inimigos. Só quem viu esses sujeitos em campo sabe do que eles eram capazes. Dadão era até chamado de “o deus do futebol acreano”.

No ataque, Julião era um artista oriundo do futebol amazonense. Valter Prado, que depois virou deputado, era um tanque trombador. E Pitola era a formiguinha que ajudava a carregar o piano: habilidoso, mas sempre pegando na marcação. Grande Juventus!

– Julho de 2023 –


Segundo artilheiro do Brasil

Francisco Dandão

Publiquei um dia desses, numa página na Internet, uma fotografia do Independência, campeão acreano de 1974. Aquele time fantástico formava dessa maneira: Zé Augusto; Chico Alab, Palheta, Deca e Flávio; Escapulário, Aldemir Lopes e Augusto; Bico-Bico, Rui Macaco e Júlio César.

Numa retrospectiva de memória, passei a lembrar das características desses jogadores. E foi assim que vi as defesas acrobáticas do Zé Augusto, goleiro que um dia da década de 1960 defendeu tanto num amistoso contra o Flamengo carioca que acabou sendo levado para jogar no Rio de Janeiro.

Os laterais Chico Alab (direita) e Flávio (esquerda) eram marcadores implacáveis. E o Chico ainda agregava mais uma virtude: cruzava a bola como poucos. Diz-se, aliás, que ele foi o primeiro lateral do futebol acreano que se aventurou ao ataque, contrariando as orientações dos treinadores.

Os dois zagueiros, Deca e Palheta, esses viraram lendas do futebol acreano do passado. Embora ambos soubessem o que fazer com a bola nos pés, não tinham nenhum pudor em deixar os atacantes com os corpos estendidos no gramado. Passar pelos dois era missão quase impossível.

Os três caras do setor de meio campo, Escapulário, Aldemir Lopes e Augusto, esses eram verdadeiros artistas da bola. Com um detalhe: nenhum deles era volante. Com a dupla de zaga que tinham atrás de si, eles não se preocupavam em defender. Voltavam apenas para cercar os adversários.

O Escapulário, que nasceu no interior do Pará e veio migrando rumo oeste até ancorar seu barco às margens do rio Acre, de tão habilidoso era chamado de bailarino. O Aldemir Lopes jogava de cabeça erguida. E o Augusto sempre antevia os lances, dada a sua extrema rapidez de raciocínio.

No ataque, Bico-Bico, na direita, e Júlio César, do lado esquerdo, eram dois demônios. Exímios dribladores e velocistas, eles causavam sérios pesadelos nos laterais escalados para enfrenta-los. Um detalhe insólito das biografias desses dois virtuoses da bola era o de que ambos tomavam todas.

Por último, o centroavante Rui Macaco, que eu entrevistei num dia qualquer de 2003. Veloz e rompedor, ele me falou de dois aspectos curiosos da sua carreira: sobre o seu apelido, que não tinha conotação depreciativa, e sobre a sua condição de um dos maiores goleadores do Brasil em 1974.

Sobre o apelido, ele disse que era por conta da sua habilidade para escapar dos sarrafos inimigos. Os caras batiam, mas não o acertavam porque ele sempre saltava por cima das pancadas. E sobre a artilharia que, no seu dizer, em 1974 ele só fez menos gols do que o famoso Dario “Peito de Aço”!

– Julho de 2023 –


Em nome da memória

Francisco Dandão

Que o Brasil sempre foi um país desmemoriado, creio que ninguém tem dúvida. Passado o instante, cada vez menos as pessoas se lembram dos diversos episódios. Sempre foi assim. E hoje em dia, com uma espécie de estado de “presente perpétuo”, creio que essa tendência se acentuou mais.

Quando falo de “presente perpétuo”, quero dizer que a maioria das pessoas, dada, principalmente, a velocidade dos meios de comunicação, vive basicamente o momento. Somente um ou outro tem a percepção de que o presente é feito de toda uma sucessão de situações e atitudes anteriores.

Como costumava dizer meu falecido pai Alício Pinheiro, pra brasileiro “bocado comido é bocado esquecido”. E já que estou falando em comida, quem aí lembra o que almoçou ontem, hein? Pois é. Se até o passado recente se esvai entre os dedos, imagine algo que já vai longe no calendário.

Mas, indo ao cerne da questão, esses três parágrafos que eu escrevi aí em cima foi só para lembrar que nessa quinta-feira que recém passou, dia 29 de junho, completaram-se 65 anos que o Brasil conquistou a sua primeira Copa do Mundo de Futebol, nos campos da Suécia. Alguém lembrava disso?

Pois é isso. Depois de perder as copas de 1930, 1934, 1938, 1950 (essa dentro de casa, fato que também ninguém pode esquecer, levando-se em conta que uma moeda tem sempre duas faces) e 1954, o Brasil, como dizia Nelson Rodrigues, superou o “complexo de vira-lata” lá na Europa.

O Brasil, deve-se ressaltar, sempre arranjava uma desculpa esfarrapada para as suas quedas. Em 1930, dizia-se que o time estava incompleto; em 1934, 1938 e 1954, dizia-se que os juízes garfaram a seleção; e em 1950, dizia-se que a nossa derrota fora por excesso de confiança.

Aí, quando chegou 1958, o nosso time foi para as cabeças. Com Pelé e Garrincha em campo não teve pra ninguém. Foi pancada na Áustria (3 a 0), na União Soviética (2 a 0), no País de Gales (1 a 0), na França (5 a 2) e na Suécia (5 a 2). Tropeço mesmo, só umzinho: 0 a 0 com a seleção inglesa.

Então, de lá pra cá foram outras quatro vezes que o Brasil subiu ao degrau mais alto do pódio numa Copa: 1962, no Chile; 1970, no México; 1994, nos Estados Unidos; e 2002, na Ásia. E só não foram mais vezes, creio eu, por conta das sempre imponderáveis interferências do senhor destino.

Tá dado o meu recado. Eu não estava na Suécia, nem mesmo ouvi pelo rádio, que naquele ano de 1958 eu estava com apenas um aninho de idade. Mas está tudo nas crônicas. É só uma questão de interesse pela memória. A gente só compreende o presente se souber o que aconteceu no passado!

– Junho de 2023 –


A dança dos números

Francisco Dandão

Todas as vezes que uma rodada é concluída na Série D do Campeonato Brasileiro, eu me pego estudando os números para tentar, num exercício de imaginação, ver quem ainda tem chances de passar para a fase seguinte e quem já está, digamos, irremediavelmente perdido, no caminho do buraco.

Dessa forma, depois dos confrontos do recente final de semana, creio que se pode dizer categoricamente que o glorioso São Francisco, o chamado clube católico do futebol acreano, se encontra dentro dos que vão apenas cumprir tabela. Infelizmente, essa é a verdade cristalina como água potável.

Após nove jogos realizados, o São Francisco venceu somente duas vezes (1 a 0 no roraimense São Raimundo, no comecinho do torneio, e 1 a 0 no amapaense Trem, na sexta rodada). O São Chico não empatou nenhuma. Perdeu as outras sete partidas. Algumas delas, ressalte-se, até de goleada.

Outros dois com poucas (raríssimas, eu diria) chances, ainda que os princípios matemáticos lhes deem alguma esperança, são os tais roraimense São Raimundo e amapaense Trem. Cada um deles tem oito pontos, a essa altura. Podem chegar a 23, “se vencerem” todos os jogos que lhes restam.

Como nenhum dos dois até aqui apresentou nada que possa fazer os seus torcedores acreditarem que vencer cinco jogos consecutivos seja possível, então, como diz o outro, o negócio é jogar pela honra, se preparar para o adeus e, se possível, atrapalhar a vida dos que estão hoje na frente.

Dos times que estão neste momento em que escrevo fora do G4, apenas o amazonense Princesa do Solimões pode almejar uma vaguinha entre a turma do meio pra cima. Mas o time de Manacapuru, treinado pelo competentíssimo Aderbal Lana, tem se mostrado extremamente irregular.

A luta dentro desse Grupo 1 tem se configurado tão desigual que nem que todos os hoje integrantes do G4 venham a perder na décima rodada (o que é impossível, já que há um confronto direto), nada se altera. Mesmo que Nacional-AM, Águia-PA (ou Tuna-PA) e Humaitá-AC percam, nada muda.

Como eu vejo o Nacional bem acima dos outros, me parece que a briga no Grupo 1 vai ser pelas posições do 2º ao 4º lugar. Uma luta bem interessante porque determina a qualidade do adversário na fase seguinte, além de estabelecer quem faz o primeiro jogo em casa e o segundo fora.

E pra concluir, como eu nunca tive medo de água fria, vou dar meus palpites para a próxima rodada: empate entre São Raimundo e Nacional; vitória do Águia contra a Tuna Luso; vitória do Humaitá sobre o São Francisco; e vitória do Princesa sobre o Trem. Detalhe: eu sempre erro! Rsrs.

– Junho de 2023 –


“Desfavoritos”

Francisco Dandão

Essa palavra aí do título ainda não existe na forma dicionarizada. Quer dizer, ainda não foi incorporada à norma culta. É um, por assim dizer, neologismo. Mas eu não a inventei. Já a vi (li) por aí nas infovias da vida, com o significado de nomear “o que ou quem não é favorito a alguma coisa”.

Pois eu recorro a ela (a palavra inexistente) para fazer menção aos times que disputam a Série D do Campeonato Brasileiro sem chances de passar para a fase seguinte. Aqueles times que não vão conseguir ir pra frente nessa competição “nem com anzol no olho”, como se dizia em gíria antiga.

O primeiro desses times, de acordo com a pontuação ostentada na tabela de classificação, decorridas oito partidas (são 14), é o Real Ariquemes. O time rondoniense conseguiu a façanha de fazer apenas um ponto até aqui, fruto de um empate com o tocantinense Interporto, na quinta rodada.

O outro dos times que só vai cumprir o resto da tabela é o Novo Hamburgo, do Rio Grande do Sul. Ligeiramente melhor do que o Real Ariquemes, o time empatou duas vezes. Segurou a onda com os também gaúchos Brasil e Aimoré, na terceira e na quarta rodadas, respectivamente.

O potiguar Globo e o capixaba Real Noroeste aparecem na sequência nessa condição de “desfavoritos”. Tanto um como o outro conseguiram vencer umazinha, empatar outra e tomar seis cascudos nos cocos. Matematicamente, ainda não estão fora. Mas nada indica coisa ao contrário.

Para os torcedores mais ao Norte do país, entretanto, o que interessa é o Grupo 1. Aquele onde estão a competir times dos estados do Amazonas, Pará, Roraima e Acre. É nesse local onde começa (ou será melhor dizer “termina”?) o Brasil que as equipes da última divisão medem suas forças.

E o que diz a classificação do Grupo 1, depois de decorrida mais da metade da primeira fase? O que diz é que o amazonense Nacional nada de braçadas no rio Solimões, com 19 pontos conquistados (seis vitórias, um empate e uma derrota). É o líder e vai para o mata-mata com absoluta certeza.

Em contrapartida (eu não quis dizer “por outro lado”, para não ser confundido com as escaramuças de Napoleão Bonaparte e sua Josefina), no mesmo Grupo 1, o acreano São Francisco (seis pontos) e o amapaense Trem (cinco pontos) patinam no lamaçal das chuvas torrenciais amazônicas.

Eu vejo o desempenho desses dois e fico a pensar em qual deles poderia segurar um instrumento que iluminasse melhor os seus caminhos. O São Chico, como tem nome de santo, a melhor alegoria seria uma lanterna cheia de velas. Já o Trem, um potente holofote pode resolver a questão!

– Junho de 2023 –


Intercâmbio

Francisco Dandão

Um dia desses eu publiquei numa rede social uma fotografia dos ex-jogadores Gilberto (Vasco da Gama-RJ) e Roberto Ferraz (Rio Branco-AC). A foto, datada do ano de 1982, quando de um amistoso entre as duas equipes, evocou recordações e não foram poucas as manifestações dos internautas.

A maioria das manifestações dava conta de um período áureo do futebol acreano, quando milhares de pessoas lotavam as dependências do estádio José de Melo. E todas, sem exceção, lembravam de como surgiam grandes jogadores no espaço territorial da antiga República de Galvez.

Aí, fruto da minha própria percepção, eu lembrei que surgiram mesmo ótimos jogadores no futebol acreano da época amadora, mas também os clubes importavam criaturas que jogavam muita bola. E que se mudavam para o Acre para faturar o que jamais ganhariam nos seus estados de origem.

Sim, eu falei que o futebol acreano era amador. Mas isso não impedia que os craques “importados” fossem regiamente pagos no local. Alguns se mudavam por polpudos salários. Outros ganhavam bons salários e empregos públicos. E outros, além do mais, ainda faturavam presentes, por fora.

Da maioria dos estados, o caminho era de mão única. Ou seja, só era feito o percurso rumo ao Acre. Mas havia um estado, o Amazonas, no caso, que esse percurso acontecia em mão dupla. Tanto ia jogador num sentido quanto no outro. E quase todos tinham um desempenho acima da média.

Se não estou enganado, aliás, o intercâmbio futebolístico entre Acre e Amazonas foi iniciado com o atacante acreano Hugo Sena, no final da década de 1950. Hugo, que na sua terra natal jogara por Boulevard, Atlético e Independência, foi para Manaus jogar no Santos do bairro Cachoeirinha.

O Santos foi só a porta de entrada do acreano Hugo Sena no futebol amazonense. Depois, ele, que era tido como um jogador que atacava com refinada técnica e defendia com eficiência, jogou ainda pelo Nacional e pelo Rio Negro, além de vestir a camisa da seleção amazonense inúmeras vezes.

De memória, enquanto escrevo, lembro de outros cinco jogadores que fizeram a ponte Acre/Amazonas, em anos distintos das décadas de 1970 e 1980: o armador Mariceudo (Nacional), o goleiro Xepa (Fast), o lateral Bento (Nacional), o zagueiro Som (Rio Negro) e o atacante Pistolinha (Fast).

Enquanto isso, no sentido inverso, do Amazonas para o Acre, migrou uma legião de artistas da bola. Valdir Silva, Tadeu, Saúba, Júlio César, Augusto, Mário Vieira, Julião, Marquinhus, Cleiber, Emilson, Palheta, Flávio, Bolinha, Saldanha, Dida, Dico… E vários outros que eu não lembro.

– Junho de 2023 –


Bons biriteiros

Francisco Dandão

Um dia desses, numa crônica passada, escrevi sobre jogadores de futebol que não resistem à tentação de tomar umas e outras, ainda que seja véspera de jogo e que o time esteja concentrado. Para esses, não tem barreira que consiga segura-los. Se o vigilante cochilar, os caras dão um jeito de fugir.

Naquela oportunidade, eu disse que a maioria desses camaradas chegados a uma carraspana não se aguenta nas pernas no jogo imediatamente seguinte à farra. E, por assim ser, jogam se arrastando no campo, letárgicos, sonâmbulos, sem ânimo pra nada e não chegando nas bolas mais fáceis.

Mas eu disse também que existiram (ainda existem?) fenômenos que jogavam ainda melhor quando bebiam. E dei dois exemplos: Garrincha, o gênio das pernas tortas que deslumbrou o mundo na década de 1960, e Bico-Bico, que fazia a alegria das plateias do futebol acreano, na década de 1970.

Especificamente falando do futebol acreano dos anos românticos do amadorismo (até 1988), os craques chegados ao samba e à cerveja costumavam usar um artifício farmacológico para não sentirem os efeitos da ressaca. O recurso, no caso, era um injetável denominado Glucoenergan.

Desenvolvido pelos químicos na primeira metade da década de 1960, o Glucoenergan era aplicado diretamente na veia dos clientes e agia com a dupla finalidade de suprimir o apetite e proporcionar doses extras de energia aos seus usuários. O sujeito tomava esse troço e corria feito um cavalo.

Com esse artifício, quase nenhum “atleta” levava a sério as orientações dos profissionais de educação física. No mais das vezes, o “preparo físico” consistia em umas corridinhas ao redor do campo, duas dezenas de “polichinelos” e uma dúzia de “cangurus”. O resto era com a “Gluco”.

É claro que depois que o efeito do medicamento passava, a pessoa que dele fizera uso ficava em estado lamentável de profundo e absoluto cansaço, sem ânimo pra nada. O que importava, porém, aos olhos da maioria, era que no jogo todo mundo via a disposição física ostentada pelo usuário/jogador.

E o pior: como não existia a compreensão de que uma injeção não podia ser aplicada em mais de uma pessoa com a mesma seringa (ainda que “esterilizada” em água fervente, como se fazia à época), procedia-se assim, provocando, via de regra, a contaminação de todo o grupo submetido ao ato.

Dessa forma, por conta dessas vias transversas, muitos craques do futebol acreano (e de outras paragens), ganharam fama de bons biriteiros, meio que super-homens que tomavam todas na véspera do jogo e que depois não davam nem sinal de cansaço dentro de campo. Era outra época!

– Maio de 2023 –

A espécie humana

Francisco Dandão

Todo preconceito é nefasto. Preconceitos significam conceitos prévios, sem conhecimento de causa. E o efeito disso, pelo desconhecimento da causa, só pode levar a situações absurdas. Se o preconceito estiver relacionado à cor da pele, então, tudo isso é elevado a potências extremas.

A espécie humana é pródiga em incorporar preconceitos das mais variadas espécies. Os sujeitos crescem em meio a uma avalanche de crenças que lhes vão sendo passadas pela família e/ou pelo nicho social em que estão incrustrados. E tudo vai sendo indevidamente perpetuado, dia após dia.

A cor da pele, no meu entender, é um dos preconceitos mais odiosos. Os ignorantes de todos os matizes não conseguem compreender que a essência de um ser humano não está na pigmentação do corpo. Não é possível meter na cabeça oca deles essa ideia de igualdade, sentimento fraterno etc.

Entro nesse assunto pensando nessas manifestações bestialógicas dos torcedores espanhóis contra o jogador brasileiro Vini Júnior, do Real Madrid. Cada vez que entra em campo e exercita a sua elevada arte, Vini é alvo dos xingamentos dos torcedores (ou seriam marginais?) dos times adversários.

Gritos de macaco ecoam pelas arquibancadas dos mais variados estádios. Pela elevada capacidade de conduzir uma bola e desmoralizar os zagueiros que o enfrentam, Vinicius desperta a raiva e a intolerância dos mentecaptos. Para eles, um negro do terceiro mundo não pode ser tão bom.

Mas o pior de tudo, no meu entender, é a conivência das autoridades. Os caras agem como se tudo aquilo fosse normal e que se trata tão somente de inocentes provocações para desestabilizar a genialidade do brasileiro. Estão muito enganados. É a mais pura manifestação de ódio e recalque!

Existem na Europa dois tipos de preconceito com relação ao pessoal do Terceiro Mundo. Um deles é a própria origem da criatura. Eles acham que somos todos esfomeados que vamos lá para ocupar os seus lugares. O outro, a cor da pele, que se for negra faz com que sejamos considerados inferiores.

Eu, negro e brasileiro, vivi uma situação, determinada vez, em Paris (a Cidade Luz lá deles) que, embora sem maiores consequências, demonstrou a diferença de tratamento entre um branco do “primeiro mundo” e os outros. Foi num parque público, nas imediações do Jardim de Luxemburgo.

A situação foi a seguinte. Um adulto branco jogava bola com uma criança, num lugar gramado, sob as vistas dos policiais que ali transitavam. Ninguém os incomodava. Quando eu entrei no espaço, para fazer uma foto, logo um segurança correu para me dizer que era proibido pisar na grama!

– Maio de 2023 –


Atrações da noite

Francisco Dandão

São inúmeras as atrações da noite para os adultos que adoram uma boêmia. Às vezes, os notívagos inveterados nem tem a intenção de se espaldar numa esbórnia. Quando saem de casa, a promessa que fazem a si mesmo é a de tomar só uma cervejinha (pra matar a sede) e voltar rapidinho.

Na prática, porém, uma cerveja puxa a outra, o papo rola solto, os maiores problemas da humanidade são resolvidos e quando os bem-intencionados membros da confraternização se dão conta, lá se vão horas da madrugada. Lá se vão horas e a cabeça, a essa altura, já está além de Bagdá.

E veja-se que eu falei apenas de uma inocente cervejinha numa mesa de bar. Se na farra for incluída uma boate, ou um night club (antigamente se dizia lupanar), cheio de mulheres de formas opulentas e com cheiro de patchouli, então, a coisa se complica muito mais e o tempo se comprime.

Aí, meus caros, os sujeitos da noite só chegam em casa quando os primeiros raios de sol do dia seguinte já apontam no horizonte. Quem não tem ressaca, só fica mesmo com uma certa lassidão no corpo. Os que sofrem da tal ressaca, porém, penam pra caramba e juram nunca mais repetir o feito.

Se os sujeitos forem jogadores de futebol e participarem de uma farrinha dessas na véspera de uma partida, aí o bicho pega. Na hora do jogo, o cérebro comanda e o corpo não obedece. O carinha que fazia cem metros rasos em dez segundos, eleva esse recorde para dois ou três minutos.

Pregados em campo, veem os adversários passando por eles em velocidade de Fórmula Um. E então, sem muito esforço, os jogadores do outro time, que normalmente nem são assim tão velozes, vão construindo placares desmoralizantes, tão fácil como quem toma doce de criança.

Isso só não acontece quando no grupo dos farristas existe algum gênio que quanto mais bebe, mais joga. Na história do Brasil o grande representante desse tipo de jogador se chamava Garrincha. E no Acre, na mesma posição do Garrincha, existiu um sujeito chamado Bico-Bico.

Ao contrário dos comuns mortais, reza a lenda que o Garrincha e o Bico-Bico, quanto mais bebiam mais jogavam. A lenda relata, ainda, que havia dirigentes que facilitavam a vida boêmia desses dois, ou introduzindo umas biritas na concentração ou deixando eles darem as suas escapadas.

E sabem por que essa conversa me ocorreu? Pelo fato de que eu ouvi dizer que um dia desses um time acreano foi goleado num jogo fora do estado por causa do gosto pela noite de alguns dos seus jogadores. Se é verdade, eu não sei. O que eu sei é que o Garrincha e o Bico-Bico não estavam no grupo.

– Maio de 2023 –


Tudo igual

Francisco Dandão

Tudo igual no Grupo 1 do Campeonato Brasileiro da Série D. Cada time jogou duas vezes, venceu uma e perdeu a outra. O fator casa tem se mostrado preponderante. Os anfitriões vencem, enquanto os visitantes são derrotados. E assim, todos estão mais ou menos do jeito como começaram.

Na primeira rodada, em Macapá, às margens do majestoso rio das amazonas (lendárias mulheres guerreiras), o Trem bateu a paraense Tuna Luso. Jogo duríssimo. O placar apertado (um gol a zero) traduz o que foi esse combate. Foi daqueles jogos, como diria o poeta, resolvidos no detalhe.

Em Marabá, na confluência dos rios Itacaiúnas e Tocantins, o Águia venceu o amazonense Princesa do Solimões. Vitória contundente, com autoridade, sem margem para contestações. Os três a zero do placar confirmam isso. Placar clássico, do tipo daqueles de dar confiança à torcida.

Já em Manaus, capital da antiga Zona Franca, onde se come o melhor tambaqui do Brasil, mas, para não fugir à metáfora fluvial, às margens do rio Negro, o tradicionalíssimo Nacional, dirigido pelo conhecido João Carlos Cavalo, meteu três gols contra um no Humaitá, vice-campeão acreano.

Enquanto isso, em Rio Branco, cidade banhada pelas águas barrentas do rio Acre, que de vez em quando saem do leito, o São Francisco derrotou o roraimense São Raimundo, que era, a julgar pelos últimos resultados, o favorito para sair na frente pelas vagas à próxima fase da competição.

Aí veio o segundo round. A esperança dos que venceram na primeira rodada era continuar triunfando. Iam jogar fora de casa, quando um empate é sempre considerado um bom resultado (ganhar em casa, empatar fora, eis a fórmula mágica). Não foi isso, porém, o que acabou por vir a acontecer.

Tudo, então, se inverteu. O Águia foi a Boa Vista e tomou um pau do São Raimundo. O Trem viajou à Rio Branco e não viu a cor da bola contra o Humaitá. O Nacional foi à Belém e dançou um carimbó diante da Tuna Luso. E o São Francisco ainda está tonto depois da goleada que levou do Princesa.

No próximo final de semana, se continuar nessa pegada, o Nacional vai vencer o Princesa do Solimões; o Águia de Marabá vai levar a melhor sobre o Humaitá; o São Raimundo vai ganhar do Trem; e o São Francisco vai bater a Tuna Luso. Isso, falando por um raciocínio do tipo cartesiano.

O futebol, entretanto, não é (nem nunca foi) regido por raciocínios cartesianos. Se assim fosse, não existiria o instituto da “zebra”. Dependendo da posição dos astros no espaço sideral, por uma razão qualquer, ou por razão nenhuma, os visitantes podem “virar bicho” e jantar os anfitriões. Ou não?

– Maio de 2023 –


Dezoito títulos

Francisco Dandão

Nessa segunda-feira que recém passou, 1º de maio, Dia do Trabalho, o Rio Branco, Estrelão para os íntimos, venceu o Humaitá e conquistou mais um título de campeão acreano de futebol. O décimo oitavo na era do profissionalismo, cuja disputa foi iniciada no já distante ano de 1989.

Trocando em miúdos, das 35 competições disputadas nessa fase da vida do futebol do Acre, o Rio Branco levou pra casa a taça de mais da metade. Ou seja: todos os adversários juntos conquistaram menos títulos do que o clube da Estrela Rubra. Um feito e tanto, pra ninguém botar defeito!

E sempre que o Rio Branco é bem-sucedido numa competição regional, eu lembro das palavras que um dia me foram ditas pelo saudoso desembargador Lourival Marques, que presidiu o clube em várias oportunidades, do final da década de 1960 até a metade da década de 1980.

Nas palavras do doutor Lourival, numa tarde qualquer de um verão do ano de 2002, o Rio Branco reunia condições (organização, estrutura e dinheiro) para montar times capazes de não perder pra ninguém, no Acre, e de fazer frente, “pau a pau”, com qualquer equipe da região Norte do país.

Naturalmente, depois daquela minha conversa com ele, muita coisa mudou. Por conta de várias decisões equivocadas, o Estrelão não exibe mais a saúde financeira de outrora. Vide a sede social, transformada em escombros. Mas, apesar disso, o time ainda reina nos gramados do Acre.

Outra coisa que o já ancião, à época, Lourival Marques me disse foi de que ele era radicalmente contra a importação de treinadores. Segundo ele, embora manifestasse respeito aos profissionais de “outras paragens”, estes já chegariam ao Acre comprometidos com vários empresários de jogadores.

Coincidentemente (ou não), o Rio Branco conquistou o seu décimo oitavo título de campeão acreano de futebol profissional sob a orientação de um treinador da terra. No caso, o meu querido amigo Ulisses Torres, um cruzeirense que ganhou fama tanto como jogador quanto como treinador.

O Ulisses Torres, eu diria sem medo de errar, é um daqueles sujeitos que alia a prática à teoria. Isso porque ele, antes de se formar em educação física, foi um atacante habilidoso, com passagens vitoriosas no Juventus e no próprio Rio Branco, além de incursões por alguns times do futebol carioca.

Da minha parte, embora eu só acompanhe o futebol acreano à distância, levando-se em conta o meu exílio voluntário na Cidade Maravilhosa, penso que o título de campeão acreano de 2023 está nas mãos certas. Afinal, foram oito vitórias em dez partidas jogadas. Incontestável!

– Maio de 2023 –


Breu e cuspe

Francisco Dandão

Um dia desses eu publiquei numa rede social a fotografia da linha atacante do Atlético Clube Juventus, atualmente licenciado dos gramados, em 1970. Na época os times jogavam no esquema 4-2-4. E assim, o ataque da fotografia era formado pelos jogadores Nilson, Nemetala, Nego e Elísio.

Os torcedores mais antigos, que gastavam as suas tardes de domingo nas arquibancadas do vetusto estádio José de Melo, atualmente sem uso para partidas oficiais, sabem o quanto esse ataque juventino era letal para os adversários. Verdadeiro pesadelo para os torcedores das demais equipes.

O Nilson era um ponteiro-direito miudinho, driblador e veloz como poucos. Características semelhantes às do ponta-de-lança (posição que não existe mais nos manuais do futebol) Nemetala, assim como às do ponteiro-esquerdo Elísio. Já o Nego era rompedor, com um canhão no pé esquerdo.

Mas o que eu quero destacar nessa crônica de hoje não é o primeiro plano da fotografia, e sim o que está na parte do fundo. No caso, dois jogadores que batiam bola. Um deles, sem identidade definida, embora eu ache que se trata do atacante reserva Eloizinho. E o outro, o goleiro Pope.

O Pope era um catarinense grandalhão que migrou para o Acre para trabalhar numa serraria (ou seria marcenaria?) que ficava atrás do Colégio dos Padres, na esquina das avenidas Marechal Deodoro e Epaminondas Jácome, por ali pelas imediações do atual point Novo Mercado Velho.

O Pope pegava pra caramba. Como ele era muito grande, a impressão que a gente tinha era a de que a bola sempre era chutada onde ele estava. Um senso de colocação fora do comum. E o mais curioso era que a bola parecia grudar nas mãos dele, seja lá quanto fosse a violência com que era chutada.

Aquela capacidade do Pope de amortecer a bola intrigava todo mundo que ia vê-lo em ação. Como é que aquilo era possível? Os caras largavam o pé na bola e ela parava dócil nas mãos do goleirão. Muitas teses foram criadas para explicar aquele, como se dizia na época, “magnetismo” do Pope.

Até que certo dia o mistério foi desvendado, por um espião de um time adversário (dois personagens são citados como o tal espião: Chico Tarzan, ligado ao Rio Branco, e Nego Jaú, massagista do Atlético). A bola “grudava” no Pope porque ele, antes de cada jogo ou treino, passava breu nas mãos.

Uma técnica que passou a ser adotada por outros goleiros, entre os quais o meu prezado amigo João Petrolitano, atualmente dirigente de Voleibol, cujo modo de amortecer a bola, antes de usar o breu, era cuspir nas mãos. É isso. No tempo em que não existiam luvas, era cuspe ou breu!

– Abril de 2023 –


Dadão, uma saudade

Francisco Dandão

Em 23 de abril próximo completa-se cinco anos desde o dia em que faleceu o cidadão Eduardo Rodrigues da Silva Filho, nascido na data de 18 de julho de 1950. Ele era conhecido nos meios esportivos com o nome de Dadão, sendo tido como o maior jogador do futebol acreano dos anos do amadorismo.

Dadão ainda era um adolescente imberbe quando foi chamado para defender um time adulto, no caso o Rio Branco, no ano de 1966. Jogava tanto que no ano seguinte já estava vestindo a camisa do Juventus, clube que costumava levar para as suas fileiras os melhores jogadores do Acre.

E nessas de ascensão, três anos depois, o então cracaço, vindo ao mundo no bairro do Caxias, nas imediações da Rádio Difusora Acreana, já estava na equipe de juniores do Fluminense do Rio de Janeiro. Pelo Tricolor carioca, ele sagrou-se campeão da Copa São Paulo de Júnior, em 1971.

No Fluminense, ele chegou a figurar no banco de reservas da equipe principal, eventualmente substituindo alguém de um ataque devastador formado por Cafuringa, Flávio, Samarone e Lula. Por um desacerto na hora de assinar contrato, Dadão acabou não se firmando no time das Laranjeiras.

Em 1972, Dadão defendeu dois clubes: o Madureira, do subúrbio carioca, e o Itabaiana, do interior de Sergipe. No Madureira passou rapidamente. Só o tempo de uma excursão. No sergipano Itabaiana disputou um campeonato estadual e virou ídolo, lembrado até os dias de hoje.

Mas aí, como se o destino teimasse em lhe apontar o rumo do Norte do país, ele contraiu uma hepatite no final desse ano de 1972. Resolveu, então, tratar-se em casa. Foi o suficiente para o Juventus repatriá-lo. E ele foi ficando e dando o seu show, até o encerramento da carreira, em 1986.

Como jogava demais, todas as vezes em que acabava uma temporada, ele era procurado pelos outros grandes clubes do Acre, que lhe ofereciam carradas de dinheiro, empregos, automóveis e vantagens para defender as suas cores. E ele, apesar de amar o Juventus, acabava seduzido pelas ofertas.

Dessa forma, Dadão jogou, marcou gols e colecionou triunfos, além do Juventus, com as camisas do Atlético Acreano, do Rio Branco e do Independência. Foi ídolo, por assim dizer, de todas as torcidas do Acre. Os seus parceiros de clube dizem que jogar com ele era uma tranquilidade!

E eu, cujo apelido difere do dele apenas pela letra “n”, devo confessar que contribui para diminuir a sua fama. É que nas peladas dos bairros eu era confundido com ele. E, como eu não jogava nada, acabava decepcionando os espectadores. Ele ria quando eu lhe contava isso. Dadão, uma saudade!

– Abril 2023 –


Meu amigo Cláudio

Francisco Dandão

José Cláudio Mota Porfiro, xapuriense de boa cepa, poeta, cronista, palestrante, doutor, meu prezado amigo de uns bons cinquenta anos, saltou para o abismo da metafísica na semana passada e foi morar no infinito, no topo de alguma constelação, em um lugar qualquer do espaço sideral!

Fiquei chocado quando soube da sua partida. Não que a morte seja algo estranho para quem vive. Mas pelo abrupto, pelo repentino, assim sem mais nem menos. No dia anterior mesmo, ele, que se mostrava bem saudável, havia feito um comentário em uma postagem minha numa rede social.

Eu publicara uma fotografia do Teatro dos Náuas. E ele, que desde a adolescência saía cheio de cadernos e livros do bairro Cadeia Velha, louvando a ideologia socialista, fez o seguinte comentário: “Conheço. Esse teatro também tem a pegada da esquerda. Assim como a ponte e muito mais”.

E fora isso, ele, que estava vivendo em São Paulo, quando soube que eu havia armado a minha barraca no Rio de Janeiro, me prometera uma visita para meados de abril. Na verdade, numa conversa que tivemos no mês de janeiro, ele disse que viria no carnaval. Depois adiou para o dia 18 deste mês.

Disse-me que ficaria no Rio entre 18 e 28 de abril. A ideia era passar o seu aniversário de 66 anos na Cidade Maravilhosa. E me convocou para uma noitada no Bar do Zeca Pagodinho, nas imediações do Aterro do Flamengo. Tudo devidamente combinado, eu estava esperando por ele.

Disse-me que tínhamos muito a conversar. Ele, que costumava me chamar de “Doutor”, “Bacana” ou “Negão”, queria a minha opinião para um livro de memórias que estava escrevendo. Obra que já contava com mais de 300 páginas, mas que, segundo ele, o relato não chegara sequer à metade.

Também planejava, dentro de uns dois anos, atravessar o país para se radicar na Paraíba, ou cruzar o oceano para Portugal. E como ele achava que eu era um cidadão do mundo, tanto de percorrer quanto de morar em muitos lugares, queria que eu falasse dos prós e contras de um sítio e do outro.

Não conversávamos cara a cara há muito tempo, mas sempre trocávamos mensagens pelos aplicativos da internet. Não nos víamos, mas não nos perdíamos de vista. Ele lia as minhas crônicas e eu curtia a sua prosa elegante e os seus versos inspirados nas mais belas e diversas musas.

Meu amigo Cláudio Porfiro, quase no fim do seu caminho terreno, deixou a selva amazônica pelos braços de concreto da “paulicéia desvairada”. E num dia de outono do hemisfério sul se tornou uma lenda. Tinha nas palmas das mãos o destino, mas não pôde mudar a própria sorte!

– Abril de 2023 –


Craques de abril

Francisco Dandão

Ainda chove em muitos lugares do Brasil, apesar de o verão já haver acabado. Mas, como muito bem disse um dia o poeta, e o sol tratou de espalhar em forma de canção, desde um tempo em que se caminhava contra o vento, portando ou não lenço e/ou documento, “na terra é pleno abril”.

Como não quero dar muita moral pra chuva, levando em conta os transtornos que o seu desaguar desenfreado tem causado no Acre, meu estado de origem, vou deixar esse assunto para os meteorologistas. E vou me ater a lembrar o aniversário neste mês de três amigos, ex-craques das quadras.

Falo do ala/fixo Adrian Allen Moreno, nascido em Rio Branco no dia 8 de abril de 1957; do pivô Elpídio Rodrigues do Nascimento Filho, nascido no dia 11 de abril de 1963, também em Rio Branco; e do goleiro Lauro Fontes, nascido no dia 13 de abril de 1956, igualmente na capital acreana.

O Adrian, cujo pai era o treinador Alício Santos, começou a vida esportiva como lateral-esquerdo do time infantil do Juventus, em 1971. Mas não foi muito longe como jogador dos gramados. Rapidamente ele se mudou para o futebol de salão, chamado à época de “esporte da bola pesada”.

Nessa modalidade, Adrian emprestou sua classe a vários times. Casos, só para lembrar alguns, do Benjamin Constant (reunindo garotos da rua do mesmo nome), do Amapá, do Independência, do Juventus, do Banacre e da seleção acreana. E em todos eles o craque conquistou inúmeros troféus.

A história do Elpídio, mais conhecido como Dô, foi parecida. Depois de passar por times infantis/juvenis como o Fluminense do Barbadinho, a Rodoviária do Rivaldo, o Internacional do Juquinha e o Rio Branco do Illimani, ele se achou como artista da bola na velocidade do futebol de salão.

Por ser um artilheiro, Dô mudou de camisa inúmeras vezes. Tantas camisas que no espaço dessa crônica talvez não desse para citar uma a uma. Todo mundo queria o carinha no seu time. E por ter o passe tão disputado, Dô me confidenciou que faturou uma grana alta no exercício da sua arte.

Já o Lauro, remanescente da antiga quadra do Colégio Acreano e de outra que ficava na frente do Palácio Rio Branco, este, no meu entender, foi simplesmente o melhor goleiro de futebol de salão/futsal do Acre em todos os tempos. Eu já disse isso várias vezes, mas não vou cansar de repetir.

O Lauro pegava, como se dizia antigamente, “até rato ensebado”, ou “até pensamento”, em noite de escuridão e tempestade. Só havia um jeito de fazer um gol no Lauro: xingar a mãe dele! Mas essa maneira de vazar o homem só foi descoberta quando ele já estava prestes a pendurar o tênis!

Vida longa aos três!

– Abril de 2023 –


Histórias de ferrolhos

Francisco Dandão

O futebol tem uma infinidade de histórias pitorescas que raramente se tornam do conhecimento público. Ou então, ainda que os torcedores venham a saber delas, com o tempo caem no esquecimento. Vou lembrar aqui neste texto de hoje duas histórias envolvendo a famosa tática do “ferrolho”.

Para os que desconhecem essa terminologia, eu esclareço que “ferrolho” é como se chamava em tempos de outrora um sistema tático que privilegiava as ações defensivas. Um time que se reconhecia inferior a outro, tratava de botar todo mundo na frente da própria área. Ninguém no ataque!

Eu tive a oportunidade, aí pelas décadas de 1970 e 1980, de ver dois times do futebol acreano que usavam esse expediente com frequência, no caso o Floresta e o Andirá. Quando jogavam contra os chamados clubes grandes, o Andirá e o Floresta escalavam um sujeito no gol e dez na defesa.

Um certo dia, quando cheguei ao estádio José de Melo, a partida entre Floresta e Juventus estava em zero a zero, próximo ao fim do primeiro tempo, quando o normal era o Floresta, àquela altura, estar perdendo. Aí, fui perguntar ao treinador do Floresta qual era o segredo para tanta resistência.

O técnico do Floresta era o Jurandi Teles, que havia sido um atacante de bom nível da referida equipe, mas que decidira pendurar as chuteiras umas tantas semanas antes. Explicação do Jurandi: “O segredo é que eu armei um ferrolho do tipo inviolável. Hoje não passa nada pela nossa muralha.”

Veio então o segundo tempo e o Juventus, como de praxe, sapecou uma estrondosa goleada no Floresta. No fim do jogo eu fui perguntar ao Jurandi o que é que havia acontecido. Resposta do dito cujo: “Os atacantes juventinos simplesmente acharam um jeito de arrombar o nosso ferrolho.”

Essa história me fez lembrar de outra, acontecida no futebol amazonense, na década de 1960. O time do Olímpico, dirigido pelo treinador Hélio Lentz, tendo um elenco mais fraco do que os rivais, usava o mesmo expediente do Floresta acreano e, assim, costumava perder de pouco.

De acordo com o falecido historiador esportivo Carlos Zamith, de Manaus, no seu livro Baú Velho, “era difícil o adversário passar pela defesa do Olímpico. Perdia para os melhores times por escores apertados, na base de 1 a 0 ou 2 a 1, tamanha era a marcação cerrada adotada pelos jogadores”.

Um dia, num jogo entre Olímpico e Sul-América, pelo campeonato estadual, este último apresentou um centroavante chamado Martelo, descoberto na várzea. Final do jogo: 2 a 0 para o Sul-América, com gols do Martelo. Manchete do jornal no dia seguinte: “Martelo quebrou o ferrolho”!

– Março de 2023 –


Farra de gols

Francisco Dandão

Chove gols no campeonato acreano de 2023. Nessa época do ano são comuns as chuvas intensas na região amazônica. Chuva mesmo. Água caindo do céu, do tipo torrencial, daquelas de encher os leitos dos rios e transbordar para as ruas e caminhos. Mas chuva de gols, que eu saiba, isso não sei não.

Eu já havia notado as goleadas, mas quem chamou a minha atenção para os números foi o meu afilhado Manoel Façanha, o cara do maior arquivo que se tem notícias sobre o futebol regional. O dito cujo fez as contas e chegou à média de 4,62 gols por partida. Trinta e sete gols em oito jogos.

Para efeito desse cálculo contribuíram sobremaneira as bordoadas desferidas pelo Humaitá sobre o Andirá (6 a 0), pelo Independência sobre a Adesg (4 a 0), pelo Atlético sobre o Vasco (6 a 1), pelo Galvez sobre o Náuas (7 a 2) e pelo São Francisco sobre o Vasco (4 a 1). Foi muita pancada!

Como eu não assisti a nenhum desses jogos, uma vez que no momento presente curto um doce exílio na Cidade Maravilhosa, ainda não sei se os times que golearam estão muito fortes ou se os que perderam estão muito fracos. Ou se as duas possibilidades são reais. Não sei se é isso ou aquilo.

Pra falar a verdade, tudo nessa vida é relativo. Uma hora se pode estar por cima, outra hora por baixo. A roda do destino gira em sentido vertical. O mesmo Humaitá que triturou o Morcego da Cadeia Velha, um dia desses levou um “sapeca iaiá” do Clube do Remo, em Belém, pela Copa Verde.

Da mesma forma, esse São Francisco que fez um furo no casco e afundou a nau do Almirante da Fazendinha, pelo campeonato acreano, não viu a cor da bola na formosa Boa Vista, capital do estado de Roraima, de índios e garimpeiros, contra o São Raimundo, igualmente pela Copa Verde.

De qualquer jeito, de acordo com o pensamento dos meus botões, se o campeonato profissional continuar nesse pique, de tédio é que ninguém vai morrer. Mais fácil os narradores Deise Leite e Zezinho Melo ficarem roucos de tanto gritar gol do que alguma testemunha cochilar nas arquibancadas.

E tem mais: os artilheiros acreanos podem muito bem, seguindo nessa linha, se tornarem experts no desenho de mapas que conduzam atacantes de outras paragens pelos labirínticos e tortuosos caminhos que costumam chegar às traves adversárias. Podem até ficar milionários se assim fizerem!

Por ora é isso. Preciso acabar logo com essa conversa mole. Tenho outro compromisso urgente para cumprir neste fim de semana. Ganhei um estojo cheio de joias de um príncipe árabe e tenho que providenciar a liberação na Receita. Se eu não conseguir, fujo para a Flórida. Ora se fujo!

– Março de 2023 –


Outra minientrevista

Francisco Dandão

Meu prezado amigo Antônio Martins, vulgo Toinho Bil, me telefonou protestando, querendo saber os motivos pelos quais o Saraiva, lateral-direito do Americano da Cadeia Velha, na década de 1970, ganhou o direito de ser entrevistado por mim, e ele (Toinho) até hoje não teve essa primazia.

Então, como eu sou um sujeito sensível, não me fiz de rogado e mandei, via e-mail, perguntas para o Bil, as quais ele prontamente respondeu. Ele escreve fácil e as suas respostas dariam um livro grosso. Mas, como eu não tenho muito espaço, transcrevo abaixo um resumo das palavras dele.

Pergunta: Como foi a sua iniciação no futebol?

Toinho Bil: Eu comecei “furando” o jogo, no estádio José de Melo, por um buraco que tinha no muro, no bairro da Capoeira. Depois disso, eu subi de posto e passei a entrar pelo portão, carregando as chuteiras do Ademir Sena.

Pergunta: Mas contato com a bola mesmo, quando se deu isso?

Toinho Bil: Eu batia pelada num campinho atrás do Hospital lnfantil. Tinha uns jogadores importados pelo Rio Branco, o Padreco, o Fernandinho, o Vale, o Peroaba, o Adauto, que moravam por perto e todos os dias marcavam ponto no campinho. Eu me enturmei com eles e ficava batendo bola. Cansei de dar xagão no Fernandinho e banho de cuia no Padreco.

Pergunta: E depois, quando você foi jogar num time federado?

Toinho Bil: Um olheiro, que eu não lembro o nome, me levou para o juvenil do Juventus, logo depois de eu completar 17 anos. O treinador era o Júlio D’Anzicourt que me aprovou para jogar na lateral-esquerda.

Pergunta: Quem era o titular dos juvenis do Juventus na sua posição?

Toinho: Era o Cara Rachada. Cheguei e tomei o lugar dele. O Cara Rachada precisou ser deslocado para o lado direito. Ou ia ou não jogava.

Pergunta: Quais eram as suas características?

Toinho Bil: Eu gostava de jogar apoiando o ataque, estilo Antônio Maria. Dizem que eu jogava tanto quanto ele, que era considerado o melhor lateral-esquerdo do futebol acreano na época.

Pergunta: E por que você não subiu para o time principal?

Toinho: Eu cheguei a ficar na reserva algumas vezes. A questão é que eu me desgostei porque um dia, jogando pelo juvenil, contra o Atlético,

marquei um gol, cabeceando de peixinho, depois de um cruzamento do Paulinho. Mas o juiz Porco Russo anulou, alegando que eu estava impedido.

Pergunta: Você jogou a carreira fora só por causa de um gol anulado?

Toinho Bil: Você acha pouco? Eu não marcava um gol há cinco anos, nem na pelada do Hospital Infantil, aí quando eu marquei veio um cara e anulou. Fiquei puto mesmo. Cheguei em casa, fiz uma fogueira, queimei as chuteiras e fui ser funcionário público. Azar do futebol!

– Março de 2023 –


Pífios resultados

Francisco Dandão

Acabou mais uma Copa Verde para os times do Acre. E acabou de forma, digamos, pouco honrosa. O Humaitá foi a Belém e sucumbiu (eu ia dizer “caiu de quatro”, mas depois desisti) para o Clube do Remo por 4 a 1. E o São Francisco levou um pau de 6 a 0 do roraimense São Raimundo.

Um time acreano perder do Clube do Remo, lá na capital das mangueiras, até que não é um resultado assim tão estranho, levando-se em conta vários fatores, entre os quais a diferença de folha salarial (a dos paraenses é muito maior) e o alçapão em que se transforma o estádio deles.

Eu já assisti vários jogos do Remo no Baenão (apelido do estádio dos caras) e posso dizer de cátedra que se os jogadores adversários não usarem tampões nos ouvidos correm o risco de sair da praça esportiva completamente fora de sintonia, chamando “urubu de meu lourinho”.

Outra coisa: se os jogadores de um time visitante caírem na besteira de jantar açaí com peixe e farinha d’água, antes da partida, aí não terão nenhuma chance de resistir à avalanche azul que se abaterá sobre as suas cabeças. Sem contar a chuva que, às vezes, cai bem na hora do confronto.

É claro que eles são favoritos naturais. Mas a gente (eu, no caso) sempre espera que algum tipo de milagre aconteça. E se não aconteça um milagre, pelo menos que o jogo seja disputado em cada palmo do campo, duro, pau a pau, o que não parece ser quando sobrevém esse tipo de lapada.

Mas tudo isso seriam abobrinhas de um cronista sem muito o que dizer numa sexta-feira à noite (momento em que este texto é cometido), quando o apelo para tomar um chope é mais do que imperioso, se não fosse o outro jogo pelo mesmo torneio. O jogo do vice-campeão acreano São Francisco.

Pior do que o desempenho do Humaitá, em Belém, foi a humilhação sofrida pelo denominado “Clube Católico”, em Boa Vista. Ou existiria outro adjetivo que não seja esse (“humilhação”) para denominar o que o São Raimundo fez com o time acreano? Digam vocês aí: existe outro adjetivo?

Eu não lembro de outra surra tão escandalosa que um time do Acre, em qualquer tempo, tenha levado de uma equipe de Roraima. Ao contrário: em tempos idos (saudosos tempos), jogar contra Roraima significava três pontos (ou mesmo dois) contabilizados por antecipação para o lado acreano.

Por me chamar Francisco, eu sempre pensei que o santo de cujo nome meus pais se inspiraram para me batizar sairia vencedor numa batalha com outra criatura de auréola branca em volta da cabeça. Ledo engano da minha parte. Tomara venham dias melhores por aí. Fica toda a minha torcida!

– Março de 2023 –


Sururu na Floresta

Francisco Dandão

Nesse período de carnaval, como há muito tempo eu deixei de cair na esbórnia, andei botando a leitura em dia. E assim, por isso ou por aquilo, me deleitei com a leitura de um cronista clássico da literatura esportiva brasileira. Justamente o pernambucano Mário Filho, falecido em 1966.

Mário Filho, até hoje tido como o maior cronista esportivo do Brasil em todos os tempos (e olhe que teve muita gente pra lá de boa), imagino que todo mundo sabe (mas não custa lembrar), era irmão do não menos famoso Nelson Rodrigues. Tão importante o Mário que deu o nome ao Maracanã.

Pois foi lendo Mário Filho, numa crônica publicada para a extinta revista O Globo Sportivo, em 1945, que eu fiquei sabendo da criação do “sururu” no futebol nacional. De acordo com o cronista, “o sururu foi uma instituição, senão respeitável, pelo menos respeitada no futebol brasileiro”.

Houve um tempo, segundo o relato do Mário Filho, “em que a cerimônia do sururu era considerada quase obrigatória, um complemento do match. Qualquer coisinha arrastava o público para dentro do campo. Para dar no árbitro. Para tomar as dores de um jogador agredido por outro”.

Havia sururu de todas as formas e em vários lugares, relatou o célebre cronista. Em alguns momentos, nessa situação de invasão do campo, a manifestação, via de regra, era da torcida do time derrotado, inconformada com as decisões de Sua Senhoria, o juiz do espetáculo recém findo.

Mas havia também o sururu de um canto da arquibancada, às vezes até entre torcedores da mesma agremiação, às vezes pela provocação de um torcedor “inimigo”. O pau comia solto e era frequente o caso de os brigões irem parar em alguma unidade hospitalar, para lamber as respectivas feridas.

E havia o sururu no meio da rua. Esse era o pior deles. Dava um trabalho danado à força militar e os sujeitos de ânimos mais exaltados iam parar numa delegacia de polícia, prestar as devidas explicações ao delegado de plantão. Depois todo mundo ia pra casa, esperar o domingo seguinte.

Como a selvageria não podia continuar indefinidamente, as autoridades, tanto esportivas quanto policiais, foram tomando medidas para findar os conflitos. E então, com o passar do tempo, as diferenças entre os torcedores passaram, via de regra, a ser manifestadas só “no grito” mesmo.

Eu li a crônica do Mário Filho e não pude deixar de lembrar que na década de 1970, em Rio Branco, o desportista Martim Bruzugu, pai do Tião Catega, por aquela época dirigente do clube Floresta, criou o Sururu na Floresta. A diferença é que enquanto no Rio era porrada, no Acre era festa!

– Fevereiro de 2023 –


Minientrevista

Francisco Dandão

Um dia desses eu fui repreendido pelo meu amigo Francisco Saraiva por não ter acompanhado a carreira dele enquanto “promessa” de craque, no tempo em que ele era adolescente, lá pelo início da década de 1970, quando ele era titularíssimo da lateral direita do Americano da Cadeia Velha.

Aí, para diminuir esse lapso na minha biografia de escrevinhador e “maníaco das imagens”, via registro fotográfico, resolvi fazer uma entrevista com o citado personagem, cujo resumo vai nas linhas abaixo.

Eu – Conte aí como foi a sua iniciação no futebol.

Saraiva – Eu fui visto numa pelada na beira do rio. A bola era uma melancia. Aí, como eu atravessa o campo dando pancadinhas, o Bugi, que já tinha uma camisa cativa no Americano, me chamou para fazer um teste.

Eu – Como foi o teste?

Saraiva – Rapaz, quando eu peguei uma bola de balata no lugar da melancia foi a maior moleza. Eu tinha uma “bicuda” potente. Eu pegava na bola e metia o tuba. Meu negócio era mandar a bola na fogueira. Só lançamento.

Eu – Fale das suas características.

Saraiva – Eu sempre fui um lateral viril. Comigo, pontinha metido a habilidoso, do tipo que queria fazer graça, não tinha vez. Se a bola passasse, eu dava no meio do gaiato. Só depois é que eu pedia pra ver os documentos.

Eu – Onde é que o Americano costumava jogar?

Saraiva – Havia um campinho no fim da Cadeia Velha, perto do areal do Elói Abud, que a gente usava como alçapão. Ali nós jamais perdemos um jogo.

Eu – E os torneios nas colônias?

Saraiva – Ah, isso aí era show. A gente viajava de batelão, primeira classe, tinha até lugar para armar a rede. E quando chegávamos ao local do jogo, tinha sempre uma charanga nos esperando. Depois do jogo, era cair de boca nas fritadas de mandi, panelada e muita cachaça. Uma alegria!

Eu – E você nunca foi convidado para entrar num time federado?

Saraiva – Sim, fui sim. Fui convidado para jogar no Vasco, o Almirante da Fazendinha. Aí foi o fim de tudo. É que o campo do Vasco ficava perto do boteco do Mané com Sono. E aí, a gente depois dos treinos

corria para enxugar umas geladas. Então, já viu, não tinha preparo físico que aguentasse o rojão. Eu poderia dizer que a minha bola perdeu para a cerveja.

Ainda conversamos muito mais. Ainda perguntei muita coisa e ele respondeu tudinho. Infelizmente, não tenho mais espaço para reproduzir o teor completo do diálogo. Se a minha preguiça deixar, outro dia eu continuo.

– Fevereiro de 2023 –


Povo do lugar

Francisco Dandão

O tempo veloz e a sucessão dos fatos cotidianos não permitem que nos lembremos constantemente de todo mundo que fez parte da nossa vida. E então, de vez em quando, a partir da fala de alguém, nos damos conta de determinadas figuras que estavam escondidas no fundo da nossa memória.

Foi o que aconteceu comigo quando eu estava lendo, em dezembro do ano passado, o mais novo livro do advogado, doutor (com doutorado, viu?), flautista, poeta, escritor, memorialista, rebelde com causa (e mais um tanto de coisas que não comportariam num mero parágrafo), João José Veras.

Foi lendo as magníficas páginas desse livro do João Veras que eu lembrei de três figuras do bairro da Capoeira (onde o João e eu passamos boa parte da nossa adolescência) que eram personagens de uma pelada de todas as tardes, fizesse chuva ou sol, nos fundos do vetusto Estádio José de Melo.

Falo do goleiro Paulo Coceira, que na descrição do João fazia halterofilismo “só para a parte torácica e não para as pernas – ficou grosso em cima, fino em baixo”; o ponteiro Zé da Porca, cujo apelido o querido autor não justificou; e o coringa Pirra, que sofria de TOC, segundo o João.

O Paulo Coceira era um dos primeiros a ser escolhido no par ou ímpar que escalava os bandos que se enfrentariam na pelada. Não que ele fosse um primor de jogador. Mas pelo fato de que ele, não tendo nenhuma aptidão para chutar uma bola, já chegava ao campo vestido com uma camisa de goleiro.

O outro goleiro de posição cativa se chamava Capelão, apelido do bancário aposentado e ex-árbitro de futebol Antônio Moreira, coincidentemente, como o Coceira, morador da Travessa Maria Amélia (eu morava na Travessa Felisbela do Nascimento, mais à frente no bairro).

Ser goleiro na pelada era um fator que dava às criaturas o privilégio de jogar o tempo todo. Nunca ficavam “na cerca”. Isso porque os goleiros de verdade, aqueles que defendiam times “federados”, casos do Tranca Rua (do Floresta) e do Pituba (do Andirá), estes só queriam saber de jogar “na linha”.

O Tranca Rua, cujo nome de batismo era Moacir Conde, queria mais era ser atacante. E ele até que, apesar de não ser nenhum virtuose, tinha alguma técnica e fazia os seus golzinhos (a maioria “na banheira”). E o Pituba, apesar de ser destro, gostava de ocupar o posto de lateral-esquerdo.

O livro do João é um poço de recordações e nostalgias para quem viveu no bairro da Capoeira na década de 1970. Qualquer dia eu fujo das páginas e conto mais histórias (ou “Istórias”, como o João chama a sua trama) “do povo do lugar”. E falo mais sobre o Zé da Porca e o Pirra!

– Janeiro de 2023 –


Futebol e eleição

Francisco Dandão

Eu tenho muitos anos de janela no futebol acreano, seja como espectador, seja como jornalista, seja como torcedor. Do final da década de 1960 até hoje (com algumas interrupções, por conta da minha mania de não parar muito tempo num mesmo lugar) acompanhei o trabalho de muita gente.

E assim, posso nominar grandes dirigentes desse esporte no espaço geográfico do Acre. Gente que despendia as suas energias, o seu tempo (às vezes negligenciando suas funções em órgãos públicos ou atividades profissionais) e tirava até dinheiro do bolso pelos seus times do coração.

Pelo lado do Atlético, lembro enquanto escrevo das figuras de Adauto Frota, Rivaldo Patriota e do casal Fernando e Flora Diógenes. O primeiro foi pioneiro na importação de jogadores para o Galo. O segundo continuou o trabalho de Adauto. E o casal citado fez de tudo um tanto pelo clube.

Falando do Juventus, cuja política maior era congregar um grupo de pessoas de extrema dedicação à causa (casos de Rivaldo Guimarães, Joaquim Cruz, Dona Iolanda, Humberto Antão, Aníbal Tinoco etc.), penso que o nome mais expressivo foi o do professor Elias Mansour Simão Filho.

No que diz respeito ao Independência, a glória tricolor não seria possível sem o trabalho e a força de vontade de Darci Pastor, Adalberto Aragão, Orlando Sabino, Macapá, Eugênio Mansour (esse exercendo uma inconveniente dissidência familiar), Osmar Valente, Valdir Silva…

Enquanto isso, o Rio Branco jamais teria conquistado tantos títulos se não fosse a dedicação de pessoas do porte de Lourival Marques, Edmir Gadelha, José Macedo, Wilson Barbosa, Illimani Suares, Sebastião Alencar, Natal Xavier, Campos Pereira, Adonai Santos, Ferraz, Barrinho…

Falei nos clubes considerados grandes, mas há muitos que merecem citação nos times denominados pequenos. Casos de Vicente Barata (São Francisco), professor Antônio Gadelha e tenente Deca (Internacional), Almada Brito (Vasco), Zé Américo (Andirá), Martim Bruzugu (Floresta)…

Mas embora todas essas criaturas tenham sido de suma importância para o esporte do Acre, nenhuma delas, por variadas razões, fez mais pelo futebol acreano do que o atual presidente da federação e vice-presidente da confederação, advogado Antônio Aquino Lopes, o popular Toniquim.

Nesse sentido, eu devo lembrar que foi do Toniquim a iniciativa de construir um estádio decente. E foi ele também que deu o salto do regime amador para o profissional, sem o qual o futebol acreano não mais existiria. Que na próxima eleição ninguém se deixe iludir pelos alienígenas!

– Janeiro de 2023 –


Santo soldado

Francisco Dandão

Reza a lenda que São Sebastião era capitão do exército romano quando o imperador lá da época, que eu não tenho certeza se era um certo Diocleciano ou um tal de Maximiano, descobriu que ele professava a fé cristã. Foi o suficiente para um dos dois citados condenar o sujeito à morte.

Ainda segundo a lenda, o capitão deveria ser amarrado a um poste e flechado até morrer. Por alguma razão que não está nos relatos, embora tenha sido dado como morto, depois de “virar tábua de pirulito”, o bom soldado não morreu. Foi tratado por alguém e voltou a se apresentar à corporação.

Aí não teve jeito. Em vez de compreender que Sebastião havia escapado da morte por uma intervenção divina, o imperador determinou que ele deveria ser espancado até que sua alma deixasse o corpo. E assim foi feito. O cara morreu pela fé. E então, como é praxe, o martírio o tornou santo.

Com o tempo, como já existia um santo padroeiro dos soldados (São Jorge, no caso), a Sebastião foi designado ser padroeiro das epidemias, pestes, guerras, tempestades e doenças contra os animais. Padroeiro, no caso, antes que alguém pergunte, para interceder pelos que sofrem desses males.

Com toda essa fama, São Sebastião virou também padroeiro de várias cidades no planeta. Eu me lembro de quatro, enquanto cometo estas mal traçadas: Epitaciolândia, Marechal Thaumaturgo e Xapuri, no meu estado de origem, e Rio de Janeiro, onde eu amarro o meu burro nos dias correntes.

Cada uma dessas localidades tem as suas razões para eleger Sebastião como o seu padroeiro. Falando do Rio de Janeiro, conta-se nas crônicas que o dito cujo foi visto de espada nas mãos, lutando ao lado dos portugueses, contra os franceses, pelo controle da cidade, lá pelos idos do século XVI.

Então, por conta de tudo isso, no dia 20 de janeiro é feriado aqui na Cidade Maravilhosa. Um motivo a mais (ou uma boa desculpa, se é que isso é preciso) pro povo daqui tomar bons litros de chope e curtir uma das maravilhosas praias que margeiam o lugar por quilômetros a perder de vista.

Eu pretendia ir ao futebol nesse feriado. Mas, quando procurei um jogo do campeonato carioca marcado para esta data, não encontrei nada. Teve jogo no dia 19 (Volta Redonda 1 x 2 Botafogo e Audax 1 x 1 Vasco da Gama) e tem jogo no dia 21. Mas no dia 20, necas. Só mesmo chopinho e praia.

Assim, por força das circunstâncias, eu fui parar nas areias do Posto 3, em Copacabana, a três quadras da Barata Ribeiro, rua que me abriga nesta minha temporada carioca. É verdade que o sol ficou meio escondido entre nuvens baixas. Mas nada que diminuísse o meu prazer. Tudo nos conformes!

– Janeiro de 2023 –


Rolê pela República

Francisco Dandão

Aproveitei a primeira semana do ano para dar um rolê pela República Dominicana, na antiga Ilha Hispaniola, onde numa tarde de outubro de 1492 o navegador italiano Cristovão Colombo aportou as suas caravelas. Apesar de entender que chegara às Índias, Colombo descobrira a América.

Viagem longa (nove horas de voo), mas de fácil logística. Embarquei no começo de madrugada de segunda-feira, num avião da Copa Airlines, no Rio de Janeiro, e no começo da tarde, depois de uma conexão na Cidade do Panamá, já estava desembarcando na parte ocidental da Ilha Hispaniola.

Santo Domingo, a capital da República Dominicana, é uma cidade linda, extremamente aprazível para todos aqueles que gostam (como é o meu caso) de colocar os pés, simultaneamente, em dois tempos: o passado, pelos seus monumentos, e o presente, representado pelas novas edificações.

No palácio de Diogo Colombo (Diego Colón, em espanhol), filho de Cristóvão, situado na Praça da Espanha, tudo se mantém conservado como nos primeiros anos do Século XVI. Mergulha-se no passado ao percorrer-se os aposentos e respira-se aquela época de descobrimentos e navegações.

Caminhando-se no sentido oposto ao palácio, que se denomina “Alcácer”, chega-se à Rua das Damas, a mais antiga da cidade, onde predominam construções centenárias, inclusive um local onde a “santa madre igreja” instalou um daqueles seus repulsivos tribunais de inquisição.

No “malecón”, que se estende por vários quilômetros em volta da cidade, enquanto isso, fruto da administração do ditador Rafael Trujillo, que se manteve no poder por mais de trinta anos ao custo de um banho de sangue no país, a cidade moderna se debruça sobre um mar de águas turquesas.

Contemplar o sol se pondo a partir do malecón é um desses raros espetáculos que a natureza proporciona. Nos seis dias que eu passei por lá, vi e revi essa cena. E todos as vezes que a revi, apesar de ser o mesmo sol, o mesmo mar e o mesmo calçadão, parecia sempre que era tudo diferente.

Andei tudo o que podia em Santo Domingo. Mas ainda tive tempo de explorar, ainda que rapidamente, os arredores, com esticadas às praias de Boca Chica e Punta Cana. Boca Chica fica logo depois do aeroporto. Cerca de 50 Km de onde eu estava. Já para Punta Cana, eu precisei ir ao interior.

O futebol de lá? Sim, eles até jogam. Mas no que eles mais se ligam mesmo é no beisebol. Nunca vi povo tão fanático por esse esporte. São horas e horas de jogos e resenhas nos programas de televisão. Tudo muito esquisito para o olhar de um brasileiro, aqueles caras jogando com um pau nas mãos!

– Janeiro de 2023 –


Haja leitura!

Francisco Dandão

Eu já fui um leitor compulsivo, daqueles de ler vários livros ao mesmo tempo (e sem confundir os relatos, viu?). Mas isso foi num outro tempo. Agora leio muito menos, provavelmente por conta dos muitos atrativos visuais que aparecem a cada dobra do caminho. Provavelmente, por isso!

Mas, ainda assim, apesar de ler menos do que antigamente, não abro mão de gastar minhas retinas com as páginas dos livros que me caem às mãos, seja por busca própria, entrando nas hoje escassas livrarias ou garimpando na internet, seja pelas doações dos vários amigos generosos.

Nessa categoria da busca própria, adquiri e li em novembro duas obras imprescindíveis da literatura esportiva brasileira: “Os subterrâneos do futebol”, do falecido cronista esportivo e técnico gaúcho João Saldanha; e “Dossiê 50”, do também falecido jornalista pernambucano Geneton Moraes.

Puxando para o lado do pitoresco, João Saldanha conta historinhas hilárias sobre as excursões do Botafogo quando ele era o treinador, na segunda metade da década de 1950. Historinhas, como não poderia deixar de ser, cujo grande protagonista era o ponteiro direito Mané Garrincha.

De acordo com Saldanha, Garrincha era um sujeito absolutamente impossível de se marcar, inclusive fora do campo. Não tinha concentração ou regra que segurasse o homem. Quando ele (Garrincha) resolvia namorar, sempre dava um jeito de fugir do hotel onde se hospedava a delegação.

No caso do livro “Dossiê 50”, Geneton Moraes entrevistou todos os jogadores e o técnico da seleção brasileira da Copa de 1950, aquela que nós perdemos para os uruguaios no Maracanã. Geneton gravou os depoimentos doloridos daquelas criaturas que não conseguiram fazer o dever de casa.

Para culminar, Geneton Moraes foi a Montevidéu conhecer o pensamento do ponteiro Alcides Edgardo Ghiggia Pereyra, o carrasco que fez um gol “impossível” no goleiro Barbosa, chutando sem ângulo uma bola entre o corpo deste e o poste esquerdo da trave brasileira. Um absurdo!

Já na categoria “doações dos amigos”, tenho dedicado esses últimos dias de 2022 para devorar três belas obras das mais encantadoras poesias: “Universos cotidianos”, do mineiro Victor Kingma; “Verticais”, da cearense Samila Soares; e “Istória do povo do lugar”, do acreano João Veras.

Sabe aqueles livros que a gente lê bem devagar e volta para ler de novo? Os três são assim. “É muito cedo pra achar que já é tarde demais”, diz Kingma. “Que as nossas verdades não sejam absolutas, mas sim constantes”, fala a Samila. Enquanto o João decide “Partir do Acre pelo ônibus circular.”

– Dezembro de 2022 –


Ladino amigo

Francisco Dandão

Tenho um amigo que se julga ladino, capaz de fazer uma corda grossa com meia-dúzia de pingos d’água. Amigo de longas datas, cujo nome não posso revelar por não ter autorização do dito cujo. Amigo esse que foi ao Catar e que saiu daqui garantindo que o Brasil ia ser feliz por aquelas bandas.

Me lembro que quando eu lhe dizia que trazer o “caneco” não ia ser fácil, apesar dos ótimos jogadores que dispúnhamos, ele respondia com ar enigmático que tudo ficaria muito simples com a presença dele por lá e que a mandinga que ele faria era garantia de mais um título aqui pra nós.

Como todos sabemos, infelizmente o nosso time ficou pelo caminho após uma malfadada disputa de pênaltis. E então, logo depois da desclassificação eu não pude deixar de pensar no que poderia ter dado errado nas artes do meu amigo e que lance do destino o teria atrapalhado.

Pois ontem ele chegou da sua malsucedida empreitada e veio me encontrar com acentuados sintomas de depressão, sinais de noites insones e pra lá de macambúzio. Mas antes que eu sequer abrisse a boca para questioná-lo, ele foi logo dizendo que iria me contar tudo, tintim por tintim.

De acordo com a narrativa dele, o que faltou para que o “serviço” que ele iria realizar desse certo foram os ingredientes. “Sabe como é, professor, sem dispor das coisas certas não se pode conjurar as forças ocultas para trabalharem na realização dos nossos objetivos. Sem isso, nada feito.”

Mediante a minha indagação de quais ingredientes teriam faltado, ele desfiou uma lista enorme. Mas disse que quase tudo poderia ser substituído por produtos similares (genéricos) locais. Tudo, menos um gato vermelho e dois quilos de farinha de boa mandioca oriunda da floresta amazônica.

“Veja bem, professor. O gato tinha que ser vermelho. Primeiro porque gatos pretos não se usam mais nos rituais esotéricos, sob pena de se infringir as normas do politicamente correto. E segundo, porque vermelho é a cor predominante na camisa croata. Sumiram com os gatos vermelhos todos.”

“E quanto à farinha”, continuou ele, “só servia a da mandioca amazônica. Coisa que eu não sei explicar, mas que eu só fiquei sabendo depois que a farofa ficou pronta. Revelação que eu tive depois de tropeçar na perna de pau de uma mesa quebrada e a panela com a farofa cair no chão”.

“Por último”, concluiu o meu amigo, agora já não mais tão ladino quanto ele se julgava ao viajar, “se tudo tivesse dado certo, no caso o gato vermelho e a farinha de mandioca amazônica, teria faltado uma esquina para depositar o trabalho. É que em Doha não existem esquinas, professor”. Putz!

– Dezembro de 2022 –


Fim de fase

Francisco Dandão

Terminou a fase de grupos da Copa do Mundo do Catar. A metade dos times arrumou as malas e voltou pra casa. Entre as eliminadas, pelo menos, no meu entender, quatro surpresas: Uruguai, Sérvia, Bélgica e Alemanha. Esperava-se, de modo geral, muito mais de todas essas seleções citadas.

Do Uruguai esperava-se mais por conta de dois fatores. Primeiro, pela demonstração de garra e vontade de vencer que sempre tomam conta da Celeste Olímpica, no passado duas vezes campeã mundial (1930 e 1950). E segundo pelos jogadores renomados que vestem a camisa do país.

Da Sérvia, embora a seleção jamais tenha conseguido um título expressivo, existe normalmente muita expectativa em torno dela, uma vez que os caras de lá são famosos por exibirem um futebol que une dois ingredientes: aplicação tática e talento, dada as suas habilidades individuais.

E a Bélgica, hein, com uma marra do tamanho do planeta, principalmente pela eliminação que impôs ao Brasil na Copa da Rússia, que decepção! A desclassificação da seleção belga foi tão inusitada que um jogador deles, ao final, saiu socando o acrílico do banco de reservas. Putz!

Quanto a Alemanha, é a segunda vez que os compatriotas de Ludwig van Beethoven, Wilhelm Richard Wagner, Franz Anton Beckenbauer, Gerd Müller, Sepp Maier e outros, inclusive um tanto que não convém citar, vão para o espaço mais cedo numa Copa do Mundo. Duas vezes seguidas!

Aliás, falando de Alemanha, o que se diz nos círculos dos entendidos é que a seleção deles vai passar 70 anos apanhando em Copas, por conta daqueles 7 a 1 aplicados no Brasil em 2014. Seria, no caso, um castigo dos deuses do esporte, convocados numa convenção de feiticeiros brasileiros.

Faz tempo que eu escuto conversas sobre essa tal convenção. Em princípio, como eu sou um homem que não crê em bruxas (embora tenha certeza que elas existem), é claro que não levei a sério. Mas agora, depois de duas Copas que os caras levam ferro, já começo a ter algumas dúvidas.

Por outro lado (acabei de inventar essa expressão, viu?), algumas surpresas com as cores de zebras grandes e gordas pintaram nessa primeira fase que recém acabou. Quem, em sã consciência, apostaria que Japão e Marrocos liderariam seus grupos rumo às oitavas-de-final? Quem?

Mas então é isso. Agora, como dizem os filósofos, o bicho vai pegar. Não existe mais espaço pra vacilo. Concentração total, que a vida, tal e qual o futebol, é pra valer. Eu continuo acreditando no Brasil. No meu entender, nós temos grandes chances de levantar esse caneco. “Yes, we can!”

– Dezembro de 2022 –


Agora é pra valer

Francisco Dandão

Sim, agora é pra valer, do vera mesmo. A Copa do Mundo de 2022 começa neste domingo e quem for podre que se arrebente. Não há espaço para vacilo. Ao menor escorregão, a vaca pode ir parar no brejo. A bola tem que ser disputada com a volúpia dos famintos quando avistam comida.

Do primeiro ao último minuto de cada jogo, a concentração tem que ser total. Arrumar o cabelo ou se deliciar com a própria imagem refletida num telão, nem pensar. Quem se distrair dentro do campo de jogo pode ter a carteira batida. E depois, por conta disso, arriscar a volta pra casa mais cedo.

Alguns azarões, é certo, já se satisfazem só de estar entre as 32 seleções que viajaram ao Catar, depois de eliminarem as suas concorrentes, nos confrontos regionalizados dos anos que precederam a festa. Mas outras, em bom número até, a estas o que interessa mesmo é o troféu de campeã.

Por razões óbvias, eu coloco o Brasil entre os maiores favoritos. Ser favorito não significa, é claro, chegar em primeiro. Mas esse Brasil nosso desta Copa tem uma artilharia tão pesada que faz tremer até os adversários mais categorizados. Eu é que não queria estar na pele dos zagueiros deles.

De qualquer forma, é melhor ir vendo como as coisas se comportam jogo a jogo. Inclusive porque não é prudente contar com um ovo que ainda não saiu pela cloaca da galinha. Afinal de contas, se o local da postura não for adequado, esse ovo pode se quebrar de encontro a alguma superfície.

Menos mal que com o advento da tecnologia, agora são mais remotas as possibilidades de alguém fazer algum gol em impedimento. Ou com um toque de mão, como aquele que o falecido argentino Diego Maradona fez contra a Inglaterra, na Copa de 1986. La mano de Diós não marca mais gols!

Também, graças a essa tecnologia, não existe mais a possibilidade de os senhores árbitros deixarem passar penalidades máximas. Ou então, de validarem gols cuja bola não ultrapasse totalmente a linha fatal. Erros grosseiros, em benefício de uns e prejuízo de outros, não mais existirão.

Confesso que estou ansioso para o rolar da bola nesta Copa. E já estou procurando tudo quanto é “bolão” para fazer a minha fezinha. Sim, eu sou do tempo do “bolão”, feito numa folha de papel almaço, com os apostadores cravando o seu palpite. Essas apostas em sites não fazem a minha cabeça.

Para o jogo inaugural, por exemplo, entre Catar e Equador, se eu achar um desses “bolões”, vou apostar nos anfitriões. Vou cravar 2 a 1 para os catarianos. Os donos da casa, embora as suas chances de levantar o “caneco” sejam remotíssimas, não merecem sair perdendo logo de cara. É isso aí!

– Novembro de 2022 –


Mais uma Copa

Francisco Dandão

Dentro de mais alguns dias, uns poucos dias, começa outra Copa do Mundo de Futebol. Desta vez, trata-se da vigésima segunda edição do torneio. Aliás, muito mais do que um torneio, a Copa do Mundo é um evento planetário que monopoliza as atenções de gregos, troianos e soteropolitanos.

Algumas pessoas não ligam muito para futebol. Tem, inclusive, quem abomine a ideia de ver vinte e duas criaturas correndo atrás de uma bola, com o intuito de fazê-la ultrapassar aquelas balizas (ou traves, como queiram) e beijar as redes que as adornam como se fossem véus de noivas.

Mas até essas pessoas que não gostam muito (ou quase nada, ou nada) de futebol costumam se tocar quando o assunto é Copa do Mundo. Se não for pela bola e pelos movimentos dos milionários artistas que a tratam com paixão, se deliciam com o espetáculo que ocorre fora dos estádios de jogo.

No meu caso, eu sou tão fissurado numa Copa do Mundo que sequer saberia dizer, assim de súbito, qual a edição da competição que eu elegeria como a minha preferida. Passei por várias emoções, da profunda tristeza, no caso das derrotas, ao estado de exacerbada euforia, nas gloriosas conquistas.

O meu primeiro rito de espanto com uma Copa se deu em 1962, no bi do Brasil. Não que eu entendesse o que estava acontecendo. Pelo contrário, foi exatamente por não entender nada, no clamor dos meus cinco anos de vida, que eu fiquei atônito com o júbilo que tomou conta da população.

Eu morava no interior do Acre, em Brasiléia, na fronteira com a Bolívia. E até então eu não havia visto tanta gente bêbada pela rua. Inclusive uns caras que falavam uma língua estranha, enroladinha, gritando “maricons” e “carajos”, além de um tal “salud por la amistad”. Patrícios!

Depois disso, aí já em plena consciência, em 1966, sobreveio uma grande decepção: aquela frustrada participação do Brasil no torneio da Inglaterra, quando os portugueses desceram o porrete no rei Pelé. Eu pensei em abandonar a minha paixão, mas, ao contrário, ela fez foi se fortalecer.

Como não há mal que dure para sempre, depois da turbulência inglesa o Brasil conquistou três outros títulos (1970, 1994 e 2002). Conquistou esses outros três, mas bem que poderia ter sido pelo menos mais dois (1982 e 1998). Coisas dos desígnios insondáveis dos deuses esses dois insucessos!

Enfim, pesando-se tudo na balança do destino, eis que o Brasil ganha nova chance de fazer o mundo se dobrar ante a exuberância do seu futebol. Eu acredito! Tanto acredito que até já comprei a minha passagem para Brasiléia, onde tudo começou. Vou pra comemorar e lembrar a primeira vez!

– Novembro de 2022 –


Caminhos e descaminhos

Francisco Dandão

Caminho por Copacabana por estes tempos. Depois de umas semanas na Barra da Tijuca e outras tantas no Catete, escolhi a rua Barata Ribeiro para armar a minha barraca. Escolhi bem. Tem de tudo em volta da minha morada. É só descer do prédio e caminhar alguns passos que tudo está à mão.

É verdade que o bairro anda maltratado, meio que abandonado pelo poder público, com calçadas que já viram dias melhores e com muitos sem teto estendidos sob as marquises quando a noite cai. E que cachorros mal-educados despejam dejetos onde lhes dá na telha, sob a indiferença dos donos

Mas nada que possa fazer alguém abominar o lugar. Um charme antigo ainda se espalha pelo ar. Aliás, em contraponto com tudo que não agrada ao olfato ou à visão, ainda existem muitas moças balançando o corpo, dentro de sumários biquínis, em busca de um destino que chega nas ondas do mar.

A bem da verdade, onde se lê biquínis entenda-se “fios dentais”. Biquíni, como se costuma dizer por aqui, é para as fracas ou para as excessivamente pudicas. Nem uma turista argentina usa mais aquilo que a gente costumava chamar de biquíni. Ser in agora é desfilar de bunda de fora.

São longas as conversas e lânguidos os olhares nas areias que margeiam a Av. Atlântica. Do horizonte chegam águas do continente africano. E estas dizem pra quem quiser ouvir que todo preconceito racial (ou não) é fruto da ignorância. Fechar estradas e discriminar minorias idem.

Pequenos deuses (e deusas) com dragões tatuados no corpo erguem esculturas na areia. Muita gente se detém para tirar uma fotografia. A pose fica armazenada numa nuvem. Já as esculturas, essas se dissolvem na primeira chuva. E como tem chovido aqui no Rio nesses últimos meses!

Por falar nisso (preconceitos, esculturas na areia e deuses), domingo passado enquanto eu percorria a lateral de uma praça na Av. Nossa Senhora de Copacabana, um som peculiar dos irmãos nordestinos chamou a minha atenção. Me aproximei e vi uma dezena de sanfoneiros em plena atividade.

Tratei de “curiosar” e fiquei sabendo que o grupo se denominava “Orquestra Sanfônica”. Um homem de semblante solene, do tipo que a gente reconhece só de olhar como oriundo do Ceará, chorava em silêncio, talvez de saudade, talvez com orgulho por ter ajudado a mudar os rumos do país.

Depois de alguns minutos, retomei os meus passos. Os sons das sanfonas me seguiram por um tempo. E nessas de caminhar e ouvir, não pude deixar de lembrar de uma frase que eu li numa crônica do Rubem Braga: a de que “a esperança sobrevive à custa de mutilações”. Que venha o hexa!

– Novembro de 2022 –


Encontro inusitado

Francisco Dandão

A historinha que eu vou contar resumidamente hoje nesta crônica me foi contada por um integrante do selecionado acreano do ano de 1957, criatura que já deixou este mundo. Dessa forma, como a tal criatura não pode mais confirmar (ou negar) os fatos, vou omitir a identidade dos personagens.

O que aconteceu foi o seguinte: a seleção acreana excursionou à Manaus e saiu fazendo “barba, cabelo e bigode” (expressão da criatura que me contou a história) nos adversários amazonenses. Tanto ganhou que o pessoal do Amazonas resolveu lançar o desafio de uma partida extra.

Como o time do Acre já se encontrava em regime de concentração há vários dias, sem sair do alojamento nem para cuspir na calçada, eis que os chefes da delegação resolveram dar uma noite de folga para os atletas. Mas uma folga controlada: todo mundo deveria voltar pra casa antes das 23 horas.

O treinador, que era uma espécie de xerife da turma e que tinha a convicção de que não podia confiar plenamente nos seus pupilos, tratou de ficar na porta do alojamento, com uma caderneta e um lápis nas mãos, anotando a volta, o horário e, naturalmente, o estado etílico da galera.

Aos poucos os craques foram voltando, uns mais alegrinhos do que os outros, mas, de qualquer forma, inteiros e prontos para a tal partida extra que os amazonenses marcaram. Aparentemente, todos cumpririam o horário determinado. Não foi isso, entretanto, o que aconteceu. Dois não voltaram.

Deu meia-noite, deu uma, duas, duas e meia da madrugada e nada dos dois caras darem o ar da sua graça. Aí o treinador foi ao quarto onde dormia um terceiro jogador, parceiro dos dois que não chegaram. Apertado pelo estilo do “xerife”, o parceiro deu o serviço e disse aonde os dois haviam ido.

O lugar, no caso, era uma casa (como direi?), dessas em que homens vão em busca de uma noitada de amor pago. Ou seja, muita cachaça, muito samba e muita mulher de lábios densamente borrados de vermelho, perucas louras, afogadas em perfume “Mil e dez” e, é claro, em trajes sumaríssimos.

O treinador pegou um taxi e resolveu ir lá na casa de “má fama”, acompanhado de um dirigente, pra dar um flagrante na dupla chegada a uma boêmia. O lugar nem era assim tão longe do alojamento. Coisa de três quadras. E menos de cinco minutos depois já estavam entrando no lupanar.

Não foi difícil achar a dupla retardatária. Os dois se encontravam rodeados de mulheres, com as camisas abertas, rindo alto e soltando baforadas de charutos para o ar. Quando o xerife se aproximou, os craques disseram: “Mas professor, que surpresa, o senhor também gosta disso?”

– Outubro de 2022 –


Outra excursão

Francisco Dandão

Escrevi na crônica passada sobre uma excursão do simpático time do São Francisco ao município de Sena Madureira, distante 140 Km da capital Rio Branco, oportunidade em que a equipe católica fez a viagem num caminhão velho, daquele do tipo que se balançasse muito perdia as portas.

No caso dessa referida excursão, o caminhão que transportava os jogadores do São Francisco não chegou a perder nenhuma das portas. Mas, isso sim, perdeu o tanque de gasolina, depois de bater numa cratera das muitas que abundavam na BR-364. Não havia asfalto, só mesmo buracos!

Ao ler a tal crônica, o lateral-esquerdo Zé Pinto, que integrou a delegação do São Francisco naquela oportunidade, me mandou uma mensagem contando um episódio acontecido durante outra excursão ao mesmo município de Sena Madureira. Desta feita com o time do Andirá.

De acordo com o Zé Pinto, que felizmente pendurou as chuteiras cedo para se dedicar às lides forenses, tudo aconteceu em meados da década de 1970, quando o Andirá, conhecido nas boas rodas como “Morcego da Cadeia Velha”, foi convidado para disputar um amistoso na capital do Iaco.

Abro aspas para o citado personagem: “(…) o nosso jogo era com um time chamado Grêmio. O campo de futebol ficava ao lado da igreja católica e nas proximidades de uma escola, sendo que entre o gramado e os torcedores não havia barreira alguma. Qualquer um se quisesse podia invadir o campo.”

Continuando a narrativa. “O nosso time era muito bom. Eu não lembro da escalação, mas sei que tinha gente do porte do atacante Amenu, que por sinal foi meu camarada de serviço militar; do armador Targino, extremamente habilidoso; e do goleiraço Pituba, o homem do salto mortal.”

Ainda no dizer do Zé Pinto. “Nós fizemos dois a zero rápido. Aí o Zé Américo, nosso treinador, sabendo que o pessoal de Sena detestava perder, falou pra gente evitar ir pra cima deles e ficar só tocando a bola. A ordem, por precaução, era não empreender uma goleada. Tirar o pé do acelerador.”

“O problema”, explicou o Zé Pinto, “é que ao ver o Andirá tocando a bola, para trás ou para o lado, o pessoal de lá se irritou mais do que se a gente tivesse tentando fazer mais gols. Aí o pau quebrou. Os caras partiram pra pura ignorância e nós tratamos de fugir. Cada um correu para um lado.”

“Quando a polícia chegou, nós voltamos para o campo. Mas percebemos que faltava o Pituba. Procura daqui, procura dali, eis que o goleiro foi descoberto em cima do telhado da escola. Foi preciso chamar os bombeiros para descê-lo de lá. E aí ficou o mistério de como ele chegou ali.”

– Outubro de 2022

Tanque ao chão

Francisco Dandão

Revirando papéis encontrei por esses dias uma entrevista que eu fiz com o Almiro, goleiro que se caracterizou por jogar em times pequenos do futebol acreano, entre 1971 e 1989. Uma carreira que passou, sucessivamente, por São Francisco (onde jogou mais), Amapá e Andirá.

O Almiro, aliás, era um goleiro baixinho, do tipo daqueles que o torcedor que não o conhecia não acreditava, quando o via, que ele pudesse defender alguma coisa. Mas era só o jogo começar que o homem parecia um gato, o tanto que saltava nas bolas e dificultava o vazamento das suas traves.

Na verdade, ele tanto saltava como poucos quanto tinha um senso de colocação absurdo. De forma que ele estava sempre onde a bola ia. Parecia um caso de atração magnética. Os atacantes adversários mandavam a bomba e o cara estava exatamente na trajetória da então chamada “deusa branca”.

O problema do Almiro, durante toda a sua carreira, foram os times em que ele jogou. Ele sempre defendeu times de poucos recursos. E então, nesse caso, não se pode dizer que as zagas das referidas agremiações eram do tipo “muralhas intransponíveis”. Ele pegava muito, mas não fazia milagres.

Mas o que eu quero mesmo lembrar nessa crônica é uma história que o referido personagem me relatou, quando de uma excursão do simpático São Chico à cidade de Sena Madureira, numa época que os 140 Km. da estrada para a “capital do Iaco” não eram asfaltados e nem havia iluminação.

Esportivamente, a excursão foi um sucesso. O São Francisco, que alinhava nas suas hostes, além do Almiro, players como Chico Alab, Bismarck, Zé Pinto, Melinho Elias, Madureira, João Trebina (pai do rei Artur) e Vicente Barata (jogador e presidente), venceu o amistoso por 1 a 0.

Ressalte-se que era muito difícil um time “de fora” vencer em Sena Madureira. O município tinha muita gente boa de bola. E, segundo relatam, o pessoal da cidade também costumava intimidar os jogadores dos times visitantes. Diz a lenda que os caras de lá diziam: “Se ganhar, vão apanhar.”

Talvez com um certo receio de alguma eventual confusão posterior ao jogo, a delegação do São Francisco declinou do convite de pernoitar na cidade e resolveu enfrentar os buracos da rodovia 364, com os jogadores amontoados na carroceria de um caminhão do tempo da 2ª Guerra Mundial.

Eis então que, lá pelas tantas, na escuridão da estrada, o caminhão estancou. O “chofer” deu na chave várias vezes e nada do bicho pegar. A turma tratou de empurrar, e nada. Foi aí que alguém descobriu que o tanque de gasolina havia caído! “Batemos carapanã a noite toda”, contou o Almiro.

– Outubro de 2022

Mitos e mitômanos!

Francisco Dandão

Eu vinha vendo por aí nos últimos tempos muita gente se confundindo no emprego da palavra “mito”. Era um tal de mito pra lá, mito pra cá, vozes que ecoavam em uníssono à passagem de uma certa criatura. Como eu achei tudo muito estranho, corri aos dicionários para saber o que isso significava.

Aí encontrei a seguinte definição para o aludido vocábulo: “(…) representação fantasiosa, espontaneamente delineada pelo mecanismo mental do homem, a fim de dar uma interpretação e uma explicação aos fenômenos da natureza e da vida.” Ou seja, nada a ver com o que diziam!

Então, como uma coisa puxa a outra, fiquei pensando numa palavra que, de alguma forma, pudesse derivar do tal vocábulo “mito”. Pensei pra lá, pensei pra cá, puxei as orelhas dos dois neurônios (o Tico e o Teco) e eles me apresentaram, como num passe de mágica, a expressão “mitômano”.

Nova consulta ao “pai dos burros” para saber o que, exatamente, viria a significar a palavra “mitômano” que, em princípio, eu já trato de esclarecer, não se trata de xingamento à mãe de nenhum árbitro de futebol ou, muito menos, remédio para sarar curuba, bicho de pé ou espinhela (des)caída.

“Mitômano”, de acordo com o livrinho que eu citei anteriormente, é um sujeito que mente compulsivamente, “mente com tanta convicção que é capaz de crer na própria mentira. Faz da mentira a sua principal qualidade. Adquire dependência da mentira e passa a ter a necessidade de mentir.”

O livrinho também esmiúça o conceito, estabelecendo como exemplo da prática do mitômano as falas “de líderes políticos que criam discursos utópicos e conseguem a crença do público”. Tal e qual fez aquele sacripanta de bigodinho que promoveu um massacre humano no século passado.

Mas eu falei do crápula de bigodinho só porque me ocorreu como exemplo maior. A culpa, é claro, não é do bigodinho. Um canalha está cheio de seguidores nos tempos que correm, de cara limpa e sem sinal de pelos sobre os lábios. A prática, no entanto, é a mesma. E a vontade de matar idem.

Naturalmente, como nem tudo continua absolutamente igual, mesmo porque as águas do rio seguem mudando de instante a instante, mentira agora se chama “Fake News”. E como, igualmente agora, existem legiões de robôs, ninguém mais precisa, necessariamente, discursar ao vivo para multidões.

Para azar de todos, principalmente dos tolos que compram as palavras dos mitômanos, o diabo há muito tempo deixou o rabo no inferno, usa Chanel nº 5 (pra disfarçar o cheiro do enxofre), desliza sobre as águas em veículos motorizados e veste Prada. “Mito” é uma coisa, “mitômano” é outra!

– Outubro de 2022 –

Adversários de três ovos

Francisco Dandão

O Lauro Fontes, caríssimo amigo de peladas de infância e adolescência, eu não canso de dizer, foi o maior goleiro de futebol de salão que os meus olhos já viram. O cara era um paredão. No dia em que ele resolvia fechar o gol, não adiantava chutar. Não passava nem rato ensebado.

Agora por último, não satisfeito com a arte que um dia exibiu nas quadras (e nos gramados também, que ele andou ensaiando pegar umas bolas no gol do Independência), o Lauro tem se revelado um exímio contador de histórias. Narrativas que ele tem tratado de contar nas páginas do Facebook.

Uma historinha que ele contou no meio dessa semana me rendeu boas gargalhadas. Justamente sobre uma partida de futebol de salão, onde ele, ainda um jovem imberbe, foi chamado para defender o time da Difusora Acreana, num torneio jogado numa quadra bem no centro de Rio Branco.

A quadra, em frente ao Palácio do Governo, não existe mais. Mas houve um tempo em que muitos moradores da capital acreana cumpriam “religiosamente” dois compromissos aos fins de semana: assistir à missa, na Catedral de Nossa Senhora de Nazaré, e apreciar as exibições na dita quadra.

E havia um time imbatível que costumava se exibir nesse local, formado por, entre outros, os irmãos Elízio e Eliézio Mansour (também conhecido pelas alcunhas de “Nego” e “Bufete”), os irmãos Dadão e Hermínio, o cracaço Antônio Maria e os goleiros Arnaldo e Zé Gilberto.

Esses caras todos jogavam igualmente no futebol de campo do Juventus. E quem os viu em ação sabe que todos eles jogavam pra caramba. Talvez o que menos “gastava a bola” era o Eliézio. Mas a suposta deficiência técnica ele compensava com um canhão, tanto de pé esquerdo quanto direito.

Pois foi justamente contra esse timaço, de acordo com o Lauro, que a Difusora Acreana iria jogar, lá pelas tantas, na decisão de um torneio da Semana da Pátria. Ainda quase menino, o Lauro disse que tremeu quando viu os tais adversários aquecendo antes do apito inicial da partida.

O Lauro confessou que ao ver do outro lado da quadra aqueles monstros batendo bola, começou a rezar baixinho e até, num dado momento, chegou, inclusive, a confessar os próprios pecados para um padre imaginário. E falou que vontade de sair correndo dali imediatamente foi o que não faltou.

O Lauro disse que só não fugiu porque um colega de time chamado Madureira, percebendo o pavor dele, cochichou no seu ouvido o seguinte: “Olha garoto, nenhum daqueles caras ali tem três ovos, deixa de frescura”. Dito isso, o Lauro jogou, fechou o gol e quebrou a invencibilidade das feras!

– Outubro de 2022 –

Vem aí o returno!

Francisco Dandão

Pelas regras do jogo, acordadas pelos candidatos ao título de presidente do Brasil, vai ter returno. Agora só restam dois contendores na busca pelo troféu. Os outros postulantes ficaram presos nas armadilhas do destino. Ou escorregaram em alguma casca de banana jogada no caminho.

A disputa teria acabado num único turno se tivesse havido uma goleada daquelas arrasadoras. Não foi o caso. Os dois sobreviventes continuam na luta. Nenhum se dá por derrotado. Houve um vencedor, é verdade. Mas, pelo regulamento em voga, a surra inicial não foi suficiente.

Se a gente se colocar no lugar do mapa do país, coincidentemente, quem deu a vitória momentânea ao contendor barbado foi o povo que habita no lado esquerdo. Canhotos, são, de fato, criaturas bem mais habilidosas. Posso citar várias dessas criaturas, a título de exemplo, no mundo do futebol.

O primeiro que me vem à mente enquanto escrevo é um maranhense chamado José Ribamar de Oliveira, que passou a ser conhecido nos gramados brasileiros pelo apelido de Canhoteiro. Ele jogou no América cearense e no São Paulo. Era um monstro correndo pela extrema-esquerda.

E teve um carioca chamado Júlio César, que jogou no Flamengo junto com o Zico (só pra citar a referência mais famosa). Esse sujeito driblava tanto, quebrava tanto os laterais, que ganhou o apelido de Uri Geller, este um israelense que brincava de entortar talheres só com a força do pensamento.

Teve também o Edu, batizado Jonas Eduardo Américo, que se notabilizou por ser o jogador mais jovem a ser convocado para disputar uma Copa do Mundo, no caso a de 1970, no México. O Edu era tão habilidoso que costumava derrubar os adversários com uma ginga de corpo à distância.

E teve ainda o Paulo Cézar Lima, o famoso “Caju”, que também fez parte do time tricampeão do mundo. O Paulo Cézar Caju era uma espécie de mágico da bola. Não raro, quando partia pra cima dos laterais contrários, ele fazia que ia, voltava, mas acabava indo mesmo. E ninguém o parava!

Sem falar, mas já falando, do senhor José Macia, mais conhecido como Pepe, que fez parte “apenas” (tão somente) do lendário Santos do rei Pelé, time que assombrou o planeta na década de 1960. Pepe, chamado de “canhão da Vila”, ali pela extrema esquerda do campo produzia milagres!

Por último, me vem à lembrança o Lula (Luís Ribeiro Pinto Neto), um pernambucano que fez história no Fluminense, entre as décadas de 1960 e 1970. Lula jogou pouquíssimo com a camisa da seleção brasileira. Apenas 13 jogos. Lula? Pernambucano? Treze jogos? Tal e qual! Vai saber! Rsrsrs.

– Outubro de 2022 –

Negritude etc.

Francisco Dandão

Tenho acompanhado com atenção (e preocupação, é claro) as diversas agressões racistas das quais são vítimas jogadores negros nos campos de futebol do planeta, principalmente os brasileiros, a exemplo do que aconteceu naquele jogo supostamente “amistoso” do Brasil contra a Tunísia.

Elementos da torcida da Tunísia atiraram uma banana no campo de jogo, aos pés dos jogadores brasileiros, depois da marcação de um gol contra eles. Como grande parte do povo tunisiano tem a cor da pele escura, a situação, muito mais do que insólita, se configurou pra lá de absurda, surreal.

Toda discriminação é deveras odiosa. Não consigo absorver como uma significativa parte dos seres humanos não consegue entender isso. Pior: não consigo absorver é como existe uma multidão que, mesmo se enquadrando no perfil dos discriminados, ainda segue os discriminadores.

O futebol brasileiro, a propósito, jamais seria o mesmo, jamais teria feito dobrar os joelhos louros de olhos azuis dos mais variados pontos do globo se não fossem os negros que um dia vestiram a camisa amarela. Para provar o que eu digo, vou escalar aqui uma seleção de negros maravilhosos.

Barbosa (goleiro da seleção de 1950); Djalma Santos (1954 a 1966), Brito (1970), Domingos da Guia (1938) e Everaldo (1970); Denílson (1966), Didi (1954, 1958 e 1962) e Paulo César Lima, o “Caju” (1970); Jairzinho (1966, 1970 e 1974), Pelé (1958, 1962, 1966 e 1970) e Edu (1970 e 1974).

Vou escalar outros onze, de forma absolutamente aleatória, só de ir lembrando. Vejamos: Jairo; Carlos Alberto Torres (o “capita”), Ditão, Djalma Dias e Marco Antônio; Adílio, Ronaldinho Gaúcho e Liminha; Garrincha, Leônidas da Silva (o Diamante Negro) e Neymar. É mole?

Agora, saindo do geral para o particular, vou escalar um time somente de negros que atuaram no futebol acreano. Os mais antigos vão lembrar. Agrícola; Bento Zero Hora, Carlão, Chicão e Duda; Borges, Jangito e Júlio César; Bidu, Edson Carneiro e Bené. Treinador: Abelardo Coca-Cola.

Segundo time, continuando com a escalação dos negros divinos de todos os tempos no futebol acreano. Pituba; Ivo Neves, Deca, Chicão e Otávio; Merica, Testinha e Pixilinga; Doka Madureira, Luís França e Ericsson. Treinador: Neneca. E ainda existem outros, muitíssimos outros.

Além dos dois times escalados, cito Ley (lateral), Luiz Carlos, Palheta, Mozarino, Curica, Jorge Floresta, Cleiber, Bararu, Gaúcho Lima, Manoelzinho e Paulão (zagueiros), Neném e Boá (meias), Bodó e Albertino (laterais). Enfim, toda a honra e toda a glória aos jogadores negros do Brasil.

– Outubro de 2022 –

Sombria primavera

Francisco Dandão

Sexta-feira passada começou a primavera no hemisfério sul. É nessa estação que as flores costumam brotar em todos os recantos. As flores tanto encantam pelas cores quando seduzem pelo perfume. O céu costuma ficar mais azul e as árvores mais verdes. E tudo parece mais leve ao redor da gente.

Por alguma razão que eu não sei determinar, entretanto, a primavera deste ano, pelo menos nas ruas do Rio de Janeiro, onde eu passo uma temporada, está mais para inverno ou outono. Chove pra caramba, as nuvens se mostram carrancudas e os dias se vestem de cinza. Tudo muito estranho!

Até aqui tem sido uma primavera sombria. Não sei muito bem o que pensar, mas tenho uma ideia. O meu palpite é o de que a natureza, de alguma forma, está demonstrando a sua tristeza pela violência estimulada que grassa em todos os cantos. São muitas armas e poucos livros circulando por aí.

Menos mal que tudo pode mudar de uma hora para outra. A esperança não pode morrer. Os brasileiros têm uma escolha a fazer no fim de semana próximo. Pelas mãos de todos, depois de teclar e confirmar os números nas urnas eletrônicas, poderá, quem sabe, no amanhã, nascer um novo tempo.

Mas é necessário uma enorme dose de senso crítico para não se deixar enganar pelos falsos profetas ou messias. Em tempos de fraudes e mentiras reiteradas, é preciso saber ler o ódio nos olhos dos psicopatas. A falta de piedade e empatia deve ser lembrada a cada passo no caminho do sufrágio.

O eterno Rei Pelé, uns anos atrás, quando de uma das suas inúmeras entrevistas, declarou que o povo brasileiro não sabia votar. Quase provocou uma hecatombe nuclear com esta declaração. Só não foi linchado porque não cansava de escrever poesias com os pés. O tempo provou que ele tinha razão.

A vantagem da democracia, que alguns querem destruir a qualquer custo, porém, é que sempre existe uma nova eleição e os erros anteriores podem ser corrigidos. Como dizia o antigo poeta baiano (ou seria coreano?), errar é humano. Permanecer no erro, entretanto, é burrice ou ignorância.

Tomara saiam das urnas de domingo ares de liberdade que possam fazer tudo voltar ao normal na vida deste país. Tomara as urnas engravidem de alegria. Penso, nos meus devaneios, que a democracia e as estações do ano tem algo em comum. Das urnas pode vir um inverno ou uma primavera.

E que tudo, se me for concedido o direito de fazer um pedido, possa ser resolvido num único turno. Mais ou menos como na Copa do Mundo. Um turno basta. Returno fica para campeonatos de longo prazo. Não é o caso aqui. Urge que se conheça o campeão. Talvez assim voltem as flores!

– Setembro de 2022 –

Kung Fu

Francisco Dandão

Por esses dias, remexendo numa coleção de jornais acreanos da década de 1970, eu me deparei com uma história deveras curiosa. A história de uma briga na qual se envolveu o cracaço Escapulário, meia do Independência nos melhores anos do referido clube, numa birosca do bairro Seis de Agosto.

A história foi contada pelo saudoso jornalista José Chalub Leite, criatura que era chegada numa boa molecagem, mas que, segundo me consta, não costumava inventar nada (talvez até aumentasse um pouquinho, colocando umas pinceladas mais fortes aqui e ali, mas só um pouquinho).

De acordo com a narrativa do Zé, o Escapulário era fanático por filmes de Kung Fu, assistindo várias vezes todas as fitas que passavam nos cines Acre, Rio Branco e Recreio. E tanto assistiu a esse tipo de filme que um dia, depois de três anos de sessões, ele entendeu que sabia tudo da luta secular.

O Escapulário estava convencido de que dominava as técnicas do combate oriental. E por isso vivia chamando os “parças” para lutar. Bastava tomar uns gorós que o Escapulário desafiava um oponente para medir forças. Como todo mundo do grupo de boêmia era amigo, ninguém topava o desafio.

O tempo ia passando e nada do Escapulário conseguir alguém que colocasse à prova o seu aprendizado. Na busca de um combate, ele percorria todos os bairros de Rio Branco nos finais de semana. Segundo consta, o citado craque pensou até em tentar achar um opositor fora do estado.

Eis que, lá pelas tantas, numa roda de sinuca no final de uma das ruas do bairro Seis de Agosto, um maluco que estava sentado numa mesa de canto enxugando umas geladas resolveu topar o desafio e enfrentar o craque numa pugna no estilo “vale tudo” (inclusive cascudo, cuspe na cara e dedada).

Para evitar que alguém chamasse a polícia, o Escapulário e o seu desafiante combinaram lutar no quintal nos fundos da birosca. Logo se juntou uma roda de curiosos e rapidamente foi criada uma bolsa de apostas. Pela fama do craque, a maioria das testemunhas fez uma fezinha no taco dele.

Quem conheceu o Escapulário sabe o quanto ele era magrinho. O desafiante, porém, quando tirou a camiseta os músculos saltaram. O cara era tão forte que respondia pelo apelido de Maciste (outro herói dos filmes que passavam no Acre), do tipo que rasgava latas de querosene com as mãos.

Quando o juiz Porco Russo autorizou o combate, o Escapulário soltou um grito estridente, igual ao que ele via nos filmes. O inimigo, nem aí, encheu o craque de tabefe. A turma correu para apartar. Foi aí que o “Escapa” descobriu que a única coisa que ele aprendeu da arte marcial foi o grito!

– Setembro de 2022 –

Cachaça não é água não!

Francisco Dandão

Todos os dias recebo mensagens edificantes, via WhatsApp, dos mais diversos amigos, entre os quais vários ex-boleiros acreanos. Quando acordo de manhã, por volta das 7 horas, e ligo o celular, lá estão os meus “parças” desejando felicidades. E aí trato de sair respondendo a cada um deles.

Faz parte dessa relação o Auzemir, o Paulo Roberto, o Marquinhos Paquito, o Marquinhus Amarelo, o Valdir Silva, o Markito, o Jorge Cubu, o Marcelinho Melo, o Anísio, o Petrolitano (também conhecido como João do Breu). Esses são os mais presentes. Mas ainda existem outros esporádicos.

Fora os ex-boleiros, porém, muitos outros chegados me cumprimentam de manhã. Caso do Gel Meireles, que se dedicou a vida inteira ao magistério de primeiro e segundo graus, e que, talvez por isso, não tenha tido tempo suficiente para praticar o nobre esporte dos pontapés.

Pois foi justamente o Gel quem me mandou o recado mais curioso nessa semana que recém passou. Recado esse me alertando para a passagem do Dia Nacional da Cachaça, cuja comemoração se dá em 13 de setembro. Devo confessar a minha desmemória: eu não lembrava que esse dia existia!

Daí, como uma coisa puxa a outra, eu lembrei que um dia desses, ao conversar com o ex-lateral cearense Alexandre, que jogou pelo Rio Branco em 1989, contratado pelo presidente Alencar, ele me disse que tinha muita gente boa de bola no Acre, no seu tempo, mas que a cachaça estragava tudo.

Não sei a quem o Alexandre se referia especificamente. Ele não disse, nem eu perguntei. O que eu sei é que em 1989, de acordo com fotos da época, uma das formações do Estrelão era Klowsbey; Alexandre, Chicão, Ronaldo e Anderson; Merica, Jair Feitosa e Mariceudo; Paulinho, Manelão e Val.

Independentemente, porém, de quais tenham sido as “boas” referências do Alexandre, o certo é que todo mundo que acompanhou o futebol acreano entre as décadas de 1960 e 1980 sabe o quanto certa galera era chegada numa manguaça. Ah, isso todo mundo sabe demais da conta.

O meu caro amigo Francisco Saraiva, poeta, memorialista, pedagogo e o escambau, conta pra quem quiser ouvir que em determinado momento existia uma verdadeira confraria de boleiros que se reunia no Bar do Mané com Sono, nas imediações do campo do Vasco, pra enxugar umas geladas.

E isso, vejam bem, é porque até agora eu não falei do Bico-Bico, ponteiro direito de rara técnica, veloz e driblador, que vestiu a camisa do Independência na década de 1970, e que, de acordo com a lenda, quanto mais bebia, mais jogava. Como diz a música popular, “cachaça não é água não!”

– Setembro de 2022 –

Nascidos em setembro

Francisco Dandão

         Muita gente boa no mundo das artes e no planeta futebol nasceu em setembro. Pra dizer a verdade, nasce gente boa todos os dias, em contraposição, por assim dizer, a outro tanto de ruindade, qualquer que seja o sentido (ou a área de atuação) que você, amigo leitor, possa imaginar.

         Se falo de setembro é porque se trata do mês em que o velhinho aqui veio à luz, lá nos cafundós de uma colônia, nas imediações de Brasiléia. Os meus amigos mais chegados, a propósito, costumam dizer que eu nasci foi na Bolívia, do outro lado do rio. A esses eu digo: “Sai pra lá, mangalô!”

         Numa pesquisa rápida na internet descobri uma “meia-dúzia de um ou dois” (como costuma dizer o meu amigo cantor Luiz Ivan) de gente famosa do futebol que nasceu em setembro. Casos do tricampeão mundial Clodoaldo Tavares Santana (dia 26) e do treinador Sebastião Lazaroni (dia 25).

         Do show bussines, então, nem se fala. Vera Gimenez, atriz (dia 14); Glória Perez, escritora e novelista (dia 25); Bruce Springesteen, cantor e músico (dia 23); Michael Keaton, ator (dia 5); Arrigo Barnabé, cantor e compositor (dia 14); Pedro Almodóvar Caballero, ator e cineasta (dia 24) etc.

         Mas, saindo do geral para o particular, chego ao futebol acreano, onde pelo menos três ex-craques saltaram para a vida neste mês onde costuma surgir a primavera no hemisfério sul. Refiro-me aos ex-atacantes Julinho (7, em 1963) e Ericsson (30, em 1963) e ao meia Mariceudo (17, em 1958).

         O Mariceudo, quem assistiu o futebol acreano entre o final dos anos de 1970 e a primeira parte da década de 1990 deve lembrar, era um daqueles raros futebolistas que jogava sempre na vertical. Com ele não tinha esse negócio de toquinho lateral não. Era sempre pra frente, em expansão.

         Já o Julinho, que nasceu em Xapuri, e que ainda bem garoto ganhava um troco para jogar pelos times de Cobija, este era um daqueles centroavantes de área que aliava técnica e força. Jogava tanto que virou profissional no Equador, quando o futebol acreano ainda era amadorista.

         Enquanto isso o Ericsson, que desfilava a sua arte na extrema-esquerda dos ataques das diversas equipes onde atuou, triste dos laterais que recebiam a incumbência de marca-lo. Provavelmente os caras tinham até pesadelos. Veloz e driblador, o Ericsson cansou de deixar os adversários no chão!

         Não sei se esses três ex-craques do futebol acreano citados nessa crônica chegaram a atuar juntos num mesmo time. Não lembro. O que eu sei é que cada um deles deu muitos espetáculos para quem teve a ventura de vê-los em ação. E sei que eles nasceram em setembro. Tal e qual o vovô aqui!

– Setembro 2022 –

Acre x Rondônia

Francisco Dandão

Eu acompanho o futebol acreano mais de perto desde os últimos anos da década de 1970. Nesse tempo, cansei de ver jogos espetaculares entre times do Acre e de Rondônia, no vetusto Stadium José de Melo. E nesse tempo sempre tive a impressão de que os acreanos eram bem superiores.

Por esses dias, entretanto, mergulhado numa pesquisa em diversas fontes hemerográficas sobre o futebol do Norte do país, a maioria presente nos arquivos da Biblioteca Nacional, eu descobri que houve uma época em que os rondonienses levavam a melhor sobre as representações seringueiras.

Foi assim, por exemplo, no campeonato de seleções de 1950 (ano, a propósito, fatídico para a seleção na Copa do Mundo), quando a seleção rondoniense (naquele tempo Rondônia ainda se chamava Guaporé) eliminou a seleção acreana depois de dois confrontos, em campos distintos.

Na partida de ida, em Rio Branco, realizada no dia 1º de janeiro, a seleção do Acre venceu a representação do Guaporé (leia-se Rondônia) por 1 a 0, gol do meio-campista Waldemar Maciel. Sair na frente, entretanto, não livrou o Acre de uma desclassificação inesperada, uma semana depois.

O troco da seleção do Guaporé veio a galope. No dia 8 do mesmo mês de janeiro, no estádio Paulo Saldanha, em Porto Velho, os anfitriões sapecaram nos acreanos uma goleada de 4 a 0. No tempo normal foi 3 a 0. Depois, por não haver o critério do saldo, veio outro gol na prorrogação.

Na competição seguinte, jogada dois anos depois, em 1952, novamente a seleção do Acre foi eliminada sumariamente pelos rapazes do então Território Federal do Guaporé. Uma vitória dos hoje rondonienses, em Porto Velho, por 2 a 1. E um empate em 1 a 1, na volta, em Rio Branco.

E não parou por aí. Mais dois anos pra frente, em 1954, outra vez o Acre amargou uma eliminação para o Guaporé. Depois de um empate em 2 a 2, em Rio Branco (Touca marcou os dois gols da seleção do Acre), no jogo da ida, sobreveio uma derrota acreana, pelo placar mínimo, em Porto Velho.

Somente no campeonato de 1956 (ano em que o velhinho aqui veio conhecer o planetinha azul) é que a seleção acreana obteve algum sucesso, batendo os rondonienses, em Rio Branco, no jogo da volta, por 3 a 1. Mas isso depois de perder o jogo da ida por 2 a 1, na cidade de Porto Velho.

E veja-se que a seleção acreana alinhava nomes que se tornaram lendários no Estado. Casos dos já citados Waldemar Maciel e Touca. E de outros, como Antônio Leó, Hugo Sena, Zelito, Tinoco, Bararu, Cidico, Dudu, Elínio, Zé Cláudio, Boá, Guimarães, Guedes, Bacelar e Mozarino!

– Setembro de 2022 –

Supremacia brasileira

Francisco Dandão

Pelo terceiro ano consecutivo dois times brasileiros vão decidir a Copa Libertadores da América, o torneio mais importante do continente sul-americano. De um lado o Flamengo (apesar de ainda faltar uma partida) e do outro o vencedor do confronto entre Palmeiras e Atlético Paranaense.

Em 2020, a decisão foi entre o Palmeiras e o Santos. Vitória do alviverde por 1 a 0, no lendário Maracanã. Em 2021, o Palmeiras foi ao bi, ao derrotar o Flamengo, naquela mancada federal do bom meio-campista Andreas Pereira, no também lendário estádio Centenário, em Montevidéu.

Voltando um pouco mais no tempo, e recuando até ao ano de 2019, embora a final não tenha sido entre dois brasileiros, a vitória sorriu igualmente para um time nativo aqui da antiga terra dos tupiniquins. O Flamengo engoliu o River Plate, no estádio Monumental, na capital peruana.

É preciso salientar que essa recente hegemonia, porém, não coloca os times brasileiros como os maiores vencedores do torneio. Os argentinos tem quatro títulos a mais do que os brasileiros (25 a 21). Seguem-se o Uruguai, com oito títulos; o Paraguai, com três; o Chile e o Equador, com um cada.

Pois bem. Voltando ao fio da meada, o que eu quero mesmo dizer é que essa recente hegemonia brasileira está incomodando extremamente os demais países. Ultimamente é só isso que eles debatem nos seus diversos programas esportivos. Eu vejo vários destes programas e o choro é geral.

Um dia desses, não sei bem em qual programa, nem de qual país, eu vi os caras sugerindo até a adoção, por parte da Conmebol, de um certo fair play financeiro. É que eles atribuem à capacidade de investimento dos clubes brasileiros o sucesso futebolístico. Como se isso fosse uma culpa.

Essa última lapada que o Flamengo deu no Velez Sarsfield, lá na casa deles, deixou as criaturas mais perdidas do que aqueles cachorros caídos de caminhões de mudança. Ao fim da partida, pelos semblantes estampados nas telas de TV, parecia que os sujeitos não sabiam sequer onde estavam.

E eu vou dizer uma coisa pra vocês: não existe coisa melhor do que ver um argentino perdido, olhando para o nada, depois de levar uma “lapada na rachada”. Arrogantes, eles inflam o peito e costumam humilhar os vencidos, principalmente quanto estes são brasileiros. Em compensação…

Então é isso, meus caros amigos. Por mim, os times brasileiros vão continuar decidindo a Copa Libertadores da América até o século XXII. Não tô nem aí para os despeitados. Inclusive porque ninguém falou em fair play financeiro no tempo em que os argentinos ganhavam tudo. Ninguém falou!

– Setembro de 2022 –

Rock in Rio

Francisco Dandão

Depois dos lockdowns que abalaram o planeta nos dois últimos anos, todo mundo ficou louco pra sair de casa. E assim, já com as medidas de prevenção da Covid devidamente relaxadas, os espetáculos públicos tem estado cheios até a tampa. Se cair uma gota a mais do céu, o copo transborda!

Um dia desses eu fui a uma peça do gênero musical, em Copacabana. Me dirigi à bilheteria com quatro dias de antecedência, entendendo que o estava fazendo com tempo suficiente para escolher um lugar na primeira fila. Me enganei completamente e só consegui vaga quase atrás de uma coluna.

Nos estádios de futebol, então, nem se fala. Os ingressos para os jogos dos times cariocas (como em outros estados do país com equipes na Série A) se esgotam com dias de antecedência. Os do Flamengo e do Fluminense, que estão nas cabeças no Brasileirão, nem adianta procurar. É perder tempo!

E tem gente para encher tudo, sem se importar o quanto custa ir num lugar desses. Sei lá onde é que a galera tem conseguido tanto dinheiro para frequentar esses espetáculos. Com a choradeira geral no ar é de se pensar se não poderia estar havendo uma primazia do circo em detrimento do pão.

Neste fim de semana, a propósito, hordas de roqueiros estão a invadir o Rio de Janeiro para participar da nona edição do Rock in Rio. Tenho visto pelas ruas pessoas de todas as faixas etárias se dirigindo para o local do evento. Adolescentes, adultos e idosos, todos reunidos numa mesma tribo.

Tem umas criaturas bem bizarras, com argolas no nariz e o corpo cheio de tatuagens. Moças vestindo saias tão curtas e coletes tão apertados que eu me ponho a pensar como é que elas conseguem respirar. Mas o mais estranho que eu vi foi um casal do tipo “dark”, com cinco jiboias enroladas no corpo.

Os dois completamente carecas. Ela com a cabeça cheia de gomos, o que a deixava com a aparência de quem carregava um casco de tartaruga no alto do corpo. E ele com uma barba de profeta, toda despontada, de cor vermelha, alongando-se até bem perto da cintura. E as cobras como adorno.

A minha curiosidade me fez chegar perto dos dois para tentar ouvir o que eles diziam. Não adiantou nada. Eles falavam uma língua bem estranha. Talvez de anjos, talvez de demônios. Ou mesmo algum dialeto perdido. Só julguei entender duas palavras saídas das bocas deles: Alice Cooper!

Se é certo que eu ouvi mesmo isso, então ficam justificadas as cobras companheiras do casal. É que Alice Cooper era um roqueiro norte-americano de muito sucesso nas décadas de 1960/1970/1980 que de vez em quando fazia umas performances agarrado com uns ofídios. Bom festival pra eles!

– Setembro de 2022 –

Álbum de figurinhas

Francisco Dandão

Tirei férias. Todas as vezes em que o meu editor Manoel Façanha entra de férias, eu pego uma carona na folga dele. Tirar férias é tudo o que um preguiçoso como eu precisa para ficar vendo o mundo passar pela janela. O problema é quando as férias acabam. A máquina precisa pegar no tranco.

Outra coisa. Quem me conhece e sabe que eu sou aposentado deve estar estranhando essa história de tirar férias. Mas é que eu sou aposentado somente dos compromissos de um trabalho regular, com hora pra bater ponto etc. e coisa e tal. O show, porém, como dizem por aí, esse “deve continuar”.

E então, como nem só de espinhaço estendido numa boa rede nordestina vive um homem, eis que, pra não ficar marcando passo sem sair do lugar, dei uma esticada do Ceará ao Rio de Janeiro. Que coisa linda é essa terra carioca, que faz a gente estender o olhar para além do horizonte.

Amarrei meu burro (talvez fosse melhor dizer “atraquei minha jangada”, mas vá lá que seja) na Barra da Tijuca. Eu, em toda a minha história pregressa, só havia estado na Barra umas duas vezes. Eu achava muito longe. Agora, entretanto, entendi que longe é um lugar que não existe.

Muito bom isso aqui. E esse não é um sentimento só meu. Tanto que andei postando umas fotos numas redes sociais e choveram declarações de amor à Cidade Maravilhosa. Quando faz sol, a areia e as ondas como que emitem um apelo irresistível para a gente se deixar levar ao sabor do vento.

Por falar nisso (vocês não vão acreditar), eu até comprei uma tanga de crochê, daquelas ao estilo Fernando Gabeira, para desfilar entre os postos sete e oito da Av. Lúcio Costa. Mas só comprei, viu? Ainda não bebi vinho suficiente para usar a indumentária. Acho mesmo que não vou usá-la. Kkk.

Só não fui ainda ao Maracanã. Aliás, faz muito tempo que não vou a um estádio. Os estádios andam muito cheios e eu não gosto de multidão. Na época dos meus estudos de doutoramento, descobri que a psicologia das multidões é quase sempre a da violência. E isso a gente tem visto toda hora.

Os torcedores passaram muitos meses sem poder ir aos estádios. E agora que a pandemia diminuiu o ritmo da contaminação e que os estádios foram reabertos, todo mundo quer descontar o tempo perdido. Desse jeito, eu prefiro ficar vendo tudo pela televisão. Em casa eu vejo o gol e o replay.

Sim, devo dizer, por último, à guisa de encerramento dessas mal traçadas de hoje, que comprei o álbum de figurinhas da Copa. Deleguei à minha mulher Maria a tarefa de preencher a peça. Eu só supervisiono. E troco as repetidas com os meninos do bairro. Voltar à infância é bom demais!

– Agosto de 2022 –

Asa de urubu

Francisco Dandão

Já era! O Rio Branco ficou pelo caminho. Não deu conta de eliminar o ASA. Depois de dois zero a zero, o caldo entornou e a vaca foi pro brejo. Foram 180 minutos sem gols. São duas as hipóteses: ou os ataques desses dois times são incompetentes, ou as defesas de ambos são duas muralhas!

Diante desse dilema transcendental, eu lembro daquele copo cujo conteúdo estava pela metade. Para uns, ele estava meio cheio. Para outros, o copo estava meio vazio. Se a situação for vista pelo lado do eliminado, o copo secou. Se o fato for visto pelo lado do classificado, o copo transbordou!

Lembrando da história entre Rio Branco e ASA, jamais houve um vencedor. São quatro jogos e o mesmo número de empates. Parece que nenhum vai conseguir vencer o outro até o final dos tempos (pelo menos dos tempos de jogo). Trezentos e sessenta minutos de jogo e necas de pitibiriba!

E no frigir dos ovos, pior para o time acreano. Os alagoanos empatam e dão sempre um passo à frente. Enquanto isso, o Estrelão trata de juntar os cacos para recomeçar. A história se repete. E eu que achava que não existia repetição da história, a não ser quando se tratava de farsas, me enganei.

Vai ver a história seja mesmo uma eterna farsa, onde uns pintam o rosto com tintas de palhaço e outros se danam a rir nas coxias. Nesse caso, quem representar melhor conquista as vitórias e os aplausos. Dizendo de outra forma: quem empatar melhor se classifica para os voos seguintes.

Esse ASA tem se tornado o azar do Rio Branco. Péssimo trocadilho, eu sei, mas não consegui resistir. Pena de morcego era o que usavam as bruxas Madame Mim e Maga Patalójika, nos desenhos Disney. No deserto do real, o que roçou a testa do Estrelão deve ter sido uma asa de urubu.

Só com reza brava o Rio Branco pode se livrar dessa sina de cruzar com o ASA e ser eliminado numa fase de mata-mata. Reza brava ou um “contra feitiço”. Alguma coisa que possa fazer uma poção mágica a partir de ingredientes como couro de surucucu, olho de sapo cururu e unha de tatu.

Quem era mestre nessas mandingas era um antigo roupeiro e zelador do Atlético Acreano, conhecido pelo nome de Velho Jaú. Mas ele já partiu desse mundo e não pode emprestar os seus serviços ao Estrelão. Dessa forma, o jeito é fazer os jogadores acreanos aprenderem logo a cobrar pênaltis.

Nesse jogo que tirou do Rio Branco o direito de sonhar com uma ascensão à Série C, aliás, nem um goleiro gigante conseguiu voar de encontro às bolas chutadas contra o seu gol ali da marca fatal. Voar é pra quem tem “asas”. Caso do time de Arapiraca. Asas de morcego ou de urubu, tanto faz!

– Agosto de 2022 –

Morte matada

Francisco Dandão

Apenas 16 das 64 equipes que começaram a Série D do Brasileirão deste ano ainda sobrevivem na competição. Ao longo do caminho, diversos corpos, das mais variadas cores, ficaram estirados na poeira da estrada. E depois da rodada deste domingo (14), outros oito serão eliminados.

Depois da primeira parte do certame, quando se jogava no sistema todos contra todos, passou-se para a fase “mata-mata”. Pra mim, quem é eliminado nessas diversas fases de “mata-mata”, morre de “morte matada” e não de “morte morrida”. A despeito dos esforços, a eliminação é sumária.

São partidas duríssimas, onde qualquer coisa pode acontecer. Nos jogos de ida dessas oitavas de final nada ficou definido. Foi tudo placarzinho apertadinho, com uma diferença de mísero um gol para os times vencedores. Cinco das oito partidas acabaram com a igualdade no placar. Pau a pau!

Quando confrontos de ida nesse sistema “mata-mata” terminam empatados, se costuma dizer que o anfitrião da partida de volta se transforma em favorito. O raciocínio é simples: se o visitante conseguiu empatar fora de casa, então, quando joga nos seus domínios, tudo deverá ser mais fácil.

Entretanto (todavia, contudo etc.), como tudo na vida sempre pode ter uma “conjunção adversativa”, e ainda mais levando-se em conta que futebol não tem muita lógica, não será surpresa para ninguém se alguns dos times que jogarão a decisão fora dos seus domínios venham a se dar bem.

Nessa linha de raciocínio, eu até fiz uma fezinha num desses sites de apostas esportivas apontando o sucesso do Rio Branco contra o ASA. Todos os prognósticos dão conta de que o time alagoano é favorito. Mas eu digo que é melhor assim, porque apostar na zebra dá sempre um prêmio maior.

E não venham me dizer que eu sou apenas um desses torcedores maluquetes que rasgam dinheiro e uivam para o céu em noite de lua cheia. Não senhor, nada disso. Embora o Rio Branco apareça como “azarão”, eu soube que o ASA não apresentou nada de especial no primeiro jogo.

Informações reais que me foram passadas pelo agente russo “Toinhoff Bilff”, dão conta de que o sistema de jogo favorito dos alagoanos é o “nove e quinze”, aquele em que as bolas são tocadas lateralmente, sem qualquer profundidade. Embora isso possa ter sido tão somente tática de visitante…

De qualquer forma, seja isso ou aquilo, o certo é que os dados rolaram e a sorte está lançada. Tomara que os deuses do futebol prefiram ver brilhar uma estrela rubra no firmamento azul do que apreciar a evolução de algum objeto alado. Pra mim, uma estrela é mais bonita do que algum tipo de “asa”.

– Agosto de 2022 –

Números e probabilidades

Francisco Dandão

Conforme eu disse numa crônica anterior, de um dia que não sei mais quando foi, eu adoro consultar números que remetam a probabilidades, principalmente em se tratando de futebol. E adoro mais ainda quando os números são desmentidos na prática, no correr do jogo, na hora do pau a pau.

Para esses confrontos das oitavas de final da Série D de 2022, os times que apresentam as menores chances de passarem de fase, de acordo com o site Chance de Gol, são justamente os representantes do extremo norte do país: o Rio Branco (AC), com 5,9%, e o Amazonas (AM), com 28,1%.

O Rio Branco enfrenta o ASA, do interior de Alagoas, com a partida de ida sendo jogada em casa, no conhecido estádio Florestão. Enquanto isso, o Amazonas vai enfrentar o Lagarto, do interior de Sergipe, mas com a vantagem de jogar a segunda partida nas imediações do caudaloso rio Negro.

Para os numerólogos do site supra referido, o adversário do Rio Branco nessas oitavas de final tem 94% de chances de chegar ao próximo nível e 9% de possibilidades de levantar o caneco da competição. Já as chances do adversário do Amazonas são 71,9% e 10,9% respectivamente.

É claro que os números mudam à medida em que os resultados vão acontecendo. E se a gente olhar para trás, vai constatar que inúmeros prognósticos foram frustrados pela realidade. Na hora em que a bola rola, os dados dos deuses descem das nuvens e podem materializar várias surpresas.

Aquela final da Copa do Mundo de 1950, no Maracanã, é a maior prova disso. O Brasil havia goleado um bocado de gente boa. O adversário, o Uruguai, por sua vez, vinha tropeçando nas próprias pernas. Não havia uma só alma no planeta que cravasse a vitória uruguaia. Mas o Brasil perdeu!

E o próprio Rio Branco, no mesmo site Chance de Gol, nessa mesma Série D de 2022, em várias situações foi dado com menores probabilidades de vencer os seus adversários na fase de classificação. Mas, a despeito disso, o Estrelão foi chegando e já está entre os 16 daqueles 64 que iniciaram a luta.

Outro detalhe, de acordo com o meu afilhado Manoel Façanha, é que 13 anos se passaram desde que o Rio Branco e o ASA se enfrentaram em uma decisão. Os jogos também foram de mata-mata. No primeiro, na casa dos alagoanos, empate por 1 a 1. No segundo, no Acre, empate em 2 a 2.

Naquela oportunidade, como se valorizava o gol fora de casa, o Rio Branco foi desclassificado. Agora, como não existe mais essa história de gol qualificado, se tudo terminar igual, a decisão vai para os pênaltis. O Façanha acha que 13 é um número de sorte, tão vermelho quanto a camisa do Estrelão!

– Agosto de 2022 –

No sufoco

Francisco Dandão

Não assisti ao jogo entre Rio Branco-AC e Pacajus-CE com imagens. Acompanhei pela internet, naquele esquema lance a lance. Independentemente, porém, de como a partida se desenrolou, o certo é que o placar não saiu do zero. E assim, a decisão foi para os famigerados penais.

Quando uma decisão vai para os pênaltis, tudo pode acontecer. Nem sempre vence aquele time que teve o melhor desempenho durante os noventa minutos. Da marca fatal, costuma se dar melhor a equipe cujos batedores demonstram maior controle emocional e mais capacidade de concentração.

Pênalti é tão importante e de tanta responsabilidade que os experts em futebol costumam dizer que deveria ser batidos pelos presidentes dos clubes. Nesse jogo do Rio Branco contra o Pacajus, segundo me disseram, o presidente Valdemar Neto, do Estrelão, já estava pronto para bater o seu.

Ainda de acordo com os meus informantes (leia-se professores Toinho Bil e Joraí Salim), Valdemar Neto só não entrou para bater o quinto pênalti porque isso ensejaria uma atitude semelhante do presidente do time visitante. Mas este não pode realizar a missão fatal por se encontrar contundido.

Então, o jeito foi deixar todas as cobranças com os jogadores que terminaram a partida. Menos mal que os cobradores do Rio Branco (Matheus Nego, Luan, Ciel, Yago e Negueba) converteram os seus chutes. Evandro Gigante, goleiro do time acreano, pegou o chute de Rayro, do Pacajus.

Dessa forma, o Rio Branco se juntou ao grupo de 16 times que jogarão as oitavas-de-final da Série D de 2022. Ou seja, continua alimentando o sonho de subir de divisão no ano que vem. Nessa escalada, é claro, cada vez o negócio vai ficando mais complicado. Mas isso faz parte do processo.

O próximo adversário do Estrelão vai ser o ASA, de Arapiraca-AL. Segundo os meus informantes, mencionados no quarto parágrafo deste texto, fases de mata-mata costumam “feder a chifre queimado”. Quem tiver qualquer sintoma de podridão, se arrebenta mesmo, fica pelo caminho.

O certo é que agora, por enfrentar um adversário que ficou melhor colocado na primeira fase, o Estrelão vai decidir fora de casa. Assim, subtenda-se que a classificação precisa ser encaminhada no primeiro jogo. Tem que valer tudo, até dança de homem com homem e mulher com mulher.

E sem esquecer que o presidente Valdemar Neto precisa estar preparado para qualquer emergência. Segundo eu ouvi falar, o presidente do ASA está treinando exaustivamente as cobranças dali da marca da cal. Provavelmente, vai ser outra vez no sufoco. Mas assim é que é bom. Ou não?

– Agosto de 2022 –

Relatório

Francisco Dandão

Como não estou no Acre e como não quis confiar, dessa vez, nos relatos da mídia tradicional para saber os detalhes do jogo do Rio Branco contra o alagoano ASA, na disputa das oitavas de final da Série D, escalei um espião da minha confiança para assistir ao jogo e me “dar o serviço”.

O espião escalado foi o meu irmão mais novo Antônio Augusto Martins Freire, conhecidíssimo no Bar do Mané com Sono, bem como na pista de atletismo do Tucumã, como Toinho Bil, a quem eu sempre recorro quando quero uma opinião abalizada sobre qualquer assunto aleatório.

Precisei atualizar os conhecimentos do Toinho, uma vez que ele, apesar de apaixonado por futebol, deixou de frequentar estádios desde o final da década de 1970, quando jogava na lateral do juvenil do Juventus e teve um gol anulado pelo auxiliar conhecido pela singela alcunha de Porco Russo.

Pra se ter uma ideia de como o meu mano Toinho Bil estava desatualizado com respeito ao elenco do Rio Branco que disputa a Série D de 2022, ele chegou a me perguntar se o ataque do Estrelão ainda era formado pelo quarteto Evandro, Danilo Galo, Bruno Couro Velho e Roberval.

Respirei fundo e expliquei-lhe que nenhum desses antigos craques ainda estava em atividade. E completei a informação dizendo-lhe que dois dos citados (Evandro e Couro Velho) sequer ainda estavam entre nós. E que, a essa altura, jogam numa seleção de celebridades nos campos celestiais.

Tudo esclarecido, preto no branco, tintim por tintim, o Toinho muniu-se com uma enorme bandeira adornada por uma estrela vermelha, devidamente enfiada numa vara de bambu, e foi para o Florestão pouco depois de meio dia, logo após almoçar uma rabada afogada em tucupi.

Com tanto zelo e conhecimento acumulado, o Toinho Bil me mandou, cedo da manhã de segunda-feira, um relatório completo do jogo, via WhatsApp, com direito a vídeo, áudio e coisa e tal. De acordo com ele, o confronto foi “pau a pau”, mas o Rio Branco teve as melhores chances.

“Rapaz, meu irmão mais velho”, disse o Toinho, “o Rio Branco poderia ter vencido se tivesse um esquema tático que permitisse ações equilibradas por ambos os lados do campo. Mas, ao contrário disso, o que eu vi foi um time torto, teimando em atacar apenas pelo seu lado direito.”

“Quanto ao ASA, o time não é essa Brastemp toda não. Os caras vieram pra empatar. Não mostraram nadica de nada. Montaram um ferrolho e depois que tiveram dois jogadores expulsos passaram a jogar no sistema nove e quinze, só tocando a bola para os lados”, falou e disse o Toinho Bil!

– Agosto de 2022 –

Te pego na volta

Francisco Dandão

País de dimensões continentais, o Brasil obriga os times que disputam os campeonatos nacionais a percorrerem grandes distâncias. E então, para ir de um ponto a outro, não raro, caso as equipes passem de fase, se duvidar, a soma dos percursos pode equivaler a uma (ou mais) volta ao redor da Terra.

Sem contar a questão da logística. Não existem (nem poderia existir) voos que liguem todas as cidades brasileiras. Por conta disso, para se deslocar do ponto A para o ponto B frequentemente um elemento vai e volta nas mais diferentes direções, tal e qual uma biruta maluca ao sabor do vento.

Nesse recente jogo do Rio Branco contra o Pacajus, pelo que eu li nos sites, o Estrelão teve que viver uma verdadeira saga para chegar ao local do confronto, no interior do Ceará, tendo que dormir mais de uma vez (contando a ida e a volta) em uma cidade diferente àquela marcada para o combate.

Nessas situações, não há preparo físico que resista. Para além da bola e da técnica necessárias para ser feliz, entra em campo um planejamento minucioso feito pelos profissionais que atuam nos bastidores das diversas equipes. Um passo em falso e tudo pode desaparecer num buraco negro.

Levando-se em conta todo esse preâmbulo, o empate do Rio Branco contra o Pacajus, em plena caatinga (é isso mesmo?), no meu ponto de vista, foi um resultado excelente. A despeito da possibilidade de vitória que bem poderia ter acontecido, a igualdade no placar ficou “bom demais da conta”.

Agora, para este domingo, 31 de julho, mês que as crônicas históricas antigas dedicam ao imperador romano Júlio César, como se diz na gíria, o negócio vai ser mais embaixo. Quem vai padecer das agruras da viagem vai ser o pessoal do Pacajus. Se duvidar, Bagdá é muito mais pra cá. Bem mais!

Nessa situação, eu não posso deixar de lembrar uma frase usada pelos meninos da minha geração (sim, faz tempo, eu sei), quando queria prometer uma vingança contra um desafeto que havia praticado alguma ofensa (fosse calúnia, injúria, difamação ou porrada na cara mesmo): “Te pego na volta”.

Pegar na volta é tudo que o Rio Branco precisa para eliminar o Pacajus e passar de fase na Série D, em busca de subir um degrau na escada do futebol brasileiro. A escalada é árdua, mas, no meu entender, nada impossível. Pior foi a missão dada a Sísifo, o cara da pedra e da montanha, lembram-se?

Pois então é isso. Acabou ficando um texto cheio de clichês, como não recomendam os melhores manuais de redação. Mas eu não consegui resistir. Se o buraco é mais embaixo e se a gente tem a oportunidade de pegar o desafeto na volta, que assim seja. Eu acredito. Ora se acredito. Acredito sim!

– Julho de 2022 –

Três palitos do jeito que vier!

Francisco Dandão

Como eu disse na crônica anterior, por esses dias ando batendo pernas pelo Rio de Janeiro, a cidade para sempre maravilhosa onde aterros, areias e pedras namoram desde muito antigamente com as ondas do mar. As ondas vão e voltam e os namoradores por ali, impávidos, esperando a hora do beijo.

Estou no Rio e sou tricolor de coração, como todos os homens (e mulheres, ressalte-se) de bom gosto e de boa vontade (vide Nelson Rodrigues, Mário Lago, Manoel Façanha, João Braña e congêneres). Estou no Rio e deveria ter ido ver o Flu jogar em Volta Redonda, no domingo.

Deveria ter ido, mas não fui. Me descuidei apreciando a paisagem da Barra da Tijuca e quando dei por mim percebi que não havia mais tempo hábil para percorrer os 150 quilômetros até o local do jogo. Menos mal que agora, com a magia da televisão, a gente pode ser testemunha à distância.

E então, tal e qual você que lê essas mal traçadas de hoje, em qualquer lugar do planeta, vi por vários ângulos os gols dos “gringos” Arias e Cano, na vitória do Fluzão por 2 a 1. Colômbia e Argentina a serviço do Tricolor das Laranjeiras. Um verdadeiro sincretismo musical: cúmbia, tango e samba!

A propósito, não tenho nenhum pudor por exaltar os colombianos. Além de eles praticarem um futebol de verdadeiro requinte técnico, ainda tratam os brasileiros com toda a fidalguia. Recentemente estive no país dos “cafeteiros” e, aqui pra nós, poucas vezes fui tão bem tratado nas “estranjas”.

Prova disso que eu chamo de requinte técnico foi o passe do Arias para o Cano, colocando o pé debaixo da bola e dando uma levantadinha de leve, só a conta de vencer a zaga adversária e deixa-la à feição para o arremate do atacante. Uma pintura! Lance digno de ser colocado numa moldura dourada!

No que diz respeito aos argentinos, pela costumeira arrogância deles, que se dizem, via de regra, mais europeus do que latinos, esses eu só elogio quando não tenho saída. No caso do Cano, que jogador fantástico! Não tem bola perdida para o sujeito. Um artilheiro como poucos atuando hoje no país.

Por uma razão ou por outra, o certo é que o Fluzão está chegando “nas cabeças”. À frente dele nesta hora só mesmo o Corinthians e o Palmeiras. Mas não muito à frente. Ambos, certamente, já estão sentindo o bafo do Tricolor no cangote. E “se bobear”, como se diz nas rodas, “a gente pimba!”

É isso, criaturas. O próximo show já está marcado. Vai ser contra o Fortaleza, nesta quinta-feira, dia 28 de julho, no Castelão cearense. Nada melhor do que um palco dessa magnitude para dar visibilidade aos artistas tricolores. Dou dois gols de vantagem. Do jeito que vier, são três palitos!

– Julho de 2022 –

Roma e Itacoatiara: dois destinos

Francisco Dandão

Praticamente ninguém no mundo contemporâneo anda sem a companhia de um celular. Esse instrumento se tornou peça indispensável da vida do homem e da mulher modernos. É mais fácil a gente botar o pé na porta da rua sem uma peça íntima do que sem esse adereço de comunicação.

E o mais interessante são as experiências que o aparelho nos proporciona. Seja a de falar com alguém que está no mesmo ambiente (e a gente não sabe, ou sabe e liga só pra ver a reação dele), seja para descobrir que uma criatura está num lugar bem diferente daquele em que deveria estar.

Num dia qualquer dessa semana, eu vivi essa situação de ligar para um amigo que eu pensava estar num lugar e o dito cujo estava em outro totalmente diverso. No caso, o presidente da Federação Acreana de Voleibol, João Petrolitano (o saudoso Campos Pereira só chamava “Petropolitano”).

É que eu havia lido em algum site que o João (ex-cabeça branca, agora mais careca do que uma bola de bilhar) iria chefiar uma delegação de voleibol num torneio na Itália. E então eu tive a ideia de falar pra ele dar uma esticada até ao Vaticano para pedir que o Papa me desse a sua bênção.

Aí eu liguei (pelo WhatsApp, é claro, para evitar o pagamento de uma chamada internacional) e já fui logo de cara tentando misturar palavras do meu português ruim com alguns vocábulos que eu decorei no tempo em que assistia faroestes “spaghetti” com Giuliano Gemma, Franco Nero e outros.

O João me respondeu com um questionamento. Disse ele: – O que é isso, meu chefe, que língua é essa mais doida, o senhor está me estranhando? E eu retruquei: – Estou só treinando o meu italiano, chefia. Aproveitando que a essa hora tu deves estar apreciando as belas pinturas da Capela Sistina.

Depois desse diálogo, eu ouvi uma sonora gargalhada, daquelas engolindo o ar peculiares do Petrolitano. Não entendi nada, até ele me dizer que não estava na Itália coisa nenhuma, mas sim no interior do Amazonas, em Itacoatiara, depois de enfrentar 260 Km de uma estrada cheia de buracos.

Aí veio a explicação para a mudança de roteiro. De acordo com o João, cujos primeiros passos no esporte foram como goleiro do Vasco da Gama, sob o comando do professor Almada Brito, ele trocou Roma por Itacoatiara para prestigiar o aniversário de um neto que mora na cidade amazonense.

É isso. Por conta do celular, eu descobri o paradeiro do meu dileto amigo. Por fim, como nada mais havia a declarar, eu apenas lhe desejei boa sorte com os buracos na viagem de volta, de preferência fazendo uso de um colete cervical… E que comesse uma boa peixada regada a pimenta Murupi.

– Julho de 2022 –

Um apagão e alguns trocados

Francisco Dandão

Como os meus amigos mais chegados sabem, moro no Ceará desde 2015. Aposentei do serviço público federal e me mudei para as terras alencarinas. A mudança, porém, não me impede de acompanhar o futebol do Acre. Mas é certo que vivo mais amiúde as emoções do futebol cearense.

No meu núcleo familiar, a propósito dessas emoções, existem quase em proporções iguais torcedores do Ceará e do Fortaleza. Dessa forma, quando todo mundo se junta, de modo geral em torno de uma boa panelada, regada a alguns litros de cerveja, não raro a discussão se torna polarizada.

Felizmente, como não existe ideologia criminosa pelo meio, a discussão não descamba para ofensas morais ou, muito menos, atentados a tiros contra a vida uns dos outros. E assim, quase sempre tudo termina na mais absoluta gozação (cearense já nasceu “mangando” do mundo). Rsrs.

Nesse domingo passado, por exemplo, quando nos reunimos para assistir ao jogo do lanterna Fortaleza contra o líder Palmeiras, na hora do apagão dos refletores, supostamente por conta de uma falha na rede elétrica do Castelão, não faltaram versões divergentes para explicar o blecaute.

A galera do Fortaleza garantiu que o apagão foi providencial ao Palmeiras. Na opinião dessa turma, embora o jogo já estivesse nos estertores (44 minutos do segundo tempo), o gol do Tricolor do Pici, que o tornaria vencedor da contenda, era só questão de mais alguns poucos segundos.

Já para a galera simpatizante do Vozão, o que aconteceu foi fruto de algum tipo de manobra para impedir que o Fortaleza acumulasse mais uma derrota (no caso, a décima em 16 jogos do Brasileirão da Série A). Para estes, um golzinho do Palmeiras era só questão de mais alguns míseros instantes.

No final das contas, o que a realidade materializou, depois do empate, foi um Fortaleza segurando firme a lanterna da competição (lanterna e apagão, tudo a ver), numa campanha sofrível e impossível de ser prevista uns meses atrás. E doravante pode piorar, já que o Pikachu vai para a Ásia.

Mas nem essa situação desagradável do Fortaleza pode servir muito de gozação para os meus parentes torcedores do Ceará. É que o Vozão, ao ser derrotado pelo Fluminense, no sábado, no Maracanã, e depois de uma combinação de outros resultados, também desceu para a “zona da confusão”.

É isso, meus caros amigos. Se os dois representantes do futebol do Ceará não quiserem morrer abraçados daqui a alguns meses, precisam urgentemente dar um jeito de nadar para longe das pedras da praia de Iracema. Até outra hora. Preciso ir ali assistir a uma aula da gramática árabe!

– Julho de 2022 –

Dois parças

Francisco Dandão

Nos primeiros anos da década de 1970, os clubes acreanos empreenderam um grande movimento de importação de jogadores de outros estados do país. O futebol era, oficialmente, amador, mas o certo é que quase todo mundo pagava os seus craques, principalmente os que vinham de fora.

De modo geral, os “importados” se transferiam para o Acre em condições excepcionais, com direito à “casa, mesa e luz”. Ou seja: com a garantia de lugar para morar e comer, ficando com o salário livre, e tendo como única preocupação treinar todas as tardes e jogar nos finais de semana.

Numa das primeiras levas de importados do Atlético Acreano, em 1972, chegou o carioca Nirval, ponteiro esquerdo de rara habilidade, com passagens por Volta Redonda e Madureira. Aos 19 anos, cheio de gás, Nirval, com os seus dribles, logo ganhou a confiança da galera atleticana.

Dois anos depois, em 1974, ainda em busca de um título que não acontecia desde 1968, o mesmo Atlético foi a Porto Velho buscar um lateral de chute fortíssimo, então jogador do Ferroviário, que atendia pelo pomposo nome de Carlos Magno, mas que veio carimbado pelo apelido de Pintão.

Com pouco tempo de convivência no alojamento do clube, que ficava ali por perto da Gameleira, Nirval e Pintão se tornaram companheiros inseparáveis. Qualquer folga e os dois “parças” se mandavam para a noite quente de Rio Branco para paquerar, dançar forró e tomar umas e outras.

Os dois craques se entendiam perfeitamente, tanto dentro quanto fora de campo. O problema era na hora de pagar as contas, depois das farras, regadas a muito churrasco e inúmeras garrafas de cerveja. Invariavelmente, um queria passar a despesa para o outro. E então dava o maior imbróglio.

Valia tudo para fazer o parceiro ficar no prejuízo, desde o clássico “paga aí que depois eu reponho” (promessa sem nenhuma possibilidade de ser cumprida), passando por providenciais e fingidos desmaios em plena mesa de bebedeira, até a fuga de um dos farristas, num descuido do outro.

Um dia desses, conversando com o Pintão, ele me confidenciou que era especialista em fugas pelos fundos dos restaurantes, deixando o Nirval com a conta nas costas. De acordo com o relato do ex-lateral, o lugar mais fácil de “fugir” era o bar O Casarão, que tinha uma piscina no quintal.

Mas ele (Pintão) me falou que só começou a fazer isso depois que descobriu que o Nirval saía de casa com o dinheiro escondido no sapato. Na hora de pagar a conta, Nirval revirava os bolsos e dizia que estava duro. “Aí, eu não podia deixar o malandro me passar a perna”, disse rindo o Pintão!

– Julho de 2022 –

Yes, it can!

Francisco Dandão

Jogadas doze das quatorze rodadas da primeira parte da Série D do Campeonato Brasileiro de 2022, um dos clubes acreanos envolvidos na disputa está classificado para a fase seguinte e o outro está eliminado. Estatisticamente falando, portanto, o aproveitamento é de 50%. Meio a meio.

Teoricamente, antes de a bola rolar pelo referido torneio, esperava-se muito do Humaitá e pouco do Rio Branco. Isso pelo fato de que no segundo turno do campeonato estadual, o time de Porto Acre havia sobrado na fita, enquanto que o Estrelão saiu meio que se arrastando ao longo dos jogos.

Veja-se que o Humaitá venceu simplesmente quatro dos cinco jogos no referido returno. Perdeu tão somente quando podia perder, na última rodada (1 a 2), num momento em que não mais seria alcançado por ninguém. Ou seja: o chamado Tourão foi campeão com uma rodada de antecipação.

Já o Rio Branco, “deusulive”, conseguiu naquele returno vencer apenas um dos seus cinco confrontos. E essa vitória foi, por assim dizer, contra ninguém, levando-se em conta que o seu oponente derrotado foi o Náuas (3 a 0), que não tirou o dedo das partes pudendas durante o tal turno.

O que sucedeu, porém, foi aquela velha teoria do futebol que fala da mudança entre o céu a e terra de um instante para o outro. Chegou a vez de ser jogado o torneio nacional e eis que o poder do Humaitá foi esvaziado, seja lá quais tenham sido as circunstâncias, e o Rio Branco inflou o peito.

E aí, nessa vibe, tudo se inverteu: o Rio Branco, cuja sede social foi ao chão faz é tempo, reorganizou o seu elenco e venceu sete dos seus 12 compromissos jogados até aqui. Enquanto isso, os chifres do Tourão murcharam e o time de Porto Acre perdeu oito entre os mesmos 12 jogados.

Como eu sou um inveterado e incorrigível torcedor do futebol acreano (louco por louco, eu sou mais eu), acreditando nas causas impossíveis até o limite da insensatez, pra mim tanto o Rio Branco quanto o Humaitá se classificariam de forma até tranquila para a fase seguinte da Série D.

A realidade demonstrou, entretanto, que se eu fosse ganhar a vida como profeta do futebol, não acertaria nada até o final dos tempos. Mais fácil os quatro cavaleiros do apocalipse adiarem a vinda para um futuro que jamais chegará do que eu acertar um prognóstico dessa natureza. Muito mais fácil!

Então, como não se pode retroceder sobre os próprios passos, o jeito agora é esperar que o glorioso Rio Branco continue nessa pegada e vá eliminando os adversários que aparecerem na fase do famigerado mata-mata. Como poderia muito bem dizer um certo Barack Obama: “Yes, it can!”

– Julho de 2022 –

Vinte anos depois

Francisco Dandão

Nessa quinta-feira que recém passou, 30 de junho, se completaram 20 anos desde que a seleção brasileira de futebol conquistou o pentacampeonato mundial, naquela Copa da Ásia, jogada na Coréia do Sul e no Japão. De lá pra cá, o time do Brasil amargou quatro participações meia boca no torneio.

Num hiato de tempo dessa dimensão, normalmente a gente esquece onde estava no momento do acontecimento. Mas eu lembro muito bem. Eu estava em casa, no Jardim Tropical III, em Rio Branco, capital do Acre. Assisti absolutamente sozinho aquela final, como eu sempre gosto de fazer.

Ao contrário da maioria das pessoas que curtem futebol, partidas importantes eu gosto mesmo de assistir sozinho. Isso porque rodeado de criaturas, quase sempre barulhentas, por algum provável desvio psicológico da minha parte, eu acabo me distraindo e não acompanhando como deveria.

E então, por conta daquele meu estado de concentração, eu lembro perfeitamente de alguns detalhes da final em questão. Nem falo dos gols, que esses tem sido mostrados à exaustão. Falo de algumas expressões que eu vi na cara dos “chucrutes”, descendentes diretos do músico Richard Wagner.

Entre essas expressões que eu digo, a do goleiro Oliver Kahn não sai da minha memória. Foram dois gols do Ronaldo Fenômeno em cima daquele sujeito que era considerado uma verdadeira muralha, tido e havido como o carinha que ia parar o ataque brasileiro. Prognósticos totalmente falhos.

O tal Kahn, que foi escolhido o melhor jogador daquele mundial (que injustiça!), pra completar o papelão, ainda bateu roupa no primeiro gol do Fenômeno. Falha feia que eu só havia visto nas peladas no campo do São Francisco, na periferia de Rio Branco, em dia de tempestade daquelas brabas.

Como eu disse anteriormente, eu não gosto de assistir jogos decisivos rodeado de gente. Mas depois, uma vez consumada a vitória, aí eu costumo sair para comemorar. Foi o que eu fiz naquele domingo pela manhã. Aí, com umas doses de álcool na cabeça, o resto eu só lembro em poucos fragmentos.

Foi uma “mistureba” muito doida. Tão doida que eu mentiria se dissesse o que foi que eu tomei. O que eu também não esqueço é a dor de cabeça no fim do dia e na noite seguinte. O que me leva a crer que eu tomei várias doses daquele uísque fabricado nos Estados Unidos do Palheiral!

É por aí. A gente vive de reminiscências. Principalmente das boas reminiscências. E a memória é seletiva. Eu, por exemplo, não lembro de jeito nenhum que anos depois o Brasil pegou de sete a um deles. Isso eu faço questão de não lembrar. Pra mim, essa história é só mais uma lenda urbana!

– Julho de 2022 –

Desencontros e outras paradas

Francisco Dandão

Pelo segundo ano consecutivo um time acreano vai ao Ceará, estado onde eu venho amarrando o meu burrinho desde 2015, para jogar a segunda fase da Série D. E eu, pra não dizer que eu não gosto de falar de flores (tal e qual um certo Vandré), pela segunda vez não estou por perto pra assistir.

Em 2021, como se num jogo de gato e rato, em que o segundo tem sempre que se esconder do primeiro, quando o Galvez viajou para enfrentar o Guarany de Sobral, na partida da volta, eu estava batendo pernas pelo Acre, depois de uma ausência de quase dois anos, por conta da “gripezinha” (Ops!).

Menos mal que eu tive a oportunidade de ser testemunha da partida de ida, jogada na Arena da Floresta, quando o Galvez empatou pelo placar de zero a zero. Assisti ao jogo ao lado do meu afilhado Manoel Façanha e confesso que tive a esperança de que o Galvez poderia se dar bem. Não deu!

No fim das contas, pra falar a verdade, eu acho que foi até bom eu não estar no Ceará para presenciar o jogo decisivo, uma vez que o Galvez levou 2 a 0 no lombo e voltou pra casa eliminado do torneio. Entre ida e vinda, de Fortaleza a Sobral, eu teria gastado quase quinhentos quilômetros de pneus.

Agora, neste ano da Graça de 2022, quando eu soube que o Rio Branco jogaria em Pacajus, na mesma segunda fase que derrubou o Galvez no ano passado, comecei a fazer os meus preparativos para percorrer os pouco mais de 50 quilômetros que separam a Fortaleza mais que bela do referido destino.

Eis então, por força das insondáveis circunstâncias que dão, de vez em quando, uma guinada no nosso destino, justo na semana anterior ao jogo entre Rio Branco e Pacajus, eu tive que alçar voo para outras paragens. Fui para longe outra vez de uma exibição de um time acreano no Nordeste.

Pra ser sincero, porém, não se diga que esses desencontros sempre existiram. Em 2018 eu tive o prazer de ver dois jogos do glorioso Atlético Acreano na citada região. O primeiro, em junho, zero a zero com o Confiança, em Aracaju. E depois, em agosto, vitória sobre o ABC, em Natal.

Ressalve-se, entretanto, que nenhum desses dois jogos do Atlético aconteceram no Ceará. Eu tive que realizar pequenos deslocamentos para presenciar as duas exibições. No Ceará mesmo, minha praia há vários verões (primaveras etc.), eu ainda estou invicto como espectador do futebol acreano.

Menos mal que por esses dias, talvez para compensar o desencontro dos times do Acre em ação no estado do Ceará, eu tenho o prazer de contemplar o mar de intenso verde e o céu de profundo azul da Barra da Tijuca, na zona Oeste do Rio de Janeiro. Não se pode ter tudo. Não mesmo!

– Julho de 2022 –

Três santos e dois amigos

Francisco Dandão

Junho é um mês de muitos festejos. Só dias comemorativos de santos católicos a gente pode citar três: Santo Antônio, São João e São Pedro. E tome forrós animados, quadrilhas cheias de brilho e magia, comidas à base de milho e muita cachaça rolando pelas várias bocas, que ninguém é de ferro.

Santo Antônio ficou famoso pela capacidade de juntar casais. Dizem que tem gente que até amarra a imagem do santo de cabeça pra baixo pra conseguir um par de botas. São João, contam, protege contra dor de cabeça. E São Pedro, esse simplesmente é quem toma conta das chaves do paraíso.

Mas essas informações são do conhecimento de (quase) todo mundo. Então, eu deixo de falar dos três santos para lembrar de dois diletos amigos que fazem aniversário neste mês festivo de junho: o ex-lateral Paulo Roberto (no dia 11); e o jornalista e meu afilhado Manoel Façanha (no dia 22).

Paulo Roberto, que nasceu em Sena Madureira, em 1958, e se mudou criança para a capital, indo morar nas imediações do campo do Vasco da Gama, foi um cracaço pelo lado direito do campo, defendendo três clubes na sua carreira, entre 1979 e 1988: Rio Branco, Juventus e Independência.

E já na sua temporada de estreia no time principal do Rio Branco, aos 20 anos, integrando um elenco de jogadores famosos do futebol acreano (Illimani, Cleiber, Tião, Mário Sales, Mário Vieira etc.), ele já conquistou três títulos: Copão da Amazônia, Campeonato Acreano e Torneio do Povo!

Logo depois de pendurar as chuteiras, Paulo Roberto foi convidado para dirigir as categorias de base do Rio Branco. E na sequência assumiu o time principal. De lá para cá, ele se firmou como treinador e já contabiliza no currículo vários trabalhos vencedores nos mais diversos clubes do Acre.

Façanha, por sua vez, que nasceu em Xapuri, em 1970, cresceu no bairro da Estação Experimental, batendo peladas dia sim e outro também no campinho denominado Maracutaia. Baixinho, rápido e enjoado, ele até tratava a bola com jeito. Mas o destino tratou de desviar o seu caminho.

E então, lá pelas tantas (em maio de 1996), pelas mãos do jornalista Raimundo Fernandes, ele entrou na redação do jornal O Rio Branco na condição de repórter esportivo. Pode-se dizer que foi um casamento para a vida. Já lá se vão, desde então, quase 30 anos de militância nessa atividade.

Para minha sorte, eu tenho o privilégio de gozar da amizade dessas duas criaturas, figuras do mais absoluto destaque no futebol acreano. O Paulo eu conheci quando integramos o time infantil do Independência, em 1971. O Façanha eu conheci nas entrelinhas das muitas matérias. Vida longa aos dois!

– Junho de 2022 –

Malandragens e que tais

Francisco Dandão

Depois de ler a minha crônica sobre a confraria etílica formada por jogadores que batiam ponto no Boteco do Mané com Sono, recebo uma ligação do Toinho Bil para me lembrar de dois outros fatos protagonizados por “atletas malandros”, pra cima do saudoso presidente Almada, do Vasco.

Um dos fatos diz respeito a um atacante do Time da Fazendinha, na segunda metade da década de 1970, que todos as sextas-feiras, depois do último treino da semana, aparecia com uma receita médica nas mãos pedindo ao presidente um dinheirinho extra para comprar os remédios prescritos.

Na sua santa ingenuidade, e por ter muitas tarefas para dar conta, inclusive as providências para os jogos dos finais de semana, o professor Almada nem conferia o que estava escrito no pedaço de papel apresentado pelo seu jogador. Simplesmente metia a mão no bolso e dava a grana.

Sorridente, o “atleta”, que era tido como um atacante perigoso, daqueles de partir pra cima dos laterais (ôpa, dei uma pista!), saía direto da Fazendinha para o Boteco do Mané com Sono, onde o dinheiro dos “remédios” era transferido para a caixa registradora do estabelecimento.

Essa história, de acordo com o Toinho Bil, durou vários meses. Só deu problema quando o papel apresentado pelo craque começou a se desfazer e as letras da receita tornaram-se quase ilegíveis. A trama teve fim no dia em que o professor Almada resolveu botar os óculos na cara e não leu foi nada.

O outro fato, sempre de acordo com a narrativa do Toinho, um dos meus maiores informantes dos bastidores da bola acreana, aconteceu com um também atacante, mas este vindo do interior do estado, depois de uma temporada de artilharia em campeonatos suburbanos e de fundo de quintal.

Acontece que o tal artilheiro era acostumado a jogar descalço. Quando chegou à Fazendinha e foi obrigado a calçar uma chuteira (pra piorar, cheia de pregos), o sujeito praticamente quase nem andou. O técnico do Vasco à época lhe deu uma semana para mostrar serviço, mas não saiu nada.

Reprovado nos testes, o atacante foi dispensado. Mas entendeu que não voltaria pra casa. Surgiu, então, um problema: como fazer para comer, uma vez que não estando mais sob a responsabilidade do Vasco, lhe foi cortado também o direito à alimentação, feita numa birosca do mercado?

Aí o carinha bolou uma saída. Escreveu do próprio punho um bilhete para a mulher da birosca, como se fosse o professor Almada. Teor da peça literária: “Dona minina der cumida para o rapaize acina prufeçor Omada”. Claro que o bilhete não passou na censura e o sujeito teve que “pegar o beco”.

– Junho de 2022 –

Confraria etílica

Francisco Dandão

Nos tempos do amadorismo (“marrom”, ressalte-se) do futebol acreano, não é segredo pra ninguém que boa parte dos artistas da bola gostava de tomar umas e outras, nas folgas dos jogos. Uns mais, outros menos, é verdade, porém o certo é que são incontáveis os nomes dessa lista.

O Neivo, por exemplo, ponteiro driblador que vestiu as camisas de todos os então grandes clubes do Acre, até me contou uma história de que, certa feita, quando ele defendia o Rio Branco, o presidente da vez chegou a oferecer um litrão de uísque boliviano como “bicho” por uma vitória.

De acordo com o Neivo, nesse dia os jogadores escalados para a defesa do Estrelão correram como nunca o haviam feito antes. E daí por diante, descobertas a pólvora e a roda, passou a ser obrigação da direção do alvirrubro ofertar o litrão de uísque como prêmio para cada triunfo da equipe.

E o Merica, quando jogava pelo mesmo Rio Branco, me disse que o presidente do clube, que morava em frente ao estádio José de Melo, costumava chama-lo para uns drinks na sua própria casa, entendendo que, dessa forma, poderia exercer melhor vigilância sobre o vigoroso volante.

Com aquele sorriso no rosto que o Merica sempre ostentou, ele me confidenciou que as festas na casa do presidente eram uma maravilha. E que aceitava os convites de muito bom grado. Mas completou a informação dizendo que, depois da festa, ele sempre dava um jeito de esticar a noitada.

Mas essas são histórias que eu já contei por aqui em algum momento. O que eu não sabia (e por isso ainda não havia passado pra vocês) era a história de uma certa “confraria etílica” que existia nas proximidades do estádio do Vasco, num local denominado como Boteco do Mané com Sono.

Quem me relatou a novidade dessa confraria foi o meu amigo de longas datas, poeta e cronista dos melhores, Francisco Antônio Saraiva de Farias, autor, entre outros, dos livros “Na estrada com meu pai”, “Escolhi viver de amor”, “Menino de seringal” e “Coronavírus – A negação da vida”.

De acordo com o Saraiva, pelo Boteco do Mané com Sono transitaram, durante anos, os mais renomados boleiros acreanos. Caso dos parceiros inseparáveis Bico-Bico e Escapulário, do volante Merica (já devidamente citado neste texto), do lateral Duda (nunca tomou uma) e do zagueirão Lécio.

Saraiva detalhou até os tira-gostos preferidos dos craques. Quitutes que iam de lascas de rapadura, passando por caldo de tucupi, até farofa de jabuti. Destaque para o Bico-Bico e o Escapulário, que gostavam de tirar gosto com jabá e, disse o Saraiva, sempre andavam com uma fatia no bolso.

– Junho de 2022 –

Estatística

Francisco Dandão

Todas as semanas, depois de cada rodada, consulto um site especializado em estatística para ver a quantas andam as chances de classificação do Rio Branco e do Humaitá à próxima fase da Série D. E a cada semana, logicamente, dependendo dos resultados, os números mudam.

Neste momento, faltando cinco rodadas para o término da fase de grupos, de acordo com o site, o Rio Branco, que soma 17 dos 27 pontos disputados, detém 96% de chances de ir ao estágio seguinte da competição. Ou seja, vai precisar ser muito ruim mesmo para deixar essa vaga escapulir.

Se a gente considerar que o jogo deste final de semana do Estrelão vai ser contra o lanterna Náutico-RR, então, pode-se deduzir que esse percentual vai subir alguns degraus. Afinal de contas, o time roraimense não venceu nenhuma até o presente instante. Perdeu sete das nove partidas jogadas.

Em futebol, a gente está cansado de saber que não se ganha nada de véspera. Esse jogo do Rio Branco contra o Náutico, porém, no meu entendimento, não tem nenhuma chance de dar algum resultado diferente que não seja uma vitória do time acreano. Absolutamente chance nenhuma!

No lado oposto da estatística se encontra o Humaitá, campeão acreano de 2022, mas que sofreu um desmanche no elenco para a disputa da Série D. O Tourão anda com os chifres apontados para o chão e as suas probabilidades de passar de fase são de somente 0.7%. Praticamente nada, por assim dizer.

Se nós levarmos em conta que o próximo jogo do Humaitá é fora de casa (escrevo na manhã de sexta-feira, mas pode ser que este texto seja publicado após a partida), e contra uma equipe que ainda luta pela classificação (o São Raimundo-RR), então a situação é bem complicada.

Esses 0.7% de chances que a estatística concede ao Humaitá, traduzindo-se em linguagem médica, é o mesmo que dizer que um paciente está na UTI respirando por aparelhos. Falta apenas um sopro para que a criatura dê adeus à vida, embora a esperança possa sempre estar presente.

É claro que os dados estatísticos são apenas um retrato de um momento. E às vezes enganam, dependendo de quem os esteja analisando. Um copo com líquido pela metade pode estar meio cheio (para o otimista) ou meio vazio (para o pessimista). Mas devem sim ser levados em conta.

Pela mais fria lógica (que a zebra não me ouça), e segundo a estatística, Amazonas, São Raimundo-AM (salve, Aderbal Lana) e Rio Branco já estão na fase seguinte do Grupo 1 da Série D de 2022. A quarta vaga ainda depende de uma briga de foice no escuro, com melhores chances para o Trem-AP.

– Junho de 2022 –

Morte na praia

Francisco Dandão

No momento em que cometo este texto, manhã de terça-feira, resta uma vaga a ser preenchida para a Copa do Mundo do Catar, em novembro deste ano. Uma decisão nervosa entre Costa Rica e Nova Zelândia. Eu poderia escrever depois do jogo, mas eu sou chegado numa adivinhação.

E assim, por conta desse meu gosto extravagante de tentar antecipar o que virá no futuro imediato, eu digo que vai dar Costa Rica. Mas é só uma premonição mesmo, sem base acadêmica ou científica alguma. Talvez eu ache isso por conta da proximidade geográfica nossa com o país deles.

Ademais, levando em conta que o glorioso Peru amoleceu (sem trocadilho) segunda-feira para os australianos, nada mais justo do que acreditar no equilíbrio da balança planetária, torcendo para que os costarriquenhos sejam mais um país aqui dessas imediações a se fazer presente na Copa dentro de alguns meses.

Na minha cabeça cada vez mais pirada, aliás, a vaga do Peru ia ser uma “barbada” (como se costuma dizer na linguagem do turfe). Os caras fizeram ótimos jogos nas eliminatórias da América do Sul, ficando em quinto lugar, à frente de seleções tradicionais, como Colômbia, Chile e Paraguai.

Mas aí, como em futebol não se ganha nada de véspera, na hora da decisão, o Peru demonstrou que não era tão duro assim como parecia. Se enrolou todo, pegou um nó dos australianos, foi incapaz de furar a retranca lá dos cangurus e sofreu a desclassificação na cobrança das penalidades.

Depois de tudo o que a sua seleção fez, penso que a sensação dos torcedores peruanos é a de uma morte na praia, após atravessar as mais violentas ondas de um oceano revolto. Bastava um único tiro. Era jogar a vida. O tiro foi de pólvora seca. E a vida ficou para daqui a quatro anos.

Por falar nessas decepções dos torcedores cujos times não conseguiram se classificar para a próxima Copa, um dia desses, quando eu estive batendo pernas pela Colômbia, pude constatar a opinião dos “cafeteiros” pela exclusão da sua seleção dessa festa maior do futebol.

Existe uma espécie de senso comum na opinião deles de que o seu país, junto com o Brasil e a Argentina, reúne os maiores futebolistas das Américas. E provam isso citando vários nomes, sempre tendo em primeiro lugar o cracaço James Rodriguez. E então, por que não vão à Copa?

O que eles me disseram é que, apesar de toda a técnica dos seus jogadores, o ambiente na seleção nunca foi dos melhores, com muita gente de salto alto e desentendimentos entre as maiores estrelas. E, como um time de futebol tem que estar sempre coeso, então, o destino da vaca foi o brejo!

– Junho de 2022 –

Posições distintas

Francisco Dandão

Rio Branco e Humaitá, os dois representantes acreanos na Série D, encontram-se neste momento em posições diametralmente opostas na tabela de classificação. Enquanto o Estrelão está lá em cima, na vice-liderança, o Tourão permanece no penúltimo lugar, à frente apenas do Náutico-RR.

Como o tempo não costuma parar (ou, dizendo de outra forma, “não para de jeito nenhum”), eis que chega mais um domingo onde tanto um como o outro têm nova chance de alterar as respectivas situações. O Estrelão pode subir para a cabeça e o Humaitá pode se afastar da rabada onde se encontra.

Não vai ser fácil, eu sei muito bem. O Amazonas, adversário do Rio Branco é, simplesmente, o líder do grupo. O time amazonense venceu cinco e empatou três dos seus compromissos. E, para complicar, o jogo vai ser na casa deles. Ou seja, tudo a favor dos comedores de jaraqui, tambaqui etc.

No turno, aliás, lembrando o passado recente, em jogo disputado no estádio Florestão, Rio Branco e Amazonas empataram em 2 a 2. Sendo que o time acreano perdia até aos acréscimos do segundo tempo. Não fosse o “gigante” goleiro do Rio Branco ir ao ataque, a vaca poderia ter ido ao brejo.

Gol de goleiro é sempre um barato. O cara está em campo, literalmente, para barrar os atacantes adversários. Se extrapola as suas funções e vira goleador, então, eu penso que o “bicho” desse sujeito deveria ser dobrado. Goleiros artilheiros são raros na história do futebol mundial.

Quanto ao Humaitá, embora o confronto contra o Trem seja em casa, ressalte-se que o time amapaense vem crescendo na competição. Em princípio, dados alguns tropeços, parecia que os amapaenses seriam meros figurantes na “série”. Mas, depois, os caras resolveram pegar um elevador.

Tanto pegaram um elevador que sapecaram a maior goleada da competição, na última rodada: 10 a 2 no incauto Náutico. Quando eu vi o resultado, cheguei a pensar que havia sido uma partida de futsal… Ou handebol… Ou um jogo entre um time profissional e outro dente de leite!

O placar desse jogo foi tão inusitado que gerou até um Boletim de Ocorrência do presidente do time derrotado, sob a suspeita de manipulação de resultado. Pode ser, pode não ser. Eu é que não me arrisco a dizer, baseado naquele pensamento de que “macaco velho não põe a mão em cumbuca”.

O fato é que esse Trem de agora parece ser movido a energia nuclear, diferentemente daquele que iniciou o campeonato, que tinha que pegar no tranco. Mas o Humaitá é Touro, bicho que só se entrega quando o toureiro lhe enfia umas espadas nas costelas. Me arrisco a dizer que vai dar Humaitá!

– Junho de 2022 –

Do Acre para a Libertadores

Francisco Dandão

Escrevi um dia desses sobre os números do torneio Libertadores da América. Mas eu não disse nada de novo naquele texto. Tudo o que eu fiz foi compilar umas informações de sites da internet e dar uma organizada, principalmente nas diferenças de desempenho entre brasileiros e argentinos.

Volto agora ao assunto para ressaltar um detalhe que a maioria não deve saber. O de que dois jogadores do futebol acreano disputaram a competição na década de 1970. No caso, o volante Tadeu Belém e o meia armador Bolinha, ambos defendendo o time boliviano do Jorge Wilstermann.

Tanto o Tadeu quanto o Bolinha nasceram no estado do Amazonas. O primeiro, em Parintins, no dia 8 de março de 1951. E o segundo, em Lábrea, no dia 26 de fevereiro de 1952. Mas, apesar dessa origem, ambos jogaram a maior parte das suas carreiras em clubes acreanos do tempo do amadorismo.

Bolinha foi o primeiro a migrar para o Jorge Wilstermann. Depois de jogar, sucessivamente, por Nacional-AM, Ferroviário-RO, Juventus-AC, Independência-AC e Atlético-AC, entre os anos de 1969 e 1974, Bolinha migrou para a boliviana cidade de Cochabamba para jogar a Libertadores.

Embora os bolivianos fossem fascinados pelo canhoto Bolinha, ele só ficou alguns meses por lá, no segundo semestre de 1974. É que o Jorge Wilstermann pegou logo de cara o Boca Juniors, da Argentina. E aí, veio a desclassificação prematura. Com isso, o elenco foi totalmente desmontado.

Tadeu, por sua vez, subiu o morro para Cochabamba em janeiro de 1977. Ele havia se transferido da Rodoviária amazonense para o Rio Branco no final de 1973. Depois de três temporadas vencedoras, veio o convite irrecusável para jogar a Copa Libertadores pelo Jorge Wilstermann.

A mudança de Tadeu do Rio Branco para a Bolívia, inclusive, se constituiu na maior transação financeira de um jogador do futebol acreano daqueles tempos. Os bolivianos pagaram um valor tão significativo que rendeu até uma matéria na revista Placar. Uma fábula para aquela época!

A aventura do elegante volante amazonense/acreano, porém, tal e qual do seu antecessor Bolinha, durou pouco tempo: somente quatro meses. A desclassificação do time da Copa Libertadores e a contratação de um treinador argentino provocaram uma troca quase absoluta dos jogadores.

De qualquer forma, ainda que sem avançar na competição continental, o Tadeu e o Bolinha acrescentaram esse feito aos seus respectivos currículos. Além deles, que eu me lembre nesse momento, o outro acreano na Libertadores é o Weverton, goleiro do Palmeiras. Mas aí é outro papo!

– Junho de 2022 –

O ataque dos pesadelos

Francisco Dandão

Um dia desses eu estava assistindo a um programa na televisão sobre os mais incríveis gols perdidos pelos diversos atacantes mundo afora. Lances bizarros, ora pela falta de carinho entre os atletas e a bola, ora por conta de alguma intervenção estranha, como, por exemplo, um defeito no gramado.

Muitas das situações, de tão impossíveis, mais pareciam obras do tal “Sobrenatural de Almeida”, personagem criada pelo impagável e genial cronista Nelson Rodrigues, usada quando este queria externar qualquer coisa sem explicação. Eram gols perdidos do tipo “até a minha avó teria feito”.

Aí, vendo aquelas esquisitices do mundo da bola, eu passei a me lembrar de umas quantas vezes que eu fui testemunha ocular (ao vivo e em cores), de carne e osso, entre as décadas de 1960 a 1980, desses gols perdidos no retângulo de jogo do vetusto Stadium José de Melo, na capital do Acre.

É verdade que no futebol acreano daquela época existiam artilheiros mortais… Nemetala, Paulinho Rosas, Madureira, Danilo Galo, Antônio Júlio, Antônio da Loteca, Bebé, Jangito, Touca, Bico-Bico, Julião, Irineu, Rui Macaco… Uma turma boa. Mas também existiam outros nem tanto assim.

Nessa vibe dos atacantes que perdiam mais gols do que faziam, eu lembrei de três nomes: o Amenu, que passou a carreira toda defendendo o Andirá; o Goiaba, que desistiu de chutar a bola depois de uma passagem pelos juvenis do Rio Branco; e o Baroninho, que vestiu a camisa de Andirá e Floresta.

Do Amenu, o lance que eu mais me lembro foi de um jogo contra o Atlético. Recebendo um lançamento, ele se viu à frente do goleiro adversário. Aí, tocou de lado e ficou na cara do gol. Sob aplausos, ele se virou e acenou para a galera. Nisso, a bola escapou e saiu pela linha de fundo.

Já o Goiaba, o lance insólito aconteceu numa manhã de domingo chuvosa, quando o time adversário faltou. Escalado para a formalidade de “bater o centro”, ele resolveu percorrer o campo e fazer o gol. Mas escorregou na hora de chutar, mandando a bola para fora e caindo na lama.

No que diz respeito ao Baroninho, um dia ele apostou com um goleiro que faria um gol de calcanhar. A oportunidade surgiu quando da marcação de um pênalti a favor do seu time. Ele até tentou cumprir o prometido, mas a bola saiu tão fraquinha que o goleiro fez a defesa com as nádegas!

Amenu, Goiaba e Baroninho jogavam, respectivamente, como ponteiro-direito, centroavante e ponteiro-esquerdo. Não tenho informações se os três jogaram juntos num mesmo time. Teria sido interessante vê-los defendendo a mesma camisa. Teriam formado o “ataque dos pesadelos”.

– Junho de 2022 –

Eles, os técnicos

Francisco Dandão

         Dois jovens técnicos e ex-atletas do futebol acreano, que por coincidência jogavam na mesma posição (volantes), comemoram idade nova neste mês de junho: Melquisedeque Resende de Brito, o popular Kinho Brito, no dia 6; e José Marco Rodrigues, o conhecido Zé Marco, no dia 16.

         Nascido em Nova Iguaçu-RJ, em 1986 (se mudou para o Acre em 1991), Kinho vestiu dez camisas, entre a base e os profissionais, de 1997 a 2019. A saber: Juventus, Vasco-AC, Portuguesa (PR), Aurora (Guatemala), Atlético Acreano, Rio Branco, Andirá, Galvez, Adesg e Independência.

         Jogando sempre em times que brigavam pelo posto máximo das competições, Kinho foi um atleta vencedor, conquistando vários títulos. Acho que cinco: um na primeira divisão (Rio Branco, 2015) e quatro na segunda (Andirá, 2011; Galvez, 2012; Vasco, 2013; e Independência, 2017).

         No final de 2019, embora estivesse com apenas 33 anos e em plena forma física, Kinho entendeu que chegara a hora de pendurar as chuteiras. Mas não de largar de vez o futebol. E então, de forma imediata, ele virou técnico, dirigindo nesses três últimos anos duas equipes: Andirá e Galvez.

         O Zé Marco, por sua vez, que nasceu no município rondoniense de Rolim de Moura, e que também se mudou com a família para o Acre ainda na infância, defendeu as cores de nada menos do que 11 clubes de seis estados diferentes: Acre, Amazonas, Rondônia, Paraná, Paraíba e São Paulo.

         Foram 15 anos de muita bola, na maioria das vezes como volante, mas também como meia ou lateral, nos seguintes times: Pinheiros-RO; Rio Negro, Grêmio Coariense e Fast (AM); Irati-PR; Campinense-PB; Penapolense e Grêmio Capivariano (SP); Juventus, Atlético e Rio Branco (AC).

         Zé Marco ganhou muitos títulos, mas ele gosta de citar três como os mais emocionantes e emblemáticos: o do campeonato amazonense pelo Rio Negro, em 2001; o da primeira fase do campeonato paranaense pelo Irati, em 2002; e o do campeonato paulista da Série A3, pelo Penapolense, em 2011.

         E da mesma forma como aconteceu com Kinho Brito, a profissão de treinador caiu nas mãos de Zé Marco tão logo ele pendurou as chuteiras. Assim, de 2014 até hoje, ele já esteve no comando de cinco times: Atlético Acreano, Princesa do Solimões-AM, Galvez, Força e Luz-RN e Fast-AM.

         Eu cansei de ver esses caras exibindo as suas habilidades nos gramados acreanos. Eles eram volantes combativos, mas não abriam mão dos toques refinados com a bola nos pés. Tomara tenham como treinadores tanto sucesso quanto tiveram enquanto atletas. Sucesso e vida longa aos dois!

– Junho de 2022 –

Remédio milagroso

Francisco Dandão

         Um dia desses, quando da passagem para outra dimensão do grande massagista Jacinto Ferreira da Silva, eu teci alguns comentários aqui neste mesmo espaço sobre o quanto este personagem era competente para recuperar em tempo recorde jogadores de futebol gravemente contundidos.

         Os depoimentos nesse sentido são inúmeros. Os caras se contundiam num domingo (distensões musculares ou pancadas) e o primeiro diagnóstico era o de que passariam uns dois meses “no estaleiro”. Aí o Jacinto entrava em ação e os contundidos voltavam a campo no fim de semana seguinte.

         Não se tratava de coincidência, muito menos de algum anestésico de última hora aplicado (ou passado) no local da contusão, para mascarar a dor dos craques. Não, nada disso. O Jacinto curava os caras de verdade mesmo. No espaço de sete dias, parecia que nem havia acontecido coisa alguma.

         Mas tudo isso que eu disse aí atrás só vale para contusões. Se a situação fosse outra, o Jacinto tinha sim os seus “truques” e não os revelava pra ninguém. Um desses “truques”, só descoberto anos depois da prática, ele o fazia com os atletas que chegavam bêbados ou de ressaca na concentração.

         Foi o caso, de acordo com o relato do ex-atacante Lula, do Independência, na segunda metade da década de 1970, do dia em que o lendário ponteiro-direito Bico-Bico, cracaço que odiava ver uma garrafa de cachaça cheia, se apresentou para um jogo com a cabeça cheia do “mé”.

         O Lula, que fora contratado a peso de ouro e jogava na mesma posição do Bico-Bico, já estava escalado como titular naquele dia. Estava escalado, devidamente massageado e uniformizado com a camisa número sete, dando vários piques sem sair do lugar, para ir soltando a musculatura.

         Segundo a narrativa do Lula, quando o Bico-Bico chegou “paulado” de cachaça, o técnico Walter Félix de Souza, vendo que o seu atleta não tinha a menor condição de entrar em campo daquele jeito, acionou o massagista dizendo: “Jacinto, cuida disso. Dá um banho daqueles aí no Bico-Bico”.

         Pensamento do Lula no momento da ordem disparada pelo Té: “Esse aí [o Bico-Bico], do jeito que ele está, cambaleando e cantando músicas de carnaval sem qualquer coordenação, não joga hoje nem com quinhentos banhos, seja desses ou daqueles. Essa camisa sete hoje ninguém me toma.”

         Meia hora depois o Bico-Bico estava “zerado” e o Lula teve que entregar a camisa ao novo titular. O Lula não acreditava no que estava vendo. Como é que um banho podia recuperar um cara daquele jeito? Só anos depois o Lula descobriu que o banho incluía uma injeção de Glucoenergan.

– Maio de 2022 –

Números da Libertadores

Francisco Dandão

         Nos últimos três anos (2019, 2020 e 2021), só tem dado os times brasileiros na Copa Libertadores da América, torneio que reúne os principais times da América do Sul (houve uma época que os times mexicanos também disputavam o torneio). Superioridade total aqui dos antigos tupiniquins!

         Em 2019, o Flamengo superou o argentino River, numa final jogada em Lima, a sempre aprazível capital dos peruanos. Foi uma vitória épica da urubuzada, levando-se em conta que os argentinos saíram na frente. Como o jogo só acaba quando termina, os brasileiros viraram para 2 a 1, no final.

         Em 2020, numa decisão entre os times brasileiros do Palmeiras e do Santos, jogada no Maracanã, melhor para o Verdão paulista. Jogo disputado palmo a palmo, o Palmeiras levou o título com o gol de um reserva. O Palmeiras era, sim, melhor, mas o Santos tratou de vender caro a derrota.

         Quando chegou 2021, novamente dois times brasileiros fizeram o confronto derradeiro. Aí foi a vez do Palmeiras superar o Flamengo, com um gol improvável do Deyverson, atacante de escassos recursos técnicos, depois de uma falha grotesca do meio campista rubro-negro Andreas Pereira

         Apesar dessa hegemonia recente, porém, ainda é considerável a distância no número de títulos conquistados entre brasileiros e argentinos. A turma do samba, da praia e do verão soma 21 conquistas, enquanto o pessoal do tango, do Papa e do nariz arrebitado soma 25 taças levadas pra casa.

         Quer dizer, para os brazucas empatarem o game com os portenhos, vai ser necessário vencer direto até 2025. Fato que, convenhamos, apesar de não ser impossível, dado o potencial técnico apresentado hoje por Palmeiras, Flamengo e Atlético Mineiro, também não pode ser considerado nada fácil.

         Já em número de títulos por clube, tão cedo não haverá uma equiparação. Os times que mais vezes venceram pelo Brasil foram Santos, São Paulo, Grêmio e Palmeiras (três títulos cada). Enquanto isso, o Independiente lá deles soma sete troféus. O Boca Juniors venceu seis vezes!

         De acordo com versões correntes por aí, essa diferença em números de títulos em favor dos argentinos só existe porque os brasileiros no início da competição não lhe davam muita importância. Mas não acredito nisso não. Se fosse assim, o Santos não teria sido campeão em 1962 e 1963.

         É isso. Neste ano da Graça de 2022, tudo ainda está em aberto, embora já despontem alguns favoritos. No momento em que cometo essa crônica, o Palmeiras tem passado a carruagem por cima dos adversários. Mas ainda é tempo da fase de grupos. No mata-mata é que a onça gosta de beber água!

– Maio de 2022 –

Segue o jogo

Francisco Dandão

Foi uma rodada perfeita para os clubes acreanos essa quinta da série D, jogada no fim de semana passado. O Rio Branco deu um sacode no roraimense Náutico, lá na casa dos caras (4 a 1) e o Humaitá (aleluia!!!) tirou o dedo daquele lugar e venceu a primeirinha (2 a 1 no São Raimundo-RR).

Agora, como o tempo não para, eis que se aproximam novos desafios: o Humaitá, também conhecido nas melhores rodas de boleiros como “Tourão de Porto Acre”, encara o Trem, na bela e aprazível Macapá. E o Rio Branco, cujo símbolo é um “Estrelão”, joga a liderança do Grupo 1 com o Amazonas.

No meu entendimento (no mais das vezes equivocado, mas vá lá que seja), dá pra vencer as duas. O Trem, adversário do Humaitá, até aqui não ganhou de ninguém. Em cinco exibições, levou três lapadas e somente empatou duas. E o Rio Branco, pode muito bem aproveitar o fator casa.

Além do mais, o Humaitá ganhou dois reforços nos últimos dias: o técnico Álvaro Miguéis, conhecedor profundo das dificuldades da Série D, tanto que já fez subir o Atlético em anos anteriores; e o atacante Fabinho, que foi o artilheiro do time no campeonato acreano e que estava suspenso.

Do glorioso Trem não tenho notícias detalhadas sobre eventuais reforços ou baixas. Também não tenho informações sobre qual é o combustível que move a referida locomotiva. Não sei se ela é movida a lenha, carvão, óleo diesel, energia nuclear ou na base do empurrão mesmo.

Nenhuma dessas possibilidades de combustível, porém, parece assim tão confiável. Se a locomotiva for movida à lenha ou carvão, o problema é com o meio ambiente. Se for óleo diesel, com o preço nas alturas, não chega ao fim da partida. E no empurrão, aí vai ter que ter muito preparo físico.

Quanto ao Rio Branco, pra fazer com que a sua estrela brilhe de forma a cegar os adversários (principalmente o goleiro lá deles), eu penso que a melhor estratégia e não deixar chegar ao Acre nenhum quilo de jaraqui ou sanduiche “caboquinho”, as comidas preferidas de amazonense que se preza.

Em vez disso, se for possível dar um pitaco no cardápio dos visitantes, creio que poderá ajudar servir-lhes iguarias como uma suculenta feijoada, ou uma gordurosa panelada, ou uma “jabutizada” no leite de castanha. Tudo isso misturado com boas toneladas de farinha d’água e pimenta murupi.

E para fechar esse papo aranha de hoje, chamo a atenção para o dia dos jogos. O do Rio Branco e Amazonas vai ser sábado, justo o dia em que Deus descansou depois da criação. E o do Humaitá contra o Trem vai ser na segunda-feira, conhecido como o dia mundial da preguiça. Segue o jogo!

– Maio de 2022 –

Detalhes de bastidores

Francisco Dandão

Eu já disse, mas não faz mal repetir: os bastidores do futebol estão cheios de histórias interessantes que a gente, de modo geral, não sabe nunca. Um dia desses eu li um livro bem esclarecedor sobre esse tema. Título: “50 anos por dentro do futebol”, escrito pelo falecido professor José Teixeira.

O professor Teixeira foi o pioneiro da preparação física nos clubes brasileiros, na década de 1950, quando foi trabalhar no São Paulo. Até então, não havia profissionais dedicados a essa atividade nos clubes. De modo geral, eram os treinadores dos times que orientavam o “aquecimento”.

De preparador físico, Teixeira passou aos cargos de técnico/supervisor e tudo o mais que se pode listar de atividades num clube. Para vocês terem uma ideia da importância e capacidade reconhecida desse personagem, basta dizer que ele atuou em 19 clubes, sendo 14 no Brasil e cinco no exterior.

Pois o livro dele, que eu citei no primeiro parágrafo, é um primor de histórias de bastidores do futebol, tanto brasileiro quanto estrangeiro. Situações que a gente nem imagina que podem acontecer para que um time entre em campo. Detalhes que podem levar uma equipe ao sucesso ou não.

Naturalmente, agora deixando de lado as peripécias do ilustríssimo professor José Teixeira (prometo contar mais sobre o livro numa outra oportunidade), muitas das histórias de bastidores dizem respeito a trapalhadas ou descuidos, seja de dirigentes, corpo técnico ou jogadores.

É muito comum, por exemplo, jogadores que viajam de avião pela primeira vez não saberem como se portar durante o voo. Existem diversos relatos de “craques” que não conseguem atar o cinto de segurança, ou então, instigados pelos colegas de clube, que querem pagar o serviço de bordo.

Um dia desses, eu soube de duas dessas historinhas vividas por jogadores do futebol acreano. Uma delas me foi contada pelo Ismael Campelo, ainda em plena atividade como atacante do Plácido de Castro. A outra me foi contada pelo ex-jogador Dim, sobre um colega de nome Vela.

O Ismael disse-me que quase morre de sede num aeroporto, na primeira vez que viajou de avião. É que ele pediu no bar uma Coca-Cola e lhe foi entregue um copo fechado, com uma abertura para botar um canudo. Ismael só descobriu como beber quando o irmão Joel foi em seu socorro.

E o Vela, lateral do Atlético na década de 1980, de acordo com o Dim, ele conseguiu viajar para um Copão da Amazônia, em Macapá, sem documentos. Distraído, Vela só se deu conta do esquecimento quando foi escalado. Mas não pode jogar e quase apanhou do técnico Roberto Araújo.

– Maio de 2022 –

Bicho em extinção

Francisco Dandão

Olhando os recentes resultados da Copa do Brasil, quando nenhum time ranqueado em posição inferior conseguiu passar pelos seus adversários, eu sou tentado a pensar, diferentemente do que eu escrevi um dia desses, que a zebra é um bicho em pleno processo de extinção nos gramados tupiniquins.

Confesso que se o meu time do coração não entra em campo, eu torço sempre pelo teoricamente mais fraco. Uma torcida que não tem dado assim muito certo nos últimos tempos, uma vez que os favoritos têm nadado de braçadas em águas plácidas. Nem sinal de onda puxando para o mar aberto.

Na noite dessa terça-feira que passou (10), por exemplo, torci pelo paranaense Azuriz no confronto contra o Bahia. E torci pelo Tocantinópolis no embate contra o Athletico Paranaense. E torci pelo alagoano CSA no duelo contra o América Mineiro. Toda essa torcida foi completamente vã.

O Azuriz (nome de uma gralha azul que predomina nas araucárias da região sudeste do país) até que encarou os baianos de frente, mas sucumbiu na cobrança das penalidades. Já o Tocantinópolis e o CSA não deram nem para assustar os seus oponentes. Foram eliminados sem nenhuma piedade.

Aí veio a noite de quarta-feira e eu ali, fazendo uma prece para um santo qualquer das causas impossíveis, vela benta numa das mãos e rosário de cem contas na outra, torcendo pelo sucesso do baiano Juazeirense e do piauiense Altos, contra, respectivamente, os favoritos Palmeiras e Flamengo.

Novamente tudo em vão. Se não foi um passeio o que empreenderam os favoritos, pelo menos também não houve sustos. Placares apertados (Palmeiras 2 a 1 e Flamengo 2 a 0), porém dando a impressão de controle total do ímpeto dos candidatos a intrusos. Tranquilidade absoluta.

Na quinta-feira minha torcida foi toda para o Clube do Remo, contra o Cruzeiro. Até ampliei as ferramentas da fé. Em vez de uma vela, acendi duas. Em vez de somente um rosário nas mãos, pendurei outro no pescoço. Este de cor azul, para reforçar devidamente os tons do Leão paraense.

Lasquei-me de novo. O Remo, provavelmente por não contar com o reforço daquela chuva que cai todas as tardes em Belém, ou por ter esquecido no aeroporto lá deles os litros de açaí, farinha e tucupi imprescindíveis para dotar de força as canelas dos atletas, dançou na cobrança das penalidades.

É por aí, meu caros amigos. A zebra parece mesmo ser um bicho em extinção nos gramados brasileiros. Se isso se confirmar nos próximos tempos, o futebol vai ficar muito chato. Vai deixar de ser aquele esporte de surpresas e todo mundo vai apostar somente nos favoritos. Muito chato!

– Maio de 2022 –

Próximos confrontos

Francisco Dandão

Os times do Acre vivem situações opostas na disputa da Série D. Enquanto o Humaitá, legítimo campeão estadual de 2022, segura a lanterna do Grupo 1, com três derrotas em três partidas disputadas, o Rio Branco vai se mantendo entre os três primeiros, com duas vitórias e um empate.

Neste fim de semana, o Rio Branco vai à Boa Vista, a bela capital do estado de Roraima, tentando manter a sua performance. O adversário é o São Raimundo, que nos últimos anos tem crescido bastante no cenário do futebol regional. O time roraimense ostenta uma vitória em três jogos disputados.

Eu imagino que vai ser um jogo duríssimo, levando-se em conta que ultimamente os times de Roraima tem batido de frente com as equipes acreanas. Bem diferente da época do amadorismo, quando, de modo geral, os times do Acre entravam sempre como favoritos contra a turma de lá.

Mas é claro que aqueles eram outros tempos e o futebol acreano, principalmente no torneio interestadual denominado Copão da Amazônia, exibia super craques como Dadão, Carlinhos Bonamigo, Mauro, Julião, Mário Vieira, Xêpa, Pitola, Paulo Roberto, Mário Sales, Chicão etc.

O Chicão, aliás, zagueiro que se mudou de Rondônia para o Acre no final da década de 1970, ressalte-se, curiosamente é hoje o técnico interino do Rio Branco, “tapando o buraco” deixado com a dispensa do treinador Marcelo Brás. É interino, mas tem feito o time jogar direitinho, sim senhor.

De acordo com o que eu vi aqui na tabela, o Rio Branco vai jogar duas seguidas em Boa Vista: neste sábado contra o São Raimundo e na outra semana contra o Náutico. Caso se dê bem, pode voltar da antiga terra da cassiterita até em alguma posição superior ao atual terceiro lugar do grupo.

Enquanto isso, agora mudando o foco para o Humaitá, provavelmente, por conta da troca do técnico anterior pelo comprovadamente competente Álvaro Miguéis, o time comece a sua virada de chave neste domingo. Inclusive porque o adversário, o Náutico, também está muito mal na fita.

O Humaitá, a propósito, considerando-se que vai jogar duas vezes seguidas em casa (neste domingo contra o Náutico e no outro contra o São Raimundo-RR), terá a sua chance de ouro para sair da situação incômoda em que se encontra. Uma lanterna, no futebol, só ilumina bem em mãos alheias.

Enfim, que se rolem os dados e que a sorte possa beijar as camisas dos times acreanos nesta rodada. Se os deuses quiserem será assim. Mas nada é garantido. Afinal de contas, os adversários também têm os seus deuses. E nenhum pode mais do que os outros. Tudo pode ser levado pelo vento!

– Maio de 2022 –

Destaques de maio

Francisco Dandão

Na próxima sexta-feira, dia 6 de maio, meu particular amigo Marcus Aurélio Peres de Freitas, lateral/zagueiro dos melhores que o futebol acreano já viu, também conhecido no meio dos antigos boleiros como “Marquinhus Amor” e “Marquinhus Amarelo”, completa 61 anos muito bem vividos.

Embora tenha nascido em Rio Branco, Marquinhus foi com a família para Manaus com apenas alguns meses de vida. E foi lá na capital amazonense que ele despontou para o futebol, integrando as divisões de base dos gloriosos, pela ordem, Sul-América, São Raimundo e Nacional.

Depois dessa época nos times amazonenses, Marquinhus migrou para o futebol acreano, onde permaneceu em atividade até o ano 2000, pendurando as chuteiras somente aos 39 anos, período em que defendeu Juventus, Rio Branco, São Francisco, Atlético Acreano e Vasco da Gama.

Marquinhus estava prestes a completar 21 anos, em 1982, quando voltou para o Acre seduzido por uma proposta do técnico Tinoco, que comandava o Juventus. De acordo com o Marquinhus, a proposta era excelente, mas, infelizmente, pouca coisa foi cumprida pelos juventinos.

Nada disso, porém, o afetou, segundo ele mesmo me confessou um dia. O que de fato importou, sempre ressaltando o seu dizer, é que ele teve a oportunidade de exercitar a sua arte na terra que o viu nascer. A mesma terra que o testemunhou construir família e progredir cultural e profissionalmente.

Mas, além do Marquinhus, lembro de outro craque do passado do futebol acreano que nasceu no mês de maio. Falo do meia-atacante Rozier Pinho, que veio à luz no dia 10 deste mês, no ano de 1977, cujos primeiros chutes numa bola de futebol aconteceram no bairro da Estação Experimental.

O campinho que viu o surgimento do Rozier se chamava Maracutaia e situava-se ao lado da sede da Fundação do Bem Estar Social do Acre (Funbesa). Um local, ressalte-se, que viu surgir inúmeros ótimos jogadores do futebol do Acre, como, entre outros, os irmãos Sabino e Antônio Júlio.

Jogador de grandes recursos técnicos, Rozier vestiu várias camisas dentro e fora do Acre. Em nível doméstico, ele jogou por Rio Branco, Vasco, Independência, Atlético, Juventus e Alto Acre. Fora do estado, ele defendeu o Vitória (BA) e os equatorianos Deportivo Quevedo e Tungurahua.

E se alguém não acreditar no que eu estou dizendo (ou achar que estou exagerando), basta consultar antigos jornais de Rio Branco. Lá, nas páginas amarelecidas das diversas coleções hemerográficas, podem ser encontrados maiores detalhes das carreiras desses dois personagens. Vida longa a ambos!

– Maio de 2022 –

Invasão portuguesa

Francisco Dandão

Os técnicos de futebol brasileiros andaram perdendo prestígio nos últimos tempos. Numa busca simples na internet, a gente constata que são muitos os “professores” desempregados, à espera de um convite para voltarem à beira do campo. Existem bem mais técnicos do que empregos!

No presente, salvo engano, nos 20 times da Série A do Brasileirão, oito são dirigidos por técnicos estrangeiros: quatro portugueses (Abel Ferreira, Paulo Sousa, Vítor Pereira e Luís Castro), três argentinos (Juan Vojvoda, Mohamed e Fabian Bustos) e um paraguaio (Gustavo Morínigo).

E são “apenas” oito porque um que começou a temporada já desocupou o lugar. No caso, o uruguaio Alexander Medina, que depois de não conseguir fazer andar o glorioso Internacional, de Porto Alegre, foi mandado estagiar na Patagônia e substituído pelo nacional Mano Menezes.

O caminho inverso, porém, não é verdadeiro. Ao longo da história contam-se nos dedos os técnicos brasileiros que foram convidados para trabalhar em Portugal, na Argentina e no Uruguai. A maioria dos técnicos “brazucas” só saiu para atuar em países do Oriente Médio e da Ásia.

Especificamente falando-se de Portugal, cujos marujos frequentaram o litoral brasileiro nos idos do século XVI, ressalte-se que os técnicos de lá tem dado muito certo abaixo da linha do Equador. A começar por aquele de nome Jesus, que comandou os “urubutingas” da Gávea em passado recente.

Mas também, um cara com o nome de Jesus só não dá certo, provavelmente, num país de tradição muçulmana. Num espaço territorial de maioria católica, apostólica romana, onde a dualidade religiosa dividida entre a pistola e a cruz faz morada, Jesus vai sempre, sim, obrar milagres.

Então, imagino que por conta do sucesso do tal Jesus é que vieram no seu rastro os patrícios Abel Ferreira (Palmeiras), Paulo Sousa (Flamengo), Vítor Pereira (Corinthians) e Luís Castro (Botafogo). Pegaram suas caravelas e vieram bater nas belas costas brasileiras seguindo o vento a favor.

E esses portugueses, deve-se destacar, tem se mostrado competentes. O Palmeiras, do Abel Ferreira, por exemplo, quando entra em campo causa arrepios no dorso e frio na barriga dos adversários. Menos do Tricolor das Laranjeiras, que não quer nem saber se o bicho é feio. Mas aí é exceção!

É isso. Os portugueses estão novamente invadindo o Brasil. Eu só espero que dessa vez eles não se ponham a contrabandear pedras preciosas dentro de “santos de pau oco”. E que também não tentem substituir a nossa feijoada pela bacalhoada lá deles. Falta, agora, vir somente a família real!

– Maio de 2022 –

Mentecaptos e muquifos

Francisco Dandão

Antes que alguém pergunte, e para evitar a necessidade de uma corrida ao dicionário (antigamente chamado de “Pai dos Burros”), eu já trato de destrinchar o significado desse primeiro vocábulo do título. A saber: “que ou quem é mentalmente desordenado, alienado, louco, néscio, sem juízo” etc.

Pois é essa palavra pouco usual que me ocorre quando eu vejo pela televisão (ou, eventualmente, ao vivo mesmo) aquelas cenas de torcedores (ou seriam marginais?) gringos imitando macacos e jogando bananas para brasileiros presentes nas partidas entre times das terras deles e daqui, nossos.

Essa semana que recém passou foi repleta desse tipo de manifestação odiosa. Os agressores não respeitam nem o fato de estarem em solo brasileiro. Certamente acreditam que não terão punição e que os seus gestos (e palavras) são absolutamente normais. “Mentecaptos” sem tirar nem por.

Provavelmente, o que motiva esses agressores seja mesmo a certeza de que se a punição existir será muito branda. O torcedor do Boca Juniors, da Argentina, preso no jogo contra o Corinthians, por gestos racistas, passou somente uma noite em cana. No outro dia, pagou a fiança e foi embora.

Quer dizer, pagou a fiança nada, que, pelo que se disse, tratava-se de um vagabundo que não tinha um tostão furado no bolso, mas que dá um jeito de acompanhar o time dele aonde quer que vá jogar. A fiança foi paga por autoridades argentinas. De certo modo, um gesto de apoio ao marginal.

Penso que se o canalha tivesse passado mais uns dias no xilindró, de preferência na companhia de alguns presos corintianos, passando por sessões de “corretivos” diários, certamente jamais iria repetir a atitude. Ao invés disso, o cara além de ir embora ainda fez deboche nas redes sociais.

“Brasileiro é muito bonzinho”, como dizia uma antiga personagem de programa televisivo. Prende num dia, recebe uma merreca a título de fiança, e solta o facínora no dia seguinte, dando-lhe passe livre para delinquir novamente. Mais ou menos, como no filme do 007, uma licença para matar.

Pra falar a verdade, não creio que a solução do problema do racismo esteja na punição dos bandidos. A solução, pra mim, está na educação das crianças. No meu entendimento, a geração adulta não tem mais conserto. Mas, enquanto a educação não vem, que a punição possa ser, sim, rigorosa.

Menos mal, no caso desse crime no jogo entre Corinthians e Boca Juniors, que o time brasileiro venceu de boa. Dessa forma, sou tentado a pensar que o criminoso argentino voltou para o seu “muquifo” (local sujo, sem ordem) com o coração estraçalhado. Ofendeu, mas, no campo, “sifu”!

– Abril de 2022 –

Jacinto, a lenda

Francisco Dandão

Em se tratando de massagem, tanto faz se terapêutica ou relaxante, um nome se destacou no Acre, seja na universidade federal ou nos diversos clubes de futebol, nas décadas de 1960 a 1980: o de Jacinto Ferreira da Silva. O cara era considerado um verdadeiro mago nessa arte curativa milenar.

São inúmeras as histórias contadas por atletas dos times acreanos da época do amadorismo que eram dados como incapacitados para um próximo jogo e que, entretanto, contrariando todos os prognósticos, depois de tratados pelas mãos do Jacinto, entraram em campo como se nada tivesse acontecido.

Confesso que não sei onde foi que o Jacinto desenvolveu a sua técnica milagrosa. O que eu sei é que ele chegou em Rio Branco, junto com a sua família, vindo de um seringal de Sena Madureira, na segunda metade da década de 1950. E que poucos anos depois já estava em plena atividade.

E sei também que Jacinto foi um pioneiro da massagem no futebol acreano, levando-se em conta que ele começou numa época em que não se falava em massagista nos times estaduais. E depois dos primeiros trabalhos, ele ficou tão importante que era sempre requisitado pelos maiores clubes.

Mas essa importância e o interesse das diversas agremiações no seu trabalho jamais o impediu de tratar todos os jogadores que o procuravam com algum tipo de lesão. E fazia isso sem cobrar um centavo, se o atleta que o procurava não podia pagar pelos seus serviços. Competente e altruísta!

Jacinto também ficou famoso como um cara de pavio curto. Cansei de vê-lo entrar em confusão, no estádio José de Melo. No início da década de 1970, a proposito disso, lá pelas tantas, inconformado com a marcação de uma falta, um sujeito invadiu o campo para bater nele e no árbitro

Da arquibancada onde eu estava, não sei qual era a bronca com o massagista. Com o juiz a queixa era a marcação da falta. Com o massagista, só Deus sabe o que era. O resultado, porém, foi catastrófico para o sujeito exaltado. Jacinto revidou e bateu no invasor como quem bate num bêbado.

Fora tudo isso, credite-se ao Jacinto a formação de uma turma de profissionais que o sucederam como massagistas, principalmente no trabalho com jogadores de futebol. Muita gente boa que se integrou a diversos clubes. Casos, por exemplo, dos também competentes Sorriso e Zé Ambrósio.

Jacinto morreu no fim da semana passada. Depois de uma longa enfermidade, ele foi descansar em paz. Acho, porém, que apesar da ausência física, ele pode ser visto no céu das noites como destaque estelar. Cumpriu a sua missão na Terra, mas paira sobre as cabeças dos antigos torcedores!

– Abril de 2022 –

Santo forte

Francisco Dandão

Eu sou daqueles torcedores que gostam quando um clube considerado pequeno fura a hegemonia dos maiores e se coloca nos primeiros degraus de um pódio. Então, nesse sentido, já confesso logo de cara que me deixou imensamente satisfeito esse vice-campeonato acreano do São Francisco.

Durante muitas temporadas o São Francisco foi massacrado pelos clubes de maior poder aquisitivo. O chamado time católico, fundado pelo saudoso desportista Vicente Barata, nos idos da década de 1960, praticamente só entrava em campo para participar das diversas competições.

Os jogadores que vestiam a camisa do São Francisco não tinham remuneração. Muitos deles eram membros da própria família Barata. Casos do próprio Vicente e dos seus filhos Bismarck, Amarildo e Adherbal. Eram eles e mais uma meia dúzia de amigos ou garotos do bairro do mesmo nome.

Mas, de vez em quando, por alguma razão, jogadores consagrados preteridos pelos clubes mais fortes, batiam às portas dos “católicos”. Casos – vou lembrando enquanto escrevo – dos famosos artilheiros Ruy Macaco e Dodô, além do armador Zé Cláudio e dos laterais Nanico e Chico Alab.

Ruy Macaco, que brilhou com as camisas do Independência e do Atlético, como a história registra, foi o segundo maior artilheiro do Brasil em 1974, ficando atrás somente do centroavante Dario Maravilha. Pois esse atacante fenomenal um dia emprestou a sua bola ao time de Vicente Barata.

No caso do armador Zé Cláudio, ele simplesmente foi titular de todas as seleções acreanas dos anos de 1950. E quanto aos laterais Nanico e Chico Alab, boa parte dos títulos estaduais das décadas de 1960 e 1970 vencidos pelo Atlético Acreano e pelo Independência foram da responsabilidade deles.

Para ilustrar como muita gente boa de bola vestiu a camisa do São Chico, embora o time ficasse sempre na parte de baixo da classificação, mostro a escalação do time de 1976: Almiro; Chico Alab, Dango, Sucupira e Nanico; Barata, Bismarck e Dias; Melinho Elias, Madureira e Trebina.

E ressalte-se ainda que o clube chegou até a disputar um Copão da Amazônia, o de 1989, levando no elenco nomes como os de Aníbal Honorato (ex-Independência), Zenon (ex-Rio Branco), Neurimar, Leitão (o conhecido Moleque), Josué, Nego, Mário Jorge, Vela e Agamenon, entre outros.

Pra mim, o São Francisco sempre foi um “santo forte”. E só não chegou mais longe anteriormente por estar muito ocupado obrando milagres para os outros. Agora, com alguma estrutura e voltado mais para os seus próprios interesses, parece estar avisando aos incautos que o céu é o limite!

– Abril de 2022

Craques dos bairros

Francisco Dandão

Escrevi na crônica passada, quando falei do falecimento, há quatro anos, do supercraque Eduardo Rodrigues da Silva Filho (Dadão), sobre a profusão de atletas acreanos das décadas de 1960/1970/1980 que nasceram nos bairros Caxias (lugar onde veio à luz o personagem referido) e Base.

Do Caxias citei, além de Dadão, Antônio Maria, Hermínio, Carlinhos Bonamigo e Milton. Da Base, citei Gilmar, Xepa, Zé Carlos, Nelcirene e Messias. Mas é claro que existiram muitos outros. E não somente no Caxias e na Base. E foi isso o que me alertou por celular o amigo Toinho Bil.

Assim, nestas mal traçadas aqui vou dizer nomes de caras de vários bairros que eu fui lembrando, que disputaram certames acreanos, relacionando-os aos times que defenderam, independente da bola maior ou menor que jogaram. Naturalmente, uns foram craques, outros nem tanto.

Do Caxias, por exemplo, lembrei ainda do Marquinhos Araújo (Juventus/Independência), Elden (Rio Branco), Nenca (Internacional) e Moisés (Juventus). Da Base, lembrei também do Altenor (Independência), Océlio (Vasco/Atlético), Medeirinho (Independência) e Goiaba (Vasco).

Da Capoeira me veio à memória Bidu (Vasco/Atlético), Nêgo (Vasco), Carlito Viegas (Juventus/Vasco), Tranca Rua (Floresta), Mário Vieira (Rio Branco) e Pituba (Andirá), lendário goleiro que costumava dar saltos mortais cada vez (infelizmente raras) em que seu time fazia um gol.

Da Seis de Agosto, me lembrei do Saldanha (Andirá), Ary (Juventus), Gerson (Juventus), Pitola (Juventus), Lauro (Atlético), Abacate (Rio Branco/Floresta), Manoel (Independência), Gutinha (Andirá), Gilson (Vasco), Audicélio (Floresta), Palmiro (Rio Branco) e Bodó (Floresta).

Do bairro 15, entre muitos outros, Manoelzinho (todos os times grandes), Mário Sales (idem), Azeitona (Amapá), Jorge Cubu (Independência), Rocemir (Atlético), Rodomilson (Atlético), Tidal (Atlético), Chico Preto (Atlético/Juventus), Belo (Atlético) e Jair (Atlético).

Do Bosque me ocorreram João Sena (Vasco), Caçula (Vasco), Ademir Sena (Vasco), Santarém (Vasco), Ferreti (Vasco), Otávio (Independência/Juventus), Flávio (Independência), Escapulário (Independência), Zé Gilberto (Rio Branco) e Tom (Juventus). Inúmeros!

Esses nomes citados tem um significado: o de que em todos os bairros surgiram muitos caras bons de bola que brilharam no futebol acreano do tempo do amadorismo. E veja-se que, por falta de espaço, eu nem falei dos bairros Floresta, Estação Experimental, São Francisco, Cadeia Velha… Irra!

– Abril de 2022 –

Eterna memória!

Francisco Dandão

Dentro de mais alguns dias se completam quatro anos do falecimento do maior jogador de futebol acreano de todos os tempos. Falo de Eduardo Rodrigues da Silva Filho, o Dadão, que saltou para o abismo da metafísica em 23 de abril de 2018, aos 67 anos, vítima de um acidente vascular cerebral.

Dadão nasceu no dia 18 de julho de 1950, no bairro do Caxias, vizinho ao bairro da Base, em Rio Branco, nas imediações da Rádio Difusora Acreana. Nesses dois bairros, ressalte-se, por um desses insondáveis desígnios do destino, nasceram grandes craques do futebol amador do Acre.

A propósito dessa confluência de nomes que nasceram nos bairros citados e marcaram o futebol do Acre, além de Dadão, lembro enquanto escrevo de Nelcirene, Xepa, Zé Carlos, Messias, Gilmar (estes da Base); Milton, Carlinhos Bonamigo, Hermínio, Antônio Maria (estes do Caxias).

Precoce, Dadão estreou como titular do Rio Branco aos 15 anos, no primeiro semestre de 1966. Ele era tão jovem que, em princípio, não foi aceito para fazer parte do primeiro time do Juventus, fundado nesse mesmo ano de 1966. Um erro que seria corrigido pela direção juventina em 1967.

Eu tive o privilégio de ser vizinho do Dadão num certo período das nossas vidas. Morávamos em ruas paralelas no Jardim Tropical. Eu morava na rua Dama da Noite, e ele morava na rua Oliveiras. Essa proximidade nos fez bater longos e descontraídos papos, aos sábados, na varanda da casa dele.

De modo geral, as conversas fluíam em torno de reminiscências, principalmente da passagem dele pelo Fluminense do Rio de Janeiro, clube para o qual ele se transferiu em 1970 e onde permaneceu por duas temporadas, alternando exibições nos juvenis com algumas no time de cima.

Em 1972, já sem idade para jogar pelo time juvenil, Dadão estava pronto para conquistar o seu lugar no time principal. Mas, segundo ele, por intransigência do seu pai, não foi possível assinar um contrato profissional. Aí ele foi gastar a sua bola no sergipano Itabaiana, onde logo virou ídolo.

No ano seguinte, 1973, depois de ser acometido por uma hepatite, Dadão voltou para sua terra natal, onde fez parte dos melhores esquadrões do futebol acreano, mostrando a sua arte até 1986. Nesse período, ele vestiu as camisas de Juventus, Atlético Acreano, Rio Branco e Independência.

Mas, além dessas reminiscências gloriosas, as nossas conversas giravam também em torno de passagens hilárias do futebol acreano. Uma dessas passagens, talvez a que mais o divertia, tratava-se de uma confusão com os nossos nomes (Dadão/Dandão). Qualquer dia eu conto essa história!

– Abril de 2022

Três grandes nomes do salão

Francisco Dandão

Três cracaços do futebol de salão/futsal acreano do passado fazem aniversário neste mês de abril de muita água descendo dos céus por toda a imensidão do país: Adrian Santos, o famoso Galo Velho (dia 8); Elpídio Rodrigues, conhecido como Dô (dia 11); e o grande Lauro Fontes (dia 13).

Adrian, que nasceu em 1957, começou sua vida nas quadras do Acre jogando na ala direita, em 1973, num jogo pelo Juventus, contra o Rio Branco, num espaço do bairro da Habitasa. De acordo com o que ele me disse um dia, o seu time saiu vitorioso no confronto, apesar de um gol contra dele.

Um tempo depois, Adrian mudou de posição, passando a jogar como fixo. Posição em que saiu-se tão bem que até lhe valeu convocações para a seleção acreana que viajou várias vezes para a disputa de torneios nacionais. E além do Juventus, ele defendeu o Amapá, o Independência e o Banacre.

Já a história do Dô, que nasceu em 1963, começou no futebol de campo logo depois dele completar 11 anos, em 1974. Daí até 1978, ele jogou sucessivamente nos infantis do Sesi, Fluminense do Barbadinho, Rodoviária do Rivaldo, Inter do Juquinha, Fast do bairro José Augusto e no Rio Branco.

A mudança definitiva para as quadras aconteceu em 1979, quando um dirigente do Incra convidou um grupo de meninos moradores do bairro José Augusto (Nande, Marinho, Casquinha, Nelsinho, Bé, entre outros) para defender o time da referida entidade no campeonato acreano da modalidade.

Foi o início da carreira de um pivô que faria história até “pendurar o tênis”, em 1994, jogando pela seleção acreana e pelos seguintes clubes: Assermurb, Rio Branco, Real, Madeireira Floresta, Juventus, Banacre, Gráfica Estrela, Casa das Tintas Luciana, Piauí e Drogaria Amorim.

No caso do Lauro Fontes, nascido em 1956, pra mim ele foi o melhor goleiro que eu vi jogar numa quadra. O cara crescia para cima dos adversários e, por vezes, parecia uma muralha dessas intransponíveis. Cansei de vê-lo defender bolas aparentemente impossíveis. Um (ir)real fenômeno!

Lauro começou na base de campo do Independência, chegando até ao time principal. Mas o futebol nos gramados foi uma experiência breve. Logo ele se mudou para as quadras, jogando, entre outros clubes, no Vasco da Gama, Amapá, Rio Branco, Juventus, Banacre, Piauí e Difusora Acreana.

É por aí, galera. Esses três sujeitos que tanta alegria deram aos torcedores do esporte das quadras do Acre nasceram em abril. Mais ou menos como se tivessem brotado das chuvas de março que costumam fechar os verões do hemisfério sul. Vida longa ao Adrian, ao Dô e ao Lauro!

– Abril de 2022 –

Melhores cidades

Francisco Dandão

Zapeando o controle remoto do televisor na manhã de sexta-feira (8) eu fiquei sabendo de um ranking, feito não sei exatamente por quem, das dez melhores cidades do mundo para se viver em 2022. Daí, como vi a matéria somente de relance, corri para a internet para saber mais sobre o tal ranking.

E então, eu tomei conhecimento de que a lista era formada por, pela ordem, Londres (Inglaterra), Tóquio (Japão), Xangai (China), Singapura (Singapura), Melbourne (Austrália), Sydney (Austrália), Paris (França), Pequim (China), Nova York (Estados Unidos) e Amsterdam (Holanda).

A cidade brasileira melhor classificada nesse ranking foi São Paulo, num modestíssimo 46º lugar, atrás, para variar, de Buenos Aires, capital dos argentinos, que aparece na 44ª colocação. Los hermanos, que já tem um Papa, ficaram na frente da gente, o que sempre se configura insuportável!

Dessas dez aí citadas, eu só conheço pessoalmente três: Paris, onde se pode comer um queijo delicioso, acompanhado de um vinho excepcional, olhando para a torre Eiffel; Nova York, onde se pode flanar indefinidamente pelo Central Park; e Amsterdam, onde se pode sentir o ar de belos moinhos.

Em Paris, aliás, além da questão gastronômica, eu vivi situações culturais maravilhosas, desde a interação com artistas de rua que falam os mais variados dialetos e línguas, até experiências com monumentos ícones da cultura mundial, como no dia em que eu mergulhei no museu do Louvre.

Já em Nova York, levando-se em conta que eu citei o Central Park, o que mais me emocionou foi parar alguns minutos no exato local do assassinato do John Lennon. E quanto a Amsterdam, me diverti demais num passeio pelo Red Light District (sim, a rua das meninas nuas nas vitrines).

Das outras sete cidades, três estão no meu radar para as próximas temporadas: Londres, para tomar um chá com os meus parentes da família real; Tóquio, para fazer um curso intensivo de judô e manipulação daqueles pauzinhos de comer lá deles; e Sydney, para aprender a andar de canguru.

Mas o que eu queria mesmo era uma explicação dos motivos pelos quais nenhuma cidade brasileira ficou nesse “top 10”. Como assim? Seria porque a inflação deu uma subida? Seria pelo número de brasileiros mortos pela covid? Seria pela destruição do meio ambiente? Por que seria? Por quê?

Sei lá eu. Talvez esses caras que fizeram o ranking sejam meio malucos e ainda acreditem que a Terra seja redonda. Ou talvez duvidem que eleições possam ser vencidas com a disseminação de fake news. Quem haverá de saber? Pelo menos no futebol, o Brasil é hoje o líder do ranking!

– Abril de 2022 –

Grupo G

Francisco Dandão

Conforme eu disse numa crônica anterior, eu preferia que o grupo do Brasil na Copa fosse o mais forte possível, com as melhores seleções dos diversos continentes. Pra mim, levando-se em conta que eu acredito nos comandados do Tite, isso faria com que times bons fossem logo eliminados.

Eu queria, por exemplo, que a gente enfrentasse já na estreia a Alemanha. Dessa forma, dava-se logo uma surra nos chucrutes, mandava pra eles uma boa sopa de repolho com joelho de porco, no jantar de depois da partida, e arrasava com a moral deles, pra fazer os caras engolirem os 7 a 1.

Ou então, que a gente enfrentasse a Holanda, para que, dessa forma, pudéssemos fazê-los calçar aqueles tamancos característicos lá deles, para desfilarem pelas ruas de Amsterdam e, como castigo maior, após a nossa vitória, dar-lhes a tarefa de soprar aqueles moinhos de vento lá deles.

Contrário às minhas pretensões, porém, nem Alemanha nem Holanda caíram no grupo do Brasil para a primeira parte da Copa do Mundo do Catar. Em vez disso, à seleção brasileira foram dadas como adversárias as seleções da Sérvia, da Suíça e de Camarões. Pra mim, um mamãozinho com açúcar!

É claro que, a essa altura, muita gente esconde o sorriso de satisfação e ensaia o discurso de que são três adversários perigosos, que precisam ser respeitados. Pra mim, esse é um discurso de falsa humildade. Se o Brasil tiver qualquer receio de um desses três, é melhor nem viajar ao Catar.

Com aquele ataque do Brasil que foi escalado nos últimos jogos das eliminatórias sul-americanas (Raphinha de um lado, Neymar mais centralizado e Vinícius Júnior na outra extremidade), quem tem que estar tremendo de medo por essas horas são os sistemas defensivos adversários.

Eu acho que os laterais da Sérvia, da Suíça e de Camarões vão ter pesadelos na véspera dos jogos contra a seleção do Brasil. Digo pesadelos para não dizer desarranjo intestinal. O Raphinha e o Vini Júnior, do jeito que estão jogando, não podem ser parados nem com armas apontadas pra eles.

E veja-se que eu nem falei no Antony, que é suplente mas que sempre entra lá pelas tantas, no lugar de um ou de outro dos citados no parágrafo anterior. O Antony tá jogando tanto que um dia desses, lá no clube dele, o holandês Ajax, ao fazer um gol de placa, foi comparado ao Cristo Redentor.

Falei, falei (ou melhor, escrevi) e não disse nada de novo. A minha ideia inicial era dissecar os três adversários do Brasil. Mas aí o texto foi me conduzindo e, de repente, acabou o minifúndio que me cabe para as mal traçadas de cada vez. No jardim da casa o mundo treme a cada semeadura!

– Abril de 2022 –

Qualquer mato é caminho

Francisco Dandão

Saiu o novo ranking da Fifa de seleções. O Brasil está no topo, seguido de perto por Bélgica, França e Argentina. A seleção brasileira não ocupava essa posição há cinco anos. A campanha nas eliminatórias da Copa, com 14 vitórias e três empates, foi que devolveu ao Brasil esse lugar de destaque.

Não sei até que ponto o ranking reflete a força de uma seleção. Às vezes, a gente tem a impressão de que uma equipe ranqueada em posição inferior joga mais do que uma que está acima na lista. De qualquer forma, são os números que acabam definindo onde fica uma e onde ficam as outras.

Digo que não sei até que ponto o ranking reflete a força de uma seleção principalmente porque não existem, via de regra, confrontos de um time que está mais acima contra um que está logo abaixo. No caso do Brasil, por exemplo, a sua posição vem apenas de duelos com seleções sul-americanas.

Não estou, necessariamente, duvidando que a seleção brasileira tenha subido de rendimento com os últimos jogadores que vem vestindo a camisa amarela. As goleadas sobre os adversários incautos atestam isso. O que me deixa reticente são seleções desqualificadas como Venezuela e Bolívia.

Independentemente, porém, de qualquer desconfiança ou euforia, o certo é que agora as atenções se voltam para a Copa do Mundo do Catar. No momento em que cometo estas linhas o sorteio dos grupos ainda não foi realizado. Nesse caso, não sei o quanto será forte o grupo do Brasil.

Fiz questão de escrever antes do sorteio porque li nos sites e nas folhas e assisti na televisão da real possibilidade da seleção brasileira pegar, logo de cara, a seleção da Alemanha ou a seleção da Holanda. O Brasil ficou no sorteio no que se chama “pote A”. As outras duas ficaram no tal “pote B”.

Explico porque fiz questão de escrever antes do sorteio. Escrevi antes para que fique o registro da minha torcida para que o Brasil pegue mesmo um desses dois países. As duas seleções devem contas à seleção brasileira. E contribuir para manda-las para casa no início diminuiria essas contas.

A Holanda deu um baile no Brasil na Copa do Mundo de 1974. Precisa perder 74 vezes para saber que não deve mexer com quem não conhece. E a Alemanha, depois daqueles 7 a 1 de 2014, que deixou os alemães com sorrisos marotos pra cima da gente, precisa perder até o fim dos tempos.

É isso aí. Paro por aqui porque não posso avançar promessas. Depois do poente e das sombras da noite vem sempre um novo alvorecer. Está mais do que na hora do Brasil chegar ao hexa. Com Vinícius Júnior de um lado e Raphinha do outro, penso que qualquer mato é caminho para levantar a taça!

– Abril de 2022 –

A chuva de cada dia

Francisco Dandão

Li por aí um dia desses sobre uma proposta de paralisação do campeonato acreano por conta das chuvas torrenciais que caem em Rio Branco, capital do estado do Acre, tornando impraticável o campo de jogo, no caso o Florestão, o único que abriga os confrontos deste ano de 2022.

Li também que a maioria dos dirigentes de clubes rejeitou a proposta, por conta de que uma paralisação acarretaria na necessidade de manter os profissionais da bola mais tempo sob contrato. Uma despesa que os clubes, sempre na penúria, não poderiam arcar, pela inexistência de boas receitas.

Com respeito ao período chuvoso, não somente no Acre mas em toda a região Norte, não é segredo pra ninguém que essa é a época do ano de maior precipitação pluviométrica. Então, quando o céu desaba sob a cabeça dos jogadores acreanos, não creio que isso se constitua num fator inesperado.

Isso é bem antigo. Eu diria que desde o tempo em que se jogava com uma chuteira chamada Gaeta (dura como o diabo) e que a bola não era impermeável. A bola depois de molhada pesava uma tonelada e oferecia o risco real de arrancar o pescoço dos caras que ousavam dar uma cabeçada.

Todo mundo sabe que vai chover muito e todo mundo topa jogar o campeonato nessa época. Provavelmente não seja possível jogar a competição local em outros meses, por conta de restrições do calendário nacional, que abrange vários torneios organizados pela CBF. Não sei.

Na verdade, o que eu acho que pegou este ano foi a interdição do estádio Arena da Floresta, obrigando a que todas as partidas sejam realizadas no estádio da federação. Um estádio só não aguenta tanto pisoteio. Vão para o brejo ao mesmo tempo tanto a grama quanto os artistas e o espetáculo.

Dessa forma, levando em conta todas essas questões, a gente nunca poderá saber se o campeão do ano é o melhor time. É bem possível que o campeão seja apenas o que mais se adapte às condições atmosféricas. Aquele cujos atletas melhor aprenderam a dar “balões pra cima e pra frente”.

Se for assim, não creio que seja despropositado dizer que o futebol jogado no campeonato acreano voltou ao “tempo do tuba”. Explicando aos mais jovens que o “tempo do tuba” foi a época onde não havia esquema tático ou estratégia. A ordem era meter o bico para o lado onde o nariz apontasse.

Digo tudo isso mas confesso que esse é um problema de difícil solução. Em princípio só me ocorre um jeito de resolver essa parada: construir uma cobertura retrátil para o estádio. Impossível? Não, não é. Com um dinheirinho a mais, talvez da CBF, talvez de um sheik árabe, quem sabe?

– Março de 2022 –

Bruta ressaca

Francisco Dandão

Acordei com uma bruta ressaca na manhã dessa quinta-feira (17). A cabeça inchada e a boca com gosto de ferro velho recordavam os acontecimentos da noite anterior: a ingestão de duas garrafas de vinho barato e a desclassificação do Fluminense da Copa Libertadores da América.

Na verdade, uma coisa foi decorrente da outra. É que eu costumo beber apenas uma garrafa de vinho a cada vez que me proponho a comemorar alguma coisa. Dessa vez extrapolei e tomei duas. A primeira, como de praxe, para entrar no clima do jogo. Já a segunda, por pura irritação mesmo.

Minha irritação se deu por conta do que o Tricolor mais lindo do mundo não mostrou. Os caras escalados pelo Abelão Braga parece que esqueceram tudo o que aprenderam nos seus anos de bola dentro de campo. Enquanto os paraguaios do Olímpia jogavam, o pessoal do Flu apreciava.

E vejam que a vantagem do Fluminense era considerável. Com os 3 a 1 que foram aplicados no Olímpia quando do jogo da ida, no Brasil, até uma derrota por um gol de diferença servia para o time brasileiro. Era jogo para botar dez caras debaixo das traves e escalar somente umzinho lá na frente.

Armar um daqueles ferrolhos peculiares aos times italianos das décadas de 1960 e 1970. Se fosse o caso, escalar até o massagista, o auxiliar técnico e o preparador físico na frente da zaga. Um daqueles ferrolhos capazes de resistir até aos mísseis do agente da KGB presidente da Rússia.

Só os gandulas é que não poderiam ser escalados para defender as traves do Fluzão. O jogo era no Paraguai e os gandulas eram todos dos caras. Com os gandulas não se podia contar. Nesse aspecto não se pode culpar ninguém. Os gandulas, a propósito, trabalharam direitinho pro time deles.

E os pênaltis, depois dos 2 a 0 que o Flu levou durante o jogo. Ah, aí foi outro problema. Quem tinha de começar batendo para o Tricolor das Laranjeiras era o presidente do clube e não o William Bigode. Quem tem que bater pênalti decisivo é o presidente do clube. Ninguém mais do que ele.

Quanto à expressão “cavalo paraguaio”, oriunda do turfe, que designa o animal que sai na frente atropelando todo mundo mas depois chega em último lugar, no caso desse confronto entre Fluminense e Olímpia se inverteu a lógica. O cavalo manco e perdedor foi o brasileiro e não o paraguaio.

É isso, meus caros leitores. A essa altura, em algum lugar do inferno, o ditador paraguaio Francisco Solano Lopez deve estar tirando o maior sarro do brasileiro Luís Alves de Lima e Silva, vulgo Duque de Caxias. E eu nunca mais bebo duas garrafas de vinho de uma só vez. Never more, never more!

– Março de 2022 –

Promessa é dívida

Francisco Dandão

É muito comum no meio do futebol (ou de outros esportes) um dirigente prometer alguma coisa para os atletas, seja de forma coletiva ou individual, para que o time tenha sucesso. Às vezes, a promessa é para vencer um determinado jogo. Outras vezes, a promessa é para conquistar um título.

No futebol acreano do passado havia um jogador chamado Bico-Bico, atacante do Independência, que gostava como poucos de tomar umas e outras. Dizem até que ele quanto mais bebia, mais jogava. Dizem também que não tinha tempo ruim pra ele e o dito cujo bebia antes e depois dos jogos.

Pois de acordo com a lenda, conta-se que quando o Bico-Bico não jogava bem no primeiro tempo, bastava um dirigente (ou torcedor) chegar no ouvido dele e dizer que se o Tricolor do Marinho Monte vencesse a partida, uma “meiota” (meia garrafa de pinga) seria o presente do craque.

Eu não sei exatamente se isso é verdade. Mas o que eu sei é que cansei de ver o Bico-Bico destruir vários laterais e arrebentar com um jogo no segundo tempo, depois de praticamente se arrastar em campo na primeira etapa. Ou seja: a lenda sobre ele tem tudo para ser verdadeira mesmo.

Independentemente, porém, desses fatos (ou lendas) do futebol acreano do passado, eu fiquei sabendo um dia desses de uma promessa mais recente, já em plena época do profissionalismo. Uma promessa envolvendo dois personagens do Rio Branco. No caso o Natal Xavier e o Juliano César.

Conta-se que o Juliano César, atacante rondoniense que fez história no futebol acreano, teria pedido para dar uma volta no carrão do presidente Natal Xavier. Aí o Natal teria respondido que se o Estrelão fosse campeão e o Juliano fosse artilheiro, ele deixaria o craque ir a Porto Velho no seu carro.

Foi uma promessa de alto risco, levando-se em conta o potencial do Rio Branco e a capacidade do Juliano César. Eis que o tempo foi passando, os jogos foram se sucedendo e, então, ao final do certame, tanto o Rio Branco foi campeão quanto o Juliano César ficou em primeiro lugar na artilharia.

No dia seguinte à conquista do título, o Juliano César estava na porta do Natal Xavier cobrando a promessa. O presidente entregou a chave do veículo ao artilheiro, mas jamais imaginou que este iria mesmo pegar a estrada. Na cabeça do Natal, o Juliano ia só dar uma volta no quarteirão.

O Juliano, porém, acreditando que “promessa é dívida”, entrou no carro e seguiu para a BR-364. Avisado da atitude do craque, o Natal pegou uma carona e saiu em alta velocidade atrás dele. Conseguiu pegar o artilheiro antes da Vila Extrema, tomou o carro dele e o deixou a pé na estrada.

– Março de 2022 –

Distraídos

Francisco Dandão

Eu estava lembrando, por esses dias, de histórias de distrações de personagens notáveis do futebol. De como as distrações dessas criaturas proporcionaram momentos do mais puro humor e gozação de quem gravitava em volta delas, seja jogadores, preparadores, dirigentes ou auxiliares diretos.

Nessa linha, conta-se que o falecido treinador Vicente Feola (1909 – 1975), que comandou o São Paulo por várias temporadas e a Seleção Brasileira nas Copas do Mundo de 1958 (Suécia) e 1966 (Inglaterra), de vez em quando tirava um cochilo no banco de reservas, no decorrer do jogo.

Segundo a lenda, ao acordar de um desses cochilos, numa partida da seleção brasileira, Feola teria gritado freneticamente para o time subir ao ataque. Alguém, então, disse pra ele que o Brasil já estava ganhando por três a zero. Aí ele mudou a ordem e passou a gritar: “Volta, volta, segura o jogo!”

Saindo, porém, do geral para o particular, diz-se que o lendário radialista acreano Campos Pereira também dava os seus cochilos de vez em quando, ao fazer reportagens de pista no vetusto Stadium José de Melo. Principalmente nos casos em que se postava sentado atrás de uma das traves.

Esses relatos dão conta de que um certo dia, depois de uma confusão na área do Juventus, quando o time do Atlético reclamava de um pênalti não marcado, o narrador do jogo perguntou: “O que houve, Campos?” Campito, então, acordou do cochilo e disse: “Ouve a Rádio Difusora Acreana!”

Mas a história de distração que eu mais curto, sempre de acordo com a lenda, é uma envolvendo o técnico Alício Santos, gente da mais fina estirpe e o introdutor do “tripé de meia cancha” no futebol acreano. Uma distração que teria causado uma derrota do Rio Branco, time que ele treinava.

O jogo em questão era entre o citado Rio Branco e o Independência. Decisão de alguma coisa. Jogo duríssimo. O Estrelão vencia por um a zero. Eis que, lá pelas tantas, já na metade do segundo tempo, o lateral esquerdo Tião, que vinha jogando bem, deu uma entrada mais dura e foi expulso.

O jogo seguiu e o treinador Alício Santos não tomou nenhuma providência para recompor o sistema defensivo do Rio Branco. E aí, então, pelo lado ali onde o lateral foi expulso, o Tricolor do Marinho Monte fez a festa e virou o jogo rapidamente para três a um, faturando aquele título.

Depois da derrota, o repórter Waldemir Canizio, da Rádio Novo Andirá, perguntou ao técnico Alício Santos por qual motivo ele não reforçou o sistema de defesa, depois da expulsão do lateral Tião. Resposta do treinador: “E o Tião saiu de campo? O Tião foi expulso? Quando foi isso?”

– Março de 2022 –

Janela

Francisco Dandão

Uma guerra afeta quaisquer aspectos da vida. Numa sociedade planetária, os reflexos negativos de um conflito armado são imediatos e atingem a todos, indistintamente. O futebol faz parte da vida. Aliás, o futebol é uma parte extremamente importante da vida de muita gente (boa ou má).

Esse ex-agente do serviço secreto da antiga União Soviética, perpetuado através de vias transversas no poder da atual Rússia, desde que resolveu invadir o país vizinho da Ucrânia, entre outras porcarias, tirou o emprego de um grande contingente de futebolistas, inclusive brasileiros.

Felizmente, porém, a senhora Fifa agiu rápido e abriu uma janela temporária de transferências para os clubes e jogadores afetados pelo megalomaníaco cruel. E assim, todos os estrangeiros profissionais da bola desses dois países estão liberados para exercer sua arte por aí (e por aqui).

De acordo com a nota da dona Fifa, os contratos de trabalho de jogadores e treinadores estrangeiros com clubes filiados à Associação Ucraniana de Futebol são considerados automaticamente suspensos até o final da temporada ucraniana, que acontece no dia 30 de junho de 2022.

No caso dos profissionais do futebol estrangeiros contratados pelos clubes russos, eles tem direito de suspender unilateralmente seus compromissos de trabalho, também até a mesma data. Nem precisa avisar. É só jogar os pertences numa bolsa e se mandar pra longe. Tchau e bênção!

No meu entendimento, é uma oportunidade de ouro para os clubes brasileiros (e gringos também) se reforçarem a custo zero, arcando tão somente com o pagamento dos salários dos contratados. Tem “mercadoria” de toda qualidade e valor, do tipo “pegue e pague”, nas diversas prateleiras.

Fora toda essa questão esportiva, falando dessa guerra entre russos e ucranianos, eu penso que os líderes dos países que não estão diretamente envolvidos no conflito estão fazendo muito pouco para acabar com a questão. Até agora só vi foi muita conversa, reuniões e sanções de pouca eficácia.

O Brasil, por exemplo, poderia contribuir muito para uma solução diplomática. Para isso bastaria mandar um emissário que pudesse convencer os russos de que a Terra é plana e que, assim sendo, não adianta eles irem muito longe, uma vez que cedo ou tarde chegarão à beira do abismo.

Ou então, enviar alguém para ensinar os caras que floresta úmida não pega fogo. Ou mandar um economista para ensinar os políticos de lá a aumentar o preço da gasolina, do feijão, do arroz e do escambau para, no fim das contas, se gabarem do aumento do PIB… As possibilidades são infinitas!

– Março de 2022 –

Zebras na Copa

Francisco Dandão

O mundo anda mesmo esquisito. De repente, não mais que de repente, o pessoal da antiga KGB russa entendeu que devia aniquilar a galera das vizinhanças. É bombardeio pra todo lado, embora os caras insistam em dizer que as bombas são inteligentes. Estou por ver uma bomba com inteligência.

O pior de tudo é que o Brasil perdeu a grande oportunidade de ganhar o prêmio Nobel da Paz. Até parecia moleza, mamão com açúcar, esse prêmio. Parecia tudo certo (pelo menos foi o que a turma das fake news disse) depois que a criatura visitou o Putin. Deu tudo errado. Quer dizer: deu zebra!

Mas deixa isso pra lá, que em briga de cachorro grande um mero escriba tupiniquim não deve meter a colher. Os agressores haverão de pagar pela afronta, pela ambição e pela insensatez. Não seria a primeira vez que uma super potência voltaria do front com o rabo entre as pernas.

Deixa pra lá porque, a despeito dessa possibilidade do fim do mundo, aqui abaixo da linha do Equador ainda se joga futebol. E assim como a suposta zebra que tirou o prêmio Nobel dos psicopatas e sem noção, do mesmo jeito quem está desfilando nos gramados daqui é o tal bicho africano.

Nesse sentido, veja-se a Copa do Brasil. Corri o olhar pelos resultados da primeira fase do torneio e percebi pelo menos três eliminações, digamos, pouco prováveis: Internacional-RS (0 a 2 para o Globo-RN), Grêmio-RS (2 a 3 para o Mirassol-SP) e Novorizontino-SP (0 a 1 para a Tuna-PA).

As eliminações dos times gaúchos, eu só consigo explicar (além do galope da zebra) pelo lado da solidariedade. É que seria insuportável para as respectivas torcidas a eliminação de apenas um deles. Se um passasse, o outro passava também. O contrário também é verdadeiro. Os dois “sifu”!

Quanto à eliminação do Novorizontino, lá em Belém, o que me ocorre é que na hora do jogo caiu uma daquelas trombas d’água costumeiras na cidade. A chuva em Belém é pontual como um relógio suíço. Aí despencou o toró de sempre e o glorioso Novorizontino se afogou.

Sim, teve também aquela zebra lá do Distrito Federal, com a vitória do Ceilândia sobre o Londrina-PR por 2 a 0. Mas aí a gente não sabe bem o que aconteceu. Em Brasília tudo é possível. Tem sempre gente fazendo falcatrua, desde depósito de dinheiro em cueca até alguma rachadinha.

Pois bem. A zebra trocou de continente. Tem mais desse bicho agora na América do Sul do que nas estepes e savanas africanas. Tomara um dia a gente aqui desse lado do Oceano Atlântico possa ganhar um prêmio Nobel. Nem precisa ser da paz não. Pode ser de qualquer coisa. Meio difícil, mas…

– Março de 2022

Refresco de tabaco

Francisco Dandão

Meu diletíssimo amigo Antônio Augusto Martins Freire, popularmente conhecido pelo apelido de Toinho Bil, quando quer desqualificar alguma coisa, principalmente times ou jogadores de futebol, costuma usar a seguinte expressão: “Mais ruim do que refresco de tabaco!”

Na primeira vez que eu ouvi a expressão saída da boca do Toinho Bil tive um ataque de riso. Afinal, até aquele momento a frase que eu considerava mais representativa de uma situação de desqualificação de alguém ou de alguma coisa era “mais ruim do que purgante de mamona”.

Esse purgante de mamona era um laxante feito a partir das sementes do mamoeiro, muito usado antigamente quando se queria soltar um intestino preso ou, em outra hipótese, “limpar as vísceras” de alguém. Não sei se esse laxante ainda é usado hoje em dia. O que sei é que era ruim pra caramba.

Por conta de tudo isso, tão logo se encerrou o jogo dessa terça-feira entre Bolívia e Brasil, com goleada da seleção brasileira, eu bati um fio para o Toinho Bil, perguntando-lhe qual era o pior dos três: refresco de tabaco, purgante de mamona ou a pouco gloriosa seleção boliviana de futebol.

Ele me respondeu que eu só podia estar brincando ao fazer-lhe uma indagação dessa natureza e que não havia comparação entre as três alternativas. Segundo ele, a resposta era muito simples e que a tal seleção dos bolivianos ganhava fácil no requisito ruindade das outras duas opções.

Ainda tentei argumentar com o meu bom amigo, dizendo-lhe que o jogo contra o Brasil pode ter sido apenas uma jornada infeliz por parte lá dos “patrícios”, que eles nem terminaram as eliminatórias sul-americanas em último lugar, que até venceram alguns adversários, mais isso e mais aquilo.

Mas aí o Toinho Bil foi definitivo dizendo-me que essa geração do futebol boliviano é tão ruim que nem com a ajuda da altitude consegue alguma coisa e que pior do que eles somente mesmo a Venezuela, mas essa não conta porque já entra em qualquer torneio sabendo que vai ser lanterna.

Ponderei pra lá, ponderei pra cá, mas, pra falar a verdade, não encontrei argumentos para refutar a opinião do Toinho Bil. Se os bolivianos não conseguem vencer num ambiente de quase quatro mil metros acima do nível do mar, então é porque não tem reza de padre velho que os ajude.

Então é isso, meus caros amigos que tiveram a paciência de chegar até aqui neste texto meia boca de hoje. Sugiro que todos passem bem longe de refresco de tabaco, purgante de mamona e jogos da seleção boliviana. Que venha a próxima Copa do Mundo com a geração atual de meninos do Brasil!

– Março de 2022 –

Parece mentira

Francisco Dandão

Eu sou uma criatura ingênua (talvez melhor fosse dizer “idiota”), principalmente no que diz respeito à relação entre os humanos. É que eu sempre acredito que a humanidade caminha no sentido da evolução do comportamento. E no sentido do entendimento mediante as divergências.

Quando eu me declaro “ingênuo” (ou “idiota”, tanto faz) é porque, falando dos dias correntes, eu não acreditei em nenhum momento que os russos invadiriam o território ucraniano. Eu sempre acreditei que a história toda ia ficar somente na base da pressão. E que a invasão não aconteceria.

Não consigo ver um único motivo justificável, ou plausível, para um país invadir outro e despejar indiscriminadamente bombas nas cabeças de populares civis. Ainda mais quando são tão díspares as forças entre um país e outro. No caso da Rússia e da Ucrânia a disparidade é absurda.

E não me venham dizer que os alvos são seletivos, que as bombas e mísseis são inteligentes e que não oferecem riscos para quem não tem nada a ver com isso. Conversa pra enganar trouxa! Não existe arma inteligente. Principalmente quando os bombardeios são ordenados por maníacos!

Repito: “maníacos!” Tanto os que ordenam os ataques quanto os que os apoiam ou visitam são nada mais do que “maníacos”, desprovidos de qualquer traço de inteligência e apegados ao poder a qualquer preço. Para estes, o que menos conta é a vida. Covardes que passam longe do front!

Tão covardes que enquanto o conflito se desenrola e as vítimas são jogadas em covas rasas, eles permanecem sentados em seus gabinetes traçando os próximos movimentos dos seus jogos de guerra. Covardes são os que promovem a guerra, os que os apoiam e os que se mantém neutros!

Numa época em que os átomos podem ser divididos ao simples pressionar de botões, essa agressão da Rússia contra a Ucrânia soa como a possibilidade real do extermínio da vida humana sobre a Terra. A ganância, a ambição e a sede de sangue dos canalhas ecoa pelos confins do universo!

Falar nisso, nesse pulsar macabro que se esconde sob a pele dos facínoras, ressalte-se que absolutamente ninguém está a salvo. A barbárie pode surgir em qualquer lugar. Olhando aqui para o Brasil, veja-se que até o ônibus do time do Bahia foi atacado com uma bomba, quinta-feira à noite.

Parece mentira, mas a epopeia da vida pode terminar numa fração de segundos. Parece mentira, mas a racionalidade é um conceito abstrato quando se trata de dimensionar as atitudes de determinados espécimes humanos. Parece mentira, mas a Terra está em transe (como disse Glauber)!

– Fevereiro de 2022 –

Debutante

Francisco Dandão

Temos um debutante acreano na Copa do Brasil. Trata-se do Humaitá, clube ali das proximidades de Porto Acre, que logrou sagrar-se vice-campeão estadual de 2021. O jogo está marcado para esta quarta-feira (23 de fevereiro), no estádio Florestão, se a chuva deixar (ressalte-se de passagem).

Todo debutante costuma subir ao palco (ou à passarela, ou ao campo de jogo etc.) com uma certa dose de nervosismo. Mas, como a experiência ensina, esse nervosismo inicial se acaba tão logo o debutante se acostuma com as luzes da ribalta que incidem sobre o seu corpo. Simples assim.

Uma dificuldade adicional para o Humaitá nessa sua estreia num torneio de tanta magnitude é o fato dele precisar vencer. É que o regulamento determina que o adversário, pelo fato de ser visitante e estar melhor ranqueado, só precisa de um empatezinho para seguir adiante na competição.

Como todo mundo sabe, é mais fácil evitar do que fazer gols. O time que joga pelo empate se dá ao luxo de ficar encolhidinho na defesa e sair somente em contra-ataques. Ou seja, se aproveitar da necessidade de vencer do oponente e ficar enrolando, só esperando a chance de dar uma beliscada.

É claro que existe quem defenda que a melhor defesa é o ataque. Mas, para isso, o time que joga pelo empate tem que ter muita confiança no seu taco. Tem que acreditar que o adversário não tem tantas armas assim para ameaça-lo e que as balas inimigas são todas fabricadas com pólvora seca.

Essa necessidade de vencer do Humaitá, porém, não é a sua única dificuldade. No meu ponto de vista, o fato de o adversário vir de Brasília também pode ser um grande problema. Da capital federal, pelo que a gente vê nos noticiários rotineiros, podem emanar os odores mais pestilentos.

Não que o Brasiliense (o adversário do Humaitá) tenha alguma coisa a ver com isso. Não, nada disso. O Brasiliense é uma equipe honrada que se empenha com unhas e dentes para viabilizar as suas conquistas e merece todo o respeito. A questão é que o poder do Planalto Central é sempre suspeito.

Não fosse assim, não fosse sempre suspeito o poder que emana do Planalto Central, provavelmente hoje nós já tivéssemos a totalidade dos brasileiros vacinados contra o vírus maldito. E não tivéssemos tantas fuzis espalhados em mãos erradas. E ninguém duvidasse da circularidade da Terra.

Enfim, como diziam os romanos, alea jacta est. O Humaitá é Touro (Tourão). O Brasiliense é Jacaré. No jogo dos bichos, eu sou mais o Touro. Principalmente em campo seco. Já no caso de desabar um pé d’água na hora do jogo, aí a coisa pode ficar complicada. Que São Pedro ajude os acreanos!

– Fevereiro de 2022 –

Sebastião Alencar

Francisco Dandão

Acordei na manhã dessa sexta-feira (18) com a má notícia piscando na tela do meu computador: o velho amigo Sebastião Alencar, provavelmente o dirigente que mais fez, de todos os pontos de vista, pela grandeza do Rio Branco, partira desta vida. Octogenário, ele não resistiu ao ataque da Covid.

Há muito tempo nos perdemos de vista. Desde que eu me mudei para Fortaleza, em maio de 2015, são poucos os amigos com quem eu mantenho contato, seja presencial ou via aplicativos de mensagens. E quando passo pelo Acre, o faço de maneira tão rápida que quase não encontro ninguém.

Mas, apesar do prolongado tempo de ausência do querido Alencar, eu de vez em quando lembrava dele, pelas palavras de gente ligada ao futebol que trabalhou com ele. Todos, a uma só voz, elogiando a maneira como ele dirigia o Estrelão, sempre cordial e cumprindo à risca os seus compromissos.

Eu o entrevistei em 2012 para a edição nº 2 do gibi Futebol Acreano em Revista. E hoje cedo, ao saber da partida dele, corri aos meus arquivos para rever o que ele me dissera naquela oportunidade, em quatro horas de bom papo, numa salinha da empresa de distribuição de água que ele criou.

Nas linhas a seguir, vou reproduzir trechos do que ele disse naquele dia, como forma de homenagem à memória desse excepcional desportista.

Sobre a chegada dele ao Estrelão: “O meu ingresso no Rio Branco se deu por conta de um convite que eu recebi do advogado Edmir Gadelha e do jornalista José Leite, porque naquele momento havia uma dificuldade para encontrar pessoas que quisessem compor a direção do clube”.

Sobre a questão das receitas do Rio Branco: “(…) uma das minhas preocupações era justamente dotar o clube de uma fonte de receita. Foi aí então que eu tive a ideia de construir a galeria de lojas na frente do estádio.”

Sobre o processo de formação dos elencos: “(…) pelo fato de eu ser o gerente local da Vasp, eu tinha um relacionamento grande em nível de Brasil. E eu tinha amizade com gente que também gostava de futebol. E através dessas pessoas eu costumava ter informações a respeito de muitos atletas.”

Sobre feitos marcantes do Rio Branco sob o seu comando: “Eu acho que chegar às oitavas de final de uma Copa do Brasil, que foi aonde chegamos em 1997, isso se configura num feito extraordinário.”

Sobre os melhores técnicos com os quais ele trabalhou: “Na época do amadorismo, o melhor técnico com o qual eu trabalhei foi o Antônio Leó. (…) na fase profissional, um treinador que eu gostei muito de trabalhar foi o Marcelo Altino, um carioca que eu conheci trabalhando em Goiás (…)”

Grande Sebastião Alencar: Requiescat in pace!

– Fevereiro de 2022 –

Viver de amor

Francisco Dandão

Recebi por esses dias, com o autógrafo do autor, um livro de crônicas e poesias recheado de reminiscências e profundo lirismo, intitulado “Escolhi viver de amor”. Costumo ler rápido, mas essa obra, em especial, estou lendo a passos lentíssimos e, não raro, voltando para ler de novo a mesma página.

“Escolhi viver de amor” é o terceiro livro do meu dileto amigo Francisco Antônio Saraiva de Farias, que foi meu contemporâneo enquanto servidores (eu e ele) durante mais de 30 anos na Universidade Federal do Acre. Um cara que sempre exibiu um sorriso largo no rosto amazônida.

No tempo presente, aposentado do serviço público, Saraiva é conhecido como escritor de verbo fácil e memória prodigiosa. Algumas páginas dos livros dele são como fotografias de outra época das florestas acreanas. O que ninguém sabe é que o homem também foi “futeboleiro”.

Sim, o Saraiva foi lateral-direito do Americano (time da Cadeia Velha), no período de 1974 a 1984. Lateral daqueles de não levar desaforo pra casa. Do tipo que só pedia os documentos dos ponteiros depois de derrubá-los no chão. Carniceiro, mas que sabia jogar com a bola nos pés.

O Americano, segundo me contou o escritor, ganhava todos os torneios que disputava nas colônias de Rio Branco, permanecendo muitos anos invicto, alinhando a seguinte formação: Nonato; Saraiva, Amarildo, Jofre e Sulinha; Alfredo, Alemar e Bolinha; Bugi, Gilson e Raimundo.

Reza a lenda que, lá pelas tantas, depois de exibições nos campos do Juventus e do Vasco, Saraiva teria até sido sondado para defender as cores do Clube da Águia e do Almirante da Fazendinha. No primeiro ele seria reserva do Mauro. Já no segundo, ele seria suplente do Carlos Quarenta.

Mas, ainda de acordo com a lenda, ele se desviou das sondagens por duas razões. Primeira: ele teria dificuldade em conciliar os treinos com as aulas do curso de Pedagogia, onde o dito cujo era acadêmico. Segunda: nas horas vagas, ele preferia desfrutar umas geladas no bar do Mané com Sono.

Por uma razão ou outra, o certo é que o Saraiva teve que dar um fim na sua história com a bola aí pelo segundo semestre de 1984, depois de, num dia de chuva, levar um sarrafo de um jogador de nome Raima (irmão do saudoso Cirênio). Um sarrafo tão grande que o homem “desmentiu o joelho.”

Numa época em que a ortopedia e a fisioterapia não eram tão avançadas, o joelho “desmentido” do lateral nunca mais o deixou entrar em campo. Eu penso que o Raima foi um instrumento do destino para fazer o mundo ganhar um poeta e memorialista do porte do meu amigo Saraiva!

– Fevereiro de 2022 –

Migué

Francisco Dandão

Não sei se “migué” ainda é uma expressão usada no mundo do futebol. Com todas as modernidades (ou pós-modernidades) em curso na vida da gente, muita coisa já ficou para trás. É a marcha do tempo que vai tratando sempre de renovar o que existe. Faz parte da existência. Faz parte sim.

Mas se muitos não sabem o que significa “migué”, eu trato de explicar. Isso é o que se falava quando um sujeito dizia uma coisa querendo dizer outra. Podia significar também um fingimento. Um jogador, com medo de enfrentar um adversário, simulava uma contusão. Ficava “de migué”.

No futebol acreano do passado, na primeira metade da década de 1970, tempo do chamado “amadorismo marrom” (quando os jogadores ganhavam pra jogar, mas não assinavam um contrato profissional), o Rio Branco tinha um lateral-esquerdo, o Stélio, que batia mais do que a polícia do Afeganistão.

Os ponteiros direitos da época, então, não raro costumavam dar uma “de migué” quando precisavam enfrentar o inimigo carniceiro. Os caras ou se contundiam nas vésperas dos jogos ou então só fingiam que iam pra cima do referido lateral. No mais das vezes, passavam longe da linha de fundo.

Que eu bem me lembre, havia um ponteiro que não corria do pau quando enfrentava o Stélio. Chamava-se Bico-Bico. Baixinho, invocado, veloz e exímio driblador, movido quase sempre a generosas doses de cachaça, o Bico-Bico não queria nem saber quem era o lateral. Ia pra cima.

E nessas de “migué” teve o caso concreto de um lateral chamado Baiano, do Juventus, que um dia, quando o seu time levava um sufoco do ataque do Independência, querendo travar o jogo (“fazer cera”, como se diz na gíria), depois de um choque com um adversário, caiu se torcendo de dor.

Acontece que o médico do Juventus era um boliviano recém chegado ao Brasil. Além de entender pouco o idioma português, o tal boliviano aparentemente jamais havia trabalhado com futebol. Compreensivelmente, então, se estabeleceria uma falha na comunicação entre ele e o jogador.

Quando viu o Baiano uivando de dor, o boliviano saiu em desabalada carreira, atravessando o gramado sob os protestos do árbitro. Aí, chegando onde o baiano se encontrava, perguntou: “Onde foi a pancada?” O Baiano respondeu: “É migué, doutor.” Tréplica do médico: “E onde é esse migué?”

É por aí, meu estimado leitor. Mesmo que a expressão não mais exista no planeta futebol, o certo é que o mundo está cheio de gente “dando um migué.” É isso, aliás, o que fazem os times europeus quando vão disputar o mundial de clubes: fingem desinteresse, mas dão o sangue dentro do campo!

– Fevereiro de 2022 –

Comemorações

Francisco Dandão

Dois craques do passado do futebol acreano fazem aniversário neste mês de fevereiro. Falo de Paulo Henrique, meia que vestiu as camisas de Rio Branco e Juventus, entre 1979 e 1996; e de Roberto Ferraz, atacante que defendeu as cores de Inter, Rio Branco e Juventus, entre 1978 e 1987.

Paulo Henrique, cujo sobrenome é Costa de Andrade, nasceu em Rio Branco, no dia 14 de fevereiro de 1964, tendo sido descoberto para o mundo do futebol aos 15 anos, em 1979, depois der sido visto pelo técnico Illimani Suares numa pelada de futebol de salão na quadra do bairro Habitasa.

A ascensão do meia foi meteórica. Eleito pela crônica esportiva como o melhor jogador do campeonato acreano infantil de 1979, no ano seguinte ele foi chamado para jogar nos juvenis. E quando chegou 1982, aos 18 anos, pelas mãos de um técnico chamado Vianinha, ele subiu para o time principal.

Dois outros aspectos são dignos de registro na carreira do Paulo Henrique Andrade. Primeiro: lá pelas tantas ele teve um problema nas articulações, foi diagnosticado como acabado para o futebol, mas deu a volta por cima. Segundo: ele também jogou futebol de salão em altíssimo nível.

Quanto ao Roberto Ferraz, que nasceu em Xapuri, no dia 28 de fevereiro de 1961, na minha opinião ele foi simplesmente um dos três maiores ponteiros direitos da história do futebol acreano (os outros dois, sempre no meu entendimento, foram o Paulinho Rosas e o Bico-Bico).

Ferraz chegou ao Internacional junto com o amigo Brizola. Eles jogavam na categoria infantil do Time do Barbadinho. Fizeram um teste no Saci do Ipase, em 1978, e passaram a alternar partidas nas categorias juvenil e principal. Um ano depois, ele se mudou para o então poderoso Rio Branco.

A ida para o Rio Branco, aliás, só aconteceu por causa de um baile de carnaval. É que Roberto queria entrar no tal baile, mas não era sócio do clube. O presidente Alencar, ao se inteirar do desejo da então jovem promessa, tratou de abrir-lhe as portas e no dia seguinte mandou o contrato pra ele.

Roberto Ferraz amadureceu para o futebol no Rio Branco, onde permaneceu até 1986, sagrando-se campeão acreano três vezes (1979, 1983 e 1986) e duas vezes campeão do Copão da Amazônia (1979 e 1984). Depois disso foi passar o último ano da carreira no Juventus, onde estourou o joelho.

Embora a memória seja um território movediço, cultivo lembranças desses dois caras que jogaram muito, inclusive no mesmo time (o Rio Branco), durante várias temporadas. Um era o arco (Paulo Henrique) o outro era a flecha (Roberto Ferraz). As traves adversárias eram o alvo comum!

– Fevereiro de 2022 –

Segunda chance

Francisco Dandão

Pelo segundo ano consecutivo, a gloriosa Sociedade Esportiva Palmeiras vai ao Mundial de Clubes. O time, antes que alguém pergunte, fez por merecer disputar duas vezes seguidas essa competição que reúne equipes de todos os continentes e que durante alguns dias atrai as atenções do planeta.

No ano passado, o Palmeiras fez a pior campanha de um time sul-americano no Mundial de Clubes: jogou duas vezes, perdendo a primeira por 1 a 0, para o mexicano Tigres, e empatando a segunda em 0 a 0, com o egípcio Al Ahly. Depois o Al Ahly venceu numa disputa de penalidades.

Nesse aspecto de fracasso, registre-se que o Palmeiras foi o primeiro time da América do Sul que perdeu a vaga para a final para um time da Concacaf (Confederação da América do Norte, Central e Caribe). E também é um dos dois (o outro é o Cruzeiro) que jamais marcaram gols num Mundial.

Mas contra os mexicanos até que que a derrota não foi tão estranha assim. Afinal, ao longo da história, tanto os times quanto a seleção do México sempre impuseram grandes dificuldades aos adversários brasileiros. Qualquer resultado entre Brasil e México pode ser considerado bem normal.

Já contra os egípcios, que me perdoem os beduínos e seus respectivos camelos/montaria, não há justificativa para uma derrota de um time brasileiro para um representante lá deles. Embora reze a lenda que não há mais bobos no futebol, um time do Brasil tem obrigação de vencê-los sim.

Como se costuma dizer que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar (embora isso possa acontecer), o que a gente espera é que o desempenho do Palmeiras agora seja bem diferente do que foi no ano passado. Ficar pelo caminho e não chegar à final seria uma duplo fiasco.

Por um capricho do destino, o adversário da vez do Palmeiras, na próxima terça-feira (dia 8), vai ser novamente um time egípcio (o próprio Al Ahly) ou um mexicano (no caso, agora, o Monterrey). Ou seja: uma ótima oportunidade de ir à forra, tirar os caras da disputa antes do último prazo.

Digo que vai ser um ou outro adversário porque escrevo na manhã de sexta-feira (4) e o jogo entre eles, do qual sai o adversário do Palmeiras, está marcado para o sábado (5). Eu acho que vai dar Monterrey, mas é só por “achismo” mesmo. Puro palpite, sem nenhuma conexão com o plausível.

Enfim, que o Palmeiras possa aproveitar essa segunda oportunidade consecutiva para trazer o “caneco” do Mundial para esse lado de cá do Atlântico. Faz tempo que um time da América do Sul não sente o gostinho do título. Se não me engano, o último foi o Corinthians, em 2012. Eca!

– Fevereiro de 2022 –

Mineração

Francisco Dandão

Segue animado o período de pré-temporada dos times acreanos, com a chegada de reforços, mudanças de nomes, contratações, apostas em novos técnicos etc. O que mais me chama a atenção, porém, para além de qualquer coisa, são os amistosos que os clubes estão realizando pelo interior do estado.

Nesse fim de semana que recém passou, a exemplo disso que eu disse no parágrafo anterior, o Rio Branco e o Galvez pegaram a estrada e foram mostrar a sua bola por aí. O Estrelão se deslocou à Sena Madureira, onde bateu a seleção local por 4 a 1. E o Imperador foi golear em Assis Brasil.

Assis Brasil, lá na fronteira brasileira com o Peru, jamais teve um time de futebol profissional nos seus anos de existência. A ida de uma equipe da capital até a cidade, portanto, se constitui numa oportunidade rara para os seus habitantes verem em ação os “craques” que vivem de gastar a bola.

No que diz respeito à Sena Madureira, aí existem várias diferenças com Assis Brasil. Primeiro que na Princesinha do Iaco, em outro tempo, houve um time que jogou campeonato profissional. Segundo que, pela proximidade das cidades, quem mora lá pode assistir jogos em Rio Branco.

Mas fora tudo isso, o que eu vejo como mais interessante dessa ida dos times da capital para o interior é a possibilidade da mineração de novos valores que estão lá nas suas respectivas cidades prontinhos (ou precisando de alguma lapidação) para serem aproveitados num patamar superior.

Aliás, num passado que começa a ficar distante, os times de Rio Branco, antes de importar jogadores de outros estados, tratavam de procurar promessas de craques no próprio interior. Nessa onda, são inúmeros os garotos que migraram das suas pequenas cidades para os clubes da capital.

Num exercício rápido de memória, eu lembro de pelo menos meia dúzia que foram “garimpados” por olheiros no interior do Acre. A saber: Doka Madureira (Sena), Ramon (Cruzeiro do Sul), Alcione (Brasiléia), Máximo (Plácido), Josman e Rogério Tarauacá (ambos de Tarauacá).

Todos esses em algum momento das suas carreiras romperam as fronteiras do Acre para mostrar o que sabiam fazer com uma bola nos pés (ou nas mãos, no caso do Máximo, que era goleiro) em algum clube de fora do estado. O Doka, especificamente, deslumbrou até as plateias da Europa!

É isso, meus prezados. É importante cuidar para que nada possa ser (ou estar) perdido no próximo minuto. Às vezes é necessário olhar primeiro para dentro de si mesmo. A solução pode estar bem aquém do longínquo horizonte. E apesar dos idiotas, é preciso acreditar na evolução da espécie!

– Fevereiro de 2022 –

Um homem sensato

Francisco Dandão

Wilmar Roldán, árbitro colombiano que apitou o jogo dessa quinta-feira (27) entre as seleções do Equador e do Brasil, pelas eliminatórias da Copa do Mundo do Catar, foi crucificado pela imprensa e pelos torcedores nas redes sociais, tão logo o empate em um a um foi dado como definitivo.

Tudo porque Roldán voltou atrás em várias marcações, depois de alertado dos seus erros pelo sistema do VAR. O fato é que ele marcava alguma irregularidade que havia visto no decorrer do confronto e, em seguida, ao ser alertado pelo vigilante eletrônico, desconsiderava a decisão.

Somente o goleiro Alisson, do time brasileiro, foi expulso duas vezes. E duas vezes também foi devidamente “perdoado”. Em ambos os lances, Alisson atingiu de forma um tanto violenta jogadores adversários. A questão é que Alisson só os atingiu depois de ter acertado a bola, objeto de culto.

Roldán, em gestos ostensivos, levantava o cartão vermelho acima da cabeça e à vista de todo o estádio. Ato contínuo: depois de chamado ao monitor de televisão, ao lado do campo, voltava um tanto cabisbaixo para onde estava o goleiro e fazia um gesto discreto de anulação da punição.

Houve até um pênalti marcado e desmarcado contra o time brasileiro. Numa fração de segundos, dentro da área do Brasil, dois pés se chocaram (um brasileiro e um equatoriano). Wilmar Roldán apitou e apontou para a marca fatal. No frigir dos ovos foi o equatoriano que atingiu o brasileiro.

Aí já viu como é, né? Foi pancada de todo lado no lombo do árbitro colombiano. A mídia, muitas vezes à procura de algum vilão, desceu o porrete. E a galera, sei lá se na onda dos críticos abalizados (ou não), embarcou na onda e só não chamou Sua Excelência de santo e inocente.

Pois eu lhes digo: Roldán, no meu entender, pelas suas atitudes na direção desse jogo entre Equador e Brasil, se comportou da maneira mais sensata possível. Em vez de errar e permanecer no erro, não teve o pudor de dar o braço a torcer e de reconhecer que as decisões não eram as mais justas.

É preciso levar em conta que o VAR não tem o poder de mudar a marcação do árbitro no campo de jogo. Sua Senhoria ali dentro das quatro linhas é soberana. Os operadores do VAR apenas sugerem que alguma decisão pode estar equivocada. Mas o árbitro acata a sugestão se quiser.

Mudando de pau pra cacete, como seria bom se os psicopatas e negacionistas brasileiros investidos de poder seguissem o exemplo do árbitro Wilmar Roldán e mudassem suas atitudes a respeito de determinadas decisões e cloroquinas. Certamente muitas vidas ainda poderiam ser salvas!

– Janeiro de 2022 –

Banca de revista

Francisco Dandão

Eu sou de uma geração cuja principal fonte de informação era a palavra escrita, seja de forma impressa ou manuscrita. Por manuscrita, faço alusão às cartas que eram entregues pelo serviço dos Correios, às vezes com um atraso considerável. Por impressa, me refiro a todo o resto: revistas etc.

A palavra impressa, cuja invenção é atribuída ao alemão Gutenberg (há quem diga que um chinês o precedeu nessa técnica) foi a primeira forma de comunicação em larga escala. Só depois, bem depois, é que vieram o brasileiro padre Landell de Moura e o italiano Marconi (os caras do rádio).

Como ninguém anda para trás, os anos passaram, a tecnologia deu um salto gigantesco e, nos dias presentes, tanto a palavra impressa quanto o rádio perderam a sua primazia no mundo das comunicações de massa. E agora são os smartphones que nos trazem as notícias do universo, em tempo (ir)real!

Entretanto (como aquela pedra do poema do Drummond de Andrade, há sempre uma conjunção no meio do caminho), apesar dos “smarts”, eu ainda sou uma espécie de cultor da palavra impressa. Não posso ver uma livraria ou uma banca de revista que já vou entrando pra dar um “bizu”.

Pena (para mim e para outros saudosistas/românticos como eu) que tanto as livrarias quanto as bancas de revistas estejam minguando. É a lei do mercado: só existe oferta se existir demanda. Se a demanda está diminuindo é natural que a oferta também sofra um igual processo de retração.

Em qualquer cidade brasileira (ou do planeta), se o sujeito demorar muito para ir a um endereço onde havia uma banca de revista ou livraria pode não mais encontrá-la. Pode haver no local qualquer outro empreendimento ou nada. Só um espaço vazio. E os livros e revistas, sabe-se lá aonde foram.

Eu lembro, nessa onda de nostalgia de um passado que jamais voltará, que em Rio Branco havia dezenas de bancas de revistas. E a gente, mesmo sem marcar encontro, se encontrava por lá para pegar o jornal do dia. E as notícias, além das páginas, acabavam também correndo de boca em boca.

Não sei quantas daquelas antigas bancas de revistas de Rio Branco resistiram à passagem do tempo e à chegada das novas tecnologias. O que sei é que uma delas, embora combalida, continua de pé, na praça Eurico Gaspar Dutra, em frente ao Palácio Rio Branco: a lendária Banca do Pelé.

É certo, porém, que até a Banca do Pelé um dia sucumbirá, se não for feito um esforço, principalmente por parte do poder público, para mantê-la existindo. Ainda que os leitores desapareçam, a Banca do Pelé merece permanecer naquele lugar, nem que seja como testemunha de uma época!

– Janeiro de 2022 –


Início de temporada

Francisco Dandão

Dentro de um mês, se nada de anormal vier a acontecer, começa o campeonato acreano de 2022. Digo “se nada de anormal vier a acontecer” porque a tal variante Ômicron dessa merda de coronavírus está cada vez mais se disseminando pelo mundo. E então, nunca se sabe o que será o amanhã.

É preciso ter fé em Deus e fé na vida para que o futuro chegue de mãos dadas com a felicidade. É preciso esse exercício de fé, mas também é preciso que o mundo da política seja ocupado por pessoas sensatas, que acreditem no poder da ciência e não tenham, digamos, muitos problemas de intestino.

Mas voltando ao fio da meada, o start dessas potocas de hoje, mais do que nunca mal traçadas linhas (como eu não sou nenhuma divindade, posso me dar ao luxo de escrever torto por linhas igualmente tortas)… Papai do céu me livrou de eu me chamar “Messias”. Seria uma piada de mau gosto.

Acabei não voltando ao fio da meada no parágrafo anterior. O faço agora. É que eu falava que daqui a um mês começa mais uma edição do campeonato acreano. E, como é de praxe, as notícias que se tem nas diversas folhas é sobre a formação dos elencos (quem sai, quem fica, quem chega).

Pra começo de conversa, segundo o meu editor e afilhado Manoel Façanha, esse vai ser um campeonato que vai render mais alguns empregos para os diversos profissionais do futebol regional. Isso porque serão onze times que entrarão na briga. Muito bom isso. Mais emprego é sempre legal.

Voltam Adesg e Independência. Como ambos estiveram afastados das últimas competições da Federação de Futebol do Acre, a gente nunca sabe como é que eles irão a campo. O que eu já sei de antemão é que a Adesg não vai poder jogar no seu campo, uma das armas do time em outras épocas.

Sim, isso mesmo, o estádio da Adesg, denominado Naborzão (não sei porque era chamado assim no aumentativo, porque nem a referida praça esportiva nem o ex-político que empresta seu nome ao local são de tamanho avantajado), era o que se poderia chamar de alçapão. Cheio de armadilhas!

Se o jogo começasse às 17 horas e entrasse pela noite, então, a coisa se complicava: com uma iluminação precária, do tipo de boate, os visitantes da Adesg sofriam. Toda bola cruzada na área se transformava numa tortura fascista para os goleiros adversários, desacostumados à luz meia boca.

Mas é isso, meus prezados. O que é feito no presente ecoa lá no futuro. Às vezes no futuro imediato, às vezes no distante. O castigo ou a recompensa são certos. Quem com a cloroquina feriu, um dia também será ferido pelo julgamento popular. Que venha para nós “tarados” a quarta dose da vacina!

– Janeiro de 2022 –


Reminiscências

Francisco Dandão

Recebi um dia desses um texto produzido pelo ex-lateral esquerdo Antônio Maria, reconhecido como um dos maiores jogadores do futebol acreano dos tempos do amadorismo. Um texto cheio de reminiscências, escrito no Dia do Amigo, tendo como foco o falecido craque Dadão.

O Antônio Maria e o Dadão, vizinhos de bairro na infância, cresceram batendo peladas nos mesmos espaços.

Mas vamos ao texto, o qual eu reproduzo aqui alguns trechos, lembrando que o ex-lateral mora hoje em Foz do Iguaçu. Daí talvez a nostalgia!

“(…) Comecei a lembrar dos meus amigos, a maioria a quase 3.400 km de distância de onde eu moro. Outros tantos já não se encontram entre nós. Daí tomei a decisão de focar em um dos muitos amigos que tenho a honra de chamar assim. (…) Após muita reflexão, escolhi o Dadão. Fechei os olhos e comecei a fazer uma retrospectiva.

(…) No início da década de 1960, meninos de dez anos (tínhamos a mesma idade, nascemos em 1950, ele dia 18 de julho e eu em 17 de outubro). Ele morava na rua Floriano Peixoto, próximo à Rádio Difusora Acreana e eu há uma quadra, no início da rua Benjamin Constant. As peladas ocorriam nos campinhos improvisados: em frente à Difusora no terreno da casa dos pais da escritora Glória Peres; outro campinho ficava em frente à Catedral onde hoje é a Pracinha dos Tocos; o terceiro campinho era onde hoje é o Sesc e finalmente a quadra em frente ao Palácio do Governo.

(…) Esses foram os principais palcos onde o Dadão se apresentava antes de chegar aos clubes de futebol. Lembro ainda que estudamos o primário na mesma turma. No Colégio dos Padres lembro dos amigos Ricardo Eluan, Romeu, Irmãos Beiruth, Mário Gil, Temístocles, Roney Neves, Eloy Abud Filho, D’anzicourt, Jansen Pacheco, dentre outros.

(…) Na metade da década, partimos para excursões nos municípios próximos de Rio Branco: Boca do Acre-AM, Xapuri-AC e Sena Madureira-Ac. Em 1966 surgiu o Juventus, que eu ajudei a fundar. Ele, como jogava muito, já era jogador do Rio Branco. Eu era juvenil do Juventus. Em 1969, cheguei à equipe principal do Clube do Povo.

(…) Ainda em 1968 servimos o Exército Brasileiro. Eu e o Dadão fizemos um curso para cabo recruta e com seis meses de caserna fomos empossados como cabos. Em 1970, Dadão deixou o Acre e foi brilhar no futebol carioca, no Fluminense.

(…) Em 1973, ele voltou para o Juventus onde continuamos jogando juntos. Em março de 1976, interrompi minha carreira de jogador por um ano e fui estudar na USP, retornando a tempo de jogar as últimas partidas do campeonato daquele ano. E em 1978 fui morar em Porto Alegre onde fiz o mestrado em Ensino de Física na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Voltei três anos depois e encerrei minha carreira futebolística ganhando o Copão da Amazônia de 1981.”

– Janeiro de 2022 –


Dia de lapada

Francisco Dandão

Não quero ser ave de mau agouro ou profeta de catástrofes de jeito nenhum, mas tudo indica que neste 5 de janeiro é dia do nosso glorioso Andirá, cujo símbolo desde a sua fundação, na primeira metade da década de 1960 é um morcego, levar outra lapada na Copa SP de Futebol Júnior.

Se na estreia, contra o Linense, um clube sem grande representação no cenário nacional, o “morceguinho” não deu nem para o começo, levando uma goleada de cinco a zero, imagine agora que o adversário é o tradicional Atlético Mineiro. Agora a coisa toda se configura mais feia do que antes!

Tudo bem que um jogo de futebol não se decide na véspera. Tudo bem também que são onze contra onze. E igualmente tudo bem que um raio dificilmente cai no mesmo lugar. Mas a julgar pelo que o Andirá não jogou na estreia, a lógica diz que o Galo das Minas vai somar mais três pontinhos.

Eu não vi o jogo todo do Andirá contra o Linense. Vi só parte do primeiro tempo. Os minutos que eu vi, porém, me deixaram uma impressão péssima. O time acreano em nenhum momento dessa parte que eu assisti criou qualquer situação de perigo ao gol do adversário. Nenhuma mesmo.

E o primeiro gol dos caras, que coisa bizarra: um cruzamento para a “fogueira”, um atacante entrando no meio dos dois zagueiros de área do Andirá e cabeceando a bola como se estivesse ali só fazendo um cumprimento para alguém conhecido. Coitado do bom goleiro Rikelmo!

Quando um atacante se infiltra no meio de dois zagueiros, só pode significar que os referidos defensores estavam mais ligados na bola do que no adversário. Eu sei que isso pode acontecer até nas boas famílias. Mas é algo que deve ser ensinado aos garotos: “um olho no padre e outro na missa”.

Independentemente de qualquer insucesso (ou de goleadas que, porventura, venham a acontecer nos demais jogos), o certo é que o Andirá é o campeão acreano e, por conseguinte, o melhor time do estado na categoria. O que faz a gente presumir que qualquer outro seria pior do que o Morcego.

Então, dito isso, também sempre de maneira presumida, parece que o futebol acreano vive uma violenta crise de novos talentos. Salvo engano, não existe nenhum garoto no qual alguém possa apostar todas as suas fichas no sentido de que ele vá se tornar uma futura estrela do futebol planetário.

No meu entender, trata-se de uma crise que já se instalou há algum tempo. Prova disso são as más atuações dos representantes acreanos nas competições regionais e nacionais. Os times profissionais do Acre ultimamente só entram nos torneios para fazer figuração. Lamentável!

– Janeiro de 2022 –


Equador

Francisco Dandão

Todo mundo sabe que a capital do Equador é sempre Quito. Todo mundo sabe, mas não é aconselhável que essa frase seja dita (ou lida) de forma rápida. Localizada a quase três mil metros de altitude, Quito é a segunda capital mais alta do mundo. Só perde para a boliviana La Paz.

Pois é nesse lugar a meio caminho das nuvens que a seleção brasileira vai jogar nesta quinta-feira (27). Como a gente sabe que jogar numa altitude dessas não é pra qualquer um, provavelmente esse fato servirá de desculpa para o caso de o time do Brasil perder a invencibilidade nas eliminatórias.

Outra desculpa, caso o Brasil leve um couro do Equador, é o fato de que a seleção verde e amarelo já está classificada para a Copa do Catar. Até aqui, muito mais pela fraqueza alheia do que pelos próprios méritos, os brasileiros passearam nas eliminatórias: 13 jogos, 11 vitórias e dois empates.

É verdade que a altitude faz uma diferença enorme para quem não está acostumado com ela. Eu sou testemunha disso. Já estive em duas cidades bem no alto do morro: Cusco, a 3.400 metros acima do nível do mar; e La Paz, a 3.640 metros. Respirar é um ato de resistência numa altitude dessas.

A minha experiência em La Paz foi terrível. Alguns minutos depois que eu desci do avião o mundo literalmente girou ao meu redor. Tive que me sentar por um bom tempo e beber um pote de chá de coca para minimamente recuperar a respiração. Passei cinco dias andando devagar como um jabuti.

Em Cusco, já com alguma experiência na montanha, o sofrimento foi um pouco mais ameno. Descobri um comprimido chamado Sorojchi Pills que me obrigou a dormir por algumas horas e depois me fez passar bem nos dias sequentes. Os antigos deuses incas correram céleres em meu socorro.

Também é verdade que um time que já está classificado para a etapa seguinte de uma competição pode perder o interesse na disputa. Já cansei de ver times cujas partidas se transformaram em amistosos de luxo diminuírem o ímpeto contra adversários que jogam a vida. De forma até inconsciente.

Nem uma coisa nem outra, porém, nesse caso do jogo do Brasil contra o Equador, no meu entender, me soam como argumentos definitivos para justificar um eventual resultado negativo. A diferença entre as duas seleções é muito grande. Pelo menos na tabela de classificação para a próxima Copa.

Resumindo a ópera: se a seleção brasileira quiser continuar com o apoio dos seus torcedores, não pode deixar a seleção do Equador se criar. Como diz o poeta, “para o rio tudo é hoje”. Quem for podre vai se arrebentar. E quem está na chuva é pra se molhar (ou seria pra “se queimar?”). Diga aí.

– Janeiro de 2022 –


Tomate em alta

Francisco Dandão

Seja como for, venha o que vier (de acordo com a música, já está valendo até dançar homem com homem e mulher com mulher), o Tomate está em alta, tanto no mercado do futebol quanto nas feiras livres. Um porque fechou o gol do Andirá Sub-20. O outro por conta da inflação desenfreada.

Como para essas mal traçadas de hoje o que conta é o Tomate do futebol, vamos ao que interessa, que eu não aguento deixar de meter o meu bedelho num assunto dessa magnitude. Antes, porém, devo dizer logo de cara que eu sou um desses tarados pela vacina que a canalhada tanto abomina.

Pois bem. Dito isso, sigamos em frente. Primeiramente, não posso deixar de louvar esse garoto que saiu do interior do Acre para se transformar num paredão de um jogo contra um clube do potencial (técnico e financeiro) do Galo Mineiro. O cara, enquanto esteve em campo, pegou até pensamento.

O Andirá, pra falar a verdade, não chegou nem uma vezinha a incomodar o goleiro dos mineiros. Foi um jogo de ataque contra defesa. O Atlético atacando e o Andirá defendendo. O setor defensivo do Morcego do Acre, porém, não teria sucesso se não fosse essa muralha chamada Tomate.

A propósito, já que eu estou falando de goleiros, deve-se lembrar que o futebol acreano sempre esteve muito bem servido nessa posição. Ao longo da história, de vez em quando um goleiro nascido nas terras de Chico Mendes e Galvez é (ou foi) convocado para prestar os seus serviços pelo mundo.

Enquanto escrevo, lembro de três nomes dessa posição que brilharam no futebol de outros estados: Zé Augusto, Xepa e Weverton. O primeiro, no final dos anos de 1960, foi para o Flamengo carioca. O segundo, na década de 1970, jogou no Fast de Manaus. E o terceiro, este dispensa comentários.

Mas voltando ao Tomate da Copinha, que fechou o gol e foi sacado das traves na hora do pênalti, o que fez todo mundo cair de pau no treinador Kinho, por conta da substituição, talvez ali, por vias transversas, tenha começado verdadeiramente a carreira do garoto. Agora só depende dele.

Com o convite que ganhou para fazer testes no próprio Atlético Mineiro, o Tomate só tem que repetir em cada treino o que fez no jogo de quarta-feira passada: exercitar a sua técnica e encarar com a maior seriedade possível essa oportunidade que o destino lhe está dando para subir na vida.

Quanto ao técnico Kinho Brito, embora eu também considere que ele tenha tomado uma decisão infeliz, não creio que se deva apedrejá-lo. Afinal de contas, caso o goleiro que entrou no lugar do Tomate defendesse o pênalti, a essa hora muita gente o estaria alçando ao patamar de grande estrategista!

– Janeiro de 2022


Dois cracaços!

Francisco Dandão

Um dia desses do infinito tempo, num desses lugares do espaço por onde eu passei ultimamente, vi um cartaz conclamando jovens a entrarem numa escola de atores para se iniciarem nas artes da representação. A frase que sintetizava o apelo era a seguinte: “Venha aprender a viver várias vidas”.

Aí, um pouco depois, eu tive a prova dessa vivência de múltiplas vidas ao assistir, numa mesma semana, dois filmes da recente produção brasileira: “Marighella”, de Wagner Moura, e “Pixinguinha – Um homem carinhoso”, de Denise Saraceni, ambos tendo como protagonista o ator Seu Jorge.

Ali, na sala escura de projeção, num espaço de dois dias de diferença, eu vi o ator/cantor Seu Jorge se transmutar nos papeis de guerrilheiro em luta contra uma cruel e sanguinária ditadura militar, fato da história política do Brasil, e de virtuose da música nativa, que influenciou gerações de músicos.

No que diz respeito a Marighella, cujo prenome era Carlos, resumindo, pra quem por acaso esteja alheio da história recente destes trópicos, ele foi considerado pelos milicos brasileiros, na década de 1960, o “inimigo número um do país”. E, por isso, foi executado numa rua de São Paulo, em 1969.

Baiano de Salvador, nascido no dia 5 de dezembro de 1911, deputado federal na segunda metade da década de 1940, Carlos Marighella se insurgiu contra o regime de força instalado no Brasil em 1964, ajudando a criar uma organização de combate ao poder intitulada Ação Libertadora Nacional.

Quanto ao Pixinguinha (Alfredo da Rocha Vianna Filho), que nasceu no Rio de Janeiro, no dia 23 de abril de 1897, ele foi provavelmente o músico mais famoso do seu tempo, fazendo sucesso, inclusive, na capital da França, empolgando os europeus com ritmos como o choro, o samba e a valsa.

Pixinguinha, cujos principais instrumentos eram a flauta e o saxofone, foi um criador compulsivo, que viveu unicamente da sua arte, agregando às suas composições elementos da música de raiz brasileira e do jazz norte-americano. Irônica (ou gloriosamente), ele morreu dentro de uma catedral.

Marighella e Pixinguinha, nas suas respectivas atividades, ainda que tão díspares, foram dois cracaços da história recente do Brasil. Felizmente, por iniciativa de Wagner Moura e Denise Saraceni, eles voltam na sua plenitude para o conhecimento e a lembrança das novas e velhas gerações.

Sim, “pra não dizer que eu não falei de flores” (propositadamente citando Geraldo Vandré), levando em conta que essas mal traçadas aqui deveriam falar de esportes, não custa lembrar que o Atlético Mineiro fechou o ano com uma tríplice coroa. O Galo vencedor canta alto nas Alterosas!

– Dezembro de 2021 –


As seleções do meu compadre

Francisco Dandão

Um dia desses, eu resolvi entrevistar o meu compadre José Augusto Fontes, juiz de direito, memorialista, e poeta dos melhores que o Acre já viu nascer. E no meio das questões, como eu sei da sua paixão pelo futebol, pedi que ele escalasse duas seleções: a acreana e a brasileira de todos os tempos.

Foi aí que o bicho pegou. Meu compadre, que vinha respondendo às perguntas na maior desenvoltura e com a elegância que desde muito tempo constituem o seu verbo, deu uma “engasgada” e começou dizendo que a tarefa era por demais ingrata, uma vez que deixaria muita gente boa de fora.

Nas palavras dele, “uma seleção brasileira de todos os tempos com apenas onze jogadores vai deixar de fora muitos craques. Seleção do Acre, também”. E citou uma fala do Gerson, o Canhotinha de Ouro, sobre uma vaga do Neymar no time de 1970. “No lugar de quem?”, teria dito o Gerson.

Para não me deixar sem resposta, entretanto, o meu compadre disse o seguinte sobre a seleção brasileira de todos os tempos: “Seria a de 1970, incluindo Garrincha e Ronaldo. Ou a seleção de 1982, incluindo Pelé, Garrincha e Ronaldo. Poderia também ser a de 2002, com Pelé e Garrincha”.

Como o meu compadre não disse no lugar de quem os seus escolhidos entrariam, eu fiz aqui um exercício de imaginação para tentar descobrir. Na seleção de 1970, Garrincha entraria no lugar de Jairzinho. Cabia bem, cabia sim. Já o Ronaldo, quem poderia sair para lhe ceder a camisa? Quem?

Quanto à seleção de 1982, tranquilamente Serginho e Éder poderiam ceder os seus postos a Pelé e Garrincha. Mas o Ronaldo (outra vez ele), quem seria sacado para colocar o Fenômeno em campo? Alguém do meio campo? No caso os caras eram o Zico e o Sócrates? Só isso. Dois fora-de-série!

No tocante à seleção de 2002, cujo ataque era formado por Ronaldinho, Ronaldo e Rivaldo, eu penso que dava para deixar todos em campo e sacar os volantes: Gilberto Silva e Kleberson. Com os três citados, mais Pelé e Garrincha em campo, a seleção não precisaria de volantes… Rs.

Quanto à seleção acreana de todos os tempos, vejam a resposta do meu compadre. Goleiro: Zé Augusto ou Ilimani ou Klowsbey. Linha de zaga: Mauro, Deca, Curica ou Paulão e Duda ou Antônio Maria. Meio-campistas: Emílson ou Eusébio, Dadão, Carlinhos ou Careca ou Doka Madureira.

Como assim? O meu compadre escalou vários caras na mesma posição? Isso mesmo. Mas então eu pensei: no ataque ele vai escolher apenas dois mesmo. Ledo engano. Ele disse: Bico-Bico ou Julião, Touca ou Roberto Ferraz e Artur ou Paulinho. Eu acho que levei um drible do meu compadre!

– Dezembro de 2021 –


A queda do Bahia e a tarde de Itapuã

Francisco Dandão

Passei uma semana na Bahia, acompanhado de todos os deuses, orixás e santos. Fazia quase dez anos que eu não ia a Salvador. O tempo ausente, porém, não mudou muita coisa de lugar. Continuavam por ali as mesmas cores das igrejas do Pelourinho, do elevador Lacerda e do Mercado Modelo.

Um lugar onde eu ainda não havia posto os pés era a praia de Itapuã. Essa praia fica bem longe do centro de Salvador. Por isso eu jamais a havia visitado. Agora, como eu preferi me hospedar num resort na praia de Catussaba, fiquei pertinho de Itapuã. E acabei indo dar uma olhada por lá.

Eu queria saber se o lugar era tudo aquilo cantado na música do poetinha Vinícius de Moraes. Sentar num banco de praça, ouvir o mar e tomar uma água de coco (Vinícius, provavelmente, misturava coco com uísque). E pra entrar mais ainda no clima, até vesti um velho calção de banho.

No fim das contas, apesar de um sol lindamente vermelho descendo no horizonte, tive a impressão de que a praia de Itapuã cantada por Vinícius se acabou (ou nunca existiu). A faixa de areia é por demais estreita, o som dos bares é alto e os locais olham para os visitantes como para invasores.

Mas o que mais me impressionou nessa minha passagem pela Bahia de Jorge Amado, Glauber Rocha, Caetano Veloso, Bell Marques, Ivete Sangalo, Gilberto Gil, João Ubaldo Ribeiro, Tieta do Agreste e Dorival Caymmi (entre muitos outros) foi a paixão dos baianos pelo futebol.

Justo nessa semana da minha passagem pela Boa Terra, o Esporte Clube Bahia decidia sua sorte no campeonato brasileiro. Se vencesse o Fortaleza, fora de casa, permaneceria na série A. Se perdesse ou empatasse, dependeria de uma combinação de resultados. Uma dança num fio de espada!

Pois o Bahia perdeu, de virada, para o Fortaleza e os seus concorrentes diretos pela permanência na série A venceram. O Bahia foi rebaixado para a série B de 2022. E a Boa Terra caiu em estado de depressão profunda já na própria noite da derrota. E no dia seguinte foi decretado o luto dos tricolores!

Eu havia feito amizade com dois sujeitos de uma barraca de praia: o Jean (garçom) e o Epaminondas (proprietário). Os dois haviam se declarado, na véspera, torcedores do Bahia. E nas nossas conversas anteriores ao jogo do descenso ambos me garantiram que não havia perigo algum do time cair.

No dia seguinte à queda, quando cheguei à praia só encontrei o Jean. Quando perguntei-lhe pelo patrão, ele me respondeu que o Epaminondas costumava fechar a barraca por vários dias após uma derrota. E nem atendia o telefone. E que, às vezes, ele jamais voltava a trabalhar no mesmo lugar.

– Dezembro de 2021 –


Aniversários dos xerifes

Francisco Dandão

Três antigos xerifes do futebol acreano, membros daquela turma que batia primeiro para somente depois pedir os documentos dos atacantes suspeitos, fazem aniversário no mês de dezembro: o ex-zagueiro Zenon (dia 1º), o ex-volante Mário Sales (dia 3) e o ex-lateral direito Pintão (dia 29).

O Zenon, que completou 61 anos, iniciou a sua trajetória no São Francisco. Morador do bairro do mesmo nome, era natural que ele começasse a sua vida de futebolista no clube do professor Vicente Barata. Do time infantil, em 1971, até a estreia no elenco principal foram apenas cinco anos.

Aos 16 anos, no primeiro semestre de 1976, Zenon já estava jogando entre os adultos do São Francisco. E mandou tão bem que logo foi contratado pelo Rio Branco, onde foi dirigido pelo lendário técnico Coca-Cola e disputou um Copão da Amazônia. Missão: “se a bola passar, o atacante fica”.

Já o Mário Sales, que chegou aos 65 anos, esse rodou por vários clubes acreanos. O começo foi no juvenil do Atlético, depois de ser descoberto numa pelada pelo goleiro Tidal. Quando ele chegou ao Galo, não foi preciso nem fazer teste. Já foi logo escalado como “cão de guarda” dos zagueiros.

Depois, pela eficiência com que cumpria as suas funções, ele rodou por Independência, Rio Branco e Amapá, ganhando (segundo declaração do próprio) sacos de dinheiro para trocar de camisa ao fim de cada temporada. Seu lema: “proibido passar qualquer coisa, nem a bola, nem o atacante”.

Enquanto isso, o Pintão, cujo nome de batismo é Carlos Magno, desse não se sabe com exatidão o seu ano de nascimento. Ele diz que veio ao mundo em 1955, em Porto Velho. Mas há quem diga que se pode acrescentar, tranquilamente, mais uns dois ou três anos aí nessa conta do ex-craque.

O certo é que ele começou no Ypiranga, em 1970, na sua cidade natal. Nessa época ele alternava partidas nos juvenis e no time principal. Do primeiro time, Pintão foi para o Ferroviário, também de Rondônia. E em 1974, ele migrou para o Acre, onde jogou no Atlético e no Independência.

Lateral de chute fortíssimo, Pintão era um terror dos adversários que formavam as barreiras quando acontecia uma falta frontal às suas traves. E ele batia na bola sem dó nem piedade. Quando não acertava o gol, nocauteava alguém da parede humana. Meta: “só tem jogo com a bola, sem ela é canela”.

É isso. Essas três criaturas fizeram a alegria dos torcedores das suas respectivas equipes. Eles eram garantias de que os atacantes adversários não teriam vida fácil para chegar na frente dos respectivos goleiros. Coincidentemente (ou não), todos nasceram em dezembro. Vida longa a eles!

– Dezembro de 2021 –


O fracasso e a glória

Francisco Dandão

Não tem jeito: no futebol, ou em qualquer outra disputa esportiva, uns ganham e outros perdem. O sucesso de um determinado grupo está visceralmente ligado ao fracasso de outro. E os respectivos torcedores, distintamente, ou vibram em altos brados ou sofrem em desalentados berros.

Nesse fim de semana que recém passou, eu me peguei contando minutos infindos a esperar por um golzinho do paraense Clube do Remo, contra o sergipano Confiança. Um golzinho que não veio e que determinou a queda do Leão Azul para a Série C do campeonato brasileiro de 2022.

Eu tinha dois bons motivos para torcer pela vitória do Remo. Primeiro porque isso determinaria a permanência de um clube da região Norte do país na Série B. E segundo porque é lá no time paraense que joga hoje o atacante acreano Neto Pessoa, um cara humilde que merece tudo de bom no esporte.

Por uma coisa ou por outra, sabe-se lá o que pode ter acontecido, o Neto passou em branco e nenhum outro jogador remista conseguiu balançar as redes dos sergipanos, que inclusive já estavam rebaixados. Dessa forma, pode-se dizer que os dois clubes afundaram abraçados na Baía do Guajará.

Naturalmente, um time não é rebaixado apenas pelo mau desempenho numa única partida. O rebaixamento decorre de uma campanha deficiente. Às vezes, os dirigentes cometem uma série de erros durante a temporada. E às vezes, simplesmente faltam recursos para a montagem de um bom elenco.

O empate até poderia servir para o Remo permanecer na Série B. Mas, para isso, o paranaense Londrina não deveria vencer o Vasco da Gama. Pois o Londrina, que fez uma campanha sofrível durante todo o ano, resolveu jogar justamente no último instante e goleou o Almirante de São Januário.

A propósito desse jogo entre Londrina e Vasco, eu tive a impressão, vendo os lances dos gols, que os jogadores do time carioca não estavam muito interessados em expor as respectivas canelas. O time não aspirava mais nada (nem descia, nem subia). Perder ou ganhar era tudo a mesma coisa.

Por outro lado, já que eu estou falando do futebol do Norte do país, pelo menos duas criaturas oriundas dessa região subiram às nuvens da glória nesse final de semana: o goleiro acreano Weverton e o atacante paraense Roni, bicampeões da Libertadores da América com a camisa do Palmeiras.

E aí, como tem se tornado praxe durante suas comemorações, ambos trataram de adornar os corpos com as respectivas bandeiras dos seus estados. Isso passa para mim a impressão de que nem tudo está perdido. Se os times do Norte não sobem de divisão, pelo menos existe algum brilho individual!

– Novembro de 2021 –


Quarentena invertida

Francisco Dandão

Morei dois anos em São Paulo, na época em que fiz meu doutorado na PUC. Por conta desse tempo, passei a gostar da capital paulista como se fosse minha cidade da vida toda. Mas os meus compromissos acadêmicos me impediram de explorá-la como eu gostaria. Principalmente suas imediações.

Dessa forma, sempre que posso volto a bater pernas na chamada “Paulicéia Desvairada”, o que fiz por esses dias, depois de um ano e meio sem dar as caras por lá. Fiquei quarenta dias entre São Paulo, capital, e diversas cidades do interior. Fiz uma espécie de “quarentena invertida”.

Naturalmente, é claro, todos os passeios foram realizados seguindo os devidos protocolos de saúde, com máscara, toneladas de álcool gel e evitando estritamente locais de aglomeração. O vírus ainda está a circular por aí e todos os cuidados são necessários, embora eu já esteja vacinado.

Falar nisso, vacina é o que não falta em São Paulo. Por iniciativa do governador João Dória, só não se imuniza no estado paulista quem não quer… Ou quem tem medo de pegar Aids… Ou quem tem medo de virar jacaré… Tudo isso seria cômico se não fosse trágico… Ou deveras patético!

Tava tão fácil se vacinar em São Paulo que eu até tomei a minha dose de reforço. Nem precisei procurar, nem nada. Um dia eu ia passando pela Av. Paulista, numa manhã de domingo, quando vi uma equipe, na frente de uma farmácia, pegando a galera no laço. Nem fila havia. Mamão com açúcar!

Foi uma temporada de muito consumo de produtos culturais. A ida aos museus ocupou boa parte do meu tempo. Catavento, Arte Sacra, Masp, Pinacoteca, Língua Portuguesa… Todos esses agora contam com a minha assinatura no livro de visitas. E pra culminar, o show de um grupo de cordas!

Só não fui a jogos de futebol. Atitude estranha para quem se diz apaixonado por esse esporte e vive escrevendo sobre isso. Atitude estranha porém justificável. Não fui porque acho que os estádios ainda não oferecem a segurança necessária para ninguém. Ainda mais para velhinhos como eu.

Mas não fiquei de todo alheio ao apelo que emana de uma bola. Quando da minha passagem por Santos, me meti por um bom par de horas pelos andares do Museu Pelé. Lindo! Divino! Maravilhoso! Para quem cultua o rei do futebol, mais do que um museu aquilo lá é um santuário!

O Museu Pelé fica no centro histórico de Santos, perto do antigo porto da cidade, na frente de uma velha estação de bondes e nas proximidades da Igreja do Valongo. Todo o local proporciona aos visitantes uma viagem na história. Transita-se de um tempo a outro num simples relance de olhar!

– Novembro de 2021 –


Loucura sem fim

Francisco Dandão

As loucuras do mundo parecem não ter limite nem fim. Se um extraterrestre que estivesse com planos de conquistar a Terra ficasse um tempo aí só nos observando, penso que desistiria na hora. Não entenderia nada e com certeza partiria para os abismos infinitos do espaço sideral.

Cheguei a essa conclusão (aparentemente definitiva) depois que eu li um dia desses que o ex-pugilista Mike Tyson, para se livrar do vício de consumir drogas pesadas (cocaína etc. e tal), resolveu fumar veneno de sapo. Segundo Tyson, o veneno melhora a depressão e ainda ajuda a perder peso.

Deve ser um “remédio” mesmo milagroso esse veneno de sapo. Afinal de contas, o ex-pugilista, que venceu a maioria dos seus combates por nocaute, dada a força desproporcional que usava contra os mais diversos adversários, sempre teve uma vida maluca, desregrada e complicada.

Acusações de estrupo e cadeia é que não faltam na trajetória dessa lenda do boxe. O cara era tão maluquinho que um dia, em pleno ringe, tascou uma mordida na orelha do oponente, no caso o também lendário Evander Holyfield. O doidão não queria vencer, queria era mutilar o inimigo

Mas o Tyson é só o exemplo que deu o start para essas mal traçadas de hoje. No mundo dos esportes tem muitas outras bizarrices. Naquela partida de terça-feira passada (16) entre as seleções do Brasil e da Argentina pelas Eliminatórias da Copa do Mundo de 2022 também teve outra doidice.

Falo da cotovelada do zagueiro argentino Otamendi na boca do atacante brasileiro Raphinha. O planeta todo viu. E, caso ninguém tivesse visto, o corte e o consequente sangramento no rosto do jogador do Brasil seriam provas suficientes da covarde agressão. E nem falta foi assinalada!

Não é a primeira vez que esse zagueiro deixa a bola de lado e parte unicamente para machucar o adversário. Se esse adversário for um jogador brasileiro, pior ainda. Parece que o cara tem um caso de amor mal resolvido com os brasileiros. Mal resolvido e jamais correspondido. E nada acontece.

No meu entendimento, o tal Otamendi não é um jogador de futebol. Ele se disfarça de jogador, mas a verdadeira profissão dele ou é a de torturador de estado de exceção ou de açougueiro. Fã incondicional do Marquês de Sade, o cara gosta de dar até sair sangue. Vade retro, satanás!

Mas se a gente sair da seara esportiva, a loucura do mundo se amplia muito mais. Vira um verdadeiro bestiário de absurdos. Inclui coisas como a afirmação de que a Terra é plana, que a vacina causa Aids e que a floresta amazônica não queima porque é úmida. Nem um ET aguenta tanta doidice!

– Novembro de 2021 –


Classificados

Francisco Dandão

Escrevo esta crônica na tarde de segunda-feira. Mais de 24 horas antes, portanto, do jogo da seleção brasileira contra a Argentina, lá na terra do tango, pelas Eliminatórias da Copa do Mundo de 2022. Difícil imaginar o que virá a ser esse confronto, uma vez que tudo (ou nada) pode acontecer.

Esse clássico do futebol entre brasileiros e argentinos é tão imprevisível que na última vez que eles deveriam ter se enfrentado, nem jogo teve. Los hermanos tentaram burlar a vigilância sanitária do Brasil e escalaram uns sujeitos vindos de um país muito afetado pela pandemia.

Aí as autoridades da saúde do “patropi” entraram em campo, depois de o jogo iniciado, para tirar os “furões”. Os argentinos não aceitaram a retirada dos seus migrantes irregulares e correram do pau. Parece até que os caras eram insubstituíveis. Vai ver, eles não confiam nos seus reservas.

O negócio é tão feio e essas duas seleções são tão importantes no cenário mundial que até agora a Fifa não disse quem estava com a razão no imbróglio. E nós, paturebas de arquibancada, continuamos sem saber se os argentinos serão punidos ou se o lixo vai ser varrido para baixo do tapete.

O palpite de alguns amigos meus (Mário Jorge “Gaguinho” e Toinho Bill entre eles) é o de que tudo vai terminar numa bela pizza. Ou então, sempre no dizer deles, numa confraternização entre dirigentes do futebol mundial num daqueles restaurantes de Puerto Madero, lá em Buenos Aires.

Independente, porém, do que venha a acontecer (ou do que tenha acontecido, que eu não sei que dia essa crônica vai para as páginas), o certo é que para a seleção brasileira esse jogo de agora contra a seleção da Argentina tem um caráter de treino de luxo, só pra cumprir a tabela mesmo.

Pra eles, porém, o buraco é mais embaixo. É que o Brasil já está classificado para a Copa do Catar, enquanto que os fiéis de Maradona ainda buscam os seus pontinhos para garantir sua vaga no próximo mundial. Eles vão se classificar, mas ainda não o estão, matematicamente falando.

Trinta e duas seleções disputarão o Mundial do Catar. Nove já se classificaram (Alemanha, Brasil, Catar, Dinamarca, França, Bélgica, Espanha, Sérvia e Croácia). Restam 23 vagas. São poucos lugares para um monte de postulantes. A Copa é uma festa para bem poucos convidados.

É isso, meus prezados amigos. Vou terminando por aqui essas mal traçadas de agora. Brasileiros e argentinos estarão na Copa do Mundo do Catar, no próximo ano. Não há quem duvide. Enquanto isso, a gente vai vivendo de pequenas ilusões. Afinal, para as águas do rio tudo é apenas hoje!

– Novembro de 2021


Politicamente incorreto

Francisco Dandão

Eu comecei a frequentar estádios de futebol na adolescência. Era uma época em que valia (quase) tudo para tentar desestabilizar os jogadores adversários, desde jogar sacos com algum líquido mal cheiroso até atacar a hombridade dos ditos cujos, duvidando da masculinidade dos sujeitos.

Árbitros e bandeirinhas, então, esses eram as vítimas preferidas. Atacados pelas duas torcidas, quem mais sofria era a mãe das citadas criaturas. A coisa era tão feia que se dizia que as equipes de arbitragens tinham duas mães: uma que ficava em casa e a outra que ia para o estádio.

E não raro, depois de bastante xingados, tanto árbitros quanto bandeirinhas e jogadores revidavam aos insultos. Às vezes, estes jogavam de volta para as arquibancadas o que os torcedores atiravam para dentro do campo. E às vezes respondiam com gestos obscenos… Cotocos e bananas!

Eram tempos deveras perigosos, de muitos excessos. Escreveu não leu, o pau comeu. Quem fosse podre corria o sério risco de se quebrar. Para quem era de paz, o negócio era ficar bem longe das chamadas torcidas organizadas, local onde a turba se tornava mais agressiva e sem pudores.

Enquanto escrevo me vem à mente dois exemplos de como o futebol era perigoso até, por aí, a década de 1980. Ambos os casos aconteceram no Acre. O primeiro, num jogo do Copão da Amazônia, entre o Juventus e um time do Amapá. O segundo foi num jogo entre o Juventus e o Atlético.

No jogo pelo Copão, um jogador do time amapaense acertou uma cotovelada no cracaço do Juventus, o Dadão. Foi o suficiente para a torcida ensaiar uma invasão do campo para linchar todo o time do agressor. A coisa ficou tão feia que o clube do Amapá decidiu abandonar a competição.

No jogo entre Juventus e Atlético, num campeonato acreano, irritado com a bola de um atacante chamado Airton (do Juventus), um torcedor do Galo acertou uma tijolada bem na cabeça do dito cujo. Airton caiu desacordado em campo e permaneceu com sequelas até o final da vida.

Ninguém, naturalmente, aprovava essas manifestações mais, digamos, contundentes. Tratava-se, é claro, de um comportamento de bárbaros. Mas quanto aos xingamentos à mãe dos árbitros e aos ataques à masculinidade dos atletas, isso era compreendido como elementos de uma catarse coletiva.

Os tempos modernos, porém, são outros. Se alguém jogar qualquer coisa no gramado dá uma cana braba. As mães dos árbitros saíram da zona de prostituição para altares dourados. E sugerir que algum jogador não é chegado ao sexo oposto, vira um processo federal. São outros os tempos!

– Novembro de 2021 –


Torcedor localizado

Francisco Dandão

Eu não tenho um time do coração em todos os estados do país. Conheço muita gente que tem. Meu afilhado Manoel Façanha é uma dessas pessoas que torce por um time em cada estado. Por ser assim, ele tem várias chances de ser campeão todo ano. E, por isso, está sempre comemorando.

No meu caso, eu torço pelo Fluminense (isso desde pequenininho), provavelmente influenciado por uns vizinhos, no bairro da Base, em Rio Branco, que se descabelavam nos finais de semana pelo Tricolor das Laranjeiras, vibrando com os gols de Cafuringa, Flávio, Samarone e Lula!

Mas eu torço também pelos times do estado onde esteja residindo (temporária ou mais detidamente). Como atualmente eu estou “amarrando o meu burro” em Fortaleza (linda, bela e acolhedora como sempre foi), sigo vibrando pelo sucesso do Ceará e do Fortaleza na Série A do Brasileirão.

Com 39 pontos conquistados, cumpridos 30 jogos na competição, o Ceará ainda corre algum risco de rebaixamento. Mas nada assim que cause tanta preocupação, levando-se em conta que o primeiro time na chamada zona da degola, o Sport Recife, está nove pontos mais trás na classificação.

Já o Fortaleza, o segundo tricolor mais lindo do mundo (o primeiro é o Fluminense, lógico), este simplesmente está lá “nas cabeças”, jogando um futebol primoroso, e ostentando um honroso quinto lugar, com plenas condições de se classificar para a próxima Copa Libertadores da América.

Tudo estaria perfeito na minha vida de torcedor se não fosse o fraco desempenho dos times do Norte, região do país de onde eu me origino (nunca é demais lembrar que eu nasci em Brasiléia e passei a maior parte da minha vida no Acre, viu?). O futebol do Norte é o meu ponto fora dessa curva!

Neste ano da Graça de 2021, eu confesso que tive esperança de que dois clubes nortistas subissem um grau no mapa do futebol brasileiro: o Paysandu-PA e o Manaus-AM. Eles jogaram a Série C e eu esperava que ambos pudessem fazer companhia ao Clube do Remo na Série B de 2022.

Tanto Paysandu quanto Manaus chegaram à segunda fase da competição. A fase em que oito clubes disputam quatro vagas para ascender de divisão. Tanto um como outro, porém, falharam. O Manaus perdeu a vaga na última rodada. O Paysandu, por sua vez, não rendeu coisa alguma.

Dessa forma, caso o Remo não caia (bato na madeira nove vezes – três vezes três), novamente a região Norte do país terá apenas um representante na Série B de 2022. Mas é isso. Nem tudo pode ser perfeito. Um caso, muitos outros casos… Das entranhas do mundo ainda sobe um perfume profundo!

– Novembro de 2021 –


A finitude da vida

Francisco Dandão

No auge da vida profissional, aos 26 anos, a cantora sertaneja Marília Mendonça saiu da vida nessa sexta-feira (5) para galgar os degraus da memória. Um acidente aéreo é que encerrou a carreira da moça que já fez (e faz) tanta gente chorar amores sofridos, em torno de um copo de cerveja.

Falei em “degraus da memória” porque lembrei de uma palestra que eu vi um dia desses sobre esse salto no abismo da metafísica para o qual todos estamos agendados. Uma palestra na qual o orador garantia que o maior problema da morte não é a extinção física, mas sim o esquecimento.

É que depois da morte, em maior ou menor tempo, todos seremos esquecidos. A Marília Mendonça, pela arte que teve em vida, será lembrada por muitos anos. Ela tinha uma legião de fãs que tratarão de recordar os seus feitos. Mas alguém de história comum rapidamente se apaga das memórias.

Escrevo essas coisas e lembro, a exemplo desse apagamento que a morte proporciona na memória coletiva, de dois cracaços do futebol acreano da época do amadorismo que partiram para o outro lado da vida e dos quais só os torcedores mais velhos é que ainda lembram: Asfury e Ruy Macaco.

O Asfury, que era lateral-direito, jogou no Grêmio Atlético Sampaio (GAS), no Rio Branco (Estrelão) e no Internacional (Saci do Ipase), entre os anos de 1967 e 1973. Ele parou cedo com a bola porque resolveu, aos 24 anos, fazer o curso de formação de sargentos da Polícia Militar do Acre.

Mas enquanto esteve em campo, ele era desses laterais duros, do tipo que não deixava os ponteiros-esquerdos adversários respirarem durante os 90 minutos do jogo. Ele tinha um fôlego de gato. Atacava e defendia com a mesma energia e desenvoltura. Ele morreu em maio de 2021, aos 72 anos.

Já o Ruy Macaco, que era atacante e vestiu, entre as décadas de 1960 e 1980, as camisas do Rio Branco, Grêmio Atlético Sampaio, Juventus, Independência, Atlético e São Francisco foi simplesmente um dos maiores artilheiros da história do futebol regional. O homem fazia gols de todo jeito.

O cara fazia tantos gols que foi até alvo de uma reportagem na revista Placar, de circulação nacional, como o segundo maior artilheiro do Brasil no ano de 1974, ficando atrás somente do centroavante Dadá Maravilha, que na referida temporada jogou por dois clubes: Atlético Mineiro e Sport Recife.

Ruy Macaco faleceu vítima de um acidente vascular cerebral, em abril de 2007, aos 58 anos de idade. Asfury foi morto por complicações deste vírus maldito que teima em correr o mundo. Aos dois a minha homenagem. Que a memória lhes seja duradoura e o que o esquecimento lhes seja leve. Amém!

– Novembro de 2021 –


Completando a história

Francisco Dandão

Escrevi na crônica passada sobre o dia em que um lateral-esquerdo acreano anulou o lendário ponteiro-direito Mané Garrincha. O lateral, no caso, foi o Antônio Maria, que jogou toda a sua vida no Atlético Clube Juventus, glorioso Clube da Águia, afastado dos gramados já faz é tempo.

Para relembrar e contextualizar o objeto daquele texto, eu explico que o jogo referido foi um amistoso entre Juventus e Rio Branco, comemorativo dos sete anos de fundação do clube acreano, em 1973. Garrincha era convidado do Juventus e jogou um tempo por cada um dos contendores.

O cracaço bicampeão do mundo, na primeira parte do jogo, vestindo a camisa do Rio Branco, se limitou a fazer lances burocráticos e não foi pra cima do Antônio Maria em nenhuma oportunidade. Parecia que estava com medo do lateral acreano. Aliás foi isso mesmo o que se disse na época. Medo!

Na segunda parte do jogo, entretanto, como se para confirmar que o Garrincha estava com medo do Antônio Maria, o gênio das pernas tortas, vestindo a camisa do Juventus, acabou com o jogo. Mais de uma vez deixou o lateral Stélio, do Rio Branco, no chão, com dribles desmoralizantes.

Eis que, conforme eu falei na crônica anterior, um dia desses o Antônio Maria me relatou que o comportamento passivo do Garrincha com a camisa do Rio Branco deu-se por conta de um acordo feito antes do jogo. O presidente juventino pediu para o gênio “amaciar” para cima do seu lateral.

A história estaria explicada. Mas faltava um detalhe: qual teria sido o teor da conversa entre o presidente juventino e o craque Garrincha que, como todo mundo sabe, não era de fazer acordos, ainda mais desse tipo de “abrir” para os laterais adversários? Qual teria sido o argumento do dirigente?

O mistério foi esclarecido com a informação que me chegou depois da publicação da crônica, pela voz do dileto amigo Mário Jorge Castro, o Gaguinho, que está sempre em contato direto com o Antônio Maria, uma vez que os dois moram hoje em Foz do Iguaçu, ao lado das famosas cataratas.

De acordo com o Mário Jorge, foi difícil convencer o Garrincha de fazer um “jogo de compadres”, fingir que ia pra cima do lateral e depois recuar para algum jogador de meio de campo. O bicampeão mundial gostava mesmo era de sujar o calção do lateral, fazer o cara cair de cara no gramado.

Nem a ameaça de deixa-lo sem jantar no dia do jogo, teria feito o Garrincha concordar com o estratagema. Segundo o Mário Jorge, o acordo só foi firmado quando os dirigentes juventinos prometeram ao gênio duas garrafas de Cocal (a melhor cachaça da época). Foi isso. Simples assim!

– Novembro de 2021 –


Garrincha e o medo do lateral

Francisco Dandão

Entre o final da década de 1960 e o início da década de 1970, o glorioso Atlético Clube Juventus (de saudosa memória) costumava promover grandes celebrações pelas passagens dos seus aniversários de fundação. Celebrações estas tanto do ponto de vista social quanto esportivo.

No que diz respeito às comemorações sociais, sempre acontecia um baile, com o conjunto Os Bárbaros, para o qual era convidada a fina flor da comunidade de Rio Branco. Os convites, escassos, uma vez que a sede do clube não comportava muita gente, eram, deveras, pra lá de disputados.

No tocante às celebrações esportivas, a direção do Juventus, liderada pelo professor Elias Mansour, costumava convidar craques do futebol brasileiro que já haviam pendurado as chuteiras. Então, sucessivamente, o Juventus convidou os campeões mundiais Nilton Santos, Vavá e Garrincha.

Eles não chegaram ao Acre ao mesmo tempo. Cada um deles foi convidado num ano diferente. Nilton Santos, lateral-esquerdo, o primeiro dessa posição a subir ao ataque, participou das comemorações de 1968. Vavá foi o convidado de 1969. E Garrincha deu o ar da sua graça no ano de 1973.

De todos esses três citados, Garrincha foi o que causou maior euforia entre os torcedores. Era natural que fosse assim, levando-se em conta tudo que o “gênio das pernas tortas” havia aprontado pelo mundo na sua carreira de jogador. O cara era, simplesmente, imarcável. Nenhum zagueiro o parava.

Garrincha fez dois jogos: o primeiro foi entre Independência x Atlético Acreano; o último foi entre Juventus x Rio Branco. Em cada jogo, o lendário camisa sete jogou um tempo por cada time. Jogou e “barbarizou” com três das quatro camisas: as do Atlético Acreano, do Independência e do Juventus.

Estranhamente, quando jogou pelo Rio Branco, contra o Juventus, cujo lateral era o Antônio Maria, Garrincha teve uma atuação bem discreta. Em nenhum momento foi pra cima do lateral juventino. Na época disseram que o gênio ficara com medo do Antônio Maria e preferiu jogar longe deste.

Eu fui um dos torcedores que acreditou na história de que Garrincha havia preferido ficar longe do Antônio Maria com medo de não conseguir levar vantagem sobre o dito cujo. Antônio Maria era um lateral de ótima técnica. Então, eu achava que ele devia mesmo ter amedrontado o Garrincha.

Eis que, porém, um dia desses o Antônio Maria me contou o que foi o “medo do Garrincha”. É que o gênio foi visitado no hotel pelo dirigente Elias Mansour, antes do jogo, e este pediu para ele “amaciar” para o lateral. Então, ficou tratado que cada um dos dois “ganhava” uma bola. E assim foi feito!

– Outubro de 2021 –


Placar de futsal

Francisco Dandão

Quando o meu afilhado Manoel Façanha, editor de esportes do jornal Opinião e dono do site namarcadacal, me contou que o Galvez levou uma lapada de nove a zero (escrevo por extenso para tentar diminuir o impacto) do Clube do Remo, pelas oitavas-de-final da Copa Verde, eu não acreditei.

Como assim? Nove a zero? No meu entendimento, havia algum erro de digitação na mensagem do Façanha. Nove a zero, pensei, só se fosse um jogo entre um time profissional e um, digamos, Sub-15. Ou então, se fosse uma Copa Verde de futsal, handebol, tênis de mesa ou coisa parecida.

Corri aos sites para verificar a informação. E então, confirmei que o meu afilhado não havia cometido nenhum erro não. O glorioso Galvez, campeão acreano de 2020, levou mesmo essa porrada pra lá de federal lá na capital das mangueiras centenárias. Uma surra pra ninguém botar defeito.

Aí, após a minha perplexidade inicial, resolvi ficar pensando no que poderia ter acontecido. Talvez muita chuva no dia do jogo (em Belém chove torrencialmente dia sim e outro também), talvez um tacacá com jambu dormido servido aos jogadores acreanos, talvez uma maniçoba estragada…

Ou então, ainda nessa linha de investigação gastronômica, quem sabe, a delegação foi visitar o mercado Ver-o-Peso e se excedeu no consumo de suculentas cuias de açaí com farinha e camarão seco. Talvez alguns tenham até resolvido experimentar um prato de pirarucu com pimenta malagueta…

Tudo isso e mais um pouco me ocorreu. É que eu me recusava a acreditar que o futebol acreano estivesse tão ruim que uma goleada desse tipo pudesse ter ocorrido pela superioridade dos paraenses. Perder, ressalte-se, faz parte do jogo. Mas perder de nove, aí já me parece um tanto demais.

Mas aí, eu tava nessas de aceitar sem acreditar, procurando explicação nas minhas cartas de tarô e na configuração das estrelas num céu de primavera, quando, um dia depois, o Rio Branco foi desclassificado da mesma competição, tomando uma porrada de 4 a 1, dentro da própria casa.

“Égua!”, como se diz em bom acreanês, dentro de casa? E sem tacacá, chuva, cuias de açaí, maniçoba estragada, pimenta e pirarucu? Então, definitivamente, não tem nada a ver com desarranjo intestinal nenhum. A questão é a bola mesmo, que não acredita mais no amor dos “craques” locais.

Então, caros senhores, como não se pode mudar o que passou, o jeito é sacudir a poeira (a lama, no caso do jogo de Belém), erguer a cabeça e dar a volta por cima. O futuro já é agora. Não dá tempo ficar lambendo as feridas. É necessário unir forças para que novos vexames não venham por aí.

– Outubro de 2021 –


Um clássico da lateral

Francisco Dandão

Dia 17 deste mês (domingo passado, portanto) fez aniversário o lateral-esquerdo mais clássico que o futebol acreano já viu (talvez jamais se veja outro igual). Falo de Antônio Maria Freire Passos, natural de Xapuri, que durante 16 anos (entre 1966 e 1981) defendeu o Atlético Clube Juventus.

Pra falar a verdade, a data estava passando em branco na minha memória cada vez mais rarefeita de neurônios. Quem tratou de me lembrar foi o amigo Mário Jorge Castro, o popular Gaguinho, outrora imbatível nos salões de sinuca da Associação Atlética Banco do Brasil de Rio Branco.

Eu e o Mário Jorge de vez em quando trocamos mensagens por um desses aplicativos aí da internet. E então, na véspera do aniversário do Antônio Maria, ele (Mário) me disse que estava saindo de casa para dar um abraço no velho amigo. Os dois, ressalte-se, moram hoje em Foz do Iguaçu.

O Antônio Maria, que nos seus tempos dentro de campo era chamado de “príncipe”, tal a fidalguia com que tratava a então “deusa branca”, completou 71 anos. E, de acordo com as palavras do Mário, ele ainda trata a bola com o maior requinte, nas peladas de velhinhos do interior do Paraná.

Dois detalhes chamam a atenção na carreira de futebolista do Antônio Maria. Primeiro que ele defendeu um único time “federado” na vida (o já citado Juventus). E segundo que ele foi um dos raros jogadores de defesa que jamais sofreu uma punição. Como se dizia, o cara jogava trajando paletó!

No que diz respeito ao Juventus, aliás, ele foi um dos seus fundadores. É que, pra quem não sabe, o embrião do Clube da Águia foi um time de ginasianos do Colégio dos Padres, onde Antônio Maria estudava. Time esse que fazia excursões ao interior, na década de 1960, e jamais perdeu um jogo.

Quanto ao fato de que o “príncipe” não sofreu punições, esse detalhe fez com que ele sofresse uma das grandes injustiças do futebol do seu tempo, uma vez que a então Confederação Brasileira de Desportos (CBD) negou ao craque o Prêmio Belfort Duarte, concedido aos atletas mais disciplinados.

Outro aspecto que torna a biografia de Antônio Maria peculiar é o de que ele se firmou como lateral-esquerdo apesar de não ser canhoto. É que o Juventus tinha um titular na lateral-direita chamado Carlos Mendes. Ele teve que ser improvisado na esquerda e permaneceu lá até pendurar as chuteiras.

Antônio Maria, enfim, faz parte de uma galeria de laterais fora-de-série que pontificaram no futebol acreano nos tempos românticos do amadorismo. Tão lendário quanto foram (cito de cabeça) Chico Alab, Mauro, Duda, Rômulo, Hélio Pinho, Flávio etc. Vida longa ao eterno “príncipe”!

– Outubro de 2021 –


Covarde agressão

Francisco Dandão

Um dia desses eu vi uma cena bárbara na televisão. Pra falar a verdade, a televisão barbariza os nossos olhares todos os dias. Mas quando eu digo isso, absolutamente não estou culpando o veículo. É a vida real que está cada vez mais violenta. A televisão só mostra que o perigo ronda em cada esquina.

Mas essa cena especificamente a qual eu estou me referindo foi a daquele marginal que agrediu um árbitro de futebol no campeonato gaúcho da segunda divisão. O facínora, cujo nome eu sequer fiz questão de gravar, além de jogar o árbitro ao chão ainda aplicou-lhe um chute na cabeça.

O sujeito ali caído, inerte, sem nenhuma chance de defesa e ainda recebeu um golpe na cabeça. Como assim? Que tipo de animal irracional pode ser capaz de um ato dessa natureza? Quer dizer, “irracional” é que não é. O “vagaba” que cometeu aquele crime o fez em perfeita racionalidade sim.

A consequência do fato foi um dia de hospital do árbitro agredido e um dia de cadeia do agressor. Embora aparentemente não tenha havido maiores sequelas, o árbitro não sabe quando voltará a exercer a sua profissão. Já o jogador mau caráter, este teve o seu contrato imediatamente rescindido.

Na esfera esportiva, provavelmente o agressor pegue uma suspensão de um ano. Na esfera penal, apesar de existirem relatos que ele já tenha passagem pela polícia, provavelmente o dito cujo não venha a “curtir” nem mais um dia de cana. O código penal brasileiro é muito brando nesses casos.

Por sorte, a “pátria amada” ainda não promulgou nenhuma lei concedendo porte de armas para jogadores de futebol dentro de campo. Se isso já houvesse acontecido, talvez aquele profissional da arbitragem, em vez de um pontapé, tivesse levado meia dúzia de caroços de chumbo nas costas.

Naturalmente, é claro, não foi a primeira vez na história do futebol que um árbitro foi agredido durante a prática do seu ofício. Antigamente, isso era fato comum. Havia árbitro que só apitava a favor do time da casa, com medo de sofrer agressões. Mas eu imaginava que isso houvesse ficado no passado.

Esse meu pensamento se justifica pelo fato de que nos anos mais antigos do passado não havia tantas câmeras para mostrar o que acontecia durante as partidas. E, dessa forma, a gente só sabia das coisas por ouvir falar. Não é o caso de agora, quando tudo pode ser visto em tempo real.

Por último, a propósito desse tema, eu lembro de que no futebol do Acre dos anos 1960 havia um árbitro chamado Adalberto Pereira que só ia a campo com uma “peixeira” na cintura. Quando alguém queria agredi-lo, ele subia a camisa e mostrava a “criança”. Isso acalmava na hora o nervosinho!

– Outubro de 2021 –


Outro título para o Estrelão

Francisco Dandão

Todas as vezes em que o Rio Branco conquista um título, como é o caso deste campeonato acreano de 2021, não posso deixar de lembrar do que dizia o falecido presidente Lourival Marques, de que o Estrelão, pela sua estrutura e capacidade de organização, deveria ganhar tudo o que disputasse.

O doutor Lourival presidiu o Rio Branco entre o final da década de 1960 e o início da década de 1970. E foi um dos responsáveis pela importação dos primeiros jogadores a vestir a camisa do clube. Fernandinho, Vale, Padreco, Espanhol, Adauto, Caíca, Luís Carlos, Eli, Roberval…!

O futebol no Acre era amador, mas todos os considerados grandes clubes pagavam os seus jogadores. Pagavam ou davam emprego. Ou as duas coisas. E ainda havia os prêmios. Os jogadores considerados de maior recursos técnicos, não raro, ganhavam automóveis, casas e outras coisas.

Na mesma época em que o Rio Branco começou com a sua política de jogadores importados, o Andirá seguiu o processo. Embora jamais tenha sido considerado um clube grande, o Morcego da Cadeia Velha tinha o patrocínio da família Dantas, cujo nome de maior destaque era o governador do estado.

Para o Andirá vieram tantos jogadores num certo período que houve quem dissesse que os caras chegaram num caminhão que passou mandando subir atletas desde o Distrito Federal, passando pelo Mato Grosso do Sul, Mato Grosso do Norte e por Rondônia. Nem todos conseguiram aprovação.

Eu lembro de pelo menos uns cinco nomes. Casos do goleiro Duplanir, que depois, salvo engano, virou roqueiro e foi morar em Xapuri; de um ponteiro chamado Peroaba, que também acabou migrando para a Princesinha do Acre; do zagueiro Pará; e da parelha de atacantes Luís França e Sabará.

Depois de Rio Branco e Andirá, o Atlético, o Independência e o Juventus também seguiram pelo mesmo caminho. E, no meu entendimento, eu considero que essa mescla entre jogadores da terra e oriundos contribuiu demais para o crescimento do nível técnico do futebol jogado naqueles anos.

Foi tanto jogador (muitos deles verdadeiros cracaços de bola) que veio para o Acre naqueles tempos dourados que se costumava, no fim de cada temporada, realizar amistosos de seleções dos “locais” contra os “importados”. E esses eram confrontos que nenhum torcedor queria perder.

Reminiscências à parte, porém, o que conta neste momento é que o Estrelão conquistou mais um título, apesar de todos os problemas que vive nos bastidores. O Rio Branco já foi um dos clubes mais importantes da região Norte. Tomara que esse título faça o time reencontrar o seu antigo caminho.

– Outubro de 2021 –


Caldo de piaba

Francisco Dandão

Apostei num site desses da vida que o Brasil venceria a seleção venezuelana por cinco gols a zero. Na hora em que eu apostei, até imaginei que estava cravando um placar modesto. Afinal de contas, a Venezuela ostentava (ostenta) a pior colocação na classificação nas eliminatórias sul-americanas.

Mal começou o jogo, porém, o meu palpite foi para o brejo. Os caras da chamada seleção Vinho Tinto (pela cor da camisa) fizeram um a zero, de cabeça, numa jogada em que os dois zagueiros da seleção brasileira escorregaram ao mesmo tempo e sujaram o calção de forma simultânea.

Mas o pior de tudo, àquela altura, nem era o placar adverso. Pior do que sair perdendo num jogo contra o lanterna do torneio era o fato de que o Brasil não estava jogando nada. A maioria dos passes, segundo a definição do parceiro Lula, era feita no sistema nove e quinze (só para os lados).

Enquanto isso, o técnico Tite arregalava os olhos e se descabelava na beira do campo em ver aquela lástima dentro das quatro linhas. Os gritos do treinador, porém, querendo mudar o ritmo da parada, não adiantavam coisa alguma. Já o locutor global Galvão Bueno, este implorava que o primeiro tempo chegasse ao fim.

No intervalo do jogo, não pude deixar de pensar em como a situação de um país pode refletir o desempenho da sua seleção. Nada vai bem atualmente nesse país de negacionistas e mentirosos compulsivos (ou vai?). Eu acho que enquanto o filhote de cruz credo estiver por aí, vai ser sofrido.

E foi nesse mesmo intervalo que eu recebi mensagens de dois amigos diletos: o Toinho Bill e o Joraí Salim. O Toinho, com sua língua ferina, disse que essa seleção brasileira é mais ruim do que “refresco de tabaco”. E o Joraí, sempre sarcástico, falou que o nosso time é “mais fraco do que caldo de piaba”.

E nem adiantou eu argumentar com as duas criaturas, dizendo que nós estamos em primeiro lugar nas Eliminatórias, longe do segundo colocado. A esse meu argumento, eles replicaram que as outras seleções conseguem ser ainda piores do que a nossa e que a bola da América do Sul já acabou.

Eu não quis seguir com a discussão. Pelo tom exaltado deles dois, eu percebi que o mais prudente era silenciar e esperar o segundo tempo. Entendi que era melhor manter dois amigos na mão do que acompanhar uma bola voando. De uma hora pra outra, afinal, tudo pode mudar de lugar, inclusive o céu e a terra.

Felizmente o técnico do Brasil substituiu algumas peças para a segunda etapa do jogo. E aí o time “amarelo” foi pra cima dos meninos do ditador Maduro. E então veio a virada: Venezuela 1 x 3 Brasil. A ordem natural das coisas foi restabelecida. Mas eu jamais vou apostar novamente numa goleada brasileira.

– Outubro de 2021


Mamão com açúcar

Francisco Dandão

Vem aí, a partir desta quinta-feira (7), mais uma rodada das eliminatórias sul-americanas para a Copa do Mundo de 2022. Depois de oito compromissos no torneio, a gente pode dizer que a seleção brasileira “nada de braçadas”, num mar tão calmo que até parece uma “piscininha, amor!”

O Brasil simplesmente venceu todas as suas partidas. Jogando dentro ou fora de casa, pouco importa quem aparece pela frente. “É chuá”, como se diz no basquete quando um jogador encesta uma bola sem tocar no aro adversário. Até aqui, os “canarinhos” somaram 24 pontos em oito partidas.

Eu diria, usando uma metáfora de domínio popular, que essas eliminatórias estão sendo “mamão com açúcar” para a seleção brasileira. Não tá dando nem graça a gente cravar Brasil nos sites de apostas. Além do que, sendo “barbada”, o prêmio é tão pequeno que nem compensa apostar.

A próxima vítima, se é que as estrelas do nosso céu pátrio não vão me deixar mentir (ou castigar pela soberba), vai ser a Venezuela, desse Maduro (quase podre) que anda por lá deixando os supermercados desabastecidos e empurrando boa parte dos seus compatriotas para um tenebroso exílio.

A propósito, já que eu toquei no assunto, devo evidenciar que a Venezuela foi o meu primeiro destino internacional. Estive por lá no final de 2001 e fiquei hospedado num bairro chamado Sabana Grande. Fiz do referido bairro o porto seguro para as minhas idas e vindas ao interior.

Naquele momento, tanto Caracas, a capital, quanto as demais cidades que eu visitei, eram lindas e prósperas, cheias de turistas e com muita festa nas ruas. Mas já havia algo de insatisfação popular, com panelaços no início de cada noite contra o então todo poderoso ditador Hugo Rafael Chávez.

Os venezuelanos eram pessoas muito simpáticas e faziam amizade fácil com a gente. Lá pelas tantas, só de me verem observando um jogo de xadrez numa praça pública, logo perguntaram se eu sabia jogar e se queria entrar na brincadeira. Aceitei e venci todas as três partidas que eu joguei.

O detalhe insólito é que o meu adversário, tão logo encerrada a terceira partida, perguntou se eu queria, dali pra frente, apostar alguma coisa. Declinei no ato, entendendo que o sujeito havia facilitado para depois apostar e tomar os meus minguados dólares. Era uma isca. Com certeza era uma isca!

Mas, voltando ao que interessa, que é o jogo do Brasil contra a Venezuela (chamada por eles La Vino Tinto por conta da camisa cor de vinho), se eu pudesse encontrar aquele enxadrista que me desafiou para uma aposta em 2001, agora eu topava e ainda dava vantagem: Brasil na cabeça!

– Outubro de 2021 –


A instituição do furo

Francisco Dandão

Um dia desses da semana que recém passou, o ex-goleiro Milton, aquele que passou mais de mil minutos sem sofrer gols quando defendia o Juventus-AC, na década de 1970, postou uma foto dele numa rede social fazendo uma defesa, numa bola cruzada. Belo flagrante, importante registro.

Ao fundo da foto, via-se a parte das arquibancadas do estádio José de Melo chamada Vietnã (sabe-se lá por quais motivos alguém a denominou assim) tomada de torcedores. Muita gente mesmo, uma vez que os jogos do Juventus, não por acaso denominado Clube do Povo, atraíam multidões.

Até aí, tudo certo. A fotografia por si só já evocava um tempo em que as tardes de domingo no Acre eram dedicadas ao futebol. Muita empolgação e rivalidade embalavam as retinas de todos os que se dirigiam à referida praça esportiva. Mas, além do retrato, alguém fez um comentário interessante.

O comentário, feito pelo hoje ilustre causídico Jorge Carlos Maia, conhecido nos seus tempos de jogador de futebol de salão como “Jorge Piaba” (ele chegou até a defender a seleção acreana, viu?), dava conta de que toda a galera que aparecia no fundo da tal foto havia “furado” aquele jogo.

Segundo o que o doutor Jorge Carlos Maia escreveu, “na arquibancada atrás do gol, direção à piscina do Rio Branco Futebol Clube, a moçada lisa do bairro José Augusto, [estava] todinha! Tínhamos acabado de furar e assistimos esse jogaço!” E, continuando na lembrança, disse: “Foi ontem!”

O “furo” era uma instituição do futebol acreano entre as décadas de 1960 a 1980. Os muros do estádio José de Melo eram tomados de buracos (a maioria feita pelos próprios furões) por onde a galera, principalmente meninos e adolescentes (alguns adultos idem), entrava sem pagar ingresso.

Às vezes, os mandantes das partidas escalavam vigias para deter a evasão de rendas ocasionada pelos “furões”. Mas era uma medida um tanto inócua porque os tais vigias, não raro, fingindo uma distração qualquer, “abriam as pernas” para deixar os “lisos” terem acesso às arquibancadas.

A instituição do “furo” chegou a tal ponto de sofisticação que, lá pelas tantas, foi criada uma espécie de “bilheteria paralela”, instalada na parte do muro que dava para a rua Marechal Deodoro. O mecanismo era simples: quem quisesse “furar” por ali, pagava 20% do valor do ingresso normal!

Tudo isso ficou para trás. Nos estádios acreanos atuais não existem mais buracos nos muros. Certamente ainda existe quem entre sem pagar, apresentando uma carteira de qualquer coisa. Mas isso não tem graça nenhuma. Bom era passar pelo buraco e sair correndo para as arquibancadas!

– Outubro de 2021


Grandes frases

Francisco Dandão

O futebol nosso de cada dia pode ser muitas coisas… Pode ser alegre, pode ser triste, pode ser nostálgico, pode trazer esperança e, por último (mas não finalmente), pode ser hilário. São inúmeras as pérolas, em forma de frases que os personagens jogam para o ar nas entrevistas ou nas reflexões.

Algumas frases se tornam antológicas, mal saem da boca de quem as proferiu ou da cabeça de quem as escreveu. É o caso dessa aqui, atribuída ao falecido técnico de futebol de areia e filósofo popular Neném Prancha: “Futebol é muito simples: quem tem a bola ataca; quem não tem, defende.”

Ou então, os casos dessas duas: “Muitas vezes é a falta de caráter que decide uma partida. Não se faz literatura, política e futebol com bons sentimentos” (Nelson Rodrigues). “Misturo poesia com cachaça e acabo discutindo futebol”, escrita num guardanapo de bar por Vinícius de Moraes.

Existem ótimos “fraseologistas” do futebol em todos os quadrantes desse enorme país tropical, hoje com a gasolina tão cara quanto os diamantes das antigas minas do rei Salomão. Mas muitos desses “fraseologistas” não ganham a grande mídia nacional, limitando-se ao seu espaço regional.

Nessa categoria dos fraseologistas regionais inclui-se o potiguar Francisco Diá, técnico de 65 anos que já rodou por dezenas de times, principalmente do Norte e do Nordeste, desde o início da carreira, em 1995. Das entrevistas dele sempre se pode esperar alguma frase pouco ortodoxa.

Veja-se o que ele disse quando, na sua recente passagem pelo futebol cearense, um repórter de rádio descobriu que ele estava sendo sondado para mudar de clube e lhe perguntou qual era o salário dele no Ferrim: “Meu salário só dura cinco dias. É igual menstruação. Não tenho salário alto”.

De outra feita, quando um repórter lhe perguntou se a “luz vermelha estava acesa”, devido aos maus resultados do Ferroviário, ele respondeu assim: “A luz vermelha que eu conheço é a de um cabaré lá em Natal, a luz de Maria Boa. Aqui o que existe é um time brigando pela classificação”.

Ou então, ainda se referindo aos maus resultados do chamado Tubarão da Barra cearense, o “fraseologista” técnico potiguar Francisco Diá saiu-se com essa tirada: “Eu acho que pisei em rastro de corno, porque o time tem jogado bem, massacrado os adversários e não tem concluído em gol (…)”.

E no dia em que o Ferroviário venceu uma partida com um gol nos acréscimos, num chute meio “Mandrake”, quando perguntaram a Francisco Diá se aquilo teria sido um lance de sorte, ele respondeu assim: “Sorte quem tem é mulher da bunda grande. Eu acredito em competência”. Fecha o pano!

– Setembro de 2021 –


Reforços inusitados

Francisco Dandão

Márcio Chocorosqui e Neivo Vilacorta são dois amigos que eu tenho cultivado pela vida. Com o Márcio, conhecedor como poucos dos meandros da língua portuguesa, eu trabalhei por alguns anos na Universidade Federal do Acre. E o Neivo eu conheci entortando laterais nos gramados acreanos.

Tanto um como o outro, eu não vejo há um bom tempo. Mas sempre nos encontramos de maneira virtual. Eles dois de vez em quando enxugam umas geladas num bar do bairro do Aviário (ou seria Cerâmica?), em Rio Branco. E nessas horas, eles me chamam no vídeo para algumas gargalhadas.

Pois na semana que recém passou, eu pedi para o Márcio Chocorosqui gravar um depoimento do Neivo sobre a trajetória deste enquanto jogador, na década de 1980, para que eu pudesse escrever um perfil dele, assim como eu tenho feito com outros ex-futebolistas. Pedido feito, tarefa cumprida!

Quando eu ouvi a gravação, duas historinhas chamaram a minha atenção. Ambas relativas à passagem do Neivo pelo Rio Branco, quando a presidência do clube era exercida pelo empresário Wilson Barbosa, criatura de boa saúde financeira, mas que entendia pouco ou quase nada de futebol.

Segundo o Neivo, o empresário referido mal assumiu a direção do Estrelão, entendeu que o time deveria ganhar todas as competições que disputasse. E então, para atingir esse objetivo, tratou de abrir os cofres das suas empresas com o intuito de contratar a fina flor da boleiragem local.

Dessa forma, o Rio Branco montou um timaço. A peso de ouro foram contratados (ou tiveram os salários reajustados) craques como o goleiro Klowsbey, o zagueiro Neórico, o lateral Paulo Roberto, o meia Mariceudo, os atacantes Roberto Ferraz e Gil, o volante Mário Sales e o próprio Neivo.

Eis que, já na estreia do time, num amistoso contra a seleção de Sena Madureira, derrota por um a zero. Irritado, Barbosa teria perguntado ao técnico Illimani o que estava faltando. Quando este disse que faltava o “entrosamento”, o dirigente teria respondido: – Pode contratar que eu pago!

Aí, na sequência, já valendo pontos, na disputa do campeonato acreano, o time mandava bem, mas Barbosa teria percebido que faltava um pouco mais de empenho por parte de alguns jogadores. Então o empresário teve a ideia de oferecer litros de uísque escocês para comemorar as vitórias.

Não deu outra. O time passou a voar em campo. De acordo com o Neivo, na primeira vez que o presidente ofereceu como incentivo “um litrão de Johnnie Walker”, o Rio Branco meteu quatro a zero no Galo. No final das contas, o título daquele ano de 1983 foi parar fácil nas vitrines do Estrelão.

– Setembro de 2021 –


Apostas abertas

Francisco Dandão

Acabou o primeiro turno do campeonato acreano 2021. Das nove equipes que começaram a disputa, quatro seguem na busca ao título. Só havia espaço na mesa do banquete para essas quatro mesmo. Às demais, resta saber o que poderá ser feito para que na próxima temporada tenham melhor sorte.

Pela ordem, se classificaram para o segundo turno o Humaitá, o Atlético, o Galvez e o Rio Branco. Nada indica que, na continuidade, essa classificação permaneça do mesmo jeito. Em futebol tudo (ou nada) pode acontecer no espaço de uma noite… Ou um dia… Ou num simples instante!

De qualquer forma, independente do que venha a acontecer, o Humaitá, a essa altura, já desponta como o grande vitorioso do ano, uma vez que a equipe de Porto Acre conquistou o direito de representar o estado na próxima Copa do Brasil, competição que enche os cofres dos que a disputam.

Chegar à Copa do Brasil é o sonho de todos os times desse imenso país, hoje dividido entre o feijão e o fuzil. Negar isso é o mesmo que afirmar que a Terra deixou de ser redonda e passou a ser plana. Ou então, garantir que remédio pra malária tem o poder de matar o coronavírus. Simples assim.

Um time do interior do país que se credencia a disputar a Copa do Brasil fatura uma grana tão boa que, no mais das vezes, dá para cobrir vários meses da sua folha de pagamento. Se passar de fase, então, aí os cofres ficam cheios de verdade. Dá para encher a burrinha e navegar em suaves ondas.

Eu sempre acho legal quando alguns valores são invertidos no campo de jogo. No caso do Humaitá, eu penso que não haveria nada melhor a ter acontecido no campeonato acreano do que a ascensão do referido time. No futebol é preciso, de vez em quando, que alguma coisa subverta a tradição.

Nesse campeonato acreano que ora caminha para o desfecho, além da ascensão do Humaitá, três antigos sacos de pancada fizeram uma competição acima das suas trajetórias. Falo do São Francisco, do Vasco da Gama e do Andirá. Todos esses andaram, aqui e ali, aprontando as suas estripulias.

A nota destoante ficou por conta do Plácido de Castro, que empatou somente um dos seus oito jogos. No restante, foi peia pra mais de metro. Não posso fazer um juízo de valor porque desconheço os motivos de o Plácido ter ido tão mal. Mas os números traduzem uma campanha muito vergonhosa.

O tempo, porém, como disse o poeta, não pode parar. O futuro dirá quem aprendeu as lições do campeonato de 2021. Esses times que ficaram de fora do returno terão alguns meses para estabelecerem um novo planejamento. Quanto ao campeão, as apostas seguem abertas sobre a mesa.

– Setembro de 2021


Meia boca

Francisco Dandão

Vocês gostaram desse último jogo da seleção brasileira de futebol, contra o Chile, pelas eliminatórias da Copa do Mundo do ano que vem? Pois eu lhes digo que não gostei nem um pouco. A despeito da vitória (magrinha, magrinha, aliás), no meu entender o time brasileiro não jogou foi nadinha.

Alguns amigos meus costumam dizer que o que interessa são os três pontos e que até vitória por meio a zero basta. Mas a eles eu digo que aos triunfos sem o devido convencimento, eu chamo de “meia boca”. E que estes me deixam com a desconfiança de que algo apodrecido permanece no ar.

No caso desse um a zero no Chile, quem evitou que o Brasil fosse derrotado foi o nosso goleiro, o Weverton. Com os reflexos em dia, o atleta do Palmeiras salvou o time brasileiro pelo menos em duas ocasiões. Se não fosse ele, penso que a vaca ficaria atolada no brejo ainda no primeiro tempo.

Tudo bem que o Brasil jogou sem os seus “ingleses”. O pessoal dos times lá das terras da rainha foi impedido de se deslocar até os cada vez mais tristes trópicos, por conta do medo da contaminação pelo vírus maldito. E, dessa forma, o técnico Tite teve que fazer as suas devidas improvisações.

Mas, pra mim, a falta dos antigos titulares não é justificativa suficiente para o futebol deficiente do Brasil contra o Chile. Eu acho que o buraco é bem mais embaixo da camada de ozônio. No meu entender, tem toda uma conjuntura que contribui para tirar o tesão dos super jogadores brasileiros.

Me ocorre que uma das maiores razões para o Brasil estar jogando assim como quem não está muito interessado na deusa bola é a questão do feijão. E não falo somente do preço que, em breve, continuando a alta do dólar e a fraqueza do real, vai ficar ali, pau a pau com a altura das estrelas.

Eu acho que pior do que o preço, o que mais está afetando os craques da nossa gloriosa seleção é eles se descobriram “imbecis”. É que todo mundo curte uma boa feijoada. E de repente, sem mais nem menos, foram avisados que é melhor um fuzil na mão do que uns caroços de feijão voando.

Pelo que eu fiquei sabendo, até os “artilheiros”, que são os caras encarregados de mandar “bolas” (ou “balas”, tanto faz) para as redes, estranharam essa nova ordem mundial. Como assim? Trocar um feijãozinho com arroz, orelha de porco, linguiça e caipirinha por fuzis? Como assim?

Pois é isso, meus caros amigos aí na frente dessas mal traçadas. A seleção brasileira não jogou nada contra o Chile. Tomara a história não se repita no próximo jogo, contra a Argentina. É preciso ter chumbo na agulha para fuzilar os adversários, sim. Mas um feijãozinho não faz mal a ninguém!

– Setembro de 2021 –


Edson, Gilmar e outros

Francisco Dandão

Dois ex-jogadores do futebol acreano fazem aniversário nesta última semana de agosto: Edson Carneiro, no dia 28, e Gilmar Sales, no dia 29. O primeiro, que completa 74 anos, veio à luz em 1947. Já o segundo, que completa 60 anos, nasceu em 1961. Edson era atacante. Gilmar era volante.

De Edson Carneiro não se pode dizer que tenha sido um jogador do mais fino trato com a bola. Alto e forte, ele era do tipo do atacante que levava os zagueiros no peito e, quando possível, entrava com bola e tudo nas traves dos adversários. Era um rompedor que não tinha medo de nenhuma cara feia.

Foi jogando dessa forma destemida que ele vestiu as camisas de três equipes, entre 1966 e 1975: as do Grêmio Atlético Sampaio – GAS (time criado pelos militares da 4ª Companhia de Fronteira), Rio Branco e Juventus. Nos dois primeiros como centroavante e no terceiro como ponteiro-direito.

E foi pelo Juventus, clube no qual Edson figura com um dos maiores artilheiros da história, que ele me disse ter marcado o seu gol inesquecível, depois de um lançamento primoroso do meia Hermínio. Foi num amistoso contra o Mixto de Cuiabá, em 1972. O Juventus venceu de virada por 2 a 1.

Já o Gilmar Sales, que foi descoberto para o futebol pelo radialista Pedro Campos Pereira, em 1979, aos 17 anos, este saiu direto dos campeonatos suburbanos para a seleção acreana de juniores. Só a partir desse momento foi que os clubes “federados” olharam com atenção para o volante.

Depois disso, o seu futebol vigoroso, que o caracterizava como um verdadeiro “cão de guarda” à frente dos zagueiros do seu time, passou a ser disputado por todos os grandes clubes do Acre. E então ele atuou, até 1992, sucessivamente, por Atlético, Independência, Rio Branco e Juventus.

Depois de pendurar as chuteiras, ressalte-se, Gilmar ainda permaneceu ligado do futebol, na função de treinador. De 1998 a 2013 ele comandou o Independência, o Vasco da Gama e o Atlético. Chegou até a conquistar título nessa condição. Mas me disse que não pretende mais seguir com isso não.

Edson Carneiro e Gilmar Sales são ídolos do passado do futebol acreano. Edson jogou numa época mais, digamos, “romântica”, puramente pelo prazer de estar em campo todos os domingos. Gilmar, por sua vez, fez parte de um tempo em que os jogadores já faturavam um certo “dinheirinho”.

Mas, para além destes dois, é preciso dizer que vários outros personagens do futebol do Acre comemoram data nova em agosto. Enquanto escrevo, me lembro de cinco deles: Faísca (dia 7), Carlos Santos (dia 8), Jorge Jacaré (dia 14), Selcimar (dia 18) e Oton (dia 21). Parabéns a todos!

– Agosto de 2021 –


Que nem chuva

Francisco Dandão

O Fluminense, meu glorioso Tricolor das Laranjeiras, time do coração dos homens de boa vontade, está eliminado da Copa Libertadores da América. Empatou em 1 a 1 com o Barcelona de Guayaquil, lá no Equador, depois de também haver empatado no Rio de Janeiro pelo placar de 2 a 2.

Quer dizer: o Fluzão foi eliminado sem perder. O critério foi o dos gols marcados fora de casa pelo adversário. Eu acho isso a coisa mais injusta. Dois empates significa que nenhum time foi melhor do que o outro. Foram iguais no desempenho final. Está no regulamento, mas eu acho injusto sim.

Pode-se dizer, nesse sentido, que o Tricolor caiu de pé. E jogando em cima da cabeça dos adversários equatorianos. Igualzinho àquelas chuvas de verão, torrenciais, que arrastam muita coisa na sua passagem, mas depois veem as próprias águas serem absorvidas pelo mar. Igualzinho, tal e qual.

De quebra, Don Fredón, primeiro e único, matador daqueles que os zagueiros adversários não podem piscar uma fração de segundo, chegou ao número de 25 gols feitos na história da Taça, empatando com Palhinha, que jogou antigamente no Cruzeiro, no Corinthians e no Atlético Mineiro.

Fred e Palhinha só perdem em questões de artilharia na Libertadores para Luizão, que marcou época no Corinthians. Enquanto isso, dois sujeitos aparecem em terceiro na lista de brasileiros artilheiros da competição: Célio Taveira, que fez todos os seus gols pelo Nacional do Uruguai, e Gabigol.

Gabigol, com as duas vezes que foi às redes contra o Olímpia, quarta-feira passada, chegou aos 22 gols marcados no torneio. Teoricamente, levando em conta a sua juventude, ainda pode até superar Luizão, que goleou 29 vezes. Teoricamente, eu disse. É que ainda falam oito gols pra isso.

Mas voltando à desclassificação do Fluminense, é preciso dizer que o Tricolor mais lindo do mundo foi seriamente prejudicado pela arbitragem. Um pênalti claríssimo, quando o jogo ainda estava em zero a zero, deixou de ser dado sobre o Fred. Ou seja: nem com o VAR os caras agem a nosso favor.

O interessante é que na mesma hora em que o pênalti foi ignorado, eu recebi uma mensagem pelo WhatsApp de um amigo tricolor, que pediu para não ser identificado (talvez com medo de ser tachado como disseminador de fake news), dizendo que aquilo era coisa típica dos inimigos flamenguistas.

No dizer desse meu amigo anônimo, os flamenguistas morrem de medo de enfrentar o Fluminense. Por mais que o time deles esteja em alta, jogar contra o Fluzão é sempre um grande risco. Já contra o Barcelona, são favas contadas. Segundo os caras, o Fla vai golear duas vezes. E ponto final.

– Agosto de 2021 –


O cruzeirense Anísio

Francisco Dandão

Andei trocando mensagens nesses últimos dias com o ex-atacante Anísio Rocha, nascido em Cruzeiro do Sul, em 1956, que se mudou para Rio Branco por conta do futebol, e que jogou em alto nível por Vasco da Gama, Juventus, Atlético Acreano e Independência, nas décadas de 1970 e 1980.

Morando no estado do Espírito Santo há muitos anos, encontrei o Anísio nas redes sociais. E aí passamos a relembrar os detalhes da carreira dele, iniciada quando o dito cujo ainda era adolescente (13 pra 14 anos), no Náuas, levado por um irmão mais velho que já integrava o referido clube.

Anísio ficou quatro anos jogando o campeonato municipal de Cruzeiro do Sul, mas sempre almejando exibir o seu futebol em outras paragens. Faltava uma oportunidade. E esta surgiu na sua frente quando, no primeiro semestre de 1973, o Vasco da Gama, da capital, excursionou àquela cidade.

Escalado na ponta-esquerda para o amistoso do Náuas contra o Vasco, Anísio se viu obrigado a enfrentar o lateral Carlos 40, tido e havido como um defensor que batia mais do que a atual milícia do talibã, do tipo que só exigia os documentos do adversário depois que o corpo deste jazia no chão.

Pois o meu amigo Anísio encarou a fera sem temer e sem cair. De acordo com o seu depoimento, ele foi pra cima e deu um baile no lateral carniceiro. E, de quebra, ainda marcou o gol de empate do Náuas (o jogo terminou em um a um). A exibição lhe rendeu o convite para jogar no Vasco.

Com a devida anuência dos pais, Anísio se mudou para Rio Branco, onde, nos primeiros tempos, alternou exibições nos times juvenil e principal do Almirante da Fazendinha. Estreou entre os titulares contra o Andirá, substituindo o ponteiro Jersey, e até 1975 nunca mais deixou a posição.

Naturalmente, logo o Vasco ficou pequeno para a bola jogada pelo Anísio. E ele migrou para o poderoso Juventus, em 1976. Durante seis anos, ele brilhou com a camisa do Clube da Águia, recheado de super craques, conquistando vários títulos estaduais e um Copão da Amazônia (o de 1981).

No segundo semestre de 1982, Anísio trocou o Juventus pelo Atlético. O time do segundo distrito de Rio Branco, apoiado num empreendimento denominado Galo Milionário, levou para suas fileiras vários bons jogadores dos outros clubes (Carioca, Zé Gilberto, Chicão, Zezito…). Anísio entre eles.

Foi uma passagem breve. Em 1983, o craque cruzeirense migrou para o Independência, tentado por uma excelente proposta financeira. Quando chegou 1986, Anísio voltou ao Atlético para encerrar a carreira. Os detalhes dessa história eu conto numa matéria especial que vai sair nos próximos dias.

– Agosto de 2021 –


Sortilégios etc. e tal

Francisco Dandão

Não sei de onde surgiu essa conversa de que sexta-feira, 13, é dia de azar. Provavelmente o santo Google, oráculo da pós-modernidade, tem a resposta. Mas a minha falta de disposição me impede de procurar. Ainda mais porque a minha mente racional não me deixa acreditar nessas coisas.

De qualquer forma, como aqueles bons espanhóis da história famosa, apesar de não crer nessas superstições, muito menos em bruxas, eu sei que tanto uma coisa quanto a outra existem. E, assim sendo, antes de sair de casa numa data dessas trato de reforçar as minhas defesas contra o sobrenatural.

Bater na madeira nove vezes (e não apenas três, como ensinam os manuais dos bons sortilégios), rezar de costas para o sol e botar no pescoço um escapulário estão entre as providências para reforçar essas defesas. Às vezes, até contrato um líbero para ficar de cão de guarda na frente da zaga.

Até o presente momento, tem dado certo. Eu saio e volto pra casa, toda sexta-feira, 13, numa nice. Sem maiores alterações, sem bolas nas costas e sem gols contra. A rigor, para fechar o corpo de uma vez por todas, eu penso que só falta comprar um patuá como aquele do técnico Marcelo Altino.

Eu sei que comprar um patuá desses vai dar o maior trabalho, uma vez que o amuleto do Marcelo Altino foi adquirido na região de Cusco, imediações de Machu Picchu. E sei que ele não o comprou. Ao contrário, lhe foi presenteado por uma feiticeira andina, depois de uma noite de amor.

Eu já estive em Cusco e Machu Picchu várias vezes, mas não vi nem sinal do amuleto. Muito menos consegui sequer um olhar enviesado na minha direção, proveniente de alguma bela feiticeira inca. Certamente, falta-me o carisma peculiar do Marcelo Altino, não por acaso chamado de “mago”.

O negócio é sério. Parece brincadeira, mas não é não. Tão sério que no dia em que o mago Marcelo Altino foi pra rua sem o seu amuleto, quase perdeu um braço num acidente de ônibus. A mídia não relatou nada disso. Não ligou um fato ao outro. Mas eu tenho certeza que foi por isso mesmo.

E o Atlético, que só pega lapada na Série D, não seria por alguma maldição também? Como é que pode, o time mandar tão bem no campeonato acreano e não emplacar quase nada no campeonato brasileiro? Só pode ser macumba da braba, a mandinga do sapo seco, alguma promessa não paga.

Como dizia Shakespeare, existem mais mistérios entre o céu e a terra do que supõe nossa vã filosofia. Marcelo Altino nunca mais vai sair de casa sem o seu amuleto. Eu vou acender as minhas velas. E o pessoal do Atlético que trate de descobrir uma encruzilhada para destravar o próprio destino!

– Agosto de 2021


Intervalo

Francisco Dandão

Acabou mais uma Olimpíada. Os deuses do esporte olímpico se recolheram ao seu aconchego. Vão dormir pelos próximos três anos. Só voltarão a dar as caras em 2024, na capital da França. Enquanto isso, os competidores que tratem de gemer e suar para melhorar as suas marcas.

Aumentar o número de medalhas a cada Olimpíada é o principal objetivo de cada país. Alguns investem nisso e dão condições aos seus atletas, incentivando-os com acompanhamento qualificado e remuneração condizente. Outros olham enviesado e não dão a mínima para ninguém.

Pra esses últimos, uma medalhinha a mais nos jogos seguintes já é motivo de vivas e urras, ufanismo delirante. É o caso do Brasil, que aumentou em duas o número de medalhas obtidas entre 2016 e 2021. Dezenove em 2016 e vinte e uma em 2021. Duas a mais. “É nóis na fita!”

O delírio pela experiência de coisas irreais é o sonho dos brasileiros. Cada vez que se aproximam novos jogos, a gente se pega torcendo pelos nossos corredores, arremessadores, atiradores, chutadores, cortadores e, ultimamente, surfistas e skatistas. O deserto do real, porém, é outra vibe.

As diversas criaturas que ocupam os cargos públicos aqui nessa terra de Macunaíma, Pererê, Bento Carneiro e demais parças, via de regra, só querem mesmo é permanecer no poder, por cima da carne seca. A ordem é tratar primeiro do próprio pirão quando a farinha for pouca. É desse jeito.

A coisa mais bela desses sujeitos é o próprio umbigo. Quem quiser, aí dos paturebas, que bote uma prancha sob os pés e deslize na crista da sua onda. Ou então, use rodinhas para superar os obstáculos do caminho. Ou, ainda nessa linha, que esmurre pontas de facas para nocautear os adversários.

Não tenho notícia de que algum dos nossos heróis olímpicos tenha sido recebido por uma autoridade de Brasília. Penso que essa é a maior prova de que ninguém poderoso esteja nem aí para o esporte brasileiro. Inclusive porque os caras parecem estar muito ocupados trocando ofensas e bravatas.

A verdade é que o país passa hoje por uma espécie de vale tudo político/ideológico: mascarados de um lado e negacionistas do outro. Pra que homenagear um atleta vencedor olímpico se o que o mundo precisa é de fake news reiteradas, encaminhadas por grupos de avatares e tropas de robôs?

Encerrados dentro de si mesmo, tateando com os olhos fechados na mais absoluta escuridão, à deriva num oceano de indiferença, os atletas olímpicos brasileiros avançam rumo um ponto futuro indefinido. Mas Paris é logo ali e as águas do rio Sena continuam correndo para o canal da Mancha!

– Agosto de 2021 –


Café com paella

Francisco Dandão

Gosto de andar pelo mundo. Acho que a melhor maneira para aprender sobre a cultura e os costumes de outros povos é vivenciá-los in loco, ao vivo e em cores. A pandemia, entretanto, deu uma travada nesse meu exercício. Já faz dois anos que eu não arredo o pé do espaço territorial brasileiro.

A respeito de costumes, uma das coisas que eu observei, desde a primeira viagem internacional, foi que a refeição matinal da maioria das pessoas é um almoço (os portugueses até chamam mesmo de “pequeno almoço”). Bem diferente da nossa, à base de pão, manteiga e café com leite.

No Panamá, onde estive em julho de 2010, me surpreendi quando vi na mesa ao lado da minha, antes das sete horas da manhã, uma família de pai, mãe e dois filhos pequenos se deliciando com um prato de feijão preto, misturado com pedaços de porco defumado, arroz branco e banana cozida.

Já na Espanha, tanto em Madrid quanto em Barcelona, Sevilha ou Cádiz, as cidades por onde passei nas duas vezes em que estive no citado país, o que os caras mais comiam cedo era paella. Generosos pratos de arroz colorido por açafrão, preparados com suculentos frutos derivados do mar.

Foi pensando nesse costume dos gringos, que eu resolvi alterar o meu café da manhã desse sábado de agosto, substituindo o pão francês por uma paella com muito camarão. Decidi isso como forma de comemorar a vitória do Brasil contra a Espanha, na final do ouro olímpico do futebol masculino.

Por via das dúvidas, que esse jogo de bola jamais foi (ou será) uma ciência exata, onde vencem os melhores, decidi comer a paella apenas ao final do confronto. Eu diria, por isso, que os meus olhos, durante a partida, ficaram se movendo entre a travessa com a iguaria e a tela do televisor.

Eis que o Brasil fez um gol, no final do primeiro tempo. Abriu o placar com o ótimo centroavante Matheus Cunha. E eu passei a ver a paella com olhos de ardente paixão. Visão que, naturalmente, se transformou em alguma desconfiança quando os violentos súditos do rei Filipe VI empataram o jogo.

Mas esse é um esporte de idas e vindas, de ventos que mudam de direção assim sem mais ou menos. Veio a prorrogação e um negro veloz de nome Malcom, atualmente exilado nas estepes russas (ele é jogador do Zenit de São Petersburgo) liquidou a fatura. Brasil bicampeão olímpico, 2 a 1.

Pude então comer a paella com raro prazer. A Espanha que me aguarde para um retorno tão logo se abram as fronteiras depois da pandemia. E nessa próxima vez, já aviso logo, descerei do avião recitando o poeta García Lorca, “mais distante que todas as estrelas e mais dolente que a mansa chuva.”

– Agosto de 2021 –


Como será o amanhã?

Francisco Dandão

Por uma questão de “hábito semântico” (isso existe?), a gente costuma entender o futuro como alguma coisa muito distante. Da mesma forma, pela mesma questão (levando em conta que isso exista mesmo), a gente costuma entender o amanhã como alguma coisa imediata, bem ali na dobra do tempo.

Mas se gente parar pra refletir, o futuro é o momento imediatamente seguinte. E o presente só é contínuo porque é feito de uma sucessão de futuros imediatos. Ao contrário do amanhã, que apenas se materializa no outro dia. Simples como a soma de dois mais dois só pode resultar em quatro.

Fico pensando nessas situações metafísico-existenciais enquanto acompanho o Brasil se arrastar na soma de medalhas olímpicas, salvo apenas pelo lampejo individual de um ou outro atleta: heróis que se fizeram praticamente sozinhos, guiados, muitas vezes, pela mão benigna do destino.

Passam-se os anos e não chega nem o futuro nem o amanhã dos atletas olímpicos brasileiros. É como se, usando uma metáfora geográfica/espacial, o pódio estivesse sempre na distância de um horizonte. Ou seja, por mais que se avance alguns metros, o objetivo continua no lugar da visão inicial.

Veja-se que nos jogos de 2016, no Rio de Janeiro, o Brasil conquistou 19 medalhas, sendo sete de ouro, seis de prata e seis de bronze. Medalhas suficientes para fazer o país ficar num (mísero) 13º lugar. Pior: números que eu acho muito difícil serem superados nessa edição lá na terra dos nipônicos.

Quer dizer: provavelmente, caso se confirme esse meu suposto vaticínio, o “país do futuro” (ou “do amanhã”), onde em se plantando, tudo dá (inclusive pés de psicopatas e negacionistas de toda a espécie), falando-se de conquistas esportivas, fez foi regredir nos cinco anos de 2016 para hoje.

E por falar em “amanhã”, nessa minha passagem pelo Rio de Janeiro visitei o museu do mesmo nome, “plantado” numa das extremidades da Praça Mauá, antiga região portuária da Cidade Maravilhosa. E o que mais se vê no interior desse museu são conselhos para a gente semear no tempo presente.

Esse foi um museu inaugurado justamente por ocasião dos Jogos Olímpicos de 2016. Um lugar por onde passam centenas de pessoas todos os dias. Todos passam e leem os conselhos. Mas, ao que parece, todo mundo lê com cara de mera paisagem. E todos esquecem tudo assim que saem de lá.

É isso. No mais, à guisa de completar esse meu latifúndio de tela e papel de hoje, falando dessa falta de perspectiva olímpica brasileira, me ocorre aquela frase do poema de Dante pregada na porta do inferno: “lasciate ogni speranza, voi ch’entrate” (“deixai toda a esperança, ó vós que entrais”).

– Agosto de 2021 –


Meus encontros com a Bardot

Francisco Dandão

Pela segunda vez na vida encontrei a diva do cinema francês Brigitte Bardot. A primeira vez foi em Paris, há vários anos, em plena Champs-Élysées, nas proximidades do Arco do Triunfo. Agora foi aqui mesmo, na terra dos tupiniquins e colegas, plena Região dos Lagos do Rio de Janeiro.

Lá em Paris não pudemos trocar nenhuma palavra. Ela estava dentro de uma loja, aparentemente experimentando um par de botas. Mas era impossível que nos aproximássemos, tal o batalhão de assessores, fotógrafos e fãs incondicionais que a cercavam. Eu a vi pelo lado de fora da vitrine.

Não era uma distância grande aquela que nos separava. E eu fiquei com a impressão de que ela me convidou a entrar na loja com os lábios entreabertos e com os olhos brilhantes. Até dei um passo para entrar na tal loja. Minha mulher Maria, porém, me segurou pelo braço e me tirou do local.

Nessa última sexta-feira de julho, entretanto, na maravilhosa orla de Búzios, finalmente eu consegui me entrevistar com La Bardot. Eu a vi de longe, sentadinha no seu posto de observação, em frente a um mar de profundo azul, contemplando as gaivotas e os barcos na vasta enseada.

Me aproximei devagar, com o coração aos saltos, tentando não assustá-la. Ela estava sozinha e imóvel. Parecia uma estátua. Nada daquela multidão que a acompanhava em Paris da vez anterior em que eu a vi. Um ou outro turista parava para posar ao lado dela. Mas nada de multidão insana.

Sentei-me ao seu lado. Ela continuou sem se mexer, com o olhar fixo em um ponto qualquer do horizonte. Pareceu não notar a minha presença. Comportamento igual ao que eu havia visto uns segundos atrás com o casal de jovens que se aproximou e acariciou o rosto e os seios duros dela.

Fiz uma selfie e já me preparava para levantar e seguir minha caminhada pela orla quando pensei ouvi-la sussurrar. Eu achei que estava pirando o cabeção. Mas ela repetiu o sussurro e me pediu para ficar. Ela só fingia que era estátua para não gerar aglomerações, por causa da pandemia.

Conversamos por um bom par de horas. Aos 86 anos (mas com um corpinho de trinta e poucos), ela domina todos os assuntos. Mas é especialista mesmo sobre as coisas do Brasil, principalmente no que diz respeito ao futebol. É fã do Neymar e da Marta, embora ande tietando o Richarlison.

De acordo com ela, o Richarlison vai ser artilheiro das Olimpíadas e a seleção brasileira masculina vai conquistar outra medalha de ouro. Disse-me que tem tanta certeza disso que até já prometeu levantar e andar do seu posto de observação, caso isso não aconteça. Figura de cinema, a Brigitte Bardot!

– Julho de 2021 –


Sol nascente

Francisco Dandão

Não é sem propósito que o Japão é chamado de “o país do sol nascente”. Por uma questão de convenção espacial geográfica, é de lá que o chamado astro-rei inicia o seu ciclo diário. E na sua jornada rumo ao oeste, 12 horas depois chega por aqui pela terra brasilis, de negacionistas e que tais.

A eleição de Tóquio para sediar as Olimpíadas de 2020 foi realizada em setembro de 2013. A capital japonesa venceu a disputa contra Madri e Istambul. A essa altura, levando em conta que já se passaram oito anos desde a definição, eu já não sei se a eleição foi com urna eletrônica ou com cédula.

Também, pouco importa se a eleição para escolher a sede das Olímpiadas foi com urna eletrônica ou com cédula de papel. O que importa é que ninguém veio a público falar em fraude ou coisa que o valha. Alegação de fraude é coisa de golpista, gente que já sabe da derrota antes do fato.

Fico pensando nisso enquanto assisto na televisão a abertura dos Jogos Olímpicos de 2020, adiados em um ano por causa da pandemia do maldito coronavírus. O mundo aos poucos vai voltando ao normal, mas ainda falta muito para que a gente tenha a mesma mobilidade que tinha antigamente.

Eu havia me programado para ir à Olimpíada do Japão. Já estava, inclusive, frequentando um curso básico da língua japonesa. Eu não podia imaginar que o planeta ia passar por uma convulsão dessa natureza. Acho que ninguém, à exceção de alguns chineses, imaginaria uma coisa dessas.

Depois que a Olimpíada foi adiada, eu ainda tive a esperança que a minha viagem daria certo. Na minha cabeça cada vez mais confusa, eu imaginava que as fronteiras seriam liberadas tão logo eu tomasse a vacina. Tomei a vacina (aquela do João Dória) mas ainda assim não pude ir à Tóquio.

Não deu certo. A sabedoria popular diz que o homem faz e Deus desfaz. Isso não significa que a gente tenha que seguir a vida assim ao sabor do vento, sem um mínimo de planejamento. Significa somente que a gente tem que ter sempre um plano B. Uma alternativa para seguir em frente.

Creio que muita gente viveu (vive) a mesma situação que eu vivi (estou vivendo) ao redor do mundo: planos frustrados para ir à Olimpíada. Menos mal que as infovias tecnológicas nos trazem as imagens em tempo (ir)real. E, dessa forma, se pode acompanhar tudo sem medo da distância.

É isso… No mais, só pra dizer que não vou abdicar de ir ao Japão quando passar a pandemia. Agora não mais para acompanhar as disputas olímpicas. Só mesmo para assistir o nascer do sol debaixo das cerejeiras. Nas minhas viagens, ainda não botei os pés na Ásia. Quero começar pelo Japão!

– Julho de 2021 –


Que os melhores vençam

Francisco Dandão

Meados de julho. Duas finais de arrepiar todos os pelos do corpo estão marcadas para este fim de semana no mundo do futebol planetário: a decisão da Copa América, neste sábado (10), entre Brasil e Argentina, e a decisão da Eurocopa, entre Inglaterra e Itália, no imediato dia seguinte, domingo (11).

Com relação à decisão da Copa América, quando eu digo “que os melhores vençam”, o que eu espero é que os brasileiros sejam esses tais melhores. Isso porque, dentro da minha parcialidade de torcedor, caso o resultado nos seja negativo, o que eu direi depois é que uma zebra galopou.

Devo explicar que no momento em que escrevi “resultado negativo”, aí no parágrafo anterior, o fiz batendo três vezes na madeira e, para garantir o sortilégio, fiz figas com os dedos das mãos e dos pés. Vade retro, lazarento! Pé de pato, mangalô três vezes! Zebras no Brasil só aquelas dos zoológicos!

Eu sei que existem brasileiros que torcem para a seleção da Argentina. Tenho que respeitar a preferência deles, levando-se em conta, principalmente, a questão da diversidade que perpassa os assuntos do coração. Respeito, mas preciso dizer que acho isso de uma total estranheza.

Para os brasileiros que torcem pela Argentina, o que eu desejo é que eles chorem abraçados ao Messi depois da final. Aliás, independente de torcida, pelo bem dos argentinos, o certo é eles perderem. É que eles gostam de tango. E não existe tango alegre. Um bom tango precisa de sofrimento!

Quanto à decisão da Eurocopa, eu ainda não decidi para quem vou torcer. Uma hora eu penso que seria legal os ingleses vencerem. Afinal foram eles os inventores desse esporte de uma bola jogada com os pés. Mas outra hora eu penso que seria legal vencer a Itália, que hoje está jogando demais.

Se bem que os ingleses, caso venham a vencer, descendentes que são da mais nobre estirpe real, vão se considerar invulneráveis deuses do Tâmisa. Vão ficar insuportáveis. E os italianos, talvez esses também não mereçam ganhar porque foram os nossos carrascos naquela malfadada Copa de 1982.

Levando-se em conta esses prós e contras, eu acho que não vou torcer por nenhum dos lados na decisão da Eurocopa. Vou rezar para que dê empate e para que saiam muitos gols no tempo normal (tipo quatro a quatro) … E que a partida vá para a prorrogação… E que os pênaltis resolvam a parada.

É isso. No mais, só pra dizer que os palcos das duas decisões são os melhores possíveis. A Copa América será decidida no Maracanã e a Eurocopa se decidirá em Wembley. Dois templos do futebol mundial. Duas catedrais do esporte, onde já desfilaram os mais diversos monstros sagrados!

– Julho de 2021 –


Nordestinos no pódio!

Francisco Dandão

Sempre fui de dormir muito pouco. Durmo sempre bem depois da meia-noite. E jamais passo das sete horas da manhã no berço. Por esses dias, tenho dormido menos ainda. Os Jogos Olímpicos de Tóquio, cujas disputas acontecem em grande parte na nossa madrugada, é que me mantém alerta.

Mas até aqui tem valido à pena essa vigília. Embora o Brasil não seja, necessariamente, um papão de medalhas (nunca foi e dificilmente será enquanto permanecerem no poder criaturas que só olham para o próprio “umbigo” – leia-se “bolso”), alguns resultados nos enchem de orgulho pátrio.

São os casos da medalha de ouro no surf, conquistada pelo potiguar (Baía Formosa) Ítalo Ferreira, e da medalha de prata no skate, conquistada pela maranhense (Imperatriz) Rayssa Leal. Dois nordestinos soltos no mundo, sem medo de serem felizes e levando junto o grito de uma multidão.

A pequena Rayssa Leal, uma adolescente de 13 anos, aliás, é a personagem central de uma dessas histórias que desmontam o sectarismo de determinadas teorias mirabolantes. Oriunda de um estado que até um dia desses era governado por um comunista, nem por isso ele deixou de se criar.

A tese recorrente entre os militantes das correntes ideológicas de ultradireita é a de que “comunista come criancinha”. Se isso fosse verdade, a Rayssa só teria sobrevivido se a família dela houvesse fugido para o Egito, mais ou menos como na história do governador Herodes, o infanticida!

Ou então, quem sabe, a Rayssa teria escapado dos dentes dos comunistas porque desde pequenina se transformou numa fada. A “fadinha do skate”, que tremula suas asas de borboleta para sair levitando com um brinquedo de rodinhas preso aos pés, tecendo parábolas ao sabor do vento.

Eu acho que o Ítalo e a Rayssa são a prova viva de que esse país tem um potencial incrível para forjar grandes atletas. Tanto um como a outra vieram do nada e venceram pelo próprio talento. Imaginem só se alguém com poder político tivesse investido neles. Ou investisse em outros deles!

Eu sei que isso é uma utopia. Os melhores mundos saem das utopias. Mas se perdem entre os dedos da realidade cruel. As distopias, ao contrário, estão aí nos espreitando em cada esquina. A maladade, a incompetência e a falta de empatia da maioria dos homens públicos é que traçam esse destino.

Eu só espero, agora, é que nenhum despeitado entre com algum tipo de recurso junto às instâncias decisórias do Comitê Olímpico alegando qualquer tipo de fraude nas notas do Ítalo e da Rayssa, só porque não houve voto impresso. Se alguém ousar, o castigo vai ser passar a vida soluçando!

– Julho de 2021


Deu certo!

Francisco Dandão

O Atlético Acreano não é mais o time de pior campanha na Série D de 2021. O glorioso Galo do segundo distrito de Rio Branco encerrou domingo passado (18 de julho), com a ótima vitória por 3 a 1 sobre o GAS-RR, um jejum que já durava mais de 20 jogos em torneios nacionais/regionais.

O time da camisa da cor do céu, é verdade, ainda está na última colocação do seu grupo, com quatro pontos ganhos (uma vitória, um empate e cinco derrotas). Mas, falando-se no conjunto dos concorrentes, já deixou para trás Murici-AL, Jaraguá-GO, Patrocinense-MG e Rio Branco-PR.

Eu havia dito na crônica passada que acreditava que os dias de surra no lombo e de infinita infelicidade do Atlético Acreano chegariam ao fim nesse jogo contra o GAS. E listava razões para apostar nessa previsão. Razões entre as quais o fato de que o adversário não era nenhuma Brastemp.

Dito e feito. Segundo os meus correspondentes, foi um Atlético diferente o que entrou em campo na rodada final do primeiro turno da Série D. Me disseram que foi um Galo desses com sangue nos olhos, crista alta e esporões afiados. Armas capazes de cortar até fio de cabelo dançando no ar.

Um Galo com tantas ganas de deixar as nuvens pesadas para trás que marcou o seu gol inaugural logo nos primeiros minutos. E com tanta firmeza nas suas ações que sequer sentiu o gol de empate dos visitantes ainda no primeiro tempo. Tanto não sentiu que foi à frente e marcou mais dois gols.

Sobre o que teria feito a água do Galo virar vinho como num passe de mágica, isso eu não tenho muita certeza. Mas creio que foi uma mistura dos três fatores que eu também disse na crônica anterior: treinos de campo em sessões corridas, consultas com parapsicólogos e viagens à Cruz Milagrosa.

Em condições normais, exaustivos ensaios em treinos de campo já são capazes de surtir um efeito legal. No caso do Atlético, porém, acho que a direção do clube quis se prevenir. Por isso, a contratação dos parapsicólogos (apenas psicólogos não bastariam, levando-se conta a questão sobrenatural).

Quanto a ida à Cruz Milagrosa, nada como uma boa dose de fé para ajudar os exercícios dos treinos e os profissionais da parapsicologia. A história do mundo está cheia de exemplos de montanhas removidas por homens de fé. Muito mais do que toneladas de dinamite ou retroescavadeiras.

A estratégia deu certo! Agora é só continuar nesse caminho. Sábado tem mais outro duelo entre o Atlético e o GAS. Agora vai ser em Roraima. Vale tudo, vale o que vier, vale o que quiser… E ao contrário da música do Tim Maia, tá valendo até dançar homem com homem e mulher com mulher!

– Julho de 2021 –


Preparativos

Francisco Dandão

Depois de levar cinco pancadas nos cocos no primeiro turno do Campeonato Brasileiro da Série D, o glorioso Atlético Acreano prepara-se para vencer o seu primeiro jogo neste domingo (18). Pelo menos eu acredito nisso, levando-se em conta o fato de que “não há mal que dure para sempre”.

Já faz tanto tempo que o Atlético não vence umazinha em competições regionais e nacionais que eu já até perdi as contas de quantas surras foram até aqui. Sei que já somam mais de duas dezenas os fracassos em confrontos com times de outras paragens. Mas penso que isso está prestes a acabar.

O primeiro indício que me leva a pensar assim diz respeito à boa estreia do Galo no campeonato acreano. O time da camisa da cor do céu é o único considerado grande entre os clubes locais que venceu na rodada inaugural do chamado “Acreanão”. O Atlético bateu o Andirá por 1 a 0.

Eu sei que vocês aí na frente dessas mal traçadas vão dizer que bater no Andirá não quer dizer nada e que isso é o mesmo que pegar um bêbado e empurrar ladeira abaixo. Mas eu respondo que quem pensa assim se engana. O Andirá não é mais aquela velha galinha morta que todo mundo fritava.

O jogo entre Atlético e Andirá, pelo que disseram os meus correspondentes, foi duríssimo, só decidido nos detalhes. Pela palavra desses meus chegados, apesar do morcego ainda não ser nenhum Batman, demonstrou que pode voar alto e dar rasantes no pescoço dos desprevenidos.

Mas então, voltando para o argumento principal do texto, que é a minha fé em que o Atlético vai ganhar a primeira na Série D, outro fator a favor do time acreano é que o oponente deste domingo, o GAS, também não está com essa bola toda não. A campanha deles também é capenga até aqui.

Tudo bem, o roraimense GAS ganhou uma. Ganhou do amazonense Fast. Ou seja, tirou o dedo das partes pudendas. Mas por enquanto foi só. Nos outros cinco jogos, eles perderam três e empataram duas vezes. Quer dizer: vai ser o confronto entre os dois piores times (até aqui) do Grupo 1.

Se o Atlético não ganhar do GAS, atuando em casa, até eu vou jogar a toalha. Vou deixar de torcer pelo Atlético em competições regionais e nacionais. Se o Atlético não começar a vencer, a partir deste domingo, acho que o melhor a fazer é isso mesmo. Deixar o rio seguir o seu fluxo até o mar.

Mas eu acho que vai dar certo. A julgar pelos preparativos do Galo para esse próximo compromisso, tem tudo para dar certo. Preparativos que incluem, de acordo com os meus correspondentes, exaustivos treinos de campo, sessões com parapsicólogos e uma ida à antiga Cruz Milagrosa!

– Julho de 2021 –


Determinadas tragédias

Francisco Dandão

Tem gente que diz que a humanidade progride a partir de tragédias. Para quem pensa assim, é só depois de uma grande convulsão que os humanos refletem sobre o seu modo de vida, seja na questão da relação com o outro, seja quanto à maneira de pensar. O agir e o pensar, por assim dizer.

Algumas tragédias afetam todo mundo, indistintamente. É o caso nos dias que correm dessa pandemia que enche de dor milhões de pessoas. São as famílias que perderam os seus entes queridos que mais sofrem com o vírus maldito. E as demais, as que não perderam ninguém, se afundam no medo.

É claro que, ainda falando do vírus, muito poderia ter sido evitado (ou minimizado) se os governantes houvessem agido com a celeridade que o instante exigia. Nos Estados Unidos, ressalte-se, a pandemia já está devidamente controlada. Bem diferente do que se passa no país dos perebas.

Outras tragédias, porém, pelo contexto em que estão situadas, só afetam um grupo de pessoas. Em sentido diametralmente oposto, ao mesmo tempo em que elas provocam choro e ranger de dentes de um lado, também enchem de felicidade os corações dos opositores. Vento que venta lá e cá!

A “tragédia do Sarriá”, por exemplo, na Copa de 1982, foi dessas que só afeta uma parte dos envolvidos. Por se tratar de futebol, havia dois lados distintos na disputa: a seleção do Brasil e a seleção da Itália. Melhor para eles. Contra todos os prognósticos, os italianos nos mandaram para casa.

Aquela seleção brasileira de 1982, pela grande quantidade de jogadores excepcionais que reunia, e pelo espetáculo que dava cada vez que entrava em campo, caso fosse campeã do mundo passaria à história talvez como a melhor representação nacional de todos os tempos. Mas perdeu!

E fazendo jus ao timaço que disputou a tal Copa, o Brasil arrasou todos os adversários que encontrou pela frente, até o fatídico dia em que foi eliminado pela Itália: 2 a 1 na União Soviética, 4 a 1 na Escócia, 4 a 0 na Nova Zelândia, 3 a 1 na Argentina. Já a Itália sobrevivia à custa de empates!

A vitória contra o Brasil, por 3 a 2, com os três gols deles sendo marcados pelo atacante Paolo Rossi, fez com que os italianos ganhassem a confiança que precisavam para deslanchar rumo ao título (o terceiro deles – 1934, 1938 e 1982). Na sequência, eles bateram a Polônia e a Alemanha.

Lembrei disso por conta do aniversário de 39 anos daquele evento dramático (para os brasileiros), transcorrido nessa segunda-feira que recém passou (5 de julho). Eu era um jovem senhor de 25 anos naquela tarde fatídica, mas lembro como se tudo houvesse acontecido ontem. Vacina neles!

– Julho de 2021 –


Datas comemorativas

Francisco Dandão

Duas datas deste mês de julho se configuram, particularmente, caras para o velhinho aqui que vos escreve: os dias 2 e 3, sexta e sábado, respectivamente. Na sexta-feira foi celebrado o Dia Mundial do Jornalista Esportivo. E no sábado a celebração foi (é) pelo aniversário de Brasiléia.

Sobre a primeira data, eu recebi dois alertas, via aplicativo de mensagens. Um deles do dileto amigo Antônio Assis, fotógrafo acreano, antigo morador do bairro da Base, que há muitos anos foi residir em Manaus. O outro, do meu afilhado Façanha, sempre alerta para as coisas do esporte.

Devo confessar que eu nem sabia que existia um Dia Mundial do Jornalista Esportivo. O que eu sei é que o jornalismo esportivo brasileiro já rendeu escritores fantásticos, seja no campo da poesia ou da prosa. Enquanto escrevo me lembro de dois deles: Nelson Rodrigues e Armando Nogueira.

Nelson Rodrigues, que nasceu em Recife, mudou-se para o Rio de Janeiro ainda menino e fez carreira tanto como cronista esportivo quanto como romancista, contista, dramaturgo e muitas outras coisas mais. Li quase tudo da lavra dele e posso afirmar sem medo que era um cracaço das letras!

Torcedor do Fluminense (assim como eu), Nelson brincava de produzir frases antológicas nos seus textos. Tem uma dessas frases que eu lembro sempre que falo dele: “Muitas vezes é a falta de caráter que decide uma partida. Não se faz literatura, política e futebol com bons sentimentos”.

No que diz respeito a Armando Nogueira, só o fato de haver nascido no interior do Acre e ganhado o mundo com a sua verve criativa já me tornaria fã dele. Só não me declaro “fã incondicional” porque ele era botafoguense. Mas isso é um detalhe menor que não tira os seus méritos.

Quando morreu, aos 83 anos, em 2010, o acreano Armando Nogueira deixou um legado de pelo menos dez livros com a temática esportiva. Casos de “Na grande área” (1966), “O homem e a bola” (1986), “Bola de Cristal” (1987), “O canto dos meus amores” (1998), “A ginga e o jogo” (2003) etc.

Sobre a segunda data a qual eu me referi lá no primeiro parágrafo, o aniversário de Brasiléia, eu a considero especial pelo fato de que trata-se da cidade onde eu vim à luz. Fundada como “Brasília”, em 1910, a cidade teve que mudar de nome, em 1943, para ceder o original à futura capital federal.

E para finalizar, como este texto foi gestado para falar das coisas do esporte, não custa destacar que Brasiléia sempre foi um berço de importantes nomes do futebol acreano. Cito alguns, a título de exemplo: Bruno Couro Velho, Lelê, Aldemir Lopes, Canjerê, Alcione, Rui Macaco, Vidal… Muitos!

– Julho de 2021 –


Gabinete paralelo

Francisco Dandão

Essa crônica, em princípio, ia receber o título de “Insensatez”, inspirada numa antiga canção dos mestres Tom Jobim e Vinícius de Moraes. Dois versos singulares da referida canção é que me motivavam para chamar o texto assim: “Quem semeia vento, diz a razão, colhe sempre tempestade”.

Mas aí, eu vi que o resto da letra de “Insensatez” não batia muito com o que eu estava pensando sobre o momento do Brasil. A canção fala em choro de dor pela perda de um amor, aconselha o uso de sinceridade e exorta um suposto pecador a pedir perdão, sob pena de não merecer jamais ser amado.

Então, somando tudo e elevando a temperatura ao quadrado, sem esquecer que tá faltando maconha, na versão dos negacionistas, resolvi chamar essas mal traçadas de “gabinete paralelo”. Nada a ver com aquele em curso no planalto, trato de esclarecer antes de qualquer mal-entendido.

O “gabinete paralelo” vai ser criado por mim para conduzir a gestão da Copa América no país do carnaval (antes do vírus, deve-se lembrar), compreendendo que se o Brasil já não tem a festa profana para se deliciar ao som dos ritmistas sazonais, que pelo menos não abra mão do seu futebol. Rs.

Ainda não sei bem quem eu irei convidar para fazer parte do meu gabinete. Vou ter que estudar os nomes com muito cuidado. Mas já tenho o perfil dos especialistas, ressaltando que o primeiro requisito é que não tenham escrúpulo em mentir ou mudar as regras do jogo com a bola rolando.

O Brasil tem que assumir a sua identidade de mentir, alterar as regras da partida e dizer o contrário do que já foi dito outra hora. O que tem de valer é o argumento imediato, não importando se um dia o pensamento se movia em sentido diametralmente oposto. A boiada não tem que seguir passando?

Afinal de contas, até o Papa argentino já disse que o povo daqui desse lado de baixo do Equador não tem mais jeito não, “é muita cachaça e pouca oração”. Apesar de se chamar Francisco e ser meu xará, o Papa nasceu nas imediações do rio da Prata. Sempre que puder, vai tratar de nos sacanear.

Sim, voltando ao tema, eu falava do meu “gabinete paralelo” para realizar a Copa América. E dizia que procuro os nomes que o comporão. Ainda faltam os nomes e outras coisas. Mas urge que a ideia saia do papel. Pelo menos os argumentos eu já tenho para justificar o torneio por aqui.

O principal desses argumentos é o de que a vacinação da população brasileira já está “bem avançada” (10% já receberam as duas doses!) e “a pandemia já está devidamente controlada” (rindo até o ano que vem). Além do mais, cloroquina pra malária é o que não falta por aqui. Fora todo mundo!

– Junho de 2021 –


Biden, o Brasil e o Peru

Francisco Dandão

Sou cada vez mais fã desse senhor Joe Biden, presidente dos Estados Unidos. Vejam que ele, apesar de ter a sua eleição posta em dúvida pelo governo brasileiro, uns meses atrás, paga agora a insensatez com a promessa do envio de milhões de doses de vacina contra a Covid para os brazucas.

Comportamento diametralmente oposto ao do seu antecessor, negacionista até a medula e ignorante até a unha do dedo mindinho do pé (tal e qual), que se tivesse sido reeleito certamente ainda não teria vacinado quase ninguém naquele país (tal e qual). Felizmente, a história avança por rupturas.

Joe Biden, ao contrário dos dementes de toda a espécie espalhados pelo mundo, acredita no poder da ciência e apostou na vacinação em massa tão logo ascendeu ao trono da Casa Branca. E o resultado está aí aos olhos de todos. Por lá, já se pode tirar as máscaras e ir aos ginásios e estádios!

A derrota do presidente anterior era uma espécie de crônica de uma surra anunciada, nos Estados Unidos. Eu estive em Nova York em 2019 e vi como boa parte do público se referia ao então mandatário. Transmutando a realidade, de lá pra cá, eu diria que o cara era o pateta mentiroso lá deles.

Por uma questão de justiça, porém, não se pode dizer que o Brasil esteja inerte no tocante às preocupações sociais. Talvez o foco seja outro, mas aqui também se cuida do povo. Prova disso é que nós (“nós quem, cara-pálida?) sediaremos a Copa América. Uns cuidam da saúde, outros do circo!

E nem se pode dizer que o Brasil seja a primeira nação da história decidida a privilegiar os espetáculos circenses. Na Roma antiga, sob o domínio do piromaníaco imperador Nero, o circo explodia em êxtase enquanto a periferia da cidade pegava fogo. Existem precedentes, senhores!

E na Roma antiga, destaque-se, também existiam epidemias. Era a maior cidade do planeta, opulenta e perdulária, mas também com uma grande população de ratos e piolhos, elementos cruciais para a proliferação de doenças. Talvez a diferença entre nós e eles é que lá o lema era “pão e circo”.

Enquanto isso, nas terras encontradas por Cabral, só prevalece o circo. Pão que é bom, necas de pitibiriba. Como não tem vacina suficiente para todos (Biden agora ficou de mandar), a maioria das pessoas tem que ficar em casa guardando o distanciamento social. E aí falta a tal munição de boca.

Sobre o Peru lá do título, que acabou não entrando na crônica, eu vou deixar para falar num outro dia. A ideia era fazer uma relação entre o mau desempenho deles nas Eliminatórias com o Brasil da Copa América. Terminei por não fazê-lo, por absoluta falta de espaço deste latifúndio.

– Junho de 2021 –


Fim de semana passado

Francisco Dandão

Foi um fim de semana ruim para os times acreanos que disputam a Série D do campeonato brasileiro. O Galvez sofreu nova derrota fora de casa (já são duas no torneio, contra, respectivamente, Castanhal-PA e Penarol-AM) e o Atlético só empatou contra o Fast-AM, jogando no próprio terreiro.

No caso do Galvez, menos mal que o time venceu nas duas oportunidades que mandou os seus jogos (2 a 1 no GAS-RR e 2 a 1 no Atlético). Quer dizer: mesmo sofrendo o revés no interior do Amazonas, ainda está ali pelo meio da tabela de classificação, com seis pontos ganhos.

Isso significa que o Imperador do Acre só depende de si mesmo para avançar na competição. Naturalmente, não pode perder todas as que jogar na casa dos outros. Em algum momento vai precisar sim pontuar também por aí, em algum lugar de uma estrada (ou rio) da vasta Amazônia Ocidental.

Como eu sou um otimista incorrigível, e como eu acredito no trabalho do técnico Paulo Roberto de Oliveira Lima, penso que o primeiro triunfo do Galvez fora de casa pode acontecer já na próxima rodada. O Fast, adversário da vez, embora ainda não tenha perdido, só ganhou umazinha até aqui.

Sei lá se isso de o Galvez ganhar fora de casa vai mesmo acontecer na próxima rodada. Não tenho visto nada na minha bola de cristal. Muito menos tenho conseguido ler coisa alguma nas cartas do meu velho tarô. Inclusive porque o céu do Brasil anda mais pra borrasca do que pra brigadeiro.

O que eu sei, seguindo a filosofia de um vetusto parceiro de dominó, no caso o engenheiro agrônomo Simi Batista de Menezes (hoje morando no litoral do Espírito Santo), é que “o jogo só acaba quando termina”. E que “entre um dia e outro tem sempre uma noite no meio”. Frases do Simi!

Por outro lado (que coisa horrível de se dizer numa crônica supostamente destinada a leitores de todas as idades), apesar da sabedoria do meu antigo parceiro de dominó, é preciso um mínimo de competência dos “artistas” dentro do campo para que os bons resultados comecem a surgir.

A única coisa que um técnico competente pode fazer é traçar uma estratégia, de acordo com o adversário, e orientar os seus comandados para a devida execução das tarefas. Se os caras que suam as camisas não conseguirem executar o que é pensado pelo treinador, a vaca some no brejo.

Pois então é isso, meus caros amigos aí na frente destas mal traçadas de hoje. Tudo ainda está por vir. Ainda tem muito chão a percorrer na Série D deste ano. O Galvez só precisa começar a jogar bem fora de casa. O Atlético, por sua vez, além de jogar bem tem também que aprender a rezar.

– Junho de 2021 –


Galo tonto

Francisco Dandão

Sou ruim com números. Sempre mandei mal em matemática nos meus tempos de ginasiano e secundarista. Foi por isso que eu derivei para as ciências humanas e sociais quando entrei na faculdade e depois na pós-graduação. Consigo contar até cento e pouco, não muito mais do que isso.

Talvez por essa razão, por causa dessa aversão aos números, eu tenha perdido as contas de quantas partidas o Atlético Acreano perdeu (ou empatou, ou deixou de ganhar) em competições nacionais nos últimos tempos. Sei que foram muitas. Há mais de ano o Galo não ganha umazinha.

Na série D do ano passado, o glorioso time do segundo distrito de Rio Branco jogou 14 vezes (sete em casa e outras sete em terras inimigas). Dessas 14 partidas, o time alviceleste empatou oito e perdeu seis. Com tantos resultados adversos, ficou na lanterna do grupo A1 da citada competição.

E todo esse calvário, ressalte-se, depois de fazer uma excelente campanha na série C de 2018. Naquela oportunidade, o Atlético, com um elenco basicamente caseiro, sob o comando do técnico Álvaro Miguéis, fez frente e atropelou várias equipes tradicionais do país. Jogava e convencia!

Se fosse um boxeador, eu diria que depois de levar tanta porrada, o Galo estaria cambaleante no espaço do ringue. Ainda não levou o nocaute, mas estaria tonto, encostado de encontro às cordas. Como ainda não beijou a lona, porém, creio que ainda tem sim alguma chance de levantar a cabeça.

Embora o time já tenha levado outras três pancadas na série D deste ano (São Raimundo-RR, Ypiranga-AP e Galvez-AC), ainda há tempo para ensaiar uma recuperação. O jogo deste domingo, na Arena da Floresta, contra o amazonense Fast surge como uma boa oportunidade para essa recuperação.

O Fast não parece ser esse bicho papão todo não. É certo que ainda não perdeu, mas ostenta modestos cinco pontos em três partidas realizadas, fruto de dois empates (3 a 3 com o Ypiranga-AP; e 1 a 1 com o São Raimundo-RR) e uma vitória (3 a 2 no Penarol-AM), em jogo tumultuado.

Pelo meu palpite, o Atlético vai começar a virar a página das derrotas neste domingo, contra o Fast. É só um palpite. Não está baseado em coisa alguma real, palpável ou visível. Melhor dizendo: é um palpite baseado na ideia de que os atleticanos começam a mobilizar algumas forças ocultas.

Quem me disse que os atleticanos estão mobilizando as forças ocultas para acabar a maré de azar foi o Joraí Salim. Segundo ele, a turma do Galo tem acendido velas no túmulo do velho Jaú, misto de macumbeiro e massagista do Galo na década de 1970. É esperar pra ver se vai dar certo.

– Junho de 2021 –


Outra idade

Francisco Dandão

Dois treinadores em atividade no futebol acreano trocaram de idade neste mês de junho. Falo de Paulo Roberto de Oliveira Lima, comandante do Imperador Galvez, e José Marco Rodrigues (o Zé Marco), condutor do Atlético. Paulo fez aniversário no dia 11; Zé Marco comemorou no dia 16.

Coincidentemente (ou não), ambos também foram jogadores de futebol de rara competência. Paulo Roberto era um lateral que defendia e apoiava com a mesma desenvoltura. E Zé Marco, apesar do ótimo trato com a bola, era um volante daqueles de não perder viagem quando ia no lance.

E coincidentemente também (ou não), ambos foram garotos saídos de cidades do interior para ganhar o status de estrelas imprescindíveis nos campos de futebol. Paulo Roberto nasceu em Sena Madureira-AC, em 1958. Zé Marco nasceu no município rondoniense de Rolim de Moura, em 1981.

Paulo Roberto fez toda a sua carreira no Acre. Durante 10 anos, de 1978 a 1987, ele defendeu o Rio Branco, o Juventus e o Independência. Isso depois de passar dois anos (1976 e 1977) nos juniores do Estrelão. Em 1978, convocado pelo técnico Leó, ele alternou partidas na base e no time principal.

E para demonstrar a sua importância, registrem-se os oito títulos dele dentro das quatro linhas, sendo seis estaduais (três pelo Rio Branco – 1979, 1983 e 1986; dois pelo Juventus – 1981 e 1982; e um pelo Independência – 1985) e dois da Amazônia (Rio Branco, em 1979; e Juventus, em 1981).

Outro detalhe relevante que torna a história do Paulo digna de ser repassada de boca em boca é o fato de ele ter conseguido jogar em alto nível apesar de um defeito no braço esquerdo, por conta de uma poliomielite contraída quando ele era criança. Foi preciso muita bola e força de vontade!

Zé Marco, por sua vez, foi uma espécie de cigano da bola, jogando em times de seis estados (Acre, Rondônia, Paraíba, Amazonas, São Paulo e Paraná), entre os anos de 1999 e 2013. Quando acabava uma temporada, uma infinidade de clubes corria atrás daquele baixinho guardião de zagueiros.

Quanto aos títulos conquistados, foram tantos que Zé Marco nem lembra quantos. Mas ele faz questão de destacar três deles: o amazonense de 2001, pelo Rio Negro; o da primeira fase do campeonato paranaense pelo Irati, em 2002; e o paulista da Série A3 pelo Penapolense, em 2011.

Escrevi sobre o Paulo Roberto e o Zé Marco, mas quero salientar que muitos outros craques do futebol acreano nasceram no mês de junho. Casos do Dirceu (1º/1973), Marcelinho (3/1972), Kinho (4/1986), Amarildo Veras (6/1962), Danilo Galo (12/1944), Ley (23/1981) e João Paulo (26/1980).

– Junho de 2021 –


Olho no olho

Francisco Dandão

Os dois representantes do Acre na Série D do campeonato brasileiro duelam neste domingo, na Arena da Floresta. É apenas a terceira das 14 rodadas da primeira fase da competição. Isso significa que muita água ainda vai rolar sob a ponte até que um dia no futuro o rio alcance o vasto mar.

É apenas a terceira rodada, mas o Atlético já deixou para trás seis preciosos pontos. O glorioso Galo do Segundo Distrito de Rio Branco, onde um dia um nordestino ancorou o seu barco à sombra de uma gameleira, perdeu na estreia, em casa, e perdeu de novo depois, fora dos seus domínios.

A primeira derrota do Atlético foi contra o roraimense São Raimundo. Eu não assisti ao jogo e, dessa forma, não saberia dizer o que aconteceu. O que eu sei é que num passado que já se distancia no tempo, os times roraimenses não se criavam de jeito nenhum quando visitavam o Acre.

Depois, o Galo foi à terra do manganês, o Amapá, e perdeu para o Ypiranga. Também não assisti, mas quem esteve lá diz que o Atlético merecia melhor sorte, uma vez que a derrota teve a influência direta de Sua Senhoria, o árbitro da partida. Dizem isso as testemunhas, que eu não vi.

Fora de casa é mesmo difícil jogar, principalmente quando se pega algum árbitro mal intencionado. Mas dentro de casa, a obrigação é vencer. Coisa que antigamente os times do Acre faziam. Os visitantes, no passado, tremiam de pavor quando entravam no velho estádio José de Melo.

Em 1972, por exemplo, eu lembro de uma excursão do Mixto-MT ao Acre. Eles desembarcaram em Rio Branco com ares de superioridade. Seriam quatro jogos e eles contavam que venceriam todos, sem grandes esforços. No final, venceram somente um, perderam dois e empataram outro.

Mais recentemente, logo depois da inauguração da Arena da Floresta, já na era do futebol profissional, o Rio Branco papava quase todo mundo que pisava no referido templo do futebol. Os paraenses Paysandu e Clube do Remo cansaram de sofrer para sair pelo menos com um empate da Arena.

E mais recentemente ainda, na Série C de 2018, esse mesmo Atlético que hoje tropeça nas próprias pernas avançou até às quartas-de-final,

triturando os adversários que jogaram tanto na Arena quanto no Florestão. Só caiu quando se defrontou com esse Cuiabá que hoje está na Série A.

Alguma coisa aconteceu entre um tempo e outro. O meu palpite é o de que os investidores, sejam de caráter privado ou público (principalmente este), deixaram de injetar os seus recursos nos clubes de futebol do Acre. E então, só resta agora para Atlético e Galvez olharem nos olhos um do outro.

– Junho de 2021 –


Habemus Copa

Francisco Dandão

Peguei esse “Habemus” aí do título emprestado do latim. É esse vocábulo que se usa quando um novo Papa é eleito. Os cardeais se reúnem, decidem quem vai ser o próximo nome no trono de São Pedro, e soltam uma fumaça branca pelos ares. E aí a gente fica sabendo que “Habemus Papa”.

Guardadas as devidas proporções, foi mais ou menos isso o que aconteceu por aqui nos últimos dias para que se pudesse dizer que “Habemus Copa América” em 2021. Uma meia-dúzia de cardeais da República se reuniu com outro tanto de cartolas da CBF e o martelo bateu na bigorna.

Durante uma semana viveu-se uma incerteza: ter ou não ter. O bardo inglês Shakespeare certamente ficaria humilhado em saber o quanto uma letrinha muda tudo do “ser ou não ser” da sua frase original. Mas, enfim, os tempos são outros e o diferente sempre vem, ainda que em forma de vírus.

Teve muita gente contra e muita gente a favor da realização da Copa América. Uns diziam que poderia haver uma explosão na taxa de pessoas infectadas pelo vírus nascido nas estepes da Ásia. Outros diziam que não teria perigo, uma vez que as delegações estariam todas imunizadas e benzidas.

Esse “benzidas” que eu disse no parágrafo anterior surgiu no texto só porque a metáfora que deu start ao texto tem um fundo religioso. Só por isso. Inclusive porque eu não sei se ainda existe tanta água no país para benzer os duzentos e poucos milhões que desfilam sua glória pelas nossas periferias.

Essa discussão sobre “ter ou não ter” Copa América no Brasil, ressalte-se, não teria sentido se a vacinação dos brasileiros estivesse avançando de maneira mais célere. Veja-se que até o presente momento em que preencho estas linhas, nem 11% dos nativos receberam as duas doses.

Nos Estados Unidos, onde o governo federal entendeu a gravidade da situação e apostou na imunização em massa da população norte-americana, as máscaras já são consideradas acessórios opcionais. E então, por conta disso, os ginásios, teatros, cinemas e estádios já estão abertos para o público.

O certo é que vai ter Copa América no Brasil, a partir do próximo domingo, e a seleção aqui da casa vai estrear em Brasília, contra a Venezuela.

Um duelo que, se fosse o caso de comparar a ideologia do poder vigente nos dois países, poderia ser traduzido como direita raivosa x esquerda extremista.

É por aí, galera. Habemus Papa, ainda que argentino. Habemus mitos, ainda que falsos. E Habemus Copa América, ainda que a vacina caminhe a passos de cágado. Menos de 11% dos brasileiros estão imunizados, mas quem se importa com isso? Salve-se quem puder (inclusive o Caboclo)!

– Junho de 2021 –


Origens latinas

Francisco Dandão

Agora que o presidente da Argentina já determinou publicamente as origens do povo lá dele (vindo dos barcos europeus), do povo mexicano (vindo dos índios) e de nosotros (vindos da selva), eu penso que a gente pode concluir que a Europa também exportou tropas de muares para La Plata.

Sim, “muares” (mulas, burros)! Afinal, são esses animais os que mais dão coices nas criaturas desaviadas que passam pela parte dos fundos dos ditos cujos. O senhor presidente da Argentina depois tratou de se desculpar. Mas o mal estava feito e eu acho que as desculpas foram só pra inglês ver.

Perdão, falei nos ingleses! Toquei numa ferida! Esqueci que a nação da Rainha deu um chute no traseiro dos argentinos, tocando-os pra fora das Ilhas Malvinas, no início da década de 1980. Margaret Thatcher mandou Los Hermanos pra casa com o rabo entre as pernas e o furico piscando.

Os argentinos se julgam superiores ao resto da América Latina pela sua colonização, predominantemente espanhola. Isso os torna arrogantes e insuportáveis. Eu já estive em Buenos Aires duas vezes e vi bem como é isso. E com os brasileiros, então, esse comportamento se eleva ao cubo.

Vários dos argentinos com os quais eu interagi nas minhas passagens pela capital portenha, do nada, sem que sequer estivéssemos falando de futebol, me diziam: Maradona és mejor que Pelé! Nessas situações, eu não aceitava a provocação. Fingia que não era comigo. E a conversa morria.

Por tudo isso, e talvez por causa do número maior de títulos mundiais do futebol brasileiro, e sabe-se lá por que coisas outras, eu acho que eles tem é um enorme complexo de inferioridade em relação aos macaquitos. Aí me surge a dúvida se o sangue deles é mesmo nobre ou de cucarachas (baratas).

Sei, estou comparando os títulos mundiais de futebol nossos (cinco – 1958, 1962, 1970, 1994 e 2002) e deles (dois – 1978 e 1986), e aí alguém vai dizer que o velhinho aqui está preso a um passado distante. Mas então eu trago a comparação para hoje, para a classificação das atuais Eliminatórias.

Jogadas seis rodadas das Eliminatórias Sul-Americanas para a Copa do Mundo de 2022, a seleção brasileira ostenta 100% de aproveitamento: passou por cima de quem apareceu na frente, venceu dentro e fora de casa. Já a seleção da Argentina, pobre dela, se arrasta empatando aqui e acolá.

Apesar de tudo, pra ser justo, Buenos Aires é uma cidade linda. E os vinhos que os caras produzem lá são daquele tipo de fazer a gente querer sempre abrir uma próxima garrafa. E o churrasco servido em Puerto Madero derrete na boca. Eles tem a suas virtudes. Don’t cry for me, Argentina!

– Junho de 2021 –


Séries

Francisco Dandão

As quatro séries do campeonato brasileiro, envolvendo times de todos os estados do país, começam nos próximos dias na sua versão 2021. A primeira a começar é a Série B, já nesta sexta-feira (28). As séries A e C tem seu pontapé inicial no sábado (29). E a Série D começa no dia 5 de junho.

Da região Norte, o time que se encontra no patamar mais avançado é o Clube do Remo, de Belém, que disputa a Série B. Depois do Remo, a região citada tem o Paysandu e o Manaus, respectivamente dos estados do Pará e do Amazonas, na Série C. Todo o resto está escalado para jogar a Série D.

Somando-se tudo, 124 times brasileiros se distribuem por quatro divisões (20 na Série A, 20 na Série B, 20 na Série C e 64 na Série D). Levando-se em conta que a região Norte conta com apenas três equipes acima da última divisão, então a conclusão é óbvia: a participação é pífia!

Ressalte-se que qualquer time pode mudar de divisão, desde que se apresente em campo de forma convincente. Ou seja: com investimentos e gestões competentes o último biscoito do pacote da divisão derradeira tem chance de ascender até à turma de elite e se transformar em cereja de bolo.

É isso, aliás, que os torcedores dos times dos “confins do Judas” almejam e sonham quando veem o seu clube do coração entrar na disputa da Série D. Para muitos, a esperança se renova a cada ano. No mais das vezes porém, o que sobrevém é uma profunda frustração ao fim da temporada.

Mutatis mutandis, como diria o meu saudoso professor de filosofia Fernando Bastos, no mestrado da Universidade de Brasília (UnB), na década de 1990, o que interessa para os acreanos neste momento é que o Atlético e o Galvez entram em campo mais uma vez em busca do acesso à Série C.

Ambos estreiam no domingo, 6 de junho. O Atlético faz o seu primeiro jogo nos próprios domínios contra o roraimense São Raimundo. O Galvez vai ao interior do Pará, medir forças contra o Castanhal. Teoricamente, a tarefa do Atlético é mais tranquila, pelo fator casa. Mas só teoricamente!

Falo de teoria porque quando a bola rola tudo o que não entra em campo fica para trás. Visitantes podem virar feras soltas no mundo e se tornar deveras indigestos. Ainda mais nesses tempos de pandemia, quando os estádios permanecem vazios e não existe incentivo vindo das arquibancadas.

Enfim, os dados estão prestes a rolar e a sorte a ser lançada. Só o tempo poderá dizer se algum time do Norte vai subir de divisão no ano que vem. Eu prefiro acreditar que sim, mas sempre mantendo um pezinho atrás. Os ventos dessa região só moverão moinhos quando alguém acreditar nisso!

– Maio de 2021 –


Goleiros tipo exportação

Francisco Dandão

A vacinação contra o vírus maldito continua em passos de tartaruga no chamado país do futuro. A impressão que eu tenho é a de que alguém não quer saber disso. Aliás, não creio que seja apenas uma impressão. Pelas atitudes dos negacionistas da República, infelizmente, isso é fato mesmo.

Não obstante, como na canção famosa do mano Chico Buarque, aqui na Terra estão jogando futebol. O espetáculo não pode parar. Todos os dias aparecem novos jogadores contaminados. Mas e daí? E só mandar os caras para o estaleiro (DM) e chamar os reservas. E que sigam rindo as hienas!

E eu que já havia prometido a mim mesmo não falar mais disso, acabei falando. Eu havia prometido não falar mais disso porque lembrei de uma frase sábia da minha falecida mãe, Dona Luzia. A minha velha vivia me dizendo que “merda quanto mais mexe, mais fede”. Haja sabedoria popular!

Então, para que a merda não aumente a fedentina, vou mudar de assunto e passar a falar dos goleiros acreanos que romperam as fronteiras do estado e foram mostrar a sua arte em outras paragens. Mas não sem antes esclarecer que uma coisa nada tem a ver com outra, viu? Nada a ver não.

Foram vários os goleiros nascidos no antigo império de D. Luís Galvez que em algum momento das suas carreiras, dado as respectivas habilidades, chamaram a atenção do mundo e saíram do Acre para atrapalhar a vida dos diversos artilheiros. A começar pelo Weverton, titularíssimo do Palmeiras.

O Weverton, convocado para os próximos dois jogos da seleção brasileira, é o futebolista acreano melhor sucedido em todos os tempos. Até aqui, além das muitas convocações para a seleção, já conquistou, entre outros títulos, uma Copa Libertadores da América e uma medalha de ouro olímpica.

Mas existem outros goleiros que saíram para jogar em times fora do Acre. Não tiveram o mesmo sucesso do Weverton, que um raio, embora seja possível, dificilmente cai duas ou mais vezes no mesmo lugar. Enquanto escrevo, lembro de quatro nomes: Zé Augusto, Xepa, Tidalzinho e Máximo.

Zé Augusto, falecido recentemente, vítima do vírus (falei de novo na merda), jogou no juvenil do Flamengo-RJ, no final dos anos de 1960. Xepa, na década de 1970, jogou no Rio Negro-AM. Tidalzinho jogou no Amazonas e em Rondônia. E o Máximo andou por Rondônia, Amazonas e Goiás.

É por isso que eu sempre digo que basta um olharzinho apurado e um tanto de apoio de quem de direito para que o interior do Brasil revele talentos para o mundo do futebol. Falei futebol, mas os virtuoses podem surgir em qualquer atividade. A questão é que os caras preferem culpar os chineses!

– Maio de 2021 –


Massagistas

Francisco Dandão

Um dia desses, em 26 de abril, se comemorou o Dia do Goleiro. Eu até escrevi alguma coisa alusiva à comemoração, lembrando que a data foi escolhida por marcar o nascimento do goleiro Manga, um pernambucano que ganhou o mundo jogando futebol e que chegou até à seleção brasileira.

Todos os anos, muita gente publica (posta, no caso da internet) comentários neste dia, mostrando os seus ídolos dessa posição. E aí, essas publicações/postagens vão lembrando a gente de muitos goleiros que um dia assombraram os nossos olhos com defesas mágicas (ou frangos históricos).

Diferentemente, porém, das inúmeras comemorações pelo Dia do Goleiro, são poucas as criaturas que tecem elogios e admirações na data alusiva ao Dia do Massagista, um profissional também de suma importância, tanto para o futebol quanto para a prática de quase todos os outros esportes.

Pra falar a verdade, eu acho que pouca gente sabe que existe um Dia do Massagista. Pois eu lhes digo que esse dia existe sim e já está bem ali, daqui a pouco mais de uma semana, na terça-feira, 25 de maio. Nada mais justo. Se existe dia de quase tudo, o massagista também merece ter sua data.

Naturalmente, o Dia do Massagista não foi instituído somente pensando nos trabalhadores do esporte. A data homenageia profissionais de todas as searas que se dedicam, principalmente com as suas mãos (mas não apenas, destaque-se), a propiciar bem estar aos corpos sob os seus cuidados.

Coincidentemente (ou não, sei lá eu), tanto goleiros (o pessoal do dia 26 de abril) quanto massagistas (a turma do dia 25 de maio) usam para a sua prática profissional, preponderantemente, as mãos. Os primeiros, para amaciar as bolas adversárias. Os outros, para relaxar músculos exauridos.

Uma diferença que me ocorre aqui enquanto escrevo entre essas duas atividades é que um sujeito que se diz goleiro, mas que na realidade não pega coisa alguma, é delatado ao primeiro chute. Já massagista, muita gente sem formação acaba, às vezes por insistência, enganando os menos avisados.

Mas agora voltando essa conversa para o lado específico do futebol, eu quero aproveitar o ensejo para lembrar os nomes de dois massagistas que marcaram época no Acre, tornando aptas para o embate as pernas de diversos jogadores nas décadas de 1970 e 1980: Jacinto Silva e Nazaré Santos.

Jacinto Silva foi um dos maiores nomes da massagem esportiva na região Norte do país. Quase um mago da massagem, que conseguia recuperar atletas em tempo recorde. E Nazaré Santos, essa foi somente a primeira mulher a trabalhar num time de futebol masculino no Brasil. Apenas isso!

– Maio de 2021 –


Mandou bem

Francisco Dandão

Sábado, 24 de abril. O time acreano do Galvez estreou na Copa do Brasil Sub-20, em casa, com uma goleada sobre o paranaense Londrina: 5 a 1. Penso que nem nos prognósticos mais otimistas alguém teria cravado uma vitória por um placar tão elástico. Foi uma grande surpresa. Foi sim senhor!

Os paranaenses, fico aqui dialogando com as negras teclas do meu computador portátil, voltaram para o seu estado sem saber qual o caminhão que os atropelou. E os meninos do Galvez, na opinião de algumas criaturas mais apressadas e imediatistas, ganharam o status de grandes promessas.

De acordo com o noticiário dos dias seguintes à partida, empresários de outras paragens brasileiras cresceram os olhos e se danaram a ligar para gente do Acre querendo saber mais sobre as características dos jovens jogadores do Galvez. Vislumbraram, talvez, uma jazida a ser explorada.

Quarta-feira, 5 de maio. O Galvez entrou em campo para jogar a primeira partida das oitavas-de-final contra o Atlético-MG. Depois da pancada no lombo dos paranaenses, o sonho era despachar os mineiros. Normal, muito normal, esse sonho. Mas agora o buraco era mais embaixo.

E então, como o vento que venta cá, venta lá, e também como “nem todo dia é dia santo”, o Galvez tomou, em Belo Horizonte, um sacode de 5 a 0. De caçador, o Imperador virou caça. Foi abatido mal ensaiou alçar voo. E os projetos de craques passaram a ser vistos por alguns com olhos oblíquos.

Foram muitas as vozes que se ergueram para criticar a bola dos garotos e o trabalho do ótimo técnico Paulo Roberto. Como se tomados de uma súbita amnésia, um grande número de torcedores parece ter esquecido o triunfo sobre o Londrina. Para esses, não existe meio termo entre o céu e o inferno.

Domingo, 9 de maio. Quatro dias depois da goleada sofrida pelo Galvez, acreanos e mineiros fizeram o jogo da volta. A toalha, provavelmente, já havia sido atirada ao chão do ringue, mas o time acreano estava longe de “beijar a lona”: 2 a 2. Uma despedida pra lá de honrosa!

Independentemente, porém, do bom resultado contra o Londrina e da goleada sofrida para o Atlético-MG, e para além do conceito radical de céu num momento e inferno no outro, o que eu acho é que no Acre existe muito menino bom de bola sim. Bons e maus resultados são apenas circunstanciais.

E a propósito dessa minha afirmação aí do parágrafo anterior, cito alguns nomes que nascidos na terra dos seringais seguiram para o mundo. Casos de Adriano Louzada, Rei Artur, Gaúcho Lima, Weverton, Rodrigo Galo, Doka Madureira, Papelim, Careca, Neto Pessoa, Polaco… Muitos!

– Maio de 2021 –


Lado B

Francisco Dandão

Por esses dias eu estava matutando sobre o quanto a gente não sabe do que acontece nos bastidores do futebol, aquela parte submersa do iceberg, aquilo que antecede ou sucede o jogo propriamente dito, os detalhes que não costumam sair nos espaços dedicados pela mídia, as tais histórias ocultas.

Existem nessas referidas histórias ocultas fatos dos mais diferentes feitios: alguns engraçados, outros dramáticos, uns que ficam no meio termo etc. O certo é que praticamente apenas os personagens e as pessoas próximas destes é que ficam sabendo, sofrendo ou se deliciando, dependendo do caso.

Vou passar aqui pra vocês nessa crônica de hoje duas dessas histórias, uma jocosa e outra “deprê”. A primeira, tendo como personagem o ex-lateral Marquinhus Freitas, também conhecido como “Amarelo” ou “Amor”. A segunda, tendo como protagonista o preparador físico Selcimar Maciel.

A história do Marquinhus (“Freitas”, “Amarelo” ou “Amor”, como queiram chama-lo”) ocorreu numa Copa do Brasil, jogo da volta, aí nos primeiros anos da década de 1990, quando o Atlético Acreano viajou para Belo Horizonte, onde entraria em campo para enfrentar o Atlético Mineiro.

Viagem tranquila, voo em céu de brigadeiro, o Galo acreano chegou à capital do feijão tropeiro, do pão de queijo e da cachaça de alambique (entre outras iguarias) numa nice. Chegou e foi alojado num confortável hotel, um edifício tão alto que quase chegava a tocar as nuvens, em plena Savassi.

Ao time do Acre foi destinado o 25º andar. E aí falaram para o Marquinhus que ele deveria ir à recepção, no térreo, pegar o ticket do almoço. Ele foi, mas não precisava de ticket algum. Detalhe: o almoço era servido no 30º andar, o elevador pifou e o lateral teve que subir na pernada!

A história do Selcimar, preparador físico de competência reconhecida, faz parte da lista daquelas que ninguém quer viver. Foi a experiência de um drama. Melhor dizendo, de um calote. Uma confusão que foi parar na justiça e que o Selcimar acabou perdendo por negligência do advogado dele.

O Selcimar trabalhava no Fast de Itacoatiara (AM), não descuidava um minuto das suas tarefas e mantinha o elenco, como se diz na gíria do futebol, “na ponta dos cascos”. Depois de várias semanas de trabalho, porém, nenhum dinheiro caiu na sua conta. E até hoje o profissional não recebeu!

É isso, por hoje. Me dá muito prazer resgatar pedaços das memórias alheias. Principalmente quando se trata de fragmentos dessas memórias que não chegam ao conhecimento do público. Qualquer dia eu conto outras dessas histórias. Dizem que o homem é o único animal que ri (e chora)!

– Maio de 2021


Quilos de carne como pagamento

Francisco Dandão

No tempo do amadorismo do futebol acreano, período que se estendeu entre as décadas de 1920 e 1980, fazia-se de tudo para atrair os melhores jogadores para vestirem determinadas camisas. Os expedientes eram variados, desde dinheiro vivo, passando por empregos públicos, até mimos.

O valor dos “contratos” dependia de múltiplas negociações entre os cartolas e os atletas pretendidos. Tinha jogador, como o volante Mário Sales, que mais de uma vez ganhou sacos de dinheiro para trocar de clube. E tinha criatura, como o zagueiro Deca, que se contentava em ganhar uma bicicleta.

Como a maioria dos dirigentes dos chamados grandes clubes era influente na política e/ou na sociedade local, conseguir um emprego era até muito fácil. Foi assim que muitos jogadores do Atlético, que era dirigido pelo prefeito Adauto Frota, viraram funcionários da Ufac ou da Prefeitura.

A lista dessa turma que conseguiu uma boquinha como servidor público é enorme. Enquanto escrevo, vou me lembrando de mais de meia dúzia. Casos de Manoelzinho e Nirval (Ufac); Bené, Vanginho, Valdir e Neivo (Emurb); Euzébio, Rui Macaco e Mário Mota (Prefeitura)… Vários!

Havia quem não quisesse ser funcionário público, preferindo mesmo apenas ganhar uma grana do clube que o contratou. Quase todos esses, principalmente aqueles sem formação profissional, uma vez acabada a bola, se arrependeram amargamente. Ficaram mais ou menos à mercê da sorte.

Mas havia também a turma que não ganhava nem salário nem emprego, jogando só por prazer ou em troca de ajudas de custo, pequenos favores, gratificações esporádicas (dinheiro para o ônibus ou para a suposta compra de remédios etc.) e presentes pontuais, depois dos treinos de apronto.

A respeito da compra de remédios, aliás, reza a lenda que havia sujeito que todo fim de semana pedia uns trocados para aviar a mesma receita. De tão antigo, o papel da tal prescrição médica quase se desfazia nas mãos. Puro “migué”, com o dinheiro arrecadado sendo diluído nos botecos das esquinas.

Em meados da década de 1980, contou-me um dia desses o Amarildo Veras, a gratificação do elenco do Atlético era um quilo de carne, doado todas as sextas-feiras por um torcedor do clube que mexia com a criação de gado. A carne era embalada em sacos plásticos com o nome de cada jogador.

“Fora isso”, contou-me gargalhando o Amarildo, “o que eu ganhei com o futebol foi o aluguel de um pequeno quarto, nos meses em que joguei pelo Amapá, e dois braços quebrados quando joguei pelo Juventus”. Daí se concluir, agora dizendo eu, que a carne nunca foi fraca no futebol acreano!

– Maio de 2021 –


Baixinhos

Francisco Dandão

Segunda-feira passada, 26 de abril, comemorou-se aqui na terra brasilis o Dia do Goleiro. Vi que muita gente fez alusão à data publicando fotografias de jogadores da posição nas redes sociais. E o meu editor, Manoel Façanha, até resgatou uma crônica minha sobre o tema, escrita em 2010.

Uma coisa, porém, chamou a minha atenção: não lembro de ter visto nas publicações o motivo pelo qual a comemoração caiu justamente em 26 de abril. E então trato de preencher esta lacuna, dizendo que a data foi escolhida em homenagem ao goleiro Manga, cujo aniversário se dá neste dia.

Manga, nascido em Recife, em 1937, e cujo nome de batismo é Hailton Correa de Arruda, de acordo com a crítica especializada está entre os cinco maiores goleiros do futebol brasileiro, chegando a vestir a camisa da seleção, entre os anos de 1965 e 1967, participando inclusive da Copa da Inglaterra.

E além da seleção, o cidadão Hailton Manga defendeu clubes de três países, numa carreira longeva, que se estendeu entre os anos de 1955 e 1982. A saber: Brasil (Sport-PE, Botafogo-RJ, Internacional-RS, Operário-MS, Coritiba-PR e Grêmio-RS), Uruguai (Nacional) e Equador (Barcelona).

Mas esse preâmbulo todo falando sobre o Dia do Goleiro, bem como sobre a figura do “Manguinha”, como os parceiros dele o chamavam, foi só para fazer um aquecimento do assunto dessa crônica de hoje, que é justamente a lembrança de goleiros baixinhos da história do futebol acreano.

Como se sabe, a primeira característica que se exige de um candidato a goleiro é que ele tenha uma estatura avantajada. Uma exigência mais do que pertinente, levando em conta que um sujeito alto, teoricamente, pode alcançar as bolas chutadas na direção dos ângulos superiores das suas traves.

No futebol acreano, entretanto, teve uma série de ótimos goleiros baixinhos que, contrariando toda a lógica da posição, pareciam muralhas de tanto que fechavam o gol. Todos eles, pelo que eu me lembro, compensavam a suposta deficiência na estatura com um senso de colocação incomum.

Cito aqui cinco desses goleiros baixinhos que me vem à memória enquanto escrevo: Aníbal Tinoco (seleção acreana, Independência e Juventus), Espanhol (Rio Branco), Pituba (Andirá), Almiro (São Francisco e Amapá) e Ilzomar (Independência, Atlético, Rio Branco e Juventus).

Esses caras todos citados, que eu tive o prazer de ver jogar no palco do velho Stadium José de Melo, além do senso de colocação mencionado anteriormente, pareciam felinos, tanto que saltavam para evitar que a bola cruzasse a linha fatal das suas respectivas “balizas”. Minhas homenagens!

– Maio de 2021 –


Primeira dose

Francisco Dandão

Tomei a primeira dose da vacina. A picada da agulha não doeu nada. Nem parece que furou a pele do meu braço. Em princípio, fiquei até em dúvida se a moça havia aplicado mesmo a dose da Coronavac. Mas depois, vendo as imagens feitas pela esposa Maria, constatei que foi tudo certo sim.

Tenho consciência de que ainda não estou imune e que preciso continuar exercitando a prática do uso da máscara e da higienização das mãos. Afinal, o vírus é invisível e pode estar em qualquer lugar. Mas, é certo que a gente fica com uma sensação de mais tranquilidade depois da vacina.

Como não existe nada assim tão absoluto, tipo altura do céu ou profundeza da terra, e pra não dizer que eu não sou chegado a discursar sobre flores, por via das dúvidas, todos os dias ao acordar dou uma olhada pra trás pra ver se não estou desenvolvendo um rabo de jacaré. Só por cautela mesmo.

Até agora tudo certo. Quer dizer, nada de rabo ou couro de jacaré. Inclusive porque se fosse o caso de virar jacaré, surgiria outra complicação: onde conseguir moradia. No prédio no qual eu moro, não toleram animais selvagens. E mudar para o Pantanal, com aquelas queimadas, nem pensar.

Essa história de queimadas e devastação das áreas verdes do Brasil, aliás, se a gente pensar bem, acaba expondo o quanto o nosso país é ridículo. Os carinhas vão pra reunião dos líderes mundiais e afirmam que irão diminuir a emissão de poluentes ambientais, mas fazem tudo ao contrário.

Aí, com esse distanciamento entre a palavra e a prática cotidiana, eu não posso deixar de lembrar aquela frase que diz ser “tudo pra inglês ver”. Não sei a origem dessa frase. Não sei a origem e estou com preguiça de pesquisar. Mas sei que o sentido é o de que as palavras não traduzem os fatos.

Por essas coisas é que a credibilidade do Brasil anda mais por baixo do que barriga de “jacaré” (perdão, leitor, fui traído pelo subconsciente!) no cenário internacional. Se toda a vida fomos tidos como um país sem muita seriedade (vide o pensamento de Charles de Gaulle), agora então, danou-se.

Pra falar a verdade, se a gente for analisar a história dessa terra brasilis vai chegar à conclusão de que a mentira e a malandragem sempre estiveram caminhando de mãos dadas com o povo daqui. Qualquer desqualificado é candidato (e ganha) a qualquer cargo. Então, parece estar tudo bem normal.

A truculência e o desvio comportamental nunca estiveram tão em alta por aqui. Quando Pelé disse que brasileiro não sabia votar, quase tiraram o escalpo do negão. E eu vou ficando por aqui, esperando a segunda dose da vacina. Enquanto isso, o meu espaço acabou e eu não falei nada de futebol!

– Abril de 2021 –


Mentir, mentir, mentir…

Francisco Dandão

Abril é um mês cheio de datas comemorativas no Brasil. A começar pelo primeiro dia do período, quando se comemora a mentira. Eu acho muito estranho um dia dedicado à mentira. Mente-se tanto, todo dia, principalmente nos altos escalões da República, que o correto era ter um “dia da verdade”.

Se existisse um “dia da verdade”, a ideia é a de que ninguém poderia mentir durante 24 horas, sob pena de ir pra cadeia. Penso nisso e fico imaginando as quantas amizades que seriam desfeitas e o tanto de políticos que seriam desmascarados. O Brasil iria virar de cabeça para baixo. Kkk.

A mentira no Brasil, aliás, atingiu ares de instituição. E não poderia ser diferente. Está no DNA da nação, desde que se passou para a história a conversa de que os portugueses de Pedro Álvares Cabral foram os primeiros “civilizados” que chegaram às praias da Bahia, no dia 22 de abril de 1500.

Muita gente, tanto da Europa quanto da Ásia, já havia passado pela terra brasilis antes do senhor Cabral e sua troupe de fedidos grumetes e marinheiros. A questão é que ninguém viu vantagem em tomar posse de uma terra onde todo mundo andava nu e gostava de comer carne de semelhantes.

Os espanhóis, tão adeptos das navegações quanto os portugueses, estiveram antes por estas plagas. Não viram ouro brotando do solo e, como dizia a gíria antiga, “caparam o gato”. Já os chineses, que também andaram por aqui, entenderam que não tinha nada de bom para gastar a sua pólvora.

Só mesmo os portugueses, que não mediam esforços para expandir seus horizontes e que sempre se empenharam nas suas campanhas de globalização da gripe, da varíola e da tuberculose, além de adorarem a visão de umas indiazinhas adolescentes peladonas, é que não enjeitaram a parada.

Mas aí, já desde o documento primeiro, escrito ao rei Dom Manuel por um certo Pero Vaz de Caminha, o que se viu foi um amontoado de encobrimentos e mentiras. Os portugas chegaram, trataram de monopolizar os serviços postais com a fundação dos Correios, e se danaram a mentir.

Caminha (diminutivo de “cama”, daí a alusão ao “berço esplêndido” que consta no hino) foi tão parcial nas suas informações para Dom Manuel que sequer fez alusão a um jogo de bola praticado nas tardes das praias de Porto Seguro. As índias jogavam nuas e daí foi que surgiu o nome “pelada”.

É isso. A pelada surgiu nas praias do Brasil. Com a evolução dos costumes, a bola ficou meio esquecida no espaço das areias, as mulheres trataram de acrescentar um fio dental à sua nudez e os portugueses viraram proprietários de padarias. Enquanto isso, todo mundo mente cada vez mais!

– Abril de 2021


Jogaço!

Francisco Dandão

Que jogaço aquele de domingo, na decisão da Super Copa do Brasil de 2021, hein? Não tenho dúvida que foi um prazer para todos os amantes do futebol bem jogado ver os dois melhores times do país na atualidade em ação, olho no olho, e buscando sempre as linhas ousadas da verticalidade.

Muitos comentaristas (tanto de botequim quanto de abalizadas bancadas) previam antes do confronto que seria um jogo muito mais de estudo do que de efetiva procura pelo reduto final do inimigo. O raciocínio era o de que nenhum dos dois seria tão louco de partir pra cima do outro.

Mas tão logo a bola rolou, no estádio da capital federal (momentaneamente ocupada por famigerados inimigos da ciência – aqueles da terra plana e dos dedos em riste, simulando armas de fogo), o que se viu foi que os comentaristas da cautela se engaram nos seus prognósticos.

O que se testemunhou foi todo mundo tentando mostrar serviço. Muita técnica, de lado a lado, e os protagonistas querendo jogar o fino, cada um mais que o outro, demonstrando o seu caso de amor com a bola, brinquedo eterno de fantasia e sonho. Deusa viajando e desenhando parábolas no ar!

Aquele primeiro gol do Rafael Veiga, por exemplo, tocando na bola de calcanhar e saindo pelo outro lado do corpo do adversário Willian Arão, mais do que um lance foi uma verdadeira obra de arte. Um quadro que bem poderia figurar ao lado de mestres da pintura em qualquer museu do mundo.

Relembre-se que o jogador do Palmeiras estava de costas para o defensor do Flamengo e ao tocar na bola e sair rapidamente deixou este sem qualquer reação. Pensamento rápido, percepção do lance, noção perfeita do espaço e do tempo. Enfim, um lance que só os grandes craques sabem fazer.

Eu, sentadinho no sofá de um nono andar num ponto qualquer do (bairro) Mucuripe, na bela Fortaleza, com um copo de vinho tinto sobre a mesinha de centro da sala, ao ver o lance protagonizado pelo Veiga não pude deixar de lembrar dois antigos virtuoses do futebol acreano: Touca e Dadão.

Touca, que pontificou nos gramados do Acre na década de 1950, costumava me dizer que o craque é aquele que antevê o lance, que já sabe o que vai fazer antes da bola lhe chegar pés. Tal e qual fez o Veiga. E o Dadão, o melhor de todos na década de 1970, este eu mesmo vi fazer coisa igual.

É isso. Tomara que venham mais jogos desse nível no futuro imediato do futebol brasileiro. As nossas retinas cansadas das tolices dos políticos e os nossos braços inertes pelo distanciamento social precisam de um tanto de magia para aliviar a nossa dor. Hediondo é o pecado de negar a vida alheia!

– Abril de 2021 –


Marcelinho, o historiador

Francisco Dandão

Se tem um sujeito com um baú de histórias pitorescas sobre o futebol acreano, esse é o Marcelinho Melo, ex-jogador de Juventus, Independência, Atlético, Adesg e Andirá, entre os anos de 1990 e 2000. Não foi por acaso que o dito cujo se formou em História pela Universidade Federal do Acre.

E quando alguém lhe pergunta por isso ou aquilo, ele não se faz de rogado: manda o interlocutor prestar bem atenção que ele vai contar como tudo aconteceu. A memória prodigiosa dele guarda com a maior exatidão fatos, lugares e personagens. E tome detalhes sobre os bastidores do esporte.

Um dia desses, quando ele leu uma crônica que eu escrevi sobre jogadores do futebol acreano que tinham nomes de animais (Vaca, Curica, Mucuim, Gato, João “Cutia”, Pixilinga, Barata, Bodó, Edson “Carneiro”, Cairara, Catita etc.), ele me disse que eu esqueci um jogador chamado Burro.

Como eu não tenho autorização do Marcelinho para revelar o nome do referido atleta, vou me ater apenas em reproduzir, de forma bem resumida, a origem do apelido, cujo personagem, diga-se de passagem, absorveu bem a brincadeira e jamais apelou com os colegas que passaram a chama-lo assim.

O que aconteceu para originar o apelido, de acordo com o meu amigo “contador de histórias”, foi que a criatura apelidada, lá pelas tantas, quando cursava o segundo grau, foi fazer uma prova sem estudar uma só linha. E aí, depois que viu a folha da prova na sua frente constatou que não sabia nada.

Para não tirar zero, o tal personagem resolveu apelar para o famigerado expediente da “cola”. E aí tratou de “cutucar” o colega sentado à sua frente para lhe passar as respostas. Tanto “cutucou” o colega que este, num descuido do professor, lhe repassou a sua própria folha de prova.

Ao repassar a folha da prova respondida, o colega advertiu o “colão”, dizendo-lhe para não copiar as respostas literalmente. Tratava-se de uma prova subjetiva e cada um deveria responder com as próprias palavras. O “colão”, segundo o Marcelinho, assentiu, dizendo: – Beleza, deixa comigo.

Dias depois, porém, quando o professor devolveu as provas corrigidas, tanto o colão quanto o colega piedoso que passou a cola levaram zero, uma vez constatado que as respostas eram rigorosamente iguais. O “colão” havia copiado até o nome do colega no lugar onde deveria constar o nome dele.

Naturalmente, como é de se esperar numa situação dessas, a criatura que deu a cola cortou as relações com o colão, recusando-se a dirigir-lhe a palavra por muitos anos. Ao colão, sempre de acordo com as palavras do historiador/narrador Marcelinho, restou o apelido de “Burro”. Fecha o pano!

– Abril de 2021 –


Um cigano da bola

Francisco Dandão

Pelo menos um jogador acreano, em atividade, pode ostentar o epíteto de “cigano da bola”. Falo do atacante Eduardo Amâncio Alves Lopes, veloz, exímio driblador e, no mais das vezes, goleador, que no mês de março recém findo foi contratado para exibir sua bola cheia no sétimo estado brasileiro.

Eduardo, que foi um dos principais personagens na campanha de acesso do Atlético Acreano à Série C, no ano de 2017, e que estava no paulista Ituano, clube pelo qual disputou a mesma competição em 2020, assinou com o cearense Floresta e já participa dos treinos no novo clube.

Além do Acre, São Paulo e Ceará, Eduardo já mostrou o seu futebol nos estados do Pará (Clube do Remo e Paragominas), Paraná (Operário Ferroviário), Maranhão (Moto Clube) e Amazonas (Nacional). Onde aparece uma boa proposta, o Eduardo, sem medo de ser feliz, trata de ir lá conferir.

Lembrando, já que eu citei nas linhas anteriores os times dos vários estados por onde o artilheiro passou, que Eduardo também defendeu as cores do RB Brasil, em São Paulo, e do Independência, Andirá, São Francisco (onde tudo começou, no ano de 2007) e Plácido de Castro, no Acre.

Levei um papo com ele no fim de semana passado, no formato de troca de mensagens em aplicativo da internet. E senti que ele está muito empolgado com o novo desafio de fazer o Floresta ascender de divisão no futebol brasileiro (o time vai disputar a Série C do Brasileirão 2021).

Aos 32 anos e garantindo que ainda vai ficar em campo muitas temporadas, Eduardo afirmou que já viveu grandes emoções no futebol. A maioria com relação a momentos de plena alegria, como os títulos, os gols e os acessos conquistados. Mas alguns momentos também de alguma tristeza.

Dos momentos de alegria ele citou o título estadual do Atlético de 2017, em cima do Rio Branco, com ele fazendo gol. E citou também o jogo do acesso do mesmo Atlético, da Série D para a C, igualmente em 2017. E no tocante à tristeza, ele citou a derrota por 2 a 1 para o Moto-MA, em 2016.

“A minha maior decepção no futebol foi perder a classificação para a Série C, em 2016, com o Atlético. Nós tínhamos empatado em 2 a 2 com o Moto, lá no Maranhão. Aí perdemos o jogo da volta, no Florestão, por 2 a 1. E o pior de tudo foi que eu ainda errei um pênalti”, lamentou o atacante.

Conforme foi dito lá no primeiro parágrafo, são sete estados até agora onde o Eduardo mostrou o seu talento. Mas, levando-se em conta que ele não tem prazo para pendurar as chuteiras, provavelmente o currículo dele ainda vai crescer. Que esse caso de amor com a bola seja infinito enquanto dure!

– Abril de 2021 –


Live

Francisco Dandão

Participei de uma live na noite de quinta-feira (25), a convite do professor Franselmo George, um amapaense que tem se dedicado a pesquisar e divulgar as histórias do Copão da Amazônia, torneio que reunia times dos estados do Amapá, Rondônia, Acre e Roraima, no período de 1975 a 1990.

Como era um torneio de times amadores, o advento do profissionalismo no Acre, em 1989, fez com que o estado se ausentasse da competição antes do seu fim ser decretado. O Acre levou cinco títulos: três com o Rio Branco (1976, 1979 e 1984) e dois com o Juventus (1981 e 1982).

O estado que mais venceu o Copão da Amazônia foi o Amapá: sete vezes. O Macapá venceu em 1975, o Trem venceu em 1985, 1986, 1987, 1988 e 1990, e o Independente ganhou em 1989. Rondônia venceu três vezes (1977, 1978 e 1980). E Roraima venceu uma vez, em 1983, com o Baré.

Mas tudo isso está registrado na página que o Franselmo mantém na internet. É só digitar Copão da Amazônia no santo Google que aparecem as informações. Então, melhor do que falar mais sobre isso é dizer que na live de quinta-feira a figura central foi o ex-lateral e atual técnico Paulo Roberto.

O Paulo Roberto, que atuava pelo lado direito do campo, ganhou duas edições do Copão da Amazônia: a de 1979, vestindo a camisa do Rio Branco, e a de 1981, defendendo as cores do Juventus. E o primeiro desses títulos foi logo no primeiro ano dele como titular. Um feito, sem dúvida, excepcional.

Ressalte-se, para quem não conhece o referido personagem, que uma poliomielite, na infância, provocou uma atrofia no braço esquerdo dele. Por conta disso, não eram poucos os olhares de desconfiança a respeito da sua capacidade. Quando a bola rolava, porém, o que se via era um senhor craque.

Quem primeiro enxergou o potencial do Paulo Roberto foi o saudoso técnico Antônio Leó. Encarregado de fazer uma reformulação no elenco do Rio Branco, que havia perdido o título estadual de 1978 para o Juventus, Antônio Leó garantiu que na lateral-direita a solução estava em casa mesmo.

Leó estava coberto de razão. Tanto que o Estrelão venceu tudo o que disputou no ano de 1979, com um elenco cujos titulares eram: Illimani; Paulo Roberto, Chicão, Cleiber e Tião; Mário Sales, Mário Vieira e Adalberto; Eli, Nino e Irineu. A região amazônica se rendeu à bola redondinha desses caras.

Depois que pendurou as chuteiras (seus últimos chutes foram dados em 1988, pelo Juventus), Paulo Roberto virou técnico de futebol, começando nas divisões de base do Rio Branco. Alçado ao time profissional, continua até hoje na estrada, agora no Galvez. Um sujeito vencedor, com toda certeza!

– Março de 2021


Vacinação tardia

Francisco Dandão

No começo dessa semana, meu amigo Zacarias Fernandes, maestro acreano há muitos anos radicado em Manaus, enviou para mim, por mensagem de WhatsApp, uma fotografia dele tomando a primeira dose da vacina contra o vírus maldito. Um sorriso enorme adornava a face do Zaca.

Como o Zacarias recém chegou aos 60 anos, fiz um gracejo perguntando-lhe se ele havia furado a fila da vacinação. Em princípio, não entendendo que eu estava de gozação, ele tratou de explicar, tintim por tintim, dizendo que a imunização anda célere em terras amazonenses.

Verdade. Depois da crise de falta de oxigênio que se abateu sobre o Amazonas, as autoridades públicas se apressaram a vacinar a população. O resultado disso é que, diferente de todas as outras unidades da federação, por aquelas bandas já são vacinadas pessoas na casa dos 50 e poucos anos.

E a consequência direta dessa tomada de providências é que os números já demonstram uma queda significativa da quantidade de pessoas infectadas, tanto na capital quanto no interior do estado referido. É claro que ainda falta muito por ser feito por lá, mas o caminho está sendo percorrido.

Desde sempre, por uma só voz, os infectologistas do mundo inteiro garantiram que a única forma de vencer a pandemia era a vacinação em massa. E o modo de diminuir a transmissão do vírus, enquanto a vacina não chega, é o uso de máscaras, a higienização das mãos e o isolamento social.

Fico pensando nisso e imaginando quantas mortes poderiam ter sido evitadas no Brasil se os negacionistas da Republica tivessem admitido há um ano que a ciência estava com a razão, ao invés de resistir em comprar vacinas, insistir em não usar máscaras e teimar em promover aglomerações.

A propósito, agora falando especificamente de futebol, li no jornal O Estado de São Paulo, edição de quinta-feira (dia 25) que os profissionais desse esporte que atuam no Oriente Médio (Catar, Arábia Saudita, Israel, Bahrein e Emirados Árabes Unidos) já começaram a tomar as suas vacinas.

Nesses países, como preconiza a Organização Mundial da Saúde, a imunização começou também pelos grupos prioritários. A vacinação, portanto, de profissionais de futebol, significa que o processo por lá está caminhando a passos acelerados. Em breve, todos deverão estar vacinados.

Enquanto isso, no nosso glorioso país tropical, bonito por natureza etc. e tal, a discussão, no que refere ao futebol, é se as competições param ou continuam. É de lascar. Não dá para seguir caminhando e cantando. Inclusive porque, como dizia Vandré, “quem sabe faz a hora, não espera acontecer.”

– Março de 2021 –


Escapulário, o bailarino

Francisco Dandão

Um dia desses escrevi sobre o aniversário de três craques do futebol acreano do passado, neste mês de março, citando o ex-volante Tadeu Belém (dia 8), o ex-meia José Augusto Passada Larga (dia 11) e o ex-atacante Elísio (dia 27). Um trio que jogou o fino da bola no vetusto estádio José de Melo.

Aí, então, por conta do tal texto, recebi um recado do amigo Paulo Edson dando conta de que o seu saudoso pai, caso ainda estivesse entre nós, também faria aniversário no mês de março. O pai do Paulo Edson era ninguém menos do que o Escapulário, lendário cracaço do Independência.

Escapulário, cujo nome próprio era José Maria Pinheiro dos Santos, nasceu em Belterra, interior do Pará, no dia 3 de março de 1945. O apelido que o tornaria famoso no mundo da bola ele ganhou nos tempos de ginasiano, pela mania de andar com um amuleto religioso pendurado no pescoço.

Mas os bancos escolares não poderiam segurar Escapulário por muito tempo. Ainda adolescente, jogando um futebol de gente grande, ele ingressou no time do São Raimundo de Santarém-PA, onde permaneceu entre os anos de 1960 e 1964, sagrando-se duas vezes campeão municipal.

Logo nas primeiras apresentações, ele já ganhou um complemento ao apelido principal: “bailarino”. Isso pelo fato de ser magrinho e ter que ensaiar danças na frente dos zagueiros adversários para fugir das sarrafadas. José Maria Pinheiro passou a ser conhecido como “Escapulário, o bailarino”.

Com o passar dos anos, o futebol do bailarino extrapolou as fronteiras paraenses e ele começou a migrar para outros estados. Primeiro para Rondônia, onde permaneceu por três temporadas (1965, 1966 e 1967), sempre em alto nível, defendendo as cores do Ferroviário e do Moto Clube.

Cumprida essa etapa, foi a vez dele chegar ao Acre, contratado pelo empresário Adalberto Aragão para jogar no Independência. Antes, porém, de estrear no Tricolor de Aço, ele foi emprestado ao Vasco da Gama, para a disputa de um torneio, sob o comando do técnico/presidente Almada Brito.

Depois disso, Escapulário virou uma lenda com a camisa tricolor, citado pelos torcedores da década de 1970 como titularíssimo em qualquer formação do Independência. Ele jogou no time do Marinho Monte de 1968 a 1976, sagrando-se campeão estadual em três ocasiões: 1970, 1972 e 1973.

Penduradas as chuteiras, o bailarino foi ficando no Acre, onde virou funcionário público, encontrou o amor da sua vida e constituiu uma família. Pendurou as chuteiras, mas não largou as animadas peladas semanais. Um gênio que saltou para o abismo da metafísica no dia 2 de janeiro de 2011.

– Março de 2021 –


A cara de cada bicho

Francisco Dandão

Os apelidos, diferentemente do que acontecia até há uns quantos anos atrás, estão em pleno desuso no futebol brasileiro. Numa época de primazia do que se denominou “politicamente correto”, o que mais se vê são jogadores sendo chamados por nomes compostos ou então por nome e sobrenome.

Me lembrei disso por conta de um atleta do Palmeiras que era chamado, quando integrava a base do clube, pelo apelido de Rafael Papagaio. Agora, já integrante do time principal, ele pediu para que o “Papagaio” fosse deixado de lado e que todo mundo passasse a chama-lo de Rafael Elias.

Coincidentemente (ou não), nessa onda de jogadores conhecidos pelo nome de bichos, na semana passada eu escrevi nas páginas do jornal Opinião, bem como nas telas do site namarcadacal.com.br, um texto de cunho memorialístico com um ex-zagueiro do futebol acreano denominado Gato.

E ainda coincidentemente (ou não), o próximo personagem ao qual eu vou dedicar algumas linhas se chama Vaca, residente em Epitaciolândia e que nos seus anos de futebolista profissional jogava em bom nível em todas as posições. Todas as posições mesmo, inclusive de goleiro, na necessidade.

Aí, como uma coisa puxa a outra, eu fui lembrando de jogadores do futebol brasileiro que ficaram conhecidos pelo apelido (ou sobrenome mesmo) de bichos. Casos, a título de exemplo, do ex-goleiro Aranha, dos atacantes Yuri Mamute e Alexandre Pato, e do meia Paulo Henrique Ganso.

Fui à internet para descobrir a origem dos apelidos. Descobri, então, que “Aranha” foi uma homenagem ao soviético Lev Yashin, chamado de “Aranha negra”. “Mamute” porque nasceu grandão. “Pato” por conta da cidade natal (Pato Branco). E “Ganso” porque não botavam fé na bola dele.

Depois desse exercício, fiquei imaginando um time do futebol acreano de todos os tempos com jogadores com apelidos (ou nomes) de animais. Acabei encontrando bem mais do que um time. Digamos que um time completo e alguns reservas. E até achei um bicho denominando um treinador.

Vejamos. Ratinho (Andirá); Vaca (Alto Acre), Gato (Náuas), João “Cutia” (Andirá) e Bodó (Floresta); Vicente “Barata” (São Francisco), Jorge “Jacaré” (Rio Branco) e Cairara (Rio Branco); Rui “Macaco” (Independência), Catita (São Francisco) e Danilo “Galo” (Vasco da Gama).

Como reservas (sem qualquer critério técnico) cheguei aos nomes de Mucuim (América de Xapuri), Jerico (Independência), Pintinho (Atlético), Pixilinga (Andirá), Curica (Atlético), João “Carneiro” (Juventus), Fernando “Bacurau” (Atlético)… Técnico: Olavo Pontes, o famoso Papagaio da Noite.

– Março de 2021 –


Incentivos

Francisco Dandão

Levando em conta que os dois candidatos a campeão brasileiro de 2020 não fazem um confronto direto na última rodada, volta à cena a questão dos incentivos extra-campo para, supostamente, fazer os jogadores dos adversários correrem um tanto mais. O tal do chamado “doping financeiro”.

Os dois times, como qualquer torcedor sabe, são o gaúcho Internacional e o carioca Flamengo. O Internacional, que está dois pontos atrás, pega o Corinthians, e só pode conquistar o título se vencer o seu confronto e ver o Flamengo perder (até o empate serve) para o São Paulo.

Como, teoricamente falando, tanto o Corinthians quanto o São Paulo nesse momento são inferiores ao Internacional e ao Flamengo, surge a oportunidade propícia para vir à tona aquilo que se chama no mundo do futebol de “mala branca”. Aquela vitamina básica para fortalecer as pernas!

Especificamente falando-se no caso em tela, os noticiários esportivos recentes dizem que esse incentivo já surgiu. E teria vindo de um empresário do Mato Grosso. Torcedor fanático do Internacional, o referido empresário teria prometido dar uma grana para o São Paulo atrapalhar o Flamengo.

Esse empresário, aliás, ganhou as manchetes na semana passada quando pagou um milhão de reais para garantir a escalação do lateral Rodinei, do Inter, contra o Flamengo. É que por ser jogador do Fla, emprestado ao Inter, Rodinei só poderia jogar pagando esse valor de multa.

O tiro saiu pela culatra, levando-se em conta que o emprestado Rodinei acabou sendo expulso de campo, no comecinho do segundo tempo, e o Flamengo ganhou o jogo. Provavelmente tenha sido o dinheiro mais mal empregado da história recente do futebol brasileiro. Um milhão jogado fora!

Independentemente, porém, do lixo para onde foi o dinheiro do empresário, que cada um faz o que bem entende com os seus ganhos, e não existe lei que proíba isso, o que se questiona é esse próximo passo: o incentivo (“mala branca”) para fazer o São Paulo dar o sangue contra o Fla.

Questiona-se, mas, é verdade, pouco se pode fazer para evitar que, de fato, o incentivo ocorra. Nessa situação, todas as bocas só estão comentando por causa da publicidade dada ao fato. Parece que o empresário gosta de aparecer. Se tudo fosse feito bem na surdina, dificilmente o mundo saberia.

O planeta futebol é assim mesmo: um pouco sob os holofotes e uma boa parte envolta na bruma. Mas aqui pra nós, baixinho e sem que ninguém ouça, eu acho que o empresário vai de novo jogar dinheiro fora. Se o São Paulo perdeu até para o lanterna Botafogo, terá forças para bater o líder?

– Fevereiro de 2021 –


Nada como antes será

Francisco Dandão

Diz-se por aí que a história só se repete em forma de farsa. Concordo. A história, tal como o rio onde não se mergulha duas vezes, é sempre outra. A história pode ter muitas semelhanças, mas não é exatamente a mesma. Inclusive porque os atores mudam. Isso tanto para o bem quanto para o mal.

Pelo princípio desse papo aranha de hoje, eu tenho certeza de que o leitor está pensando que o velhinho aqui está querendo morar na filosofia. Pode ser, pode não ser, quem haverá de saber? Nem o bardo inglês Shakespeare poderia dizer. A verdade pode se esconder no meio do caminho.

E então, indo direto ao ponto, o que eu queria dizer com tudo isso mesmo é que mal terminou uma Copa Libertadores da América e já tem outra aí sendo jogada. Praticamente não deu nem tempo o Palmeiras comemorar o título conquistado. Já tem novos combates pela frente do glorioso Verdão.

É a vida que não para. Assim como não param as ondas do mar. Vão e voltam continuamente. Dessa forma, não se passaram nem dois meses desde que acabou a referida competição e todos já tem que entrar em campo outra vez para as refregas de praxe. A esfinge devora os que não a decifram!

Como a história não se repete, cabe ao time do Allianz Parque escrever novos capítulos. Se as linhas serão tortuosas ou retas, isso só se vai saber lá na frente, no bico do funil. O que a gente sabe é que se depender do goleiro acreano Weverton, depois da final terá uma bandeira adornando o seu corpo.

A propósito, a moda de se enrolar com a bandeira do estado natal depois de uma conquista, lançada pelo Weverton, parece que fez escola. No recente título da Copa do Brasil, conquistado pelo mesmo Palmeiras, o atacante paraense Rony desfilou coberto pela bandeira do Pará. Puro tucupi!

Eu disse tucupi, mas poderia ter dito açaí, maniçoba, tacacá, farinha ou congêneres. Se juntar essa gastronomia toda com meia dúzia de saltenhas, “quêbe de arroz”, “quêbe de macaxeira”, “saltenha frita”, pirarucu seco, mandis com pirão etc. e tal, dá uma boa presença do Norte nesse banquete.

O goleiro acreano Weverton e o atacante paraense Rony são dois bons exemplos de que o futebol não tem fronteiras para o talento. Tem menino bom de bola em todos os cantos. A questão é que uns tem oportunidade (e a agarram com unhas e dentes) e outros se perdem pelos descaminhos da vida.

Enfim… A vida vem em ondas como o mar, segundo disseram Lulu Santos e Nelson Motta. E a farsa não é história. Flamengo e Palmeiras, que ganharam, respectivamente, as duas últimas edições da Copa Libertadores da América, são as melhores opções do Brasil para um novo dia nascer feliz!

– Março de 2021 –


Outros aniversários

Francisco Dandão

Escrevi na crônica passada sobre a proximidade do aniversário de 70 anos do ex-volante Tadeu, amazonense de Parintins que migrou para o Acre em 1973 para defender as cores do Rio Branco, jogando depois, até encerrar a carreira, já na década de 1980, pelo Atlético Acreano e pelo Independência.

E então, depois de contar resumidamente a história esportiva do Tadeu, cujo aniversário se dá nesta segunda-feira (8), lembrei de outros dois monstros sagrados do futebol acreano do passado que também completam anos em março: José Augusto “Passada Larga”, dia 11, e Elísio, dia 27.

Nascido no ano de 1940, o “Passada Larga”, cujo apelido sinaliza para o estilo clássico dele dentro de campo, era um meia cerebral que vestiu as camisas de quatro times do futebol do Acre, entre os anos de 1956 e 1971: Rio Branco, Vasco da Gama, Grêmio Atlético Sampaio (GAS) e Andirá.

Nesses seus anos de bola, o “Passada Larga” foi campeão acreano nada menos do que em seis oportunidades: cinco pelo Rio Branco (1956, 1957, 1960, 1961 e 1962) e uma pelo GAS (1967). E talvez pudesse ter conquistado outros títulos se não tivesse machucado o joelho lá pelas tantas.

Pra variar, ele ainda exerceu a profissão de treinador, dirigindo por alguns anos da década de 1970 o Internacional (o famoso Saci do Ipase), o Vasco da Gama (1976 e 1977) e o Atlético. Pelo Galo Azul, clube onde resolveu pendurar a prancheta, “Passada Larga” conquistou o título de 1991.

Já o Elísio, um ponteiro esquerdo de velocidade e habilidade incomuns, nascido no ano de 1949, não fossem as suas breves passagens pelo Independência (time juvenil, em 1964) e Rio Branco (time principal, em 1965), se poderia dizer que toda a carreira dele foi construída no Juventus.

E foi dele o primeiro gol da história do Juventus, na vitória de 8 a 0 sobre um time chamado Botafogo, em 1966. Um jogo inaugural no qual o Juventus formou com Zé Augusto; Carlos Mendes, Pedro Louro, Júlio D’Anzicourt e Estevão; Carreon e Romeu; Elísio, Airton, Touca e Ernani.

Um incidente de percurso fez com que Elísio e a bola se divorciassem muito cedo. Aos 23 anos, ele estourou o joelho direito, jogando as partidas finais do campeonato de estadual de 1972, contra o Independência. Mesmo assim, entrando no sacrifício, ele ainda conseguiu jogar até o final de 1973.

É isso, meus caros amigos. O futebol acreano do passado teria sido menos espetacular sem a presença desses três jogadores citados nesta crônica. Quem teve a felicidade de vê-los em campo sabe do que é que eu estou falando. Craques no verdadeiro sentido da palavra. Vida longa a todos!

– Março de 2021 –


Memória de uma excursão

Francisco Dandão

Um dia desses, ao entrevistar o advogado Edson Carneiro, atacante dos times acreanos Grêmio Atlético Sampaio (GAS), Rio Branco e Juventus, nas décadas de 1960 e 1970, ele lembrou de um golaço marcado pelo próprio com a camisa deste último clube, contra o então famoso Mixto de Cuiabá.

Aí, trocando uma ideia sobre o depoimento do ex-atacante com o meu editor Manoel Façanha, este tratou de mergulhar no seu riquíssimo acervo hemerográfico para saber mais sobre o fato. Como resultado do mergulho, o Façanha emergiu com os detalhes da campanha do Mixto em terras acreanas.

Corria o ano de 1972 e o Mixto viajou ao Acre com a missão de enfrentar os quatro grandes clubes locais: Atlético Acreano, Juventus, Rio Branco e Independência, nessa ordem. Jogos amistosos, levando em conta que o futebol do Mato Grosso já era profissional, e o acreano ainda amador.

Foram quatro jogos de lotação esgotada no estádio José de Melo. Uma excursão como aquela era oportunidade rara para os torcedores acreanos verem uma equipe de fora do estado. Em 1972, registre-se, sequer havia emissoras de televisão no espaço territorial do Acre. Então, todos aos jogos!

Havia no ar uma expectativa de que os times anfitriões poderiam fazer boas partidas contra o Mixto. Mas, ao mesmo tempo, havia uma certa desconfiança de que os visitantes levariam vantagem. Afinal de contas, era o confronto de jogadores profissionais contra amadores de um lugar distante.

Dentro de campo, porém, a expectativa negativa não se confirmou. E já no jogo de estreia, vitória do Atlético por 1 a 0, com gol do arisco e veloz atacante Rui Macaco. Segundo os recortes dos jornais da época, Rui Macaco driblou os dois zagueiros do Mixto antes de mandar a bola para as redes.

Poderia ter sido um descuido momentâneo do Mixto a primeira derrota em solo acreano. Mas, então, no segundo compromisso, sobreveio nova derrota dos cuiabanos. Juventus 2 a 1, de virada. Dizem que o árbitro Ribamar marcou um pênalti “Mandrake” para o Juventus, mas vá lá que seja.

Nos dois últimos jogos, o Mixto deu uma melhorada, empatando com o Rio Branco em 1 a 1 e vencendo, na despedida, o Independência por 2 a 0. O Tricolor de Aço tinha um timaço no ano de 1972, mas, ao que tudo indica, entrou em campo relaxado, pelas deficientes atuações anteriores do Mixto.

O detalhe que não consta no acervo que o Façanha me mostrou é que o Mixto foi alvo de tantas críticas na imprensa local que um dos seus atletas, antes de entrar no avião que os levaria de volta a Cuiabá, limpou os sapatos com um exemplar do jornal O Rio Branco. Time ruim e muito mal educado!

– Fevereiro de 2021 –


Edson Carneiro

Francisco Dandão

Advogado militante (com 40 anos de inscrição na OAB), com especialização em Processo Tributário Administrativo, ex-policial federal e funcionário público aposentado, atualmente residindo em João Pessoa (PB), o ex-atacante Edson Carneiro da Costa foi o meu entrevistado da semana.

Filho de uma das lendas do futebol seringueiro dos anos mais antigos do passado, no caso o lateral Pedro Sepetiba, Edson Carneiro jogou, entre os anos de 1966 e 1975, em três grandes equipes acreanas: o Grêmio Atlético Sampaio (GAS), o Rio Branco e o Juventus. Jogou e fez inúmeros gols!

O pai Pedro Sepetiba, aliás, foi tão importante para o futebol regional que virou até personagem do cronista Armando Nogueira, acreano de Xapuri, que migrou para o Rio de Janeiro em 1944 e se transformou, poucos anos depois, num dos maiores craques da literatura esportiva brasileira.

De acordo com Armando Nogueira, numa crônica publicada na primeira metade da década de 1950, “Sepetiba era o terror dos bolivianos, preto de raça que nunca fugia do jogo, fosse em Rio Branco ou em Cobija, em cujos campos costumava sangrar uma terrível realidade de fronteira.”

Mas voltando ao Edson, que esta crônica é sobre o filho e não o pai, dois detalhes da nossa conversa me chamaram a atenção: o vale tudo que perpassava as atitudes dos dirigentes dos times tradicionais de Rio Branco e a prática do doping que grassava no futebol acreano, na década de 1970.

Sobre o vale tudo, de acordo com o Edson, o mais recorrente era subornar as equipes de arbitragem. Literalmente, ele disse que “naquela época, pra mim, todos os juízes eram suspeitos contra o Juventus”. E até árbitros que vinham de fora apitar decisões, segundo ele, eram comprados.

No que diz respeito ao uso de doping, o ex-atacante disse que presenciou várias vezes jogadores fazendo uso de estimulantes químicos para correrem mais dentro do campo, sendo os medicamentos preferidos uma anfetamina chamada Desbutal e um injetável denominado Glucoenergan.

Esse tal Glucoenergan, cujo finalidade era, ao mesmo tempo, suprimir o apetite e garantir mais energia aos usuários, a propósito, causou estragos inimagináveis. Conta-se que os caras passavam a mesma seringa de braço em braço. E aí, anos depois, a grande maioria foi diagnosticada com hepatite.

Concluímos a conversa com o Edson me dizendo o quanto o futebol acreano já foi pródigo de craques. E aí ele citou uns tantos… “Pedrito, Tinoco, Bolinha, Mustafa, Mauro, Deca, Curica, Palheta, Flávio, Dadão, Boá, Carreon, Euzébio, Elísio, Bico-Bico, Nilson, João Carneiro… Muitos!

– Fevereiro de 2021 –


Rebaixamentos

Francisco Dandão

Todos os anos o roteiro (e o drama) se repete: quando os diversos campeonatos brasileiros se aproximam do final, alguns times ficam lutando desesperadamente para fugirem do rebaixamento às divisões anteriores. É a hora da espada da justiça cortar a cabeça daqueles mais incompetentes.

São muitos os fatores que convergem para que um time seja rebaixado, desde a desorganização no gerenciamento do clube, até a deficiência do elenco. O bom gerenciamento é primordial para que tudo corra bem durante o processo. A qualificação do elenco também. Fatores que não se dissociam.

Durante o percurso de descida, invariavelmente, vários técnicos são demitidos. Os técnicos servem como uma espécie de válvula de escape para a incompetência dos dirigentes. Como todo mundo que acompanha futebol sabe, é mais fácil demitir o treinador do que dispensar vários jogadores.

O rebaixamento, ressalte-se, tem se mostrado uma ferramenta pra lá de democrática, não poupando camisa ou tradição. O que vale (pelo menos nos últimos tempos) é o desempenho dentro dos gramados. No caso da Série A do Brasileirão, os candidatos dispõem de 38 rodadas para evitar o desastre.

Nesta edição de 2020, por exemplo, dois clubes de grande tradição já foram para o espaço: o Botafogo, que vergonhosamente caiu com quatro rodadas de antecedência; e o Coritiba, que caiu pouco depois dos botafoguenses. Dois campeões brasileiros procurando luz no fim do túnel.

A campanha do Botafogo foi ridícula. O antigo “glorioso de General Severiano”, cuja camisa já adornou os corpos de caras como Garrincha, Nilton Santos, Jairzinho, Gerson, Paulo César Caju, Quarentinha, Zagallo, Didi (cito de memória), só venceu quatro dos 36 jogos realizados até aqui.

Igualmente ridícula foi a campanha do Coritiba, que até o presente momento conseguiu perder 19 vezes. Distante, muito distante do desempenho do ano de 1985, quando se tornou campeão jogando num Maracanã lotado, numa final contra o Bangu, do bicheiro Castor de Andrade.

Mas o drama ainda não terminou. Restam duas vagas no rebaixamento para a Série B de 2021. Pelo menos outros cinco clubes tradicionais estão com a corda no pescoço. Casos do Goiás, do Vasco, do Bahia, do Fortaleza e do Sport Recife. Dois desses cinco times vão “sifu”, dançando miudinho.

Olhando-se por outra perspectiva (a do “copo meio cheio”), porém, pode-se dizer que a próxima Série B vai ser das mais animadas, uma vez que já estão garantidas as participações de quatro campeões brasileiros: Cruzeiro, Botafogo, Coritiba e Guarani… E assim continua o caminhar da humanidade!

– Fevereiro de 2021 –


Cairara, um vencedor

Francisco Dandão

Entrevistei no meio dessa semana, para produção de um daqueles perfis de ex-jogadores que vem sendo publicados, nos últimos tempos, no jornal Opinião e no site namarcadacal.com.br, o ex-volante Sérgio Roberto Pinto Veras, mais conhecido como Cairara. Um cara pra lá de vencedor!

Do início da sua aventura com a bola, no infantil do Recriança, em 1984, aos 11 anos, até pendurar as chuteiras, em 2003, recém chegado na casa dos 30 anos, defendendo as cores do Andirá, Cairara vestiu somente outras quatro camisas: Independência, Vasco da Gama, Rio Branco e Adesg.

Nesse período, ele foi campeão acreano de futebol profissional em três oportunidades: pelo Independência (seu time do coração), no ano de estreia, 1993; e pelo Rio Branco, duas vezes, em 1994 e 2000. E ele também bateu na trave várias vezes, conquistando uma porção de vice-campeonatos.

Uma rápida olhada tanto em fotografias antigas quanto em matérias arquivadas dos tempos de bola do Sérgio Cairara também pode constatar, para além dos títulos e vices que que ele conquistou, como o dito cujo era requisitado por um clube e por outro cada vez que acabava uma temporada.

Tudo isso que eu disse até aqui, porém, imagino que seja do conhecimento da maioria dos torcedores que costumavam lotar o estádio José de Melo nas noites de quarta-feira e tardes de domingo. O que poucos devem saber foi a batalha da vida que o Cairara travou fora das quatro linhas.

De acordo com as palavras do ex-volante, lá pelas tantas, aí pelo final da década de 1990, ainda enquanto jogador profissional, ele começou a beber e a consumir drogas. Um vício que se intensificou quando a mãe dele faleceu, em 2002. De repente, segundo me disse, o mundo virou de cabeça pra baixo.

Felizmente, depois de anos mergulhado nas trevas, quando perdeu até convivência com a própria família, Cairara encontrou no amigo José Roberto Araújo o apoio que precisava para se libertar do vício, passando seis meses internado numa casa de recuperação e ingressando numa igreja evangélica.

Atualmente, já faz seis anos que Cairara está totalmente “limpo”, batalhando pela vida em dois trabalhos dignos. Durante o dia, ele faz parte da equipe de uma empresa de serviços terceirizados. E na parte da noite, ele complementa a sua renda como motoboy de uma distribuidora de bebidas.

No meu entender, essa é uma dessas verdadeiras histórias de superação. Todo mundo sabe que é muito difícil submergir no mundo do vício e voltar para a luz. O Cairara conseguiu. É por isso que eu disse lá no final do primeiro parágrafo que o considero “um cara pra lá de vencedor”.

– Fevereiro de 2021 –


Jogo dos bichos

Francisco Dandão

Não deu para o Palmeiras. Na semifinal do Mundial de Clubes, o time brasileiro entregou o ouro para os mexicanos do Tigres. Um a zero. Aparentemente, levando-se em conta o placar, foi um jogo duro, resolvido nos detalhes. Mas na prática não foi bem assim. O Tigres merecia era mais.

Dentro de campo, o Tigres foi sempre melhor, conduzindo o jogo à sua maneira. Tanto que no primeiro tempo o Palmeiras só deu um chute certo ao gol dos caras. Uma pancada do Rony da entrada da área. Mas o goleiro argentino lá deles, meio goleiro, meio líbero, se esticou todo e fez a defesa.

E no segundo tempo, o Palmeiras atacou mais na base do abafa, sem um mínimo de organização. O ataque do Verdão perdeu quase todas para a defesa do Tigres. Ainda levou algum perigo quando entrou em campo o William Bigode. Mas nada que pudesse causar algum dano para os sujeitos.

É a primeira vez que um time mexicano chega à final do Mundial. E aí, provavelmente, muita gente deve estar se perguntando a essa hora os motivos de mais esse fracasso brasileiro, bem como do sucesso dos amigos de Emiliano Zapata. Eles aprenderam a jogar ou nós que desaprendemos?

Existem muitas teorias (talvez fosse melhor dizer “especulações”) para explicar um fato assim tão, digamos, desagradável. Teorias (ou especulações, como queiram) que começam pela culinária. A deles e a nossa. A que os mexicanos levaram na bagagem e que os brasileiros deixaram aqui.

De acordo com as minhas fontes, os mexicanos, cuja vaga para o Mundial foi conquistada bem antes do dia em que o Palmeiras soube que iria ao Catar, tiveram tempo para encher as malas de abacates, pimentas, frangos e batatas. E assim, não precisaram mudar os seus costumes alimentares.

Os brasileiros, por sua vez, que só souberam que viajariam para o deserto uma semana antes, não tiveram tempo para providenciar o feijão, o arroz e o ovo necessários para acompanhar a delegação. E aí tiveram que se contentar com muito charuto de folha de uva, quibe cru e coalhada. Só isso!

Outra teoria (essa quem me relatou foi o Rodrigo Torres) é a de que o Palmeiras começou a perder a parada no “jogo dos bichos”. De acordo com esse meu “parça”, um “porco não pode medir forças com um tigre. E se for um porco contra vários tigres, pior ainda”. Verdade. Faz o maior sentido!

Sei lá se foi, se não foi ou o que poderia ter sido. O que eu sei é que se não fosse o goleiro Weverton, a surra teria sido bem mais feia. E sei também que faz um tempo enorme que um time brasileiro não traz a taça do Mundial pra casa. Se não me engano, a última vez foi com o Corinthians, em 2012.

– Fevereiro de 2021 –


Duelo no deserto

Francisco Dandão

Palmeiras e Tigres, times respectivamente do Brasil e do México, entram em campo neste domingo pelas semifinais do Mundial de Clubes do nefasto ano de 2020 (sai pra lá, pandemia!), em Doha, capital do Catar, no gramado do estádio batizado pelo sugestivo nome de Cidade da Educação.

A partir das 15 horas de Brasília tem início o duelo que levará um dos dois times à final do torneio, provavelmente contra o alemão Bayern de Munique. Será a primeira partida do Palmeiras neste Mundial. O Tigres, por sua vez, já obteve um triunfo ao tirar do páreo o coreano Ulsan Hyundai.

Levando-se em conta o clima árido e extremamente quente da capital catariana, eu diria que esse jogo entre brasileiros e mexicanos se trata de um duelo no deserto. Mais ou menos como acontecia naqueles antigos filmes de faroeste que a gente assistia nas sessões de matinê dos anos de 1960 e 1970.

Se eu bem me lembro, nos filmes referidos, os mexicanos, que normalmente eram os bandidos da história, levavam sempre a pior. Vestidos com umas calças “boca de sino”, jaquetas apertadas e usando uns chapelões, invariavelmente eles eram feridos mortalmente, num final de tarde qualquer.

É verdade que os mocinhos que matavam os mexicanos nos filmes de faroeste jamais eram brasileiros. Esse papel sempre coube a algum cowboy norte-americano, inclusive quando os filmes eram produzidos pela indústria italiana (os famosos “faroeste spaghetti”, com Franco Nero e congêneres).

Mas é verdade também que num mundo globalizado não existe mais essa obrigação de o papel do mocinho ser destinado aos norte-americanos. Dependendo de quem escreve o roteiro, o papel de herói pode caber a qualquer um. E então, eventualmente, um brasileiro pode dar o tiro fatal.

Aliás, se a gente for seguir essa linha de raciocínio das balas, não custa nada lembrar que um dia desses, pra variar, um figurão dessa nossa república de bananas andou até ameaçando os norte-americanos com “pólvora”, caso em algum momento falhassem as gestões diplomáticas para dirimir dúvidas.

Vejam vocês o patético da ameaça: enquanto os norte-americanos estão trabalhando com a divisão do átomo, pelo menos desde a Segunda Guerra Mundial (há mais de 50 anos, portanto), aparece um debilóide falando em pólvora. E ainda tem quem diga ser o Brasil um país sério. Rsrs.

Fanfarronices, negacionismos e idiotices à parte, porém, e voltando ao start deste texto, o que eu quero dizer é que os brasileiros do Palmeiras vão ter que redobrar os cuidados para não se quedarem feridos de morte pelos mexicanos do Tigres, no crepúsculo deste domingo, no deserto do Catar!

– Fevereiro de 2021 –


Um acreano no mundial

Francisco Dandão

Quando o Palmeiras, recém campeão da Copa Libertadores da América, entrar em campo, no próximo domingo, lá do outro lado do planeta, em Doha, capital do Catar, o futebol acreano se sentirá de certa forma representado pelo goleiro Weverton, criado na periferia de Rio Branco.

Eu havia planejado estar lá nesse mundial, independentemente da participação de um time brasileiro. Planejei isso em meados do ano passado, entendendo que a pandemia já teria acabado, seis meses depois. Eu não contava, naturalmente, que o flagelo da circulação do vírus iria durar tanto.

Pelo meu raciocínio simplório, os negacionistas e genocidas, principalmente por conta do desejo deles de se perpetuarem no poder, iriam dar um passo atrás nas suas insanidades e começariam logo a levar o vírus a sério, coordenando ações que pudessem proteger eficazmente os brasileiros.

O tempo provou que eu estava enganado. E meses depois o vírus continua circulando com uma velocidade e uma letalidade absurdas. Nem que eu quisesse desafiar o perigo poderia estar no Catar a essa hora, levando em conta que os brasileiros estão proibidos de entrar naquele país peninsular.

Ainda bem que eu não cheguei a comprar as passagens para ir e voltar de Doha. Se tivesse comprado estaria às voltas agora com um problema maior, sem saber o que fazer para pegar o dinheiro de volta ou remarcar os bilhetes para algum lugar, em algum momento futuro, depois da pandemia.

Aliás, a propósito de planos de viagens futuras, agora volto o meu radar para os Jogos Olímpicos de Tóquio, marcados para o mês de julho. Já até estou arranhando algumas palavras em japonês. Coisinha pouca, como arigatô, sushi (com muito arroz) e sashimi (com muito salmão cru e pimenta).

Já estou arranhando algumas palavras, mas ainda não decidi quando vou adquirir os bilhetes e/ou reservar o hotel. Vou esperar chegar a minha vez de tomar a vacina. Pra mim, qualquer vacina serve. A que chegar primeiro, eu dou o braço pra furar. Não quero nem saber se posso virar jacaré.

Digo que qualquer vacina serve, mas, se eu pudesse escolher, iria preferir a dos russos. Segundo eu ouvi falar, é a vacina dos camaradas que oferece a proteção mais alta. O braço que eu esticaria, por razões óbvias, seria o esquerdo. Inclusive porque a cortina dos caras nem é mais de ferro.

Mas voltando ao fio da meada, acho que os acreanos, inclusive os corintianos, mesmo que não confessem abertamente, estarão todos torcendo pelo Weverton. Creio que não há acreano que não sinta uma ponta de orgulho quando o goleiro se cobre com a bandeira do Acre para comemorar vitórias!

– Fevereiro de 2021 –


Lapadas

Francisco Dandão

Durou menos de dez dias a participação dos três times acreanos na Copa Verde de 2021. Da estreia do Galvez, no dia 20 de janeiro, até essa quinta-feira que recém passou (28) foi questão de pouco mais de uma semana. E o pior é que todos foram despachados com humilhantes goleadas.

O Atlético foi o primeiro a sucumbir. O Galo do segundo distrito de Rio Branco, de tantas tradições, levou uma lapada tão feia (1 a 5 do Manaus) que, provavelmente, até agora não acertou sequer voltar pra casa. Uma lástima para um time que até dois anos atrás estava disputando a Série C.

Aliás, faz tempo que o Atlético não vence uma partida em torneios contra times de outros estados. Se eu não estou enganado, com essa recente pancada, somando-se compromissos pela Série D, Copa do Brasil e Copa Verde, completam-se 16 jogos sem uma vitoriazinha do clube azul e branco.

Pelas minhas anotações, a última vitória dos atleticanos aconteceu no dia 25 de agosto de 2019, contra o mato-grossense Luverdense: 3 a 2, no Florestão, na última rodada da Série C daquele ano. De lá pra cá, como se dizia antigamente nas melhores rodas de malandragem, “necas de pitibiriba”.

Depois foi a vez do Rio Branco: 1 a 3 do paraense Independente, em plena Arena Acreana (ex-da Floresta). O Estrelão, que não encontra o caminho das pedras desde aquela eliminação judicial da Série C, em 2011, paga o preço de decisões equivocadas de antigos dirigentes. Um preço alto!

Vai sobrevivendo aos trancos e barrancos o Rio Branco, meio que sendo obrigado a matar um leão por dia. São tantas as dívidas do Estrelão que montar um time competitivo, creio eu, se torna uma tarefa de extrema dificuldade. E aí o resultado é uma eliminação atrás da outra. Simples assim.

Nesse oceano de incertezas e tragédias, eu apostava as minhas fichas no Galvez para ir mais longe na Copa Verde. E o primeiro confronto até que me deu algumas esperanças, levando-se em conta que o Imperador eliminou o adversário inicial no terreiro deles: 4 a 3 no roraimense São Raimundo.

O meu editor Manoel Façanha ainda tentou conter a minha boa expectativa afirmando que o sistema defensivo do Galvez não passava muita confiança. Mas eu não acreditei, retruquei e disse para o dito cujo que mais importante do que os gols que a defesa toma são os gols que o ataque faz.

Aí veio o jogo contra o Paysandu, lá às margens do rio Guamá: 4 a 1 para os anfitriões. Ou seja: a defesa do Galvez continuou sua história recente de peneira furada, enquanto o ataque não conseguiu reeditar o feito de uma semana atrás, em Roraima. Os fatos dizem tudo e o Façanha tinha razão!

– Janeiro 2021 –


Três carnavais

Francisco Dandão

Eu não lembro muita coisa dos anos da minha infância. Acho que ninguém (ou quase) é capaz de reter na memória a maioria das coisas vivenciadas. O que eu lembro são flashes, fragmentos, imagens soltas e, a essa altura, já em plena terceira idade, só os fatos que mais me impactaram.

Algumas lembranças impactantes permanecem bem vivas à distância no túnel de um tempo que se afasta a cada instante, ainda que as situações à época parecessem insólitas (talvez por isso). Lembranças como os três carnavais que movimentaram, em 1962, as ruas de Brasileia, onde eu nasci.

Em março daquele ano, as artérias da pequena cidade do interior do Acre se encheram de foliões para os festejos de Momo. Eu tinha cinco anos e me causou muito estranhamento ver tanta gente bêbada, principalmente um bando de homens de lábios sujos de batom e vestidos com roupas de mulher.

Lá pelas tantas, acho que na tarde do último dia da festa, caiu um pé d’água daqueles de fazer até sapo se acorrentar em algum poste de concreto. Eu e a minha família tivemos que passar horas abrigados sob uma marquise da rua principal. Ainda assim me molhei todo e peguei uma gripe federal.

O pessoal do meu núcleo familiar foi quem me explicou que aquilo se chamava carnaval e que acontecia somente uma vez por ano. Mas aí, para minha surpresa, alguns meses depois, em junho, toda aquela explosão de alegria e loucura tomou conta novamente das ruas da cidade fronteiriça.

Outra vez as explicações vieram dos mais velhos. Tratava-se de um carnaval “fora de época” (a expressão só surgiu anos depois), por conta da conquista da Copa do Mundo pelo Brasil. Era a segunda vez que o país vencia a Copa, mas no torneio anterior eu nem havia completado dois anos.

Dois carnavais no mesmo ano parecia um limite total e absoluto para tanta festa em tão pouco tempo. Certamente eu não pensei nada disso, levando em conta a minha idade. Mas acho que esse deve ter sido o pensamento dos adultos. Se pensaram assim, entretanto, eles se enganaram.

Eis que em agosto, pra variar, que ninguém é de ferro, mais uma vez as ruas de Brasileia foram tomadas por uma galera “cheia do chá”, com muita cachaça Cocal e cerveja boliviana Paceña na cabeça. Motivo: o primeiro título de uma Copa Libertadores por um time brasileiro, o Santos de Pelé.

Pois foi isso o que aconteceu naquele ano de 1962, em Brasileia (e no resto do país, creio): três carnavais. São as minhas maiores lembranças (talvez as únicas) daquele ano. Se teve alagação naquele ano? Isso eu não lembro. Se teve pandemia? Não, não teve. Mas aí já são outras histórias.

– Janeiro 2021 –


Gols em profusão

Francisco Dandão

A essência do futebol é o gol. Fazer um gol é atingir a meta máxima do jogo. É a concretização do sucesso de uma estratégia previamente traçada. É o ápice de todo um esforço coletivo, tanto dentro quanto fora do campo.

Alguns gols saem meio sem querer, mas tudo bem. Esses também valem. Quando não existia o sistema de revisão eletrônica (VAR), caso o árbitro não visse, valia até gol de mão (vide Maradona contra os ingleses).

Por mim, nenhum jogo terminaria com o placar em branco. Zero a zero é a coisa mais chata. Dá a impressão que os jogadores não foram tão competentes ou os planos de jogo traçados não eram assim tão eficientes.

Aliás, nesse sentido da chatice do zero a zero, eu acho que a Fifa poderia pensar em criar uma regra no futuro determinando que toda partida deveria ter pelo menos dois gols, não importando o tempo que durasse.

Seria fácil adotar essa regra. Era só criar sucessivas prorrogações depois dos noventa minutos regulamentares. E para não exaurir os atletas, as equipes poderiam substituir todos os onze antes da primeira prorrogação.

Essas elucubrações me vem à cabeça por conta da profusão de gols que foram marcados no meio desta semana que recém passou, em jogos do Campeonato Brasileiro da Série A. Casos de Bragantino 4 x 1 Vasco, São Paulo 1 x 5 Internacional, Goiás 0 x 4 Ceará, Coritiba 3 x 3 Fluminense.

Uma goleada, mais ou menos como o primeiro beijo, a gente não esquece. Nem o time que perde, nem o que vence. As razões para a lembrança de uns e outras são diversas, é claro. Os que perdem choram e rangem os dentes, enquanto os vencedores se embriagam de felicidade. Mas o certo é que, por um motivo ou por outro, a goleada é eterna na memória.

Se a profusão de gols resulta de uma virada, aí então a vitória torna-se épica, levando os torcedores do clube vencedor a uma espécie de delírio.

Também no meio dessa semana que passou, uma dessas vitórias épicas foi protagonizada por um time acreano: o Galvez, que derrotou o São Raimundo, de Roraima, em plena Boa Vista, por 4 a 3, pela Copa Verde.

O São Raimundo ficou duas vezes à frente do placar. Abriu 2 a 0. O Galvez diminuiu. Depois os roraimenses ampliaram para 3 a 1 e acreditaram que a fatura estava liquidada. Não estava. Os acreanos cresceram e viraram.

Na verdade, tirando um pouco a brasa da sardinha dos acreanos, houve outras goleadas expressivas na primeira rodada da Copa Verde. A saber: Manaus-AM 5 x 0 Ji-Paraná-RO, Aparecidense-GO 7 x 0 Aquidauanense-MS, Brasiliense-DF 4 x 0 Vitória-ES e Sinop-MT 4 x 0 Águia Negra-MS.

Bendito é o fruto dos pés dos artilheiros!

– Janeiro de 2021 –


Verborragia da pelada

Francisco Dandão

Vira e mexe eu me pego lembrando fatos de um passado remoto.

Um dia desses, eu lembrei de dois professores de geografia do meu tempo de ginasiano (Alberto Oliveira e Jacó) que falavam da necessidade de se preservar o meio ambiente e da estupidez que era pensar uma Terra plana.

Agorinha, no momento em que sento para “cometer” esta crônica, o que me vem à memória são determinadas frases ditas numas peladas de fim de tarde, tradicionais à época no bairro da Capoeira, meu reduto de então.

Uma das frases se aplicava quando dois sujeitos estavam querendo se estranhar.

Formava-se uma roda, colocava-se os desafetos no meio, frente a frente, e alguém do grupo botava a mão entre os dois e dizia: “O mais macho cospe aqui.” O resultado era que os brigões acabavam cuspindo um no outro. E aí a porrada comia, até que alguém resolvia separar os duelistas.

Outra frase se dizia quando as luzes do dia iam se apagando e praticamente só se via o vulto da bola e dos peladeiros.

Nessa situação, um sujeito gritava: “Meia hora na macaca.” Isso significava que não haveria mais marcação de falta. Caso em que tinha gente que dava um jeito de jogar só plantado na defesa.

E havia aquela frase destinada a inibir os candidatos a peladeiros, de modo geral forasteiros que ainda não podiam ser considerados como membros do grupo de todos os finais de tarde.

Esses candidatos chegavam meio tímidos, pelas beiradas do campo, e ficavam olhando de modo meio suplicante para os dois caras do par ou ímpar, torcendo para serem escolhidos para integrar um dos times.

Aí, alguém veterano do grupo tratava de adverti-los, antes da escolha, com a seguinte frase: “É o seguinte, moçada: se quiserem jogar fiquem logo sabendo que aqui na nossa pelada do pescoço pra baixo tudo é só canela.”

Mas as frases que eu recordo como as mais emblemáticas, capazes de serem aplicadas a várias situações da vida, era as que sugeriam que um sujeito que estivesse jogando mal pedisse pra sair, usando certa desculpa.

As tais frases eram as seguintes: “Fulano, tu não tá jogando coisa alguma… Não ganha uma dividida, só mata de canela, não acerta um passe, não dá uma dentro, não faz porra nenhuma… Então, pede pra cagar e sai!”

A pelada da Capoeira tinha uma verborragia bem peculiar naquele tempo. Peculiar e cheia de sabedoria. Essas últimas frases, inclusive, eu acho que até hoje se aplicam à perfeição a alguns figurões da República. Ou não?

– Janeiro de 2021 –

O caso Gerson

Francisco Dandão

Representante de um estado onde predominam as pessoas de pele negra, gente descendente na sua maioria de africanos trazidos para o Brasil como escravos, o glorioso Esporte Clube Bahia acabou, involuntariamente, envolvido na mais recente acusação de racismo do futebol brasileiro.

Digo “involuntariamente” porque não se pode responsabilizar o clube pela suposta atitude de um dos seus jogadores. A direção do Bahia, aliás, dando provas de que não compactua com tal abjeção, agiu rápido e afastou o seu jogador (que nem sequer é brasileiro), até que se apurem os fatos.

O imbróglio começou na tarde de domingo no Maracanã, estádio onde inúmeros jogadores negros já fizeram delirar milhões de torcedores: Didi, Pelé, Garrincha, Domingos da Guia, Barbosa, Jairzinho, Paulo César Caju, Silva, Neymar, Ronaldinho Gaúcho… A relação poderia ir até o infinito.

De acordo com o depoimento do ofendido, o meio-campo Gerson, do Flamengo, lá pelas tantas o colombiano Ramirez, do Bahia, no calor de uma discussão, sapecou a seguinte frase recheada de preconceito: “Cala a boca, negro!” Gerson não se calou. Ao contrário: tratou foi de falar mais alto.

Levando-se em conta que já vivemos os últimos dias do mês de dezembro, provavelmente tenha sido a última confusão racista do futebol brasileiro neste ano de tanta dor. Provavelmente! Mas, com absoluta certeza, quando começar o novo ano, outros casos semelhantes tornarão a acontecer.

O racismo está arraigado na maioria dos países do mundo. E, no meu entender, a única maneira de fazer o ser humano compreender que a cor da pele não estabelece nenhuma diferença entre uns e outros é pela via da educação. E isso é impossível de acontecer assim de um dia para o outro.

No caso do futebol, eu acho que a solução rápida passa pelo caminho da punição: crime e castigo. Provado o delito, o criminoso pegaria um “gancho” de vários jogos e ainda ficaria condicionado a só jogar depois de pagar um valor ao ofendido. Os reincidentes seriam banidos do esporte.

Se a agressão racista partir da torcida, caso o agressor seja identificado, penso em algo parecido: cadeia por um tempo e indenização para o ofendido. Caso o agressor não seja reconhecido, que o time mandante passe meses com os portões fechados, jogando para arquibancadas vazias.

O que não pode acontecer é tudo continuar como sempre. Muito menos o sujeito se esconder atrás de uma confusão linguística e afirmar que falou outra coisa. Nesse caso do Gerson, o gringo disse que falou “jogue sério, irmão” e não “cala a boca, negro”. Seria cômico se não fosse trágico!

– Dezembro de 2020 –


Presentes de Natal

Francisco Dandão

Não tenho dúvida que a pandemia que ora prolifera no planetinha azul é um dos maiores flagelos que já assolaram a humanidade nos tempos modernos. Não há um único cantinho escondido da Terra que não esteja sofrendo as consequências do vírus maldito originado nas estepes asiáticas.

O número de pessoas que já foram vítimas fatais do tal corona se soma na casa dos milhões. E todos os dias se contabilizam novos óbitos. Dizem por aí que existem grupos de risco e que uns são mais vulneráveis do que outros. Na prática, porém, o vírus escroto não tem respeito por ninguém

Assim, por conta disso, creio que o maior presente de Natal que poderia ser entregue pelo bom velhinho para a espécie humana seria a imunização em massa dos terráqueos. Eu disse “imunização em massa”, queiram ou não os negacionistas e idiotas de todos os gêneros e ideologias.

Em alguns lugares, como por exemplo no Reino Unido, esse presente de Natal até já chegou. Mas levando-se em conta que o mal atinge todo mundo sem nenhuma distinção, não basta imunizar comunidades isoladas. Como eu disse antes, há que se distribuir vacinas para todos, indistintamente.

Nesse sentido da necessidade de se imunizar todo mundo e da resistência de alguns mentecaptos, penso que a Organização das Nações Unidas poderia até tomar a atitude de pegar o “magote” de falsos líderes e meter todos no xilindró (ou em hospícios) pelo hediondo crime de genocídio.

A imunização, repito, seria o maior presente de Natal para a humanidade. Mas, é claro, de forma menos generalizante, existem outros objetos de cobiça relacionados a pequenos grupos. No caso do futebol, então, cada torcida tem um desejo latente para o sucesso do seu respectivo time.

Como não posso falar de todos os desejos, me limito aqui aos presentes de Natal pelos quais estão sequiosas as torcidas dos nortistas Galvez-AC e Fast Club-AM: eliminar, respectivamente, os potiguares América e Globo, passar de fase na Série D e depois beliscar uma vaguinha na Série C de 2021.

Para chegar à Série C do próximo ano faltam ao Galvez e ao Fast “apenas” dois confrontos nesse letal sistema de mata-mata. Eliminar dois adversários significa subir um degrau na escada do futebol brasileiro. Lugar onde hoje só estão três clubes do Norte do país: Manaus, Remo e Paysandu.

Resumindo a ópera: para a humanidade, o melhor presente de Natal seria a imunização contra o vírus amaldiçoado. Para as torcidas de Galvez e Fast, um ótimo presente seria a eliminação do América e do Globo, num primeiro momento, e depois a ascensão para a Série C. Que assim possa ser!

– Dezembro de 2020 –


Oitavas

Francisco Dandão

O funil da Série D está cada vez mais apertado. Dos 64 clubes que disputaram a fase de grupos, restam apenas 16. Desde a etapa anterior, como diria um bom pescador, “cada enxadada é uma minhoca”. Ou então, como diriam os melhores filósofos de botequim, “escreveu não leu, o pau comeu”.

No caso da região Norte, foram 12 os times que iniciaram a disputa (três do Acre, um do Amazonas, um do Amapá, dois do Pará, dois de Rondônia, dois de Roraima e um do Tocantins). Desses todos, só sobrevivem dois times nas oitavas de final: o amazonense Fast e o acreano Galvez.

O Fast mandou muito bem na fase de grupos, vencendo sete dos seus 14 confrontos. O time do glorioso espaço territorial das mitológicas guerreiras amazonas (daí a origem do nome do estado) perdeu em somente duas oportunidades. E cinco foram os empates. Muito boa campanha sim.

Enquanto isso, no Galvez, cujo nome tomou emprestado do primeiro e único imperador das terras onde, posteriormente, fruto de muita bala e inúmeras gestões diplomáticas, veio a se formar o estado do Acre, também sete foi o número de vitórias, perdendo quatro e empatando outras três vezes.

No que diz respeito ao primeiro mata-mata, posso dizer que tanto um como o outro se comportaram de forma heroica. O Fast só definiu a sua classificação na cobrança de penalidades máximas, depois de dois empates. E o Galvez, melhor ainda, foi buscar o seu triunfo lá na terra dos inimigos.

Naturalmente, cada vez a coisa vai ficando mais complicada. O Fast só passa das oitavas se sobrepujar o norte-rio-grandense Globo, time que recentemente estava disputando a Série C. A seu favor apenas o fato de que a partida decisiva vai ser jogada em Manaus, na bela Arena da Amazônia.

No lado do Galvez a parada vai ser uma daquelas que a gente costuma chamar de “federal”. Sobrou para o time da Polícia Militar do Acre um confronto contra outro potiguar: o tradicional América, cujo currículo inclui até participações, em outras eras, na divisão de elite do futebol brasileiro.

Por mim, passam os dois (Fast e Galvez) para a fase seguinte. Mas quando digo isso o faço tão somente do ponto de vista do torcedor, sem nenhum fator palpável de análise. Somente mesmo pelo meu desejo de que a região Norte ganhe mais representação no quadro geral do futebol pátrio.

É isso, por hoje. No mais só pra dizer que a vacina está saindo. Quer dizer, a vacina já está correndo o mundo. Mas isso só em países onde a saúde das pessoas interessa aos governantes. Os negacionistas e incompetentes de toda a espécie ainda levarão algum tempo para começar a vacinar o seu povo!

– Dezembro de 2020 –


Amenu e Baroninho

Francisco Dandão

Teve um tempo, aí pelos meados da década de 1970, que o Andirá, glorioso Morcego do bairro Cadeia Velha, alinhava no seu ataque dois ponteiros que atendiam pelos nomes de Amenu (na direita) e Baroninho (na esquerda). Ambos velozes, agressivos e um tanto atrapalhados com a bola.

Com eles, não tinha esse negócio de voltar para ajudar na marcação, não senhor. O negócio tanto de um como de outro era se mandar para a linha de fundo, para executar os cruzamentos de praxe, ou tentar a jogada em diagonal, entrando por um eventual espaço entre os laterais e os zagueiros.

Pra falar a verdade, embora nenhum deles tivesse esses dotes todos para um dia chegar à alguma seleção estadual, até que não eram assim dos piores atacantes em atividade naqueles tempos românticos do futebol acreano. Tinha muita gente de categoria bem inferior a Baroninho e Amenu.

O que mais irritava os técnicos andiraenses que os dirigiram era a mania deles de querer jogar sozinhos. Os caras eram fominhas como poucos jogadores na história do futebol mundial. Não gostavam de passar a bola pra ninguém. Queriam resolver as paradas sozinhos, sem o auxílio dos parceiros.

Quando havia falta para o Andirá, fosse perto da própria grande área ou no ataque, os dois se apresentavam para bater. E ficavam discutindo por alguns minutos pra ver quem fazia. Na hora dos escanteios, era a mesma coisa. Um se mandava para a posição do outro, brigando para ver quem batia.

Eis que um dia, num jogo contra o Floresta, pintou um escanteio pelo lado direito do campo. Pela ordem natural das coisas, o Amenu deveria cobrar. O Baroninho, porém, cruzou o campo lateralmente e expulsou o Amenu de perto da bola, que saiu irritado. A cobrança seria de pé trocado.

As testemunhas na tarde chuvosa se prepararam para ver a bola sair em curva, de fora para dentro do gol do Floresta. Houve até quem apostasse que poderia pintar um daqueles chamados “gols olímpicos”. Tudo parecia certo, mas o Baroninho escorregou e acabou foi chutando o pau da bandeira.

Ante o fiasco do amigo, dizem que o Amenu desatou numa crise convulsiva de riso. Fato que irritou o Baroninho, a ponto de os dois quase irem às vias de fato. Discussão feia que só não terminou em pancadaria porque os companheiros de time trataram de apartar os dois contendores.

O pior de tudo foi que enquanto os jogadores do Andirá se preocupavam em acalmar os ânimos do Baroninho e do Amenu, o Floresta foi ao ataque e marcou um golzinho no goleiro Pituba. Aí, todo mundo queria bater nos dois que, providencialmente, nunca mais foram escalados juntos.

– Dezembro de 2020 –


Deu ruim

Francisco Dandão

De verdade mesmo, ficou ruim a situação do Rio Branco na Série D. Por perder o jogo da ida dentro de casa, o Estrelão agora vai ter que suar sangue para dobrar o Altos lá no Piauí e lograr o avanço para a próxima fase da competição. Nada impossível, mas com certeza deveras complicado.

Ao levar de 2 a 0, em plena Arena (“da Floresta” para uns e “Acreana” para outros), o Rio Branco foi o único time mandante a perder nessa primeira escaramuça do mata-mata. Houve vários empates (nove, pra ser exato), como foi o caso do outro acreano, o Galvez (0 a 0 com o River, também do Piauí).

No correr da semana, certamente, a comissão técnica do Rio Branco vai tratar de lamber as feridas e motivar os guerreiros para a próxima batalha. Talvez o moral e a autoestima sejam os fatores que mais necessitem ganhar o foco das palestras. Fazer ver que em futebol não se perde de véspera.

Diante de toda a dificuldade, fico imaginando algumas possibilidades de caminhos a serem trilhados, bem como de providências que a galera do time da estrela rubra deve tomar para virar essa parada. A começar por pegar um avião ainda hoje e chegar ao estado do Piauí bem antes do dia do jogo.

A chegada dias antes do jogo permitiria aos jogadores do Rio Branco se acostumarem com o calor infernal que faz naquela terra, onde um sol pra cada cabeça é capaz de fritar ovo no asfalto, desde os primeiros minutos da manhã. Sei, no Acre também faz muito calor. Mas o calor do Piauí é pior.

O meu outro conselho é para o pessoal do Rio Branco usar, pelo menos no primeiro tempo, a tática do carrapato. Essa tática consiste em grudar no adversário e não sair do corpo dele nem por um instante que seja. Seguir os caras até se, por acaso, algum deles tiver vontade de deslocar-se ao banheiro.

Aí, no segundo tempo, depois que eles tiverem irritados com a marcação “carrapato”, a ideia é mudar para a tática do “kamikaze”, atirando-se ao ataque com todos os onze jogadores. Se for o caso, tirar o goleiro e se mandar pra frente com onze atacantes. Sufocar os sujeitos lá na área deles.

Como complemento dessas providências, convém a delegação do Rio Branco viajar com um cozinheiro para preparar toda a comida a ser consumida. Não que Altos tenha alguma coisa a ver com Bragança, onde os jogadores do Estrelão pegaram uma infecção alimentar. Mas, sabe-se lá.

E, por último, a exemplo do que fez o Cruzeiro, no recente jogo contra o Brasil de Pelotas (4 a 1 para os mineiros), não custa nada o Rio Branco espalhar sal grosso nos quatro cantos do gramado do estádio lá deles. Se deu certo pra o Cruzeiro, porque não ajudaria o Rio Branco? Hein? Por quê?

– Dezembro de 2020 –


Sobreviventes

Francisco Dandão

Dos 64 times que disputaram a fase de grupos da Série D do Campeonato Brasileiro deste ano, restam a metade. Exatamente 32 sobreviventes continuam no game, com chances de ascenderem à Série C de 2021. Mas as batalhas agora se configuram mais perigosas. Letais mesmo!

As tolerâncias para os erros, nessa ponto da competição, são quase zero. Se o time que faz o primeiro jogo em casa não conseguir alguma vantagem, por mínima que seja, vai para o jogo da volta praticamente morto. Nesse sentido, pode-se dizer que no jogo da ida todo cuidado ainda é pouco.

No que diz respeito aos times acreanos, ambos decidem a sorte fora de casa. Galvez e Rio Branco se classificaram para a fase mata-mata em terceiro e quarto lugares, respectivamente, no Grupo 1. Essa classificação os colocou em confronto com River e Altos, do glorioso e super quente estado do Piauí.

Do site “chance de gol”, especialista em estatística de futebol, obtenho a informação de que o Galvez tem mais probabilidade do que o rival River para ir às oitavas de final. O referido site dá para o Galvez 54,9% de chances de avançar. Para o River, de acordo com o site, as chances são de 45,1%.

As chances do Rio Branco, entretanto, sempre de acordo com as probabilidades estatísticas projetadas pelo site “chance de gol”, são bem mais modestas do que as do adversário Altos. O clube piauiense aparece na fita com 66,2% de chances, contra 33,8 de chances do time da estrela rubra.

Os prognósticos, é claro, são meros exercícios especulativos. Se baseiam em resultados passados. Retratam uma tendência, mas não tem o poder de prever o futuro com exatidão. Ainda mais em se tratando de futebol, onde qualquer coisa pode acontecer durante os noventa minutos de um jogo.

Se dependesse da minha torcida, todos os quatro times remanescentes do Grupo 1 (Bragantino, Fast, Galvez e Rio Branco) eliminariam os seus adversários (pela ordem, Juventude Samas-MA, Moto Club-MA, River-PI e Altos-PI). Nesse caso, a região Norte daria mais um passo rumo à Série C.

No meu entender, é preciso que os times da região Norte ganhem mais representação nos campeonatos brasileiros. Neste momento, são apenas três times (Remo, Paysandu e Manaus) deste lado ao país na Série C. E nenhum representante nas séries B e A. Esse mapa precisa ser melhor preenchido.

É isso. Como diriam os antigos romanos, no tempo em que o futuro podia ser lido nas vísceras de determinados pássaros, alea jacta est. A sorte está lançada para 32 concorrentes. Daqui a pouco serão apenas 16. Depois, somente oito. Até que restem quatro sobreviventes. Morituri te salutant!

– Dezembro de 2020 –


Neto, o artilheiro

Francisco Dandão

Faltando uma rodada para o fim da primeira fase do Campeonato Brasileiro da Série C deste ano, um acreano encabeça a lista de artilheiros da competição. Falo de Neto Pessoa, atacante nascido em Rio Branco, jogador do gaúcho Ypiranga e que até o presente momento já marcou nove gols.

Neto Pessoa, é verdade, não é o artilheiro isolado do torneio. Willian Lira, do Ferroviário-CE, também marcou nove gols. Mas enquanto o jogador do clube cearense só tem mais um jogo a cumprir, o time do atacante acreano, que hoje está em segundo lugar no seu grupo, tem boas chances de avançar.

Independentemente de qualquer coisa, porém, o que me interessa nessa conversa de hoje é relembrar a trajetória do Neto, que começou na base do Plácido de Castro, em 2012, aos 18 anos (ele nasceu no dia 16 de maio de 1994). E no ano seguinte já estava no elenco profissional do time placidiano.

Por um desses acasos do destino, eu fui uma das poucas testemunhas a ver os primeiros passos do Neto Pessoa na base do Plácido. E lembro que me chamou atenção o jeito como ele se portava em campo. Tanto que comentei com outra testemunha que ali estava um belo projeto de craque.

Naturalmente, que eu não sou profeta nem nada, muitos enxergaram a mesma coisa no futebol do jovem Neto. E logo o Plácido ficou pequeno, iniciando-se para ele uma intensa troca de camisas, em nível local, entre as quais as de Rio Branco, Andirá, Amax (time da cidade de Xapuri) e Atlético.

Fora do Acre, Neto teve uma primeira experiência em 2016, quando passou um período no Nacional de Muriaé-MG, que disputava o Módulo 2 do Campeonato Mineiro. Não se pode dizer que foi uma experiência tão satisfatória. Neto jogou pouco e acabou fazendo o caminho de volta pra casa.

Aí, como Deus costuma ajudar a quem se esforça, eis que o futebol do atacante emergiu com força na Série C de 2018, em defesa das cores do Atlético Acreano. O ataque do Galo, formado por Neto, Rafael Barros e Eduardo, fez misérias com as defesas adversárias. Três caras de ótimo nível!

Quando chegou 2019, Neto tratou de ganhar o mundo, jogando no primeiro semestre pelo potiguar ABC e na segunda metade do ano pelo pernambucano Náutico. Pode-se dizer que mandou bem em ambos os clubes. No Náutico, inclusive, ajudou a levantar o título do brasileirão da Série C.

Agora, no Ypiranga-RS, aos 26 anos, provavelmente Neto viva a sua melhor fase. Talvez até muito próximo de concretizar os sonhos que um dia, quando o entrevistei, ele me confessou: jogar num time de Série A e se transferir para um clube fora do país. Que assim seja, se assim tiver que ser!

– Dezembro de 2020 –


Francisco Dandão

Eu já disse uma boa dúzia de vezes em crônicas antigas que não sou dado a acreditar na ação de bruxas de nenhuma espécie, principalmente do tipo das que espalham maus fluidos pelo ar ou cascas de banana nas calçadas. Rainhas más, por esse olhar, só mesmo aquelas dos contos de fadas.

Mas eu também já disse na mesma proporção da dúzia de vezes que, por via das dúvidas, não deixo jamais de bater triplamente na madeira cada vez que alguém por perto se dana a vaticinar algum tipo de mau agouro. Bato na madeira e ensaio o sinal da cruz, além de fazer figa com as duas mãos.

Agorinha mesmo, quando estive no Rio de Janeiro na virada do ano, tratei de me vestir de branco dos pés à cabeça e pular as minhas sete ondinhas, bem na hora em que os barcos ao largo do mar de Copacabana começaram a mandar para o vento figuras multicoloridas e ensurdecedoras.

O Gilberto Gil mal acabou de afirmar a sua decisão de andar com fé, que ela não é coisa que costume falhar, lá no palco armado em frente ao Copacabana Palace, e eu já estava com o “pisante” na mão dando pinotes dentro d’água, ao lado de uma carioca com um fio dental pra lá de revelador.

Só festa! Se houve estampido de arma de fogo, eu não ouvi. Se houve gente ferida ou assaltada, eu não vi. Quer dizer, até ouvi e vi sim. Mas apenas no dia seguinte nas matérias dos jornais e nos noticiários da televisão. Eu, o celular e a carteira com alguns reais voltamos incólumes para o hotel.

No retorno pra casa, em Fortaleza, cidade que vive dias de terror, com todo tipo de barbaridade nas vias públicas, por conta da ação da bandidagem, tratei de sair do avião com o pé direito (a cueca, essa já estava pelo avesso desde muito cedo, quando eu me vesti para enfrentar as devidas conexões).

Imagino que são esses cuidados que tem feito com que eu me livre das armadilhas que espreitam em cada esquina nesse tempo de tanta bala perdida, ônibus incendiado, arrastão e outras ações assemelhadas. Um drible aqui, um golpe de vista ali… E segue-se o jogo que a vida é sempre pra valer…

Independente, porém, das minhas superstições ou convicções, o certo é que a bruxa parece estar mesmo solta nesse início de ano. Nunca vi tanta confusão. Um mago meu chegado disse-me que os planetas estão totalmente desalinhados. Tudo porque os chineses chegaram ao lado escuro da lua.

É isso, meus prezados leitores. Que venha o futebol nosso de cada dia, pra que a gente possa soltar o grito de gol e, se possível, dividir um tanto das notícias da barbárie com a alegria da vitória dos nossos times do coração. O Flu vai ser campeão do mundo. Eu li numa estrela. Ela só não disse quando!

– Janeiro de 2019 –


Francisco Dandão

O acreano Galvez é o melhor time da região Norte do país na Copa São Paulo de Futebol Junior de 2019. Os outros sete clubes oriundos da referida região (estados de Roraima, Rondônia, Pará, Tocantins, Amapá e Amazonas) foram mandados embora do torneio ainda na primeira fase.

Algumas equipes, como foram os casos do amazonense Holanda e do tocantinense Capital não somaram nem um pontinho chorado. Sequer conseguiram empatar. Foram três exibições e três pancadas no lombo. O Holanda marcou dois gols e sofreu 16. O Capital fez cinco e levou nove.

Outros times, como o amapaense Trem e o paraense Carajás, perderam duas vezes, mas pelo menos tiveram o prazer de atrapalhar a vida de algum adversário. Cada um destes empatou uma vezinha. O trem roubou um ponto do Votuporanguense (SP). E o Carajás (PA) empatou com o Taubaté (SP).

Melhor do que esses dois mandou o Real Ariquemes, que ainda chegou a vencer um adversário: o Bragantino. Um a zero, placar mínimo, mas que o livrou de ficar segurando a lanterna do Grupo 28. Os rondonienses não tinham mais chance de classificação, mas se despediram com honra.

E melhor do que todos os citados até aqui foi o glorioso Clube do Remo que perdeu uma, empatou outra e venceu a terceira. O Remo ficou em terceiro lugar. Fez os mesmos pontos que o segundo colocado, o paulista Desportivo Brasil. Só não avançou por conta dos famigerados critérios.

Mas, a essa altura dos fatos, o que importa mesmo é o Galvez, fazendo até aqui um campeonato de encher os olhos. Perdeu na estreia para o Palmeiras por 2 a 0 (nada mais natural, eu diria) e depois ignorou os outros dois adversários, o Capivariano (dono da casa) e o XV de Piracicaba.

Registre-se que é a segunda vez que o Imperador vai à Copinha. Em 2016, o time acreano perdeu uma (São Bernardo) e empatou duas (ABC-RN e Goiás-GO). Ficou em terceiro lugar no Grupo. Deixou de passar de fase pelo saldo de gols inferior ao do potiguar ABC. Mandou bem, muito bem!

Os times acreanos participam da Copinha desde 2004. Trata-se, portanto, da 16ª participação. E, se eu não estou enganado, é a segunda vez que um time do estado vai à segunda fase. O Rio Branco passou em 2017 e foi eliminado pelo Avaí. E agora o Galvez, que pega a Desportiva (ES).

É por aí, galera. O Galvez está fazendo história na Copinha. Tomara possa ir ainda mais longe. Mas, caso não vá, já mostrou que não viajou a São Paulo a passeio, só para fazer figuração. O Galvez é menino rebelde e veste-se de amarelo. Não pensa nem um momento em se vestir de azul! Afe!

– Janeiro de 2019 –


Francisco Dandão

Desde os tempos do amadorismo, de mil novecentos e lá vai bolinha até 1988, que o futebol acreano vê surgir bons jogadores em suas fileiras. Qualquer torcedor mais entrado nos anos (caso do velhinho aqui) lembra de inúmeros nomes que gastavam a bola no vetusto “Stadium” José de Melo.

A lista pode se estender por folhas e folhas de papel (ou, no caso “modernoso”, telas e telas de computador). Cito alguns que vou lembrando enquanto escrevo: Touca, Dadão, Bico-Bico, Zé Augusto, Curica, Nostradamus, Mariceudo, Chico Alab, Duda, Paulinho Rosas… Muitos!

No decorrer das suas carreiras, vários desses citados foram sondados para jogar em outros centros do futebol brasileiro e ganhar um troco que jamais ganhariam ficando no Acre. Alguns jamais aceitaram ir pra lugar algum. Outros até saíram, mas depois acabaram voltando para a terrinha.

Dois desses aí que não toparam gastar a sua bola em terras estranhas foram os atacantes Touca e Bico-Bico, não por acaso tio e sobrinho. O Touca recusou um convite do governador do Amazonas para jogar no Nacional, em 1957. E o Bico-Bico não topou jogar no Fortaleza, na década de 1970.

Ao goleiro Zé Augusto e ao meia Dadão lhes foi dada a oportunidade de jogar nos juvenis de dois dos maiores times do Brasil: Flamengo e Fluminense. O primeiro voltou quando se viu impedido de cursar faculdade. E o segundo não aceitou os valores oferecidos na hora de se profissionalizar.

O volante Nostradamus e o meia Mariceudo chegaram a jogar, respectivamente, no São Raimundo (1969) e no Nacional (1979), ambos da capital amazonense. Ficaram tão somente por uma temporada. Voltaram porque, costumam explicar, a saudade de casa calou fundo nos seus corações.

O xapuriense Curica, um cracaço da quarta-zaga, andou por Manaus, mas sempre foi mais boêmio do que boleiro. Igualzinho ao lateral Duda, sondado por todos os times que faziam amistosos no Acre. E o ponteiro-direito Paulinho Rosas foi ídolo por uma temporada no Equador (1987).

De 1989 pra cá, quando o futebol acreano se tornou profissional e os jogadores ganharam visibilidade, dada a disputa de competições nacionais, aí o êxodo se acelerou. E então, os caras começaram até a atravessar o Oceano Atlântico: Testinha, Adriano, Artur, Rodrigo Galo, Ancelmo…

Atualmente são tantos os jogadores formados no Acre que se mandaram para outras paragens que eu nem saberia dizer quantos andam por aí. Só do time do Atlético que chegou às quartas-de-final da série C do ano passado foi quase todo mundo embora. Quase todo mundo. É ruim, hein?

– Janeiro de 2019 –


Francisco Dandão

Tudo certo. O campeonato acreano de futebol profissional deste ano começa no próximo domingo, dia 20 de janeiro. Por coincidência (ou não), o dia dedicado a São Sebastião, mártir católico cuja representação iconográfica é um sujeito amarrado num poste flechado por todos os lados.

Não sei se isso vai importar alguma coisa quando a bola começar a rolar. Mas, como São Sebastião é padroeiro de Xapuri, isso pode significar que nesse campeonato prestes a começar, um time do interior pode se dar bem. Náuas, Humaitá e Plácido de Castro seriam, então, os melhor cotados.

O cruzeirense Náuas, a propósito, que nos últimos campeonatos tem apanhado mais do que couro de tamborim em época de carnaval, de acordo com notícias que uns pássaros me trouxeram por esses dias, vem recheado de jogadores do sul do país. Vem com disposição para ser protagonista.

No caso do Humaitá, ali das proximidades de Porto Acre, essa fórmula de importar uma galera de outras paragens já não se pode mais dizer que seja uma novidade. No ano passado já foi assim. E se o time não chegou às finais, pelo menos se comportou muito bem dentro das famosas quatro linhas.

E no Plácido de Castro, que se despediu da temporada anterior levando uma goleada do amapaense Santos, na Série D, a ordem é deixar as águas passadas (seja do rio Abunã, seja do igarapé Rapirrã) seguirem correndo rumo ao Oceano Atlântico, e captar ventos novos para futuras conquistas.

Mas como a tanga que São Sebastião vestia no dia da sua execução era vermelha, um campeonato que começa no dia do referido personagem pode indicar que um time que usar essa cor na camisa tem grande chance de ser feliz. Aí, meus caros, nesse caso, tudo leva a crer que deve dar Rio Branco.

Ou então, Independência, tricolor que de vez em quando também se veste de vermelho. Tudo bem que não é um vermelho assim daqueles vivos, tipo poente, mas uma variação dessa cor que pode ser tida como tal. O Tricolor do Marinho Monte já sabe: vai ser mais vermelho do que sempre.

Sei. Correndo por fora, nessa onda do 20 de janeiro, tem o São Francisco. Santos podem se entender. Podem muito bem estabelecer algum tipo de pacto: o que vence o campeonato fica incumbido de percorrer todas as igrejas do planeta tirando as flechas do corpo do outro. Um trato razoável!

Os outros concorrentes? Bem, eles também tem lá as suas marcas. O Andirá é morcego, gosta de sangue (vermelho). O Atlético usa números vermelhos na camisa. O Galvez tem um uniforme de predomínio vermelho. E o Vasco tem uma cruz vermelha no escudo. São Sebastião que se vire!

– Janeiro de 2019 –


Francisco Dandão

Não faz muito tempo, coisa de 20 ou 25 anos atrás (tempo pra frente só na ficção hollywoodiana), um jogador de futebol mal completava três décadas de vida e já se via ante a emergência de parar com a bola. A carreira se configurava curtíssima. Era parar ou ficar se arrastando em campo.

As figurinhas que passavam dos 35 anos, via de regra, era a daqueles de maior fama, mais por conta do nome que construíram do que, necessariamente, pelo que ainda produziam. Por se tornarem lendas vivas, esticavam um tantinho o currículo e ganhavam mais alguns trocados.

O próprio Pelé, o maior de todos os tempos, só ficou em atividade até aos 37 anos porque nas últimas três temporadas foi faturar uns “cobres” nos Estados Unidos. Em nível de alta competividade, o “rei” ficou mesmo até aos 34, no Santos. À América ele foi mais para dizer “love, love, love”.

Garrincha, o “gênio das pernas tortas”, que desmoralizou laterais dos quatro cantos do mundo, foi outro que muito cedo parou de jogar em alto nível. Basicamente aos 32 anos, enquanto vestiu a camisa do Botafogo. Depois andou por aí com várias camisas, mas só pelo nome que tinha.

Não existia uma preparação física adequada. Não existia uma perfeita compreensão da fisiologia dos atletas. Não existiam fármacos específicos para a cura das lesões. Não existia tecnologia. Não existia consciência das limitações do corpo por parte de alguns jogadores. Não existia quase nada.

Como tudo isso que não existia passou a existir, a carreira dos boleiros, tanto dos cracaços quanto dos cabeças de bagre, foi deveras “esticada”. E agora, não raro, a gente vê voando em campo, em plena capacidade produtiva, jogadores que passaram ou se aproximam dos 40 anos.

Zé Roberto, lateral/meia que fez carreira em clubes brasileiros e europeus, com boas passagens na chamada “amarelinha”, é um desses exemplos de longevidade. O cara jogou em alto nível até aos 43 anos. Passou 24 anos em atividade. E ainda poderia estar em campo se quisesse.

E fora ele, tem vários outros quarentões que permanecem em campo. Léo Moura, 40 (Grêmio); Magrão, 41 (Sport); Fernando Prass, 40 (Palmeiras); Magno Alves, 43 (Floresta-CE); Loco Abreu, 42 (Rio Branco-ES); Marcelinho Paraíba, 43 (Treze-PB); Juan, 40 em breve (Flamengo)…

Mas essa conversa toda de hoje me ocorreu por conta da informação de que o Andirá vai alinhar três jogadores “veteranos” no campeonato acreano que inicia neste domingo: Ley (37), Marcelo Brás (38) e Testinha (41). Todos ainda com muito gás. É sempre um prazer vê-los em ação!

– Janeiro de 2019 –


Francisco Dandão

De modo geral, eu costumo “alugar” o principal televisor (o da sala) aqui de casa nos finais de semana. Fico passando de um canal para o outro desvairadamente para tentar acompanhar o máximo de jogos de futebol possível. São muitos canais e inúmeros os jogos ao alcance dos olhos.

A rotina desse recente fim de semana, porém, mudou um pouco. Resolvi ir ver um jogo ao vivo do campeonato cearense. Estou com o meu neto Enzo passando férias aqui em casa e entendi de leva-lo ao estádio, para ele sentir o clima de uma partida de corpo presente, no calor da galera.

No campo de jogo, dois times considerados pequenos: o Atlético Cearense, que até o ano passado se chamava Uniclinic, e o Guarani de Juazeiro, representante da terra do “padim” padre Cícero, orador eloquente que fez carreira nos púlpitos do sertão e ganhou fama de santo milagreiro.

Dadas as campanhas de ambos, tudo apontava para uma vitória fácil do Atlético Cearense. Afinal, o time da capital havia vencido duas das três partidas jogadas até então. Enquanto isso, a equipe interiorana havia levado três pancadas em três compromissos, um deles, inclusive, de goleada.

Antes de se completar o primeiro minuto de jogo, entretanto, um volante de nome peculiar, Isaú, disparou com a bola nos pés desde a sua intermediária, passando por um, evitando outro e batendo da entrada da área no canto esquerdo do bom goleiro Artur. Um a zero, assim, bem de saída.

O primeiro milagre da tarde estava consumado. Nos três jogos anteriores, o Guarani de Juazeiro não havia marcado um mísero gol. Estava, portanto, há mais de 270 minutos sem mandar a bola para as redes. Nada garantia que o faria no quarto compromisso. Nada garantia, mas aconteceu.

Apesar daquela vantagem inesperada, um rápido olhar em volta indicava que nem os torcedores, nem os jogadores, do Atlético Cearense se abalaram com aquele gol relâmpago. O Guarani de Juazeiro era muito fraco para aguentar 89 minutos sem levar gols. Era só ir pra cima deles. Só isso!

E aí, meus caros amigos poetas e assemelhados, de todas as cores, credos ou gêneros, virou um jogo de ataque contra defesa. E veio uma sequência de milagres do goleiro. Os rostos foram ficando tensos. E pelo que se viu depois, nem que se jogassem 890 minutos o gol do Atlético sairia.

No fim das contas, para resumir a ópera, o Guarani de Juazeiro marcou o seu primeiro gol no campeonato cearense de 2019 e entregou a lanterna para outro candidato. Se eu sei o nome do goleiro do Guarani? Não, eu não sei. Mas suspeito que se chama Cícero! Padre Cícero! Deve ser ele sim!

– Janeiro de 2019 –


Francisco Dandão

O campeonato acreano de futebol profissional está em andamento. Oito das dez equipes já mostraram as suas caras. Em princípio, tudo parece estar mais ou menos nos conformes. Até aqui nada surpreendente aconteceu. Os favoritos venceram, os semelhantes empataram e a vida vai seguindo.

A essa altura, ainda que seja prematuro fazer qualquer prognóstico assim mais aprofundado, tipo quem vai ser campeão ou quem vai ser rebaixado, já é bastante possível dizer alguma coisa a respeito dos times que estrearam no início e no meio dessa semana que vai saltando para trás.

O Rio Branco, Estrelão pra lá de glorioso, por exemplo, que somente conseguiu bater o Náuas no momento que se convencionou chamar “apagar das luzes”, joga melhor, pelo que eu vi, quando está com nove homens em campo. Quando o time está completo, tem muita perna para pouca bola.

Pra falar a verdade, não foi só eu que tive essa impressão não. Tão logo o jogo foi encerrado, o empresário Ezequias “Açaí Sarado”, torcedor roxo do Estrelão, me mandou s seguinte mensagem de texto: “Professor, com nove é muito melhor. Sobra mais espaço para o Doka Madureira jogar”.

Já o Náuas, representante mais do que gabaritado do Vale do Juruá, que em campeonatos passados cansou de ser saco de pancada, aparentemente descobriu uma fórmula para fazer frente aos “grandes” da capital: pó de guaraná. Talvez, nesse primeiro jogo, só tenha errado na dose. Tão só.

Enquanto isso, o Atlético não quis nem saber se do outro lado do campo estava um time com nome de santo, ícone da Igreja católica. Sapecou a primeira goleada do campeonato. Meia dúzia de gols a zero. Demorou a fazer o primeiro. Mas depois de passar um boi, sempre atrás vem a boiada.

O São Francisco, aliás, que ninguém se engane, entre causar tristeza a alguém, por conta de uma eventual vitória das suas cores, prefere mesmo oferecer o lombo pra apanhar. São Francisco é santo e, assim sendo, não pode bater em ninguém. Tem que sofrer para ter direito ao reino dos céus.

O Humaitá e o Vasco fizeram um jogo meio lá, meio cá. Um a um. Ninguém ganhou, ninguém perdeu. Melhor levar um ponto pra casa do que voltar zerado. Seguro morreu de velho. Nem tanta chuva, nem tanto sol. Um pouco terra, um pouco mar. Melhor dizendo: “nem barro nem tijolo”

Sobre o Andirá e o Plácido, os times que não estrearam, agorinha eu ainda não posso dizer nada. Se o Andirá vencer, levando em conta o elenco cheio de “veteranos”, acho que a gente vai poder confirmar aquela tese de que “panela velha é que faz comida boa”. Eu simpatizo com essa tese. Rsrs.

– Janeiro de 2019 –


Francisco Dandão

Em fevereiro do ano passado, quando Neymar se machucou num jogo do campeonato francês, o mundo do futebol ganhou um protagonista pouco usual para as suas manchetes: o quinto metatarso. O osso do dedinho do pé passou a ter uma importância jamais vista na história da humanidade.

Os torcedores brasileiros, ante o diagnóstico dos médicos de que o seu craque maior deveria passar por uma cirurgia, se encheram de apreensão. Afinal, a Copa estava bem ali na esquina. Não havia garantia de que o gênio Neymar se recuperaria a tempo para jogar o Mundial da Rússia.

Aí o Neymar foi operado, botou um pino de aço no dedinho, se recuperou a tempo de jogar a Copa e, enfim, tudo terminou bem. Quer dizer, bem mesmo não terminou, uma vez que o Brasil acabou sendo eliminado pela Bélgica. Mas o que interessava era ver o Neymar inteiro.

A boa recuperação do atacante dava-nos a esperança de que ele nunca mais machucaria o dedinho do pé direito. Não era mais só osso naquela parte da anatomia do super craque. Agora era um pino de aço. Houve até quem tenha dito que o chute dele de trivela ficaria bem mais poderoso.

Eis que, porém (entretanto, contudo, todavia), menos de um ano depois Neymar voltou a quebrar o tal do quinto metatarso. Na primeira vez, Neymar se machucou sozinho, ao pisar em falso. Agora, o dedo foi para o espaço depois de uma entrada de um zagueiro do francês Strasbourg.

O mundo se quedou perplexo. Como assim? Não colocaram um pino de aço no dedinho do Neymar? E o pino de aço não é mais forte do que o original de osso? E não era para esse dedinho aguentar porrada? E tome interrogações, seguidas das complementares teorias conspiratórias.

Uma dessas teorias explica que o dedinho no Neymar quebrou de novo porque não houve o tal pino de aço na primeira cirurgia. De acordo com os defensores dessa tese, mesmo a cirurgia não tendo sido feita pelo Sistema Único de Saúde, o dedinho teria sido colado com Super Bonder.

Outra teoria dá conta que colocaram um pino sim no dedinho do Neymar, mas não feito de aço, como saiu na mídia. Por essa versão, o pino teria sido produzido em Barcelona. E aí já viu, né? Magoados com a ida de Neymar para a França, os catalães trataram de fazer um pino de vidro.

Por último, os teóricos da conspiração suspeitam que o pino foi produzido por algum país da América Latina. Nesse caso não existe consenso para determinar onde. Argentina e Paraguai são os mais citados. A Argentina por razões óbvias. E o Paraguai pela tradição de falsificar tudo. Será?

– Janeiro de 2019 –


Francisco Dandão

O futebol acreano chora a partida prematura do ex-jogador e desportista em tempo integral Hermano Filho. Ele foi, seguramente, o maior entusiasta desse esporte em Sena Madureira, sua cidade natal, promovendo inúmeros eventos em torno de uma bola para pessoas de todas as idades.

Muitos dos seus conterrâneos que viraram craques foram iniciados no futebol pelas suas mãos (Doka Madureira, que fez carreira na Europa, é o exemplo maior disso). Muitos se desviaram do mundo do crime pela iniciativa dele. E muitos simplesmente se divertiram pelas ações dele.

Eu não cheguei a ter uma convivência muito próxima com o Hermano, mas nas poucas vezes em que nos encontramos enxerguei nele um desses homens imprescindíveis, preocupadíssimo com o bem estar da comunidade da qual ele fazia parte. Por conta disso, até fiz questão de entrevista-lo.

Foi a partir da entrevista, basicamente sobre a carreira dele enquanto jogador de futebol, que eu fiquei sabendo que a primeira camisa vestida por ele foi a dos juvenis do Grêmio. Hermano estava com 15 anos e jogava de volante. Isso no ano de 1977. No ano seguinte ele jogaria pelo Comercial.

Depois disso, em 1979, ele passou a defender as cores do Fluminense. Aí já na condição de ponteiro-direito. Nessa nova posição ele permaneceria até o encerramento da carreira, em 1995, depois de defender as cores do Vasco, do Mixto, da Assincra e da seleção municipal. Dez anos na seleção!

Hermano viveu muitas histórias nos seus anos como jogador de futebol da sua eternamente querida Sena Madureira. Duas dessas histórias ele gostava de lembrar quando contava as suas memórias. Uma delas, sobre um jogo contra a seleção de Xapuri. A outra, a de uma tarde de artilharia.

A história do jogo entre as seleções de Sena Madureira e Xapuri aconteceu no estádio Góes e Castro, na Princesinha do Acre. Vitória de Sena por 3 a 0. “Nesse dia”, disse-me Hermano, “parecia que nós fomos tocados por um espírito divino. A bola rolava fácil. Fomos aplaudidos de pé”.

A outra história aconteceu num jogo entre Comercial e Assincra, pelo campeonato municipal de Sena Madureira. O Comercial, time pelo qual jogava Hermano, fez 5 a 1 na Assincra. Ele fez quatro dos cinco gols. Aí passaram a chama-lo de “Hermandite”, mistura de Hermano com Dinamite!

E tudo isso falando somente do futebol de campo. Hermano também foi um adepto do futebol de salão/futsal, esporte que praticou em nível competitivo até bem depois dos 40 anos. Enfim, como eu disse lá no primeiro parágrafo, o futebol acreano chora a sua partida. Requiescat in pace!

– Fevereiro de 2019 –


Francisco Dandão

Marcelo Altino, carioca dito sangue bom, está de volta à beira dos gramados, depois de um período de ausência. Aos 75 anos, ele vai encarar a duríssima missão de dar um gás no São Francisco, time que perdeu os três jogos que disputou na atual edição do campeonato acreano de futebol.

O São Francisco, clube do grupo dos “pequenos” desde que nasceu, dadas as suas inúmeras dificuldades estruturais e financeiras, via de regra entra nos campeonatos só mesmo para fazer figuração. Mas os seus admiradores sempre esperam que a equipe apronte pra cima de alguém.

Dessa forma, nada mais justo, depois de três sapatadas consecutivas, que se demita o treinador (isso é mais fácil e racional do que trocar o elenco inteiro) e se contrate outra criatura para o lugar do demitido. Trocar o treinador pode ser a pedra de toque para o advento de uma nova era.

E nada mais razoável também do que chamar alguém com fama de mago para tirar a equipe da zona obscura em que se encontra. Essa fama, aliás, acompanha o Marcelo Altino desde que ele passou pelo mesmo São Francisco, há doze anos, e levou o time da lanterna ao terceiro lugar.

Evidentemente, Marcelo Altino não ganhou esse epíteto de mago apenas pelo desempenho no São Francisco em 2007. Ele já operou outras magias ao longo da sua carreira. Afinal, foi sob o comando dele que o Rio Branco venceu a Copa Norte depois de bater o Remo em pleno Mangueirão.

E fora esses triunfos esportivos, os seus amigos mais chegados garantem que ele fez sim um curso intensivo sobre o universo imaterial, baseado na força do pensamento, numa época em que morou na cidade peruana de Puerto Maldonado. A professora teria sido uma velha cigana.

Provém desses referidos amigos a informação de que ele (o mago), quando morou em Plácido de Castro, treinando o time do mesmo nome, teria sido visto inúmeras vezes, em madrugadas de lua cheia, banhando-se nas águas barrentas do igarapé Rapirrã e falando com entidades invisíveis.

Se essas informações procedem, eu não sei dizer. O que eu sei é que o veterano treinador todas as vezes que me encontra faz umas previsões que acontecem direitinho. E sei também, como está fartamente documentado, que ele costuma obrar prodígios nas equipes que lhes são dadas para treinar.

O que se configura pitoresco é que um time dito católico chame justamente um mago para tirá-lo do buraco. Eu fico aqui pensando que talvez essa seja a prova definitiva do sincretismo religioso que permeia o coração do povo brasileiro. Um santo e um mago unidos em nome da mesma bola!

– Fevereiro de 2019 –


Francisco Dandão

As maiores peladas do meu tempo de menino foram aquelas sob chuvas torrenciais. Bastava uma nuvem mais pesada aparecer no horizonte e a minha turma de peladeiros já corria pra convocar o dono da bola. E quando ele estava gripado, que ficasse em casa e emprestasse o objeto do culto.

Muito mais do que fazer jogadas de efeito, dribles desmoralizantes ou tabelinhas com os parceiros habilidosos, o que valia era o chutão pra frente (ou para o lado em que o nariz estivesse apontando). Pelada na chuva não era para os cracaços. Os caneludos é que costumavam se sobressair.

Conduzir a bola grudada aos pés era quase impossível. Aqui e ali, as poças d’água faziam o papel de zagueiros, brecando o sujeito que teimava em carregar a bola por alguns metros do gramado. Na época, mesmo nos campos tidos como oficiais, não existia ainda esse negócio de drenagem.

Pelada com o campo seco não tinha a graça dos dias em que a grama ficava escorregadia. Até a lama, principalmente no lugar onde o goleiro exercia o seu ofício, dava um toque de “charme” aos peladeiros. Entrar naquele lugar sagrado era quase sinônimo de sair todo enlameado. Rsrs.

Quase todo mundo, a propósito, possuía um calção só para usar nos dias de chuva. Alguns desses calções, de tanta lama, postos nos varais para secar depois de muito mal lavados, jamais voltavam a ostentar a textura original do tecido. No uniforme dos peladeiros só cabia mesmo um calção.

Das peladas com o sol a pino, eu lembro poucos lances ou jogadas. Já das peladas dos dias de chuva, muitos detalhes permanecem bem vivos na minha memória, mais de quarenta anos depois dos fatos. Lembro até que foi numa pelada na chuva que um dia eu arrisquei o meu primeiro carrinho.

Esse tal carrinho aconteceu numa pelada depois da aula de educação física, num campinho que ficava atrás do Colégio dos Padres, na Av. Epaminondas Jácome, onde hoje está plantada a Galeria Meta. Ao meu primeiro carrinho seguiu-se uma confusão que fez acabar a brincadeira.

Não tinha jeito de a pelada continuar. Afinal, jogador de muito pouca técnica como sempre fui, em vez de acertar a “deusa branca” (naquele dia ela era marrom) o que eu acertei foram as canelas do adversário, um sujeito maior do que eu, chamado Zé Maria. O tempo fechou e a pelada acabou!

É isso, leitores: o tempo fechou, a pelada acabou e o espaço para a crônica seguiu o mesmo destino. Falei que falei e não disse quase nada. Esse texto lembrou os velhos dias das bolas encharcadas: só chutão, linhas tortas, muitas quedas, ideias retorcidas e o calção completamente sujo de lama!

– Fevereiro de 2019 –


Francisco Dandão

A notícia eu recebi pelas redes sociais. Os amigos Riba Sam e Francisco Saraiva, de forma quase simultânea, foi que me avisaram: o carioca Nirval, ponteiro esquerdo do Atlético Acreano por quase toda a década de 1970, havia apagado o sorriso e partido para a eternidade.

Nirval foi um dos quatro primeiros jogadores importados para as fileiras do Galo. Os outros três da leva inicial foram Carlão e Manoelzinho (zagueiros) e Bené (atacante). Quem os contratou foi o dirigente Fernando Diógenes. Corria o ano de 1972 e o Atlético queria pintar o céu de azul.

Nirval estava com 19 anos, treinando no Fluminense, depois de jogar nos juvenis do Volta Redonda e do Madureira. Era um garoto de futuro promissor. Mas vivia um grande impasse: o Madureira queria uma grana preta para liberá-lo ao Fluminense. Este, por sua vez, não queria pagar.

Para jogar num time amador do Acre, o Madureira não se importava. A ideia era a de que ele ficasse uma temporada, ganhasse experiência e voltasse para o time do subúrbio carioca. O destino, porém, tratou de elaborar outros planos para o Nirval. E assim, ele fixou raízes no Acre para sempre.

Engana-se, porém, quem pensa que Nirval ficou no Acre unicamente por causa do futebol. Embora ele fosse tido, em nível local, como um jogador acima da média, dois outros fatores foram decisivos para a permanência dele em solo acreano: um casamento e um emprego no serviço público federal.

Três anos depois de chegar ao Acre, Nirval estava casado e com um emprego para toda a vida. Ele dava expediente apenas em um período. Dessa forma, podia continuar jogando a sua bola. Somando os dois salários, ele ganhava bem mais do que ganharia se voltasse ao futebol profissional.

Tímido em excesso, Nirval nunca foi de conversar muito. De modo geral, só fazia sorrir quando um interlocutor lhe fazia alguma provocação, comparando-o com algum cabeça-de-bagre ou afirmando que teve lateral adversário que, lá pelas tantas, num jogo tal, dera um nó nas pernas dele.

Ele gostava, entretanto, de lembrar o dia em que os companheiros do Atlético forçaram o técnico Té a escalá-lo. Ele foi barrado pelo treinador numa decisão contra o Juventus, em 1977. O resto do time se recusou a entrar em campo. Nirval jogou e sofreu o pênalti que decretaria o empate final.

Nirval é mais um ex-craque do futebol acreano convocado para uma seleção celestial. Carlão e Bené, dois dos três parceiros que vieram com ele para o Acre, e Fernando Diógenes, que o tirou do Rio de Janeiro, também já viajaram para o além. Que as suas memórias permaneçam vivas entre nós!

– Fevereiro de 2019 –


Francisco Dandão

Acabou o sonho dos times acreanos passarem de fase na Copa do Brasil deste ano de 2019. O Galvez e o Rio Branco receberam, respectivamente, o ABC-RN e o Bahia, na Arena da Floresta, numa incomum rodada dupla. Um perdeu e o outro empatou. Ambos saíram.

Não vi os jogos. Fiquei só acompanhando as atualizações pela internet. Mas, pelos placares apertados, posso deduzir que os visitantes não encontraram nenhum mamão com açúcar pela frente. Em vez disso, quero crer que o osso foi bem mais duro do que eles poderiam ter previsto.

Principalmente o Bahia, time de série A, cheio de jogadores rodados e infinitamente melhor pagos do que os do elenco do Rio Branco, time de série D. No final das contas, o empate em 2 a 2 e os quinhentos paus que sobraram para o Estrelão acreano até que ficaram de um tamanho bem razoável.

O Bahia, aliás, foi o time que mais deslumbrou os meus olhos de menino, na segunda metade da década de 1960. Eu recém havia mudado de Brasiléia para Rio Branco e pela primeira vez fui ver um jogo no estádio José de Melo. Jogo não, melhor dizer uma exibição impecável de futebol.

Naquele tempo, era comum times de grandes centros futebolísticos excursionarem pelo Norte do país, para ganhar uns trocados, nos períodos em que não havia jogos oficiais. O calendário era bem mais flexível do que o praticado atualmente. E então sobrava tempo para se exibir por aí.

O detalhe relevante era que os times acreanos costumavam surpreender os visitantes. Nos times do Acre tinha muita gente boa de bola. Cair no “José de Melo” não significava a morte. Mas neguinho tinha que suar sangue para levar a vitória pra casa. Não foi, porém, o caso do Bahia.

Os baianos desfilaram em campo. Parecia que estavam num salão de danças. Ou num palco. Evoluíam pelo gramado como bailarinos. E não demonstraram preocupação em golear. Nunca vi um toque de bola igual. Eles ganharam aquele jogo por 2 a 1. Mas poderiam ter feito muito mais.

Os tempos agora são outros. Os tempos sempre são outros. Desde que Heráclito explicou que não se mergulha no mesmo rio duas vezes, a gente compreendeu que a história não se repete. Nem mesmo como farsa. E assim, nem o Bahia dá mais show, nem os times do Acre são presa tão fácil.

O sonho de seguir na Copa do Brasil acabou para os acreanos, mas a vida continua. A vida sempre continua. Galvez e Rio Branco tem muita coisa pela frente nos próximos meses. Se houve algum erro crasso nesses confrontos nacionais, dá tempo ainda corrigir. A série D está às portas!

– Fevereiro de 2019 –


Francisco Dandão

A dor da gente não sai no jornal. A dor da gente machuca o peito, revira as entranhas, esvazia o corpo por dentro, molha o rosto de lágrimas, mas não sai no jornal. O que sai no jornal é só a notícia fria da imensa dor da gente. O sentimento, entretanto, este nada é capaz de representá-lo.

Essa tragédia com os dez garotos da base do Flamengo, imolados enquanto dormiam numa terrível fogueira de insensatez, é o último exemplo disso. Gastam-se pilhas de papel, consomem-se telas de computador, usam-se minutos infindos na televisão e ainda assim a gente não mensura a dor.

Da mesma forma, a gente não é capaz de saber o tamanho do sonho dos meninos que pereceram. Dizer que todos eram talentosos e que almejavam se tornar profissionais de futebol e ganhar muito dinheiro é muito pouco. O sonho de cada um só eles é que sabiam. Só eles e mais ninguém.

Naturalmente, alguns deles jamais conseguiriam chegar ao topo do mundo da bola. Mas esse não é o problema. A questão maior é a de que eles não tiveram tempo de saber onde poderiam chegar. A fé, a alegria de jogar bola e o sonho de maravilhar plateias desapareceram entre labaredas.

O mundo se quedou comovido ante o fim coletivo dos garotos. Colhidos nas asas da morte enquanto dormiam, muitos sequer puderam esboçar uma reação. A rota de fuga apontava uma única porta de saída. Dormiam num contêiner. Ainda que acordassem, talvez não escapassem.

Jamais me ocorreu que um contêiner pudesse servir de dormitório. Que eu saiba, um contêiner serve para transportar carga em navios. No futebol brasileiro faz as vezes de abrigo e de armadilha cercada de espuma e placas de metal. Quem haveria de reclamar, se a glória poderia estar bem ali?

Na Idade Média, bruxas eram queimadas em fogueiras nas praças públicas. No mundo contemporâneo, o sacrifício é o de aprendizes de alquimistas. Magia lá e cá. Elas pretendiam cozinhar poções para melhorar a vida; eles só queriam transmutar a matéria para fazer soar a alegria.

O Brasil, aliás, já que eu me meti no assunto, tem vivido uma absurda sequência de tragédias. Algumas bem anunciadas, como os rompimentos de barragens em Minas Gerais. Outras que ninguém ousaria imaginar, como essa dos meninos do Flamengo. O transe do país estampa-se no nosso horror!

A dor da gente não sai no jornal. A dor da gente é não saber estancar os minutos passantes. A dor da gente é não esperar os finais infelizes. A dor da gente afoga de lágrimas o coração. Mais de uns do que de outros. Mas de uns e outros, com certeza. A dor da gente é não segurar as estrelas cadentes!

– Fevereiro de 2019 –


Francisco Dandão

Paulo Henrique Ganso, meio campo de futebol refinado, de passes precisos e elevada clarividência, é o novo maestro do glorioso Fluminense. Ele chegou depois de alguns anos no futebol europeu (Espanha e França), continente onde jamais conseguiu o mesmo brilho obtido no Brasil.

No dia 1º de outubro de 2016, eu pude vê-lo em ação, no estádio Ramon Sanchez-Pizjuan, em Sevilha, vestindo a camisa do time do mesmo nome, na vitória por 2 a 1 contra o Alavés, pelo campeonato espanhol. E naquele dia ele gastou a bola, usando e abusando de passes de calcanhar.

No mais das vezes, porém, o fato é que o Ganso não foi bem na sua aventura pelos gramados do Velho Mundo. Tanto que jamais se firmou como titular. Nem mesmo quando passou uma breve temporada no obscuro time francês Amiens, Ganso conseguiu se firmar como titular. Nem no Amiens!

O Amiens, ressalte-se, é um desses times que entra nos campeonatos sempre como candidato ao rebaixamento. No mais das vezes, passa o tempo todo frequentando a parte inferior da tabela de classificação. Uma verdadeira draga. Deveria ser um time para o PH Ganso reinar absoluto.

É difícil compreender os motivos pelos quais esse jogador brasileiro não emplacou na Europa. Afinal de contas, quando começou no Santos, ao lado do Neymar, tudo indicava que ele se tornaria um dos grandes craques do futebol mundial. Nitidamente, ele jogava muito mais do que a maioria.

Aliás, não somente no Santos. O Ganso também jogou em alto nível no São Paulo. Provavelmente nem tanto quanto no time da Vila Belmiro, mas sendo também protagonista, atraindo a bola para si, dando passes milimétricos, deixando os atacantes na cara do gol e conquistando títulos.

Eu mesmo cheguei a dizer muitas vezes que gostava mais dele do que do parceiro Neymar. E que se tivesse de escolher no par-ou-ímpar da pelada, chamaria ele e não o outro para o meu time. No meu entendimento da época, o sucesso do Neymar se devia, em boa parte, à bola do PH Ganso.

O tempo passou e tudo o que eu pensei se revelou um tremendo equívoco. Enquanto o Neymar, apesar do “quinto metatarso”, galgou os mais altos degraus do sucesso, a ponto de se tornar um dos jogadores mais caros do planeta, o Ganso veio descendo a ladeira até ao quintal das Laranjeiras.

Enfim, o certo é que o Ganso agora é nosso. Tomara ele ressurja para o mundo da bola como o craque que um dia saiu de Belém do Pará para as areias da Baixada Santista. Tenho a esperança de que ele será o par perfeito para o centroavante Pedro (quando voltar da contusão). O arco e a flecha!

– Fevereiro de 2019 –


Francisco Dandão

O Independência conseguiu a façanha de vencer duas vezes no mesmo dia, nessa quinta-feira passada. Dentro de campo, valendo pelo campeonato acreano, bateu o Náuas por 2 a 0. E fora de campo, valendo pelo torneio da memória, emplacou uma bela homenagem ao ex-craque Valdir Silva.

O referido Valdir, que nasceu em Icoaraci, no interior do Pará, e que hoje mora em Manaus, talvez seja o mais acreano dos paraenses. O amor ao Acre, espaço geográfico onde ele passou a maior parte dos seus 70 anos, fica deveras evidenciado sempre que a gente leva um papo com ele.

Pelo menos foi isso que eu percebi nas últimas duas oportunidades em que nos encontramos. Uma dessas vezes, em Manaus, em 2017, onde ele me levou para almoçar uma banda de tambaqui. E a outra em Fortaleza, em 2018, quando eu retribui a gentileza com uma fritada de camarões.

Morar na capital amazonense foi uma espécie de necessidade familiar. Os filhos mudaram para Manaus e Valdir acabou seguindo o mesmo caminho, depois que se aposentou do serviço público. “Mas sempre que posso estou ao Acre, onde tenho os melhores amigos”, disse-me ele.

No que diz respeito à carreira futebolística, pode-se dizer que o Valdir foi um desses gênios precoces que brotam nos confins do Brasil. Tanto que mal completados 15 anos, em 1963, ele já brilhava com seus dribles e arrancadas no ataque do time principal do Pinheirense da sua terra natal.

De 1963 a 1968, Valdir desfilou sua arte por gramados paraenses com as camisas de vários clubes. Além do já citado Pinheirense, outros três times contaram com a sua bola: Paysandu (juvenil), Liberato de Castro e Sporting Belém. Depois disso, ele tratou de seguir a estrela do ocidente.

E então, veio uma estada de sete anos (até 1974) no recém criado profissionalismo amazonense, onde Valdir Silva defendeu as cores do Sul-América, do São Raimundo, da Rodoviária e do Olympico. De acordo com o ex-craque, “o futebol do Amazonas vivia uma época exuberante”.

Em 1975, Valdir Silva, sempre seguindo a rota do oeste, trocou de ares outra vez. O Independência precisava de um atacante para substituir o ídolo Rui Macaco, que resolvera mudar de clube. E aí Valdir foi indicado pelo meia Augusto, um dos muitos amazonenses que jogava no Acre.

Deixar o profissionalismo amazonense pelo amadorismo acreano parecia um paradoxo. Mas o dinheiro oferecido compensava. Três ou quatro vezes mais do que Valdir ganhava em Manaus. Ele topou, se apaixonou pelo Acre e escreveu uma bela história no Tricolor. Virou ídolo para sempre!

– Fevereiro de 2019 –


Francisco Dandão

Manoel Façanha, dublê de jornalista esportivo e sindicalista, meu afilhado dileto, é quem me mantem informado dos bastidores do futebol acreano. Desde que eu amarrei a minha cachorrinha magra na capital do Ceará, quatro anos atrás, é pelo dito cujo que eu fico sabendo das coisas.

E assim foi que um dia desses, por conta dessa nossa parceria, eu recebi uma fotografia do Façanha fazendo um lanche na companhia do mago Marcello Altino (já devidamente defenestrado do comando técnico do São Francisco) numa birosca do acolhedor mercado municipal de Rio Branco.

Na imagem, como é de praxe em fotos posadas, duas criaturas sorridentes, olhando diretamente para a câmera, como se estivessem olhando para mim, destinatário da correspondência. O Façanha de vermelho, como convém a um sindicalista, e o Marcello de preto, como convém a um mago.

Pela cor da roupa do mago, aliás, eu deduzi logo que a tal foto havia sido feita num dia de sexta-feira. Faz mais de 20 anos que o Marcello Altino se veste de preto todas as sextas-feiras. Desde 1997, quando o Rio Branco foi campeão da Copa Norte, batendo o Remo, em pleno Mangueirão!

De acordo com o que o mago me falou numa entrevista que eu fiz com ele, em 2017, o preto é a cor que absorve todas as energias e, dessa forma, nada melhor do que se vestir assim dos pés à cabeça (inclusive a cueca) em dias que antecedem os finais de semana. Uma explicação bem plausível.

Só achei estranho o detalhe de que na fotografia o mago aparece segurando um copo de um líquido que o Façanha me falou ser de guaraná em pó diluído em catuaba. Fiquei pensando que era muita energia para uma criatura só. Mas vá lá que seja: um olho no cravo e outro na ferradura!

Crenças e providências à parte, porém, o que eu quero dizer mesmo nesse papo furado de hoje é que do encontro desses dois personagens do futebol acreano ficou esclarecido o motivo pelo qual o mago passou recentemente como um cometa pelo comando técnico do São Francisco.

Conforme o Façanha me falou, não foi fácil arrancar do mago as razões para a demissão dele depois de apenas uma partida. Mas após três ou quatro copas da beberagem referida anteriormente neste texto, ele acabou abrindo o jogo: a impossibilidade de treinar o time em dias de chuva.

Segundo Marcello Altino, a direção do São Chico não permite usar o campo quando chove, sob a alegação de que o gramado será destruído. E aí, como nessa época do ano chove num dia e no outro também, o time jamais treinaria. No fim, o mago ironizou: “Eles acham que estão em Wembley!”

– Março de 2019 –


Francisco Dandão

Começou animado o returno do campeonato acreano de futebol. Nos três primeiros jogos foram marcados 12 gols. Média de quatro gols por jogo. O Atlético entrou com a corda toda. Mandou logo meia dúzia no lombo do Humaitá. E o Plácido tirou sua casquinha de um santo chamado Francisco.

Só o Vasco, até o presente momento, é que estreou sem goleada. Ficou na vantagem mínima sobre o Náuas. Fazia mais de ano que o Vasco não ganhava umazinha. Tirou o dedo, como se diz nas altas rodas de malandragem. De acordo com o presidente Lobinho, agora a coisa vai.

Mas o que eu quero fazer mesmo nesse papo furado de hoje são reflexões sobre o primeiro turno, cujo caneco o Galvez levou para as suas vitrines. São muitas as reflexões. No latifúndio de papel (ou virtual) que me toca para escrever o texto não dá para listar todas. Mas cabe algumas delas.

Primeira reflexão: levando em conta o calendário da “mama” CBF, que determina que os campeonatos estaduais sejam disputados no comecinho da temporada, e levando em conta que esse é o período do ano em que mais chove, todos os jogadores tem que aprender a tabelar com os pingos d’água.

Segunda: ainda levando em conta a intensa precipitação pluviométrica, todos os times devem providenciar uniformes impermeáveis, de preferência feitos de plástico. Para dias de tempestades, faz sentido até que vistam uniformes de borracha, tipo aqueles usados por mergulhadores.

Terceira: magos não devem ser contratados por times católicos. Mesmo que a gente viva numa época em que se enaltece o sincretismo religioso, no futebol essa prática não dá certo. Prova disso foi a passagem relâmpago do veterano Marcello Altino como técnico do São Francisco.

Quarta: com relação ainda a essas coisas de magia, fica a suspeita que o Marcello Altino não é um daqueles magos que se pode dizer “até debaixo d’água”. A ligação do dito cujo parece ser somente com a terra e o fogo. Mas isso é só um palpite do cronista. Carece de maiores observações no futuro.

Quinta: o Tricolor de Aço, sob o comando do competente e abnegado Illimani Suares, deu o exemplo de que tudo pode ser reciclado nesse mundo de intenso desperdício. Bastou, para isso, pregar o escudo do time em cima de uma antiga estrela. E aí, a camisa que era de um passou a ser de outro.

Sexta: os preparadores físicos de hoje podem ser os grandes treinadores de amanhã. Afinal, o Edson Maria (Vasco) e o Jáder Andrade (Rio Branco) estão aí para confirmar essa hipótese. Sem falar no Marcelo Fontinele, que levou o São Chico a uma vitória depois de anos infindos!

– Março de 2019 –


Francisco Dandão

Se nada mais der certo para o Galvez, na sequência do campeonato acreano de futebol profissional, eu diria que o ano do clube já está de bom tamanho. É que ao bater o Atlético, nos pênaltis, e levar pra casa o primeiro turno, o Imperador já adquiriu o direito de botar a mão numa ótima grana.

Explico: o fato de ser campeão do primeiro turno dá ao time militar o direito de participar da Copa do Brasil de 2020. E, assim sendo, pelo menos 500 mil reais entrarão nos seus cofres dentro de alguns meses. Um gás legal nas finanças de qualquer time da extrema periferia da República.

Eu disse “se nada mais der certo para o Galvez”, mas não creio que nada mais vá dar certo na sequência da temporada para o bom time do Imperador. A organização fora do campo, o comando do técnico Zé Marco e o empenho dos jogadores prometem que vem mais coisa por aí.

Ao Galvez, aliás, apesar dos seus poucos anos de existência (foi fundado em 2011), já não se pode negar a condição de time grande. Está sempre chegando às finais das competições que disputa, enfrentando os tradicionais Atlético e Rio Branco em pé de igualdade. “Pau a pau!”

E ainda tem mais um detalhe relevante a se destacar no que diz respeito aos caminhos trilhados pelo clube até aqui: a atenção às categorias de base. Prova disso foi a boa participação do time Sub-20 na Copa São Paulo de Futebol Júnior, em janeiro passado. Na base está o futuro de um clube!

No que diz respeito às quinhentas merrecas que eu falei no título, ainda resta outro tanto desses para o campeão geral da competição. Nove outros times estão no páreo. Quer dizer, nove são os candidatos, mas apenas três ou quatro tem condições reais para isso. Os demais são apenas figurantes.

Ser “figurante”, em linguagem de cinema, é aquela criatura que aparece só em raras oportunidades, às vezes no fundo da cena, às vezes sem falar coisa nenhuma e às vezes morrendo no meio de uma multidão de anônimos. Muitos times entram no campeonato, sim, como figurantes.

Mas voltando às quinhentas merrecas, eu diria que os quatro que brigam por essa bufunfa são o Atlético, o Rio Branco, o Independência e o Plácido de Castro. O Atlético porque lutou até o fim pelo título do turno, o Rio Branco por necessidade e os outros dois pelo que mostraram até aqui.

E se o Galvez for campeão do returno, o que lhe dará o título geral direto sem a necessidade de jogar uma finalíssima, aí esses quinhentinhos vão para quem ficar com o segundo lugar na competição. O Imperador está de boa no game. Quem quiser que corra atrás. O returno é tudo ou nada!

– Março de 2019 –


Francisco Dandão

O bom do mundo dito pós-moderno é que a gente não precisa inventar nada. É só pegar as ideias do pessoal da modernidade e adaptar a um novo contexto. Dessa forma, a gente pode ir se apropriando do que já foi dito em outras situações. “Nada se cria, tudo se copia”, dizia um velho guerreiro.

Assim, que ninguém se assuste se eu disser ainda um milhão de vezes que “clássico é clássico e vice-versa”. Sei lá quantas vezes eu usei essa expressão ao longo de quase duas mil crônicas sobre futebol. O que eu sei, com a mais absoluta certeza, é que eu disse isso na crônica passada.

E disse para falar justamente do jogo entre Atlético Acreano e Independência, pelas semifinais do primeiro turno do campeonato acreano de futebol. Eu mais ou menos afirmei naquele texto que o Galo era o favorito, mas não seria estranho se o Independência saísse de campo como finalista.

Eis que veio o jogo e tudo se confirmou. Apesar de o Atlético ter superado o Tricolor de Aço, esse triunfo só foi possível numa decisão por pênaltis, depois de um empate no tempo normal. Um empate, segundo relata a fiel galera, no qual o Independência esteve sempre mais perto do triunfo.

Mas então, deixando de lado a pós-modernidade (o falecido sociólogo Zygmunt Bauman falava em “modernidade líquida”), e procurando as explicações para o vice e o versa característico dos grandes clássicos do futebol planetário, o que teria acontecido para o Galo bater o Tricolor?

Tive que recorrer ao fotógrafo/jornalista/escritor Manoel Façanha para obter maiores elementos que me ajudassem a compreender quais os motivos que determinaram a vitória do Atlético. Fiz-lhe uma pergunta direta. E ele me respondeu igualmente de forma direta: – Foi macumba, professor!

Intrigado com a resposta do meu interlocutor, pedi-lhe mais detalhes. E ele me respondeu que o Independência mandou no jogo, que marcou dois gols de bela feitura, sendo um deles num canhão de fora da área, enquanto que o Atlético só chegou às redes com dois gols daqueles ditos “espíritas”.

Ainda ponderei que o segundo gol do Independência só aconteceu porque a bola se ofereceu ao pés do atacante com a ajuda de uma poça d’água. Mas aí o Façanha retrucou que aquilo foi uma jogada ensaiada. E que os atletas do Tricolor são treinados para tabelar com pingos de chuva.

Pode ter sido, pode não ter sido. No mundo pós-moderno, cheio de imagens e telas, tudo pode, ainda que nada se realize completamente. Mas eu é que não vou duvidar da palavra do Façanha. Em vez de duvidar, vou é tratar de ler as cartas do meu tarô. Depois eu conto como foi a leitura.

– Março de 2019 –


Francisco Dandão

Depois das escaramuças e combates do meio da semana, enfim foram definidas as semifinais do primeiro turno do campeonato acreano de futebol profissional deste ano da Graça de 2019. Atlético e Independência duelam de um lado, enquanto Galvez e Plácido se pegam do outro.

Apesar do dito popular que garante que “clássico é clássico e vice-versa”, bem como àquele outro preceito da vã filosofia que determina que “o jogo só acaba quando termina”, eu ousaria apostar as minhas fichas no sucesso do Atlético e do Galvez contra os seus respectivos adversários.

No entanto, para que ninguém diga que eu nunca falo de flores, devo ressaltar que o meu histórico de palpiteiro não serve de jeito nenhum para garantir que as coisas venham a acontecer do jeito que eu imagino. E assim, que tanto o Galo quanto o Imperador tratem de botar as barbas de molho.

De mais a mais, todo mundo está “careca de saber” (expressão que eu tirei de um Stand Up televisivo protagonizado por um filósofo da Unicamp), quando a bola rola são onze contra onze e ninguém é mais macho do que ninguém. Os favoritos precisam provar a sua suposta bola cheia.

A maior surpresa, porém, deste ocaso de turno, é a ausência do Rio Branco das semifinais. Acompanhando à distância, fica impossível pra mim saber com exatidão o que teria se passado para o clube ficar de fora. Mas o certo é que vai ser preciso mudar o rumo das coisas para o returno.

O Estrelão, aliás, no que diz respeito a mudanças, eu acho que já tomou a primeira grande decisão. Justamente a entrega do comando técnico ao doutor Jader Andrade. Estudioso e focado em tudo o que faz, o Jader costuma dar conta do recado quando lhe entregam as buchas alheias.

Pelo menos foi assim no ano passado, quando o dito cujo foi alçado à condição de titular da comissão técnica do alvirrubro, num momento de dificuldade semelhante, por acaso (ou não) substituindo um treinador oriundo de outras paragens. Ele assumiu e conquistou o título do estadual.

Se o raio cair no mesmo lugar, talvez seja o caso de já se pensar em deixar o Jader assumir o posto de treinador desde o início do ano. Conhecendo-o como o conheço, eu tenho a convicção de que ele não fica nada a dever para a maioria dos “professores” que chegam de fora do estado.

O certo é que o Estrelão está fora das “semi” e o jogo segue com outros candidatos a protagonista. Os palpites estão abertos. Com respeito ao título do turno, o Toinho Bill garante que dá Galo, o Façanha aposta no Independência, o Lula acha que dá Galvez e o Joraí afirma que dá Plácido!

– Março de 2019 –


Francisco Dandão

Eu mesmo não assisti. Mas li por aí pelos sites que o ex-goleiro Jefferson, que marcou época no Botafogo e que pendurou as chuteiras no ano passado, declarou numa entrevista na televisão que ele teria sido deixado de fora da convocação para o Mundial Sub-20, em 2003, por ser negro.

De acordo com as declarações do ex-jogador, reproduzida nas páginas da internet, um dirigente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) é que teria vetado a convocação dele, por conta da cor da sua pele. Isso foi o que lhe disseram. Pena que o informante não quis declinar o nome do racista.

Pra sorte do Jefferson, o Mundial daquele ano, marcado para os Emirados Árabes Unidos, foi adiado de junho para dezembro. E nesse ínterim, o dirigente criminoso saiu da CBF. Com o sujeito fora do caminho, o goleiro foi convocado, virou titular, e sagrou-se campeão do mundo.

No meu entendimento, o mais estarrecedor nem é o ato preconceituoso, que o Brasil, apesar da legislação, tão cedo não deixará de exibir esse perfil nefasto. Pra mim, o mais estarrecedor é a forma como esse preconceito se manifestou, de maneira camuflada, furtiva, dissimulada…

Quando o preconceito é escancarado, o sujeito agredido tem a oportunidade de tomar as suas providências, seja de algum jeito mais brusco, seja acionando os canais legais. Mas quando é camuflado, o ofendido sente os efeitos do ato e não pode fazer nada. Às vezes, nem fica sabendo.

Sem a ação visível, fica impossível a reação. E assim, tudo continua como sempre foi. O inimigo oculto pode frequentar os mesmos lugares que a vítima da agressão. No caso do futebol, o preconceituoso pode até dar tapinhas nas costas e elogiar o discriminado, mas tudo só de “migué”.

E aí, passando de um ponto ao outro, mas sem sair do lugar (vá entender…), eu fiquei pensando em como o futebol brasileiro seria mais pobre (talvez jamais tivesse conquistado alguma coisa) se não tivesse contado com a presença de negros maravilhosos, mágicos no trato da bola.

Nesse aspecto, basta citar um desses negros: Pelé, o gênio que levou a seleção brasileira ao pódio em três Copas do Mundo, marcou mais de mil gols, foi coroado rei na França e fez os norte-americanos compreenderem que a emoção não precisa ser construída apenas com uma bola nas mãos.

Pelé, aliás, na metade da década de 1960, foi capaz inclusive de acabar com o preconceito no futebol de um país europeu. O país foi a Itália, cujos times ofereceram rios de dinheiro para ele jogar lá. O negão jamais aceitou. Não aceitou, mas abriu caminhos para vários outros “crioulos”. Reticências!

– Março de 2019 –


Francisco Dandão

De vez em quando eu encontro acreanos num supermercado perto de onde eu moro, em Fortaleza. Já encontrei vários. De cabeça, assim, enquanto escrevo, lembro de pelo menos três deles: o engenheiro Sebastião Fonseca, o poeta José Augusto Fontes e o virtuose da música Joãozinho Rocha.

Aí, papo vai, papo vem, a gente acaba gastando alguns minutos de conversa lembrando histórias antigas do futebol acreano. E então, as jogadas dos eternos craques da aldeia são contadas de um para o outro como se tivessem acabado de acontecer. Para a memória, nada é assim tão distante.

Quer dizer, nem somente as jogadas dos craques é que costumam ser lembradas. No meio da conversa, aqui e ali, a gente vai se lembrando também dos “crueiras”. Aqueles sujeitos que tanto batiam quanto maltratavam a bola. Nada mais natural. Afinal, só existem craques por causa dos “crueiras”.

O raciocínio é simples: se todo mundo jogasse muita bola, tudo ficaria tediosamente nivelado. Provavelmente não haveria o drible desmoralizante e os lances de efeito se sucederiam, sem que isso causasse algum espanto nos torcedores. O brilho do craque é maior por causa da ruindade do “crueira”.

Mas o que eu quero dizer mesmo é que nessas de encontrar acreanos num supermercado de Fortaleza, um dia desses eu me deparei com o advogado xapuriense Joraí Salim Pinheiro. De férias (pela terceira ou quarta vez no ano), ele escolhera a capital cearense para pegar uma boa chuva.

Cito a chuva por causa de um argumento dele quando começamos a trocar ideias. Eu disse que ele havia escolhido um péssimo momento para vir ao litoral. E ele me respondeu que a escolha havia sido estratégica e que simplesmente não aguentava mais o sol do Acre, ainda que no inverno!

Aí, mudando de assunto e emendando com o futebol acreano das antigas, ele me contou uma história do lateral Otávio Lunguinha, falecido em 2014, que vestiu as camisas do Independência e do Juventus. No dizer do Joraí, não houve maior secador no futebol do Acre do que o Otávio.

Segundo o Joraí, embora o Otávio fosse reserva, tanto num quanto no outro time, ele sempre jogava, uma vez que os laterais titulares sempre se machucavam (às vezes momentos antes do jogo). “O Otávio jogava nas duas laterais. Então, quando não dava de um lado, dava do outro”, disse o Joraí.

No Juventus, os laterais da época eram o Mauro (direito) e o Antônio Maria (esquerdo). No Independência eram o Chico Alab (direito) e o Flávio (esquerdo). “O Otávio secava tanto os titulares que às vezes os caras se contundiam até na hora da massagem”, concluiu o Joraí gargalhando!

– Março de 2019 –


Francisco Dandão

Ando às voltas por esses dias com a tessitura de um artigo acadêmico sobre grandes escritores brasileiros que se dedicaram, entre outras variadas produções, a escrever crônicas sobre esportes. E então, por conta disso, tenho me deliciado com a releitura de verdadeiras pérolas do referido gênero.

São peças do mais refinado humor ou profundo lirismo de gente do porte do acreano Armando Nogueira (1927-2010), do gaúcho Luis Fernando Veríssimo (1936-), dos mineiros Paulo Mendes Campos (1922-1991) e Roberto Drummond (1933-2002) e do paulista José Roberto Torero (1963-).

Armando Nogueira, xapuriense e botafoguense desde que nasceu, foi um dos maiores poetas da crônica esportiva, como se pode ver neste fragmento: “O grito da multidão é e será, sempre, a moldura de uma obra imensa, forjada na pureza de uma bola, tocada e retocada por pés mágicos”.

Ou então, quando um dia escreveu uma crônica de exaltação aos futebolistas que jogavam de cabeça erguida e sem dar pontapés, ele disse que os caras formavam “(…) uma dinastia de craques soberbos a cuja estampa, a fluir pelo campo, só faltava uma echarpe de seda no pescoço principesco”.

Lirismo a perder de vista, assim como “cronicava” (não adianta procurar essa palavra nos dicionários, viu, leitor?) Paulo Mendes Campos, quando dizia coisas como: “Mineiro (…) espia, escuta, indaga, protela, se sopita, tolera (…). Parece até um estudo sobre o futebol de Tostão”.

No que toca a Roberto Drummond, que morreu no dia de um jogo do Brasil, na Copa do Mundo de 2002, veja-se o que ele disse sobre a paixão de torcer pelo Galo mineiro: “Se houver uma camisa branca e preta pendurada no varal durante uma tempestade, o atleticano torce contra o vento”.

Esses citados faziam poesia em prosa sobre o futebol. No caso de um dos sujeitos que traduzem a relação homem/bola com o humor, veja-se o que disse José Roberto Torero sobre a declaração de um cartola: “O importante no futebol é cada um achar a sua posição. A minha era de dirigente”.

Quanto ao Veríssimo, vejam só a sua percepção depois da derrota do Brasil na Copa de 1986: “Nova derrota, nova frustração e uma leve suspeita de que continuávamos sendo os melhores do mundo, mas que já era tempo de provarmos isso na prática, senão o pessoal ia começar a desconfiar”.

E para fechar, cito outra vez Luis Fernando Veríssimo, falando das suas apreensões num dado momento da vida da seleção brasileira de futebol: “Como se não bastassem o Brasil, a Humanidade e a próstata, comecei a me preocupar com o Vanderley Luxemburgo”. Rsrsrs. Fecha o pano devagar!

– Março de 2019 –


Francisco Dandão

Vai começar a fase de grupos da Copa Libertadores da América. O primeiro dos times brasileiros a estrear na competição vai ser o Flamengo, na próxima terça-feira, último dia do carnaval. Vai subir o morro para jogar contra um certo São José, representante do “nada a ver” futebol boliviano.

Em princípio, deveria ser um jogo de relativa facilidade para o rubro-negro carioca. Existe uma diferença abissal entre o futebol brasileiro e o boliviano. Ainda haverá de passar uns bons cinquenta anos para que os bolivianos, em condições normais, possam fazer frente aos nossos times.

Disse eu “em condições normais” porque um ingrediente fundamental envolve esse jogo. Justamente a altitude de 3706 metros onde se localiza a cidade de Oruro, sede do tal São José. Pra quem não está acostumado, jogar numa altitude dessas requer um esforço absurdo. Aliás, pra lá de absurdo.

Eu sei disso por experiência própria. No início de 2005, eu me atrevi a fazer um tour por La Paz, a capital lá dos colhas. Pra subir uma pequena ladeira, eu precisa fazer três ou quatro paradas para descanso. E ressalte-se que eu não fui jogar futebol. Além disso, La Paz é menos alta do que Oruro.

Nem a mandinga vendida aos paturebas no Mercado de las Brujas (Mercado das Bruxas), no centro da capital boliviana, me fez melhorar do troço que eles chamam “mal das alturas”. A bruxa que me atendeu jurou que umas doses generosas de chá de coca me fariam melhorar no mesmo instante.

E se o chá de coca não fosse suficiente, que eu pregasse na testa uma folha de capeba, que seria “tiro e queda”. E que se, ainda assim, eu continuasse a me sentir mal, era porque os deuses que habitam a montanha Illimani (cartão postal da cidade) não tinham ido com a minha cara.

Pois eu lhes digo que nada surtiu efeito. O único resultado do chá de coca foi me fazer ir ao banheiro a cada meia hora (em um dado momento, um boliviano me aconselhou a mijar no meio da rua mesmo). E a folha de capeba só serviu para deixar uma marca de sujo bem no meio da minha testa.

Pra completar, no dia marcado para voltar estourou uma greve dos aeroviários. E ressalte-se que lá, à época, não tinha esse negócio da companhia aérea pagar hotel para os passageiros. Eles riam quando eu falava nisso. Tive que sofrer mais dois dias e ainda estourar o cartão de crédito.

Mas voltando ao fio da meada, o que eu dizia lá no começo deste texto era que o Flamengo vai pegar uma senhora pedreira, a despeito da (má) qualidade do adversário. Em Oruro, assim como em La Paz, a grande arma (talvez a única) dos nativos é o fator campo. A altura é o maior craque deles!

– Março de 2019 –


Francisco Dandão

Falta menos de um mês, e pouco mais do que isso, para o início, respectivamente, das novas série C e D do campeonato brasileiro. Três times acreanos estarão envolvidos nos combates: o Atlético, na série C, e o Rio Branco e o Galvez na série D. Jogos duríssimos, certamente, vem por aí.

O Atlético, que subiu em 2017, fez um campeonato de excelência na série C do ano passado. Entrou no torneio como candidato ao rebaixamento, segundo a opinião dos analistas, passou para a categoria de azarão depois das primeiras partidas e acabou sucumbindo só ao chegar às quartas de final.

Como não é mais estreante na competição, seria de se esperar que o Galo agora entrasse no game como um dos favoritos para mudar de patamar no mapa do futebol brasileiro, subindo à série B de 2020. Na realidade, porém, não se pode raciocinar de forma assim, digamos, tão cartesiana.

É que de um ano para o outro muita coisa muda. E muita coisa, de fato, mudou na vida do glorioso clube celeste do 2º Distrito de Rio Branco. Muita coisa mudou, a começar pelo elenco, cuja boa parte dos integrantes, aqueles de mais destaque, foram mostrar a sua bola em outras paragens do mundo.

O ataque inteiro que o Galo usou na campanha de 2018 se mandou. Eduardo foi nos últimos meses do ano para o paulista RB Brasil. E depois se mudou para o paranaense Operário. O jovem Neto agora é um dos artilheiros do potiguar ABC. E o Rafael Barros foi para o boliviano Blooming.

Para tentar substituir tanta gente boa de bola, o Atlético precisaria, teoricamente, seguir um desses dois caminhos: puxar outros candidatos a craques da sua base ou ir buscar no mercado jogadores de igual qualidade. Na prática, entretanto, nenhum desses caminhos parece assim tão factível.

Primeiro pelo fato de que nem sempre surgem na base jogadores tão talentosos. Às vezes é preciso anos de trabalho para que uma joia passe pelo devido processo de lapidação. E para contratar bons jogadores precisa ter dinheiro em caixa, coisa que não deve ser o caso do Atlético atualmente.

Quanto ao Rio Branco, a julgar pelos seus resultados no campeonato estadual até o presente momento, nada indica que o time vá entrar na série D com ares de favorito. Não chegar sequer às semifinais do turno acende uma brilhante e perigosa luz amarela no horizonte do time da estrela rubra.

Então, dados todos esses prolegômenos de um cronista encharcado pela chuva que não para de cair nem depois de fechado o verão, resta a expectativa do desempenho do Galvez. Com grana em caixa e campeão do primeiro turno local, o time militar pode ser a melhor aposta. Pode sim!

– Abril de 2019 –


Francisco Dandão

Parece que eu sequei o Galvez. É que eu falei na crônica passada que o time da PM era a nossa melhor aposta para os campeonatos brasileiros que virão por aí. O meu prognóstico se baseava em vários elementos, sendo o principal deles o desempenho do time no turno do campeonato estadual.

Aí, depois disso, veio o jogo com o Vasco, equipe que passou o mesmo primeiro turno sem uma vitoriazinha sequer. O time da Fazendinha, no turno, jogou cinco vezes e só conseguiu empatar duas. Com dois pontos na tabela, era sério candidato ao rebaixamento. O Galvez, por seu lado, favoritíssimo.

Como favoritismo (tabu, tradição, retrospecto etc. e tal…) não entra em campo, e por isso o futebol é um esporte tão fascinante, eis que no confronto entre as duas campanhas tão díspares deu o teoricamente pior. E assim, o favorito Galvez levou uma peia do então tido como azarão.

Pra falar a verdade, o segundo turno do Vasco tem sido impecável: duas vitórias em três jogos. Além do Galvez, o Almirante também bateu o Náuas. E só empatou com o Plácido de Castro, com o qual divide as primeiras colocações do grupo B. As semifinais do returno batem à porta.

Mas o que poderia ter acontecido para o Vasco melhorar tanto o seu desempenho entre um turno e outro, saindo praticamente de uma condição de saco de pancadas para terror dos adversários? O que poderia ter acontecido se a gente não vive mais tempos de água transformada em vinho?

Para satisfazer a minha curiosidade e responder às minhas indagações, me danei a disparar e-mails para os chegados. Uma enquete eletrônica, reunindo as opiniões de especialistas de bastidores (ou de sofás, ou de arquibancadas, tanto faz), pode trazer luzes num horizonte de trevas.

A maioria das criaturas consultadas ignorou a minha enquete. Outras responderam de forma ambígua, tipo acho isso, acho aquilo, nem barro nem tijolo, muito menos céu ou terra. Dois desses chegados, porém, me deram respostas bem diretas. No caso, o Ezequias Açaí Sarado e o Joraí Salim.

De acordo com o Ezequias, essa mudança de atitude do Vasco se deve a um trabalho feito numa encruzilhada pelo presidente Lobinho. Trabalho sério, regado a farinha d’água e charuto cubano. Já a explicação do Joraí é a de que um time com um técnico chamado Som tem que jogar por música.

São duas boas explicações. Charuto cubano, contrabandeado via Caracas, dizem que se não matar, engorda. E a teoria do jogo por música pode não ter dado certo no primeiro turno porque o time (orquestra) ainda não estava devidamente ensaiado. O Ezequias e o Joraí são grandes analistas!

– Abril de 2019 –


Francisco Dandão

Se um é pouco e se dois é bom, três é melhor ainda. Sei lá se é mesmo. Só sei que vai ser assim a rodada deste sábado (13 de abril) do campeonato acreano, no Florestão. Rodada triplamente qualificada. Oportunidade única para a galera esperta ver em ação seis dos dez times envolvidos no torneio.

A situação se explica por conta de um jogo atrasado entre Andirá e Independência, que deveria ter sido disputado no dia 24 de março. Foi um dia em que choveu tudo e mais um pouco. Um daqueles dias em que a gente tem certeza de que o planeta deveria se chamar era “Água” e não “Terra”.

O Morcego e o Tricolor, nesse caso, vão só cumprir tabela. Não aspiram nada mais dentro da competição. Talvez até, se pudessem, deixavam esse jogo pra lá e davam férias mais cedo para os seus elencos. Como não podem fazer isso, vão ter que ir a campo e tentar se despedir com honra.

Depois de morcegueiros e tricolores, chegam as semifinais do returno e aí a coisa pega pra valer. Primeiro com Atlético e Galvez. Depois com Vasco da Gama e Rio Branco. Dois desses seguem em frente para a finalíssima do referido returno. Os outros dois vão pra casa chupar o dedo.

No confronto entre Galo e Imperador eu não ousaria apontar um favorito. São times bem parelhos. Costuma sair faísca quando se encontram. Já jogaram duas vezes esse ano. O Atlético venceu uma e a outra foi empate. Mas o Galvez se deu melhor porque foi o campeão do turno, nos pênaltis.

Como não existe um terceiro turno, pode-se dizer que a responsabilidade maior recai sobre os ombros do Atlético, único representante do estado na série C. Para garantir o seu “trocado” na Copa do Brasil do ano que vem, o Atlético precisa avançar até o alto do pódio.

Já para o segundo confronto dessas semifinais, entre Vasco e Rio Branco, de acordo com as informações do meu afilhado Manoel Façanha, o que mais chama a atenção é a postura dos treinadores. Som, pelo lado do Vasco, fala tudo e mais alguma coisa; Jader, do Rio Branco, não diz nada.

No discurso do técnico Som, relata o Façanha, a afirmação de que o Vasco jamais perdeu duas vezes para o Rio Branco no mesmo campeonato. E essa cota já foi atingida, naquela peia de 1 a 5 do primeiro turno. Enquanto isso, a resposta do Jader é um sorriso enigmático, bem no estilo Mona Lisa.

Quatro times, quatro sonhos, quatro desejos de seguir rumo ao título estadual. Da minha parte, bem à moda do político Tancredo Neves, eu torço pelo Atlético, tenho uma certa predileção pelo Rio Branco, remelo o olho pelo Vasco e simpatizo com o Galvez. E assim, que vençam os melhores!

– Abril de 2019 –


Francisco Dandão

Escrevo algumas horas antes da partida entre Rio Branco e Atlético pela decisão do returno do campeonato acreano de 2019. Trata-se de um clássico, onde qualquer resultado pode ser considerado normal. Clássico não tem favorito, ainda que um time possa estar melhor do que o outro.

Rio Branco, Atlético e Independência são os clubes de maior tradição e longevidade no futebol acreano. O Estrelão foi fundado em 1919; o Galo em 1952; e o Tricolor do Marinho Monte em 1946 (inicialmente se chamava Ypiranga). Muito suor e glórias encharcam as camisas de cada um deles.

No que diz respeito a títulos, entretanto, o Rio Branco deixa na poeira os seus dois adversários. Só na era do futebol profissional, que começou em 1989, o Estrelão levantou 16 “canecos” (1992, 1994, 1997, 2000, 2002, 2003, 2004, 2005, 2007, 2008, 2010, 2011, 2012, 2014, 2015 e 2018).

O Atlético e o Independência, juntos, somam apenas cinco títulos nesses tempos de profissionalismo. O primeiro venceu em 1991, 2016 e 2017. Já o Tricolor venceu em 1993 e 1998. Mas ambos, ressalte-se, disputaram várias finais nos últimos 30 anos. É tradição a perder de vista!

Alguns cracaços de bola vestiram as camisas dos três times. Nos tempos do amadorismo, assim que acabava uma temporada, os dirigentes tratavam de tirar os melhores jogadores dos adversários. E apesar de o regime ser amador, esses tais craques eram contratados quase a peso de ouro.

Lembro, enquanto desenvolvo esse raciocínio de hoje, três desses nomes que vestiram (e honraram) as três camisas: o meia Dadão (que um dia andou pelo Fluminense-RJ), o goleiro Zé Augusto (que jogou na base do Flamengo-RJ) e o volante Tadeu Belém, oriundo do futebol amazonense.

E lembro também de dirigentes que dedicaram anos da suas vidas pelas cores dos referidos clubes. Casos de Adauto Frota e Fernando Diógenes (Atlético); Lourival Marques, Sebastião Alencar e Edmir Gadelha (Rio Branco); Adalberto Aragão e Eugênio Mansour (Independência).

Foi a partir do trabalho desses dirigentes, entre outros, que o futebol acreano começou, nas décadas de 1970 e 1980, a importar jogadores de outros estados. O Galo buscava jogadores no Rio de Janeiro, o Rio Branco trazia gente do Paraná e o Independência preferia o interior de São Paulo.

Pois bem. O certo é que o título do returno do campeonato acreano de 2019 estará em boas mãos com qualquer um dos vencedores. E que venham as finais, contra o Galvez, que venceu o primeiro turno e ficou de boa esperando o bicho que vai dar. Vai ter emoção nos gramados do Acre!

– Abril de 2019 –


Francisco Dandão

Antigamente, no espaço territorial acreano, futebol era o esporte dos finais de semana, o evento dos sábados e domingos. As tabelas costumavam marcar os jogos menos importantes para as tardes de sábado. Os domingos eram os dias reservados aos clássicos, aos jogos entre os melhores times.

Nos primeiros anos da década de 1970, a exemplo dessas minhas afirmações aí do primeiro parágrafo, existiam duas competições realizadas antes do campeonato principal: o Torneio da Imprensa e o Torneio do Povo. O primeiro destinado aos “clubes menores”. O outro jogado pelos “grandes”.

Andirá, Floresta, Vasco da Gama e Internacional, tidos como pequenos, jogavam aos sábados. Rio Branco, Independência, Atlético e Juventus, jogavam aos domingos. Quase sempre em rodadas duplas que começavam muito cedo porque não existia ainda a iluminação artificial.

O palco dos espetáculos era um só: o Stadium (assim mesmo, em latim, como toda a pompa do mundo) José de Melo. E a galera se ligava, de segunda a sexta-feira, nos programas esportivos das rádios Difusora Acreana e Novo Andirá, ambas AM, para saber as notícias dos seus times do coração.

O tempo, porém, como diria a verve lírica do poeta Mauro Modesto, “estilete vermelho em caule febril”, passou num instante e eis que bateu às portas do século XXI. O futebol jogado aos sábados e domingos ficou só na lembrança. E agora, meus caríssimos amigos, tem jogo todos os dias.

Dessa forma é que o campeonato acreano de futebol profissional de 2019 vai ter sua finalíssima jogada numa segunda-feira. Nesta segunda-feira, 22 de abril, por acaso (ou não) o dia em que se atribui ter sido o Brasil encontrado pela frota do navegador português Pedro Alvares Cabral.

Pela primazia de subir ao alto do pódio e beijar a mocinha (a taça, dizendo de outra maneira) no fim da epopeia, defrontam-se, na Arena da Floresta, a partir das 19 horas, o Galvez (campeão do primeiro turno) e o Atlético (campeão do returno). Isso, naturalmente, se a chuva permitir.

É uma decisão sem favorito. No primeiro jogo, disputado na sexta-feira recém passada, deu empate em um gol. O Galvez marcou primeiro, aos 39 minutos do segundo tempo. Àquela altura parecia que o time militar largaria em vantagem. Mas o Atlético correu atrás e obteve o empate.

O título vale muito para os dois clubes, apesar de ambos já terem garantido as vagas na Copa do Brasil do próximo ano, o que lhes assegura uma boa grana nos cofres. Para o Atlético vale a reafirmação do ótimo trabalho dos últimos anos. E para o Galvez vale a primeira grande conquista.

– Abril de 2019 –


Francisco Dandão

Acabou mais uma edição do campeonato acreano de futebol profissional. Depois de dois empates em um a um nas partidas decisivas e mais uma sessão de pênaltis, o Atlético Acreano, time do segundo distrito de Rio Branco, ganhou o direito de levar a taça para guardar nas suas vitrines.

Eu pensei em dizer que o título ficou em boas mãos. Acabei dizendo mesmo, mas depois me dei conta do quanto esse pensamento representa uma obviedade. O título sempre fica em boas mãos. O título significa que, no geral, o time que o conquistou funcionou melhor do que os adversários.

No caso do Atlético, chama a atenção o súbito apetite que o clube adquiriu pelo alto do pódio. Fundado em 1952, o Galo conquistou apenas cinco títulos na época do amadorismo, regime que perdurou até o ano de 1988. O time que se veste de azul ganhou em 1952, 1953, 1962, 1968 e 1987.

Na era profissional, o Atlético precisou de três tentativas para levantar o seu primeiro caneco. Depois de o Juventus vencer os campeonatos de 1989 e 1990, o glorioso Galo do segundo distrito chegou à sua conquista inaugural, com um time que alinhava craques como Paulinho, Dim, Ley e Joãozinho.

Depois disso, o clube passou por uma série de percalços do ponto de vista da organização, com erros sucessivos dos seus dirigentes. E assim, o segundo título profissional só veio 25 anos depois, em 2016. Mas aí o Galo tomou gosto pela coisa. E agora venceu três dos quatro últimos campeonatos.

Ao vice-campeão Galvez, por seu turno, deve-se dar todos os méritos. Fundado em 2011, o Imperador rapidamente se transformou num time extremamente competitivo. Já chegou à finalíssima em três oportunidades (2015, 2018 e 2019). Está batendo na trave. Uma hora a bola vai entrar.

Agora é hora de virar a chave. Tudo é vertigem. O tempo não para e a bola segue o seu ritmo. O Atlético nem vai ter tempo para comemorar. Na sexta-feira já pega a estrada para encarar outra pedreira. O Galo vai ao interior do Rio de Janeiro para estrear na série C contra o Volta Redonda.

O Galvez idem. No dia 4 de maio o Imperador vai encarar o rondoniense Real Ariquemes, pela série D. Menos mal que a estreia vai ser em casa e, dessa forma, dá para fazer o elenco descansar antes de iniciar mais um desafio. O Galvez vai tentar de novo o seu primeiro título profissional.

É isso. Como eu disse umas linhas atrás, tudo é vertigem e nem o tempo e nem a bola podem parar. O campeão acreano parte em busca de novos triunfos. O título estadual de 2019 ninguém esquecerá. Seguirá para sempre na história do clube. Mas já é chegada a hora de uma nova conquista!

– Abril de 2019 –


Francisco Dandão

Neste final de semana começa mais um campeonato brasileiro da primeira divisão. Quatro das cinco regiões do país tem representantes na competição: Sudeste (10 times), Sul (cinco), Nordeste (quatro) e Centro-Oeste (um). Nenhum time da região Norte, a de menor recursos financeiros.

Aos clubes da região Norte são reservados os torneios das séries C e D. No caso, a terceira e a quarta divisões nativas. Evidentemente, todos podem, dependendo dos seus desempenhos, um dia subir os degraus. Isso, porém, é tão difícil quanto raios caindo no mesmo lugar a cada tempestade.

É justamente por conta da questão dos recursos financeiros que os times das regiões Sudeste e Sul são tidos como favoritos para conquistar o título da série A depois dos oitos meses de disputa previstos. Quem tem mais dinheiro garante melhor estrutura e jogadores mais qualificados no elenco.

No topo dessa pirâmide de favoritos se destacam pelo menos cinco nomes: Palmeiras, Flamengo, Cruzeiro, Grêmio e Internacional. Os dois primeiros gastaram uma grana preta para montar os respectivos elencos. Os outros três fizeram exibições de encher os olhos nos primeiros meses do ano.

Alguns, como o Atlético Paranaense, o Santos, o São Paulo e o Corinthians podem, eventualmente, surpreender e furar essa lista de favoritos aí do parágrafo anterior. São todos times tradicionais e donos de torcidas apaixonadas. Precisam sempre se superar. Mas só mesmo eventualmente.

Enquanto isso, virando a tabela de classificação de cabeça para baixo, nas diversas bolsas de apostas também se elegem aqueles times que, teoricamente, não tem chance alguma de levar a taça pra casa. E que, assim sendo, devem atravessar a temporada brigando para não serem rebaixados.

Entre estes que, na teoria, deverão lutar para não cair, são incluídos todos os representantes das regiões Centro-Oeste e Nordeste. Com menos capacidade de investimento, o que mais almejam CSA (AL), Bahia (BA), Fortaleza (CE), Ceará (CE) e Goiás (GO) é permanecer na divisão de elite.

Evidentemente, tudo isso de favoritos ao título e candidatos ao rebaixamento não passa de mera especulação. Futebol não é uma ciência exata. Há muito aquele animal de pele zebrada deixou a África para passear pelos campos do mundo. E quando a bola rola a lógica pode ir pelo ralo.

O certo é que 20 destinos se entrelaçam nos estádios brasileiros a partir deste final de semana. O futebol ainda é a grande festa do povo. Quando o time do coração entra em campo, todo o resto, da reforma da Previdência às hecatombes da natureza, fica em segundo plano. É isso. Tão somente isso.

– Abril de 2019 –


Francisco Dandão

Começou com um tropeço a caminhada do glorioso Atlético Acreano na série C do campeonato brasileiro. O Galo foi ao interior do Rio de Janeiro e levou uma sapecada de 3 a 0 do Volta Redonda. Os ares da Cidade do Aço não fizeram bem ao elenco atleticano. E quando os ares não fazem bem…

Mas antes que digam que a vaca do Atlético já aponta para o rumo do brejo, deve-se lembrar que o time acreano nunca foi um visitante assim tão indigesto. No ano passado, é certo que o Galo estreou com vitória (1 a 0 no Clube do Remo). Mas aquela estreia foi em casa, na Arena da Floresta.

Quando o Galo alçou voo para o primeiro compromisso fora do Acre, em 2018, também tropeçou feio. Pegou de 3 a 1 do Santa Cruz, em Recife. Além disso, em dez partidas jogadas nos campos adversários, foram apenas duas vitórias ao longo do ano: 3 a 1 no Salgueiro (PE) e 1 a 0 no ABC (RN).

Lembro esses números na crônica para dizer que não é o fim do mundo sair para jogar longe dos próprios domínios e levar um pau feio. O mais importante, em torneios com jogos de ida e volta, é vencer na condição de mandante. Perder em casa não pode. Até empatar pode ser muito ruim.

Além do mais, pra falar a verdade, é coerente dizer que o Atlético ainda é um time em formação. Entre o campeonato acreano e a série C perdeu o Careca, o cara que pensava o jogo no meio do campo. E ainda não estreou o seu maior reforço, o Doka Madureira. Sem falar na volta do Polaco.

Há quem diga que também pode pintar a qualquer hora com a camisa do Galo uma dupla de zagueiros argentinos. Quem me disse isso foi o Joraí (o jogador que mais marcou gols contra na história do futebol acreano, com a camisa do Andirá, na época do futebol amador, nunca é demais lembrar).

O Joraí, que nos últimos tempos do Stadium (assim mesmo em latim) José de Melo era chefe de uma torcida chamada de Tesouras do Vietnam (os caras cortavam até minuto de silêncio), disse que o Geison Morais, diretor celeste, esteve em Buenos Aires pra esse fim: contratar reforços para o Galo.

Ainda repliquei ao Joraí que o Geison foi à capital argentina de férias, praticar uns passos de tango na Calle Florida, provar o churrasco de Puerto Madero, tomar um vinho esperto nas bodeguitas de El Caminito e conhecer La Bombonera. Mas o Joraí me disse que isso não passava de papo furado.

Nunca vi o Joraí mentindo (pouco). Mas tenho minhas dúvidas sobre a chegada desses zagueiros argentinos. De qualquer forma, com ou sem esses tais reforços portenhos, no meu entendimento o Galo vai começar a escalada no próximo domingo, em casa, contra o Ypiranga (RS). Eu acredito!

– Abril de 2019 –


Francisco Dandão

Se tem uma coisa que passa como um raio, essa coisa se chama tempo. E cada vez que a gente vai envelhecendo, parece que ele (o tempo) se desloca numa velocidade mais e mais alucinante. Dessa forma, não raro a gente se pega lembrando de alguma coisa que aconteceu há muitos anos (ou décadas).

Essas reflexões me ocorrem por conta do aniversário de 22 anos da maior conquista do futebol acreano, que ocorre neste sábado (4 de maio): a Copa Norte de 1997, vencida pelo Rio Branco, decidida em jogos de ida e volta contra o Clube do Remo. O primeiro jogo no Acre e o segundo no Pará.

Aquela Copa Norte, a primeira, foi disputada por dez clubes, divididos em dois grupos. No Grupo A ficaram Remo e Tuna Luso (PA), Imperatriz (MA), Ypiranga (AP) e 4 de Julho (PI). O Grupo B foi formado por Rio Branco e Independência (AC), Ji-Paraná (RO), Nacional (AM) e Baré (RR).

Após a primeira fase da disputa, o Remo venceu o Grupo A com quatro vitórias em igual número de jogos: 2 a 0 no 4 de Julho, 2 a 0 no Ypiranga, 4 a 1 na Tuna Luso e 2 a 0 no Imperatriz. Dez gols marcados e somente um sofrido. Saldo de nove. Artilharia pesada e defesa seguríssima.

Já o Rio Branco, o famoso Estrelão, empatou um e venceu três dos seus jogos na primeira fase: na estreia não saiu do zero, com o rondoniense Ji-Paraná, mas venceu em seguida o roraimense Baré por 1 a 0, o também acreano Independência por 1 a 0, e o amazonense Nacional por 4 a 1.

Como o Remo tinha melhor campanha, ganhou o direito de jogar a segunda partida da decisão nos seus domínios. Veio então o primeiro jogo, no Acre, e o placar registrou um empate em zero a zero. Tudo levava a crer que vencer em Belém seria barbada. Pelo menos os paraenses acreditavam.

Foi nesse ponto que os deuses do imponderável resolveram interferir. E assim, em pleno Mangueirão, no dia 4 de maio de 1997, o Estrelão de todas as glórias passou por cima do Leão azulino, vencendo por 2 a 1, com gols de Palmiro e Venícius. Contra todos os prognósticos deu Rio Branco em Belém.

Até esse ponto da crônica, porém, eu não disse nada que ninguém já não soubesse. O que provavelmente poucos sabem foi o que aconteceu na noite anterior ao confronto entre estrelados e azulinos, quando o treinador do Rio Branco, o mago Marcelo Altino, desapareceu por algumas horas.

Em princípio, se imaginou que o mago teria ido descontrair numa boate chamada Lapinha. Alguém foi até procura-lo no local. Ele não estava lá. Quando voltou ao hotel, o mago explicou que havia ido rezar na Catedral de Nossa Senhora de Nazaré. E ainda jurou por Deus que foi isso mesmo.

– Maio de 2019 –


Francisco Dandão

O fim de semana do futebol acreano foi um daqueles para ser esquecido rapidinho. Daqueles em que se deve passar uma borracha. Daqueles que não podem ser repetidos, sob pena de todos os clubes do estado que disputam os campeonatos nacionais afundarem num buraco negro.

A avalanche de maus resultados começou no sábado, quando o Galvez perdeu por 3 a 2 para o rondoniense Real Ariquemes, em plena Arena da Floresta. O time acreano ficou na frente duas vezes. Fez um a zero, sofreu o empate. Fez dois a um, sofreu o empate. Aí sofreu a virada nos acréscimos.

Eu assisti ao jogo nas proximidades do banco de reservas dos visitantes. No momento em que eles chegaram ao segundo empate (2 a 2), o resultado já se lhes configurava satisfatório. Tanto que os reservas faziam sinais para os que estavam em campo sobre o tempo de jogo que faltava.

No meu entender, ninguém do Ariquemes esperava sair com a vitória, principalmente depois de o time levar um gol antes de completado o terceiro minuto de jogo. Naquele momento, eu penso que todos os presentes ao estádio imaginaram que o Galvez ia ganhar fácil, talvez até de goleada.

No dia seguinte quase que a história se repete com o Atlético. O Galo fez um gol no comecinho do jogo. O Ypiranga-RS parecia assustado. E, a rigor, não apresentava nada que pudesse sinalizar para o endurecimento da partida. Ledo engano. Os caras empataram e quase que chegam à vitória.

Tudo bem que a arbitragem foi uma lástima. O árbitro que veio de São Paulo deu a entender que não tem praticamente nenhum conhecimento das novas regras. Expulsou o goleiro do Galo quando deveria só adverti-lo. E a bandeirinha “marcou” um pênalti numa falta ocorrida “bem” fora da área.

Independente de tudo isso, porém, é certo que faltou ao Atlético algum poder de definição. Se o Galo jogasse 45 minutos com a mesma intensidade que começou, teria goleado fácil o time gaúcho. E aí, com a fatura liquidada, poderia ter passado o segundo tempo só de “migué”, só administrando.

Mas o pior ainda estaria por vir. E veio. O Rio Branco foi ao interior de Rondônia e perdeu para um time sem goleiro. Explico: um jogador de linha do Barcelona de Vilhena teve que ir para o gol porque os contratados da posição não estavam regularizados. E ainda assim o Estrelão perdeu!

No fritar dos ovos (desde a morte do Jânio Quadros ninguém diz mais “frigir dos ovos”, viu?), dos nove pontos disputados no final de semana pelos times acreanos, tão somente um ficou na antiga terra das seringueiras. Se continuar assim, caríssimos considerados, não vai ter fundo nesse poço.

– Maio de 2019 –


Francisco Dandão

Depois de um fim de semana para ser esquecido, conforme eu disse na crônica anterior, o futebol acreano entra em campo em busca dos primeiros resultados positivos nos campeonatos brasileiros das séries D e C. O Galvez e o Rio Branco perderam e o Atlético só empatou na semana passada.

A obrigação de um time que perde em casa, como foi o caso do Galvez, é recuperar os pontos perdidos em outras paragens. Assim, o Imperador vai tentar surpreender o Manaus, neste sábado, em plena capital amazonense. A tarefa não é impossível. Mas que é complicada, isso ninguém pode negar.

O técnico do Galvez, o competente Zé Marco, conhece muito bem o futebol do Amazonas. Certamente já está pensando em armar algum tipo de arapuca para pegar o Manaus desprevenido. Uma tática que eu sempre recomendo é aquela do falso morto que baba de vontade de jantar o coveiro.

Por via das dúvidas, é bom também não deixar ninguém que vai entrar em campo comer jaraqui no almoço (a não ser que o sujeito tenha a aspiração de fixar residência por lá). Menos ainda usar pimenta murupi para dar gosto na comida. Pimentinha braba é essa murupi. Quem come, cospe fogo!

Enquanto isso, no domingo, na Arena da Floresta, o Rio Branco pega o Fast louquinho para somar os seus primeiros pontos. O time amazonense venceu o São Raimundo (RR) no primeiro jogo, em casa. O Estrelão perdeu para o Barcelona (RO) fora de casa. Este sem um especialista no seu gol.

Levando-se em conta esse detalhe peculiar do atleta de linha que jogou no gol do Barcelona, a principal providência do Rio Branco para o próximo confronto é exigir que o Fast jogue com um goleiro de verdade. Se o Fast chegar sem um goleiro de origem, o Estrelão não deve entrar em campo.

Ou então, caso a CBF teime em realizar do jogo, mesmo que o goleiro do Fast seja um zagueiro, o jeito vai ser o Rio Branco escalar no gol um não especialista. Não sei quem iria para o gol do Estrelão num caso desses, mas o meu voto vai para o diretor Getúlio Pinheiro: 1,55 m de puro reflexo!

Por último, o Atlético vai a Varginha encarar o Boa Esporte. Ambos perderam na estreia e empataram depois. O Boa perdeu para o Remo e empatou com o Volta Redonda. O Atlético perdeu para o Volta Redonda e empatou com o Ypiranga. Os critérios, porém, deixam o Atlético para trás.

Em Varginha, no meu entender, o maior perigo que o Atlético vai ter que enfrentar, muito mais do que a artilharia do time mineiro, são os extraterrestres que costumam aparecer por aquelas bandas. Driblando os ETs, eu acredito que o Galo acreano tem tudo para voltar pra casa feliz!

– Maio de 2019 –


Francisco Dandão

Dividi minha atenção nesse jogo de domingo passado, do Rio Branco com o Fast, na Arena da Floresta, entre o que acontecia em campo e o desempenho do técnico do time visitante Aderbal Lana, um mineiro de Uberlândia que se mudou para a região Norte do país na década de 1980.

Aderbal Lana, aos 72 anos, é uma dessas lendas vivas do futebol amazonense. Já dirigiu tudo que é time grande de Manaus. E teve também experiências no futebol mineiro, goiano e mato-grossense, andando até pela Arábia Saudita. Um gentleman bom de discurso e de olhar pra lá de arguto.

Na beira do campo, Lana fala o jogo inteiro, orientando o posicionamento do time e incentivando os seus jogadores. Nesse grupo atual do Fast, percebi que o jogador com quem ele mais fala é o meia Willian Sarôa. Talvez pela boa técnica e pela larga experiência do dito cujo.

Depois do jogo, troquei algumas palavras com o Lana. E fiquei agradavelmente surpreso com o fato de ele conhecer o meu trabalho. Disse que lê as minhas crônicas nos sites. Mas não tivemos muito tempo para conversar. E assim ficamos de nos encontrar qualquer dia para esticar o papo.

No que diz respeito ao jogo… Que jogo ruim. Desse eu preferia nem falar. Passar uma borracha, deletar, deixar pra lá. Pense num jogo ruim, multiplique por três ou quatro… Pensou? Multiplicou? Pois acredite, meu leitor amigo, ainda assim você não consegue imaginar o que aconteceu.

O Rio Branco, pelo meu julgamento e observação, passou a ideia de que reuniu os jogadores apenas momentos antes da partida. Os caras, apesar do esforço (não se pode reclamar desse aspecto), não se encontram dentro do campo. Parece que não se conhecem e que cada um joga só por si mesmo.

Aliás, essa opinião não é somente minha. O cronista Paulo Henrique Nascimento chegou a dizer para um torcedor que esse time atual do Rio Branco é tão fraco que nem todos os torcedores se ajoelhando um mês em cima de caroços de milho, como penitência, nem isso resolve a parada.

No meu entendimento, a Série D desse ano já acabou para o Rio Branco. Nem tanto pelos pontos que ainda faltam disputar (matematicamente não tem nada perdido), mas pelo que o time não jogou neste compromisso recente contra o Fast. Não vi nada que pudesse me dar alguma esperança.

A situação se configura tão periclitante que até o Ari Nauá, vencedor da primeira corrida pedestre disputada no Acre, que não perde um só jogo, com ou sem chuva, torcedor fervoroso de todos os times do estado, já jogou a toalha. “Professor, não tem reza de padre velho que dê jeito”, disse-me ele.

– Maio de 2019 –


Francisco Dandão

Mais um fim de semana com jogos dos times do Acre nas séries D e C do Brasileirão. Das três equipe acreanas envolvidas nessas competições, nenhuma venceu ainda. O Galvez perdeu as duas que jogou. O Rio Branco perdeu uma e empatou outra. E o Atlético perdeu uma e empatou duas.

Campeonato de “tiro curto” (apenas seis partidas na primeira fase), a série D praticamente não dá chances ao time que demora a encaixar o seu jogo. Nesse sentido, tanto o Galvez quanto o Rio Branco podem se despedir das suas participações se não lograrem êxito nos próximos compromissos.

Nenhum dos dois terá vida fácil. O jogo do Galvez, lá em Macapá, tem ares de vida ou morte também para o adversário. Da mesma forma que o time acreano, o amapaense Santos também perdeu as duas partidas que jogou. Só está na frente do Galvez porque tomou menos gols (quatro contra oito).

Até um empate será muito ruim para ambos. Equivaleria a uma morte de braços dados, uma vez que os outros times da chave, o Manaus e o Real Ariquemes, somam seis pontos nas duas rodadas disputadas. Então, por isso, como diz o filósofo, “vai feder a chifre queimado” no marco zero do mundo.

Na semana passada, quando o Galvez foi jogar em Manaus, eu dei a dica: ninguém da delegação deveria almoçar jaraqui, nem comer pimenta murupi. Fiquei sabendo que os jogadores não deram a mínima para a minha advertência. Deu no que deu. Agora o conselho é que se evite a Fazendinha.

A Fazendinha é uma praia a 16 Km de Macapá. Um espaço pra lá de aprazível, banhado pelo rio Amazonas, onde se come o melhor camarão de água doce do mundo. E, se o sujeito for chegado a uma loura gelada, lá pelas tantas pode se surpreender rodopiando ao som de um autêntico carimbó.

Quanto ao Rio Branco, o meu palpite é que o time da estrela rubra vai ter que lamber sabão para dobrar o roraimense São Raimundo. A equipe de Roraima, apesar de ter perdido para o Fast na estreia, fez valer o fator campo no seu segundo compromisso e sapecou uma goleada no Barcelona (RO).

Pelo visto até aqui, o São Raimundo tem um ataque poderoso. Sem contar o boato de que foram contratados artilheiros recém chegados da Venezuela, gente capaz de acertar um mosquito a cem metros de distância. O goleiro rubro Edivandro vai ter que entrar concentrado até a medula.

E por último, tem o Atlético, que pega o gaúcho São José, domingo, no Florestão. Com o empate no jogo anterior, contra o Boa Esporte, em Minas Gerais, o Galo acreano saiu da lanterna do grupo B da série C. Mas ainda precisa pontuar para ganhar posições. A hora pode ser agora. Pode sim!

– Maio de 2019 –


Francisco Dandão

Quem vê o jeitão tranquilo do representante comercial Alzerino Paiva, mais conhecido no meio do futebol pelo apelido de Azeitona, nem imagina o quanto de títulos ele já conquistou na vida. Eu mesmo, que vivo entrevistando antigos ídolos do esporte acreano, não tinha noção disso.

Só vim a descobrir na semana passada quando o encontrei por acaso numa farmácia do bairro do Bosque, em Rio Branco, na minha recente visita à capital acreana. Entabulamos uma conversa sobre os “antigamentes” e eis que, lá pelas tantas, ele começou a narrar as próprias conquistas.

Devo confessar que eu fiquei deveras surpreso. Eu sabia que o Azeitona havia vestido três camisas ao longo da sua carreira: Ponte Preta (infantil), Atlético (juvenil) e Amapá (time principal). Mas que ele havia levantando inúmeros troféus, isso eu juro que absolutamente não sabia.

Aliás, a bem da verdade, eu tinha conhecimento de que o Azeitona só não virou um desses craques consagrados do futebol acreano porque teve o azar de encontrar o técnico Té quando estava estourando a idade para jogar no time juvenil. É que o treinador não gostava muito de escalar promessas.

Antes do professor Té chegar para treinar o Atlético, o time celeste do segundo distrito de Rio Branco era dirigido pelo também professor Fuzarca. Este gostava do futebol do Azeitona e vivia chamando o lateral para compor o banco de reservas. Chegou até a levá-lo em algumas excursões ao interior.

Mas o certo é que o Azeitona foi posto de lado assim que o professor Fuzarca pediu o boné da direção técnica do Galo. E aí quem ganhou na festa foi o Amapá, onde o Azeitona jogou de 1976 a 1984. Levado para o Diabo Laranja pelo Toniquim, o Azeitona jamais teve a titularidade ameaçada.

Foi no dito Amapá, inclusive, que o Azeitona começou a sua coleção de títulos. Vejam só: tricampeão da divisão de acesso, tricampeão do torneio do Dia do Trabalho e pentacampeão do Torneio da Imprensa. “Só isso aí” já o obrigou a construir uma estante nova para exibir as taças e medalhas!

Mas o homem tinha fome de títulos. Depois do Amapá, disse-me ele, vieram mais dois “importantes” títulos futebolísticos: campeão municipal no Quinari, pelo Bangu do Darci Silva, e campeão num torneio na Colônia Souza Araújo (Leprosário), defendendo o Grêmio do João Aleijadinho.

E se alguém pensa que acabou, engana-se redondamente. Fora dos gramados o Azeitona ainda levantou os seguintes títulos: pentacampeão do carnaval pela Escola de Samba do Bairro 15, campeão também do carnaval pelo Juventus e heptacampeão de dominó na pelada do Bancrévea… É mole?

– Maio de 2019 –


Francisco Dandão

No futebol acreano do passado, décadas de 1960 e 1970, poucos artilheiros foram tão competentes quanto o atacante Danilo Galo. Veloz, rompedor e de chute fortíssimo, ele era um perigo para as defensivas adversárias. E fora tudo isso, ele era daqueles que a bola batia nele e entrava.

Já em 1958, quando ele mal havia completado 14 anos, ao participar de uma “peneira” no Vasco da Gama, foi logo marcando gols no time titular. Ele foi para a tal “peneira” com um bando de garotos do bairro 6 de Agosto. Somente ele foi aprovado. E aí ganhou o seu primeiro par de chuteiras.

Daí até encerrar a carreira, em 1978, Danilo vestiu outras quatro camisas: Rio Branco, Independência, Atlético Acreano e Andirá. No Tricolor do Marinho Monte fez apenas amistosos. É que os dirigentes ficaram enrolando para cumprir o que o artilheiro pediu. Foi embora sem se despedir.

Já no Atlético e no Rio Branco, Danilo viveu momentos de glórias e ainda faturou um bom dinheirinho. Apesar de o futebol acreano não ser profissional à época, os contratos existiam e também eram dados empregos públicos para os jogadores. E ainda tinha o “bicho” por cada vitória.

Mas o Danilo não se notabilizou apenas pelo seu faro de artilheiro. Ele também ficou famoso, assim como o irmão Stélio, lateral-esquerdo do Rio Branco e do Andirá, por não levar desaforo pra casa. Era alguém pisar no seu calo que a porrada cantava no gramado do vetusto estádio José de Melo.

Até hoje é lembrada pelos torcedores mais antigos uma batalha campal entre os jogadores do Vasco e do Grêmio Atlético Sampaio, no campeonato de 1967. O estopim da confusão foi uma frase do Danilo para o goleiro Monteiro. Danilo fez um gol e disse: “Pega, frangueiro”. Aí o pau comeu!

Outra confusão célebre com a participação dele aconteceu num jogo entre Atlético e Rio Branco. Simplesmente brigaram em campo ele, jogando de ponta-direita pelo Galo, e o seu mano Stélio, defensor do Estrelão. Difícil dizer quem apanhou. O que se sabe é que os dois foram expulsos de campo.

Pra vocês terem uma ideia de como o Danilo era brabo, lá pelas tantas o comentarista Raimundo Nonato “Pepino” passou a chama-lo de “cavalo batizado”. Foi isso, aliás, que fez o Danilo Galo largar a bola, a pedido de uma filha dele, que por conta do apelido passou a sofrer gozações na escola.

Sim, antes que acabe o meu espaço, preciso explicar a razão do epíteto “rei dos galos”, ressaltando que isso não teve/tem nada a ver com o futebol. É que o artilheiro toda a vida foi apaixonado por galos de briga. Tanto que até hoje, embora não dispute mais rinhas, ele segue criando os seus galinhos!

– Maio de 2019 –


Francisco Dandão

Subo e desço as ladeiras do centro histórico de São Luís por esses dias. Fachadas antigas, azulejos e pequenas lojas de artesanato fazem a festa dos turistas. Apesar de a cidade parecer meio abandonada, longe do zelo com que foi cuidada um dia, ainda assim é um raro prazer circular por aqui.

Além do mais, para quem gosta de música regional, o centro histórico é um lugar mais do que perfeito. Em praticamente todos os restaurantes da área o que se ouve são animadas toadas de boi. A gente come embalado pelo som de uma turma de maravilhosos artistas. Papete está em todos os cantos!

Como eu sou uma criatura ligada ainda a uma forma de consumo tradicional (mas não sou, necessariamente, tecnofóbico, viu?), aproveitei pra encher a mochila com CDs de músicos e cantores maranhenses. César Teixeira, Erasmo Dibell, Adelino Nascimento, Antenor Bogéa… Muitos!

Eu devo ser um dos últimos consumidores de CDs do mundo… Agora tudo pode ser encontrado e baixado na internet… O vendedor da lojinha que eu encontrei no Centro Histórico certamente percebeu esse meu costume jurássico… E tentou me empurrar a loja toda… Tive que segurar o bolso. Rs.

No que diz respeito ao futebol nosso de cada dia, o time mais discutido por aqui atualmente nas rodas de conversas dos torcedores é o Sampaio Correa, conhecido pelo epíteto de Bolívia Querida. As cores do uniforme do Sampaio (vermelho, amarelo e verde) são as mesmas da bandeira boliviana.

O time lidera o Grupo A do Campeonato Brasileiro da Série C. Venceu três das cinco partidas jogadas até aqui. Marcou 10 gols e sofreu cinco. Fora isso, acabou de duelar com o poderoso Palmeiras pela Copa do Brasil. Perdeu duas vezes. Mas conseguiu engrossar ambos os jogos. Tá bem na fita!

Com todos os torcedores que eu tive contato percebi a convicção de que o Sampaio Correa vai voltar para a Série B no próximo ano. Quer dizer: percebi a convicção, vírgula, é o que eles dizem mesmo. Embora ainda falte muito campeonato da Série C pela frente, ninguém duvida que o time suba.

Quanto aos ídolos do passado, o mais lembrado chama-se Canhoteiro. Era um ponta-esquerda baixinho, veloz e driblador que chegou a jogar no São Paulo e até na seleção brasileira, na década de 1950. Dizem que era o Garrincha canhoto. Pelé o tinha como ídolo. No Maranhão é quase um santo.

Por último, antes que alguém diga que eu não falo de flores, devo esclarecer que vim a São Luís participar do congresso Nordeste da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. O assunto sobre o qual falei foi o lirismo e o humor na crônica esportiva brasileira. É isso aí!

– Maio de 2019 –


Francisco Dandão

O genial cronista Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto, no batismo), carioca da gema, falecido nos idos da década de 1960, tinha uma frase emblemática quando queria dizer que alguém andava de mal a pior. No dizer dele, aquele referido alguém estava “mais por baixo do que tapete de porão”

Depois dos últimos resultados do campeonato brasileiro da Série D, eu não pude deixar de fazer uma analogia entre a frase do Stanislaw/Sérgio e os representantes do futebol acreano na competição. O Rio Branco e o Galvez foram eliminados antes mesmo da última rodada da primeira fase.

O Rio Branco, então, pelo amor de Deus… O Estrelão perdeu quatro das cinco partidas disputadas. Só empatou uma, meio que “no bambo”, jogando em casa, contra o amazonense Fast. Pior do que isso: foi goleado duas vezes (São Raimundo-RR 6 a 1 e Fast-AM 5 a 0). Uma vergonha!

Seguramente esse é o pior time que o Rio Branco montou na era do futebol profissional acreano. Independentemente da vontade que os atletas demonstram durante os jogos, é certo que alguns deles não conseguiriam vagas nem nas equipes mais ruins que disputam o campeonato do Calafate.

Antes do início da competição, aliás, o cronista Paulo Henrique Nascimento já havia me dito de que nem que os torcedores ficassem ajoelhados dois dias sobre caroços de milho, ainda assim o Estrelão não ganharia de ninguém. Pensei que era exagero dele. Mas vi que não era não.

E por falar nisso, acho que devo retificar o que eu disse dois parágrafos atrás, quando afirmei que esse é o pior time montado pelo Rio Branco na era do futebol profissional. Melhorando o meu pensamento, acho que esse é o pior time da história desse clube que já deu muitas glórias ao futebol acreano.

Eu sei que os problemas financeiros do clube são terríveis. Sei também que os atuais dirigentes não tem nada a ver com a estupidez de quem os precedeu. Mas e daí? Era preciso ter bom senso para perceber que não tinham como montar um bom time. O Estrelão é muito grande para tanta vergonha.

Por outro lado, se não se pode afirmar que o Galvez deu vexame, pode-se dizer que decepcionou. Ao deixar de fazer o dever de casa, não vencendo as suas partidas na Arena da Floresta, condição obrigatória para disputas no sistema de ida e volta, o time militar se despediu precocemente do game.

Não sei bem o que aconteceu com o Galvez. Olhando nome por nome, constata-se que vários jogadores de qualidade fazem parte do elenco do time. Talvez tenha faltado foco, talvez a concentração não tenha sido a necessária, talvez tenha faltado um psicólogo… Sei lá… Haja tapete de porão… Haja!

– Junho de 2019 –


Francisco Dandão

Não é pra qualquer um chegar aos 100 anos de vida. O mesmo se aplica às entidades. Para um clube de futebol, então, chegar ao centenário se constitui numa verdadeira façanha. São tantos os percalços no meio do caminho que muitos fecham as portas bem antes de atingir essa marca.

O Rio Branco Futebol Clube, tradicionalíssima agremiação do futebol acreano, entretanto, é um desses, digamos, sobreviventes e resistentes ao passar do tempo. Fundado em 8 de junho de 1919 por um grupo de desportistas apaixonados por futebol, o Estrelão continua na estrada.

Pelo que consta nos registros históricos, tudo começou quando um advogado amazonense de nome Luiz Mestrinho Filho, que estava na capital acreana para presidir um inquérito na agência dos Correios, chamou para uma reunião uma turma de notáveis do então Território Federal do Acre.

A tal reunião, ainda de acordo com os registros, foi realizada no Éden Cine Theatro, antecessor do Cine Theatro Recreio (de saudosa memória), com a presença, entre outros, dos senhores Mário de Oliveira, Conrado Fleury, Pedro Feitosa, Nathaniel de Albuquerque e Francisco Lima e Silva.

No mesmo dia da fundação já foram definidas as cores do clube (vermelho e branco) e escolhido o primeiro presidente (Nathaniel de Albuquerque). O clube também ganhou rapidinho um terreno, doação do prefeito Augusto Monteiro. Ou seja, já nasceu organizado e grande.

É certo que o ano do centenário do alvirrubro da Avenida Getúlio Vargas não tem sido assim tão glorioso. O time tem amargado uma série de derrotas, a começar pela perda da vaga na Copa do Brasil de 2020, passando pelo desastre que foi a participação no campeonato brasileiro da Série D.

Além do mais, como se todas as maldições do mundo tivessem resolvido cair sobre as cabeças dos riobranquinos, o clube acumulou uma dívida gigantesca na justiça do trabalho, fruto de gestões equivocadas nos últimos anos. E até a sede social suntuosa veio abaixo no centro da cidade.

Mas em contraponto com essas desgraças, que eu torço para ser superadas o mais rápido possível, é producente lembrar às aves de mau agouro que profetizam o fim do clube as tantas conquistas que esse clube já teve. Só de campeonatos profissionais somam 16 as conquistas do Estrelão.

E sem falar, mas já falando, daquela primeira Copa Norte, em 1997, que o Rio Branco tomou do Clube do Remo em pleno Mangueirão. Por tudo isso, e por muitas outras “coisitas” mais, eu estou no grupo dos que acreditam existir uma luzinha brilhando no fim do túnel do clube. Parabéns, Estrelão!

– Junho de 2019 –


Francisco Dandão

Quem acompanhou o futebol acreano da década de 1980 e início dos anos de 1990 lembra bem do volante Gilmar Sales Bento. Com a camisa número cinco às costas, ele impunha respeito à frente dos zagueiros das equipes que defendeu (Atlético, Independência, Rio Branco e Juventus).

O que pouca gente sabe, entretanto, é que o Gilmar, quando adolescente, nem por um momento pensou em se tornar jogador de futebol. Nascido e criado no bairro da Base, no centro de Rio Branco, o negócio dele era pescar de tarrafa e bater peladas nos campinhos da periferia da cidade.

Tanto que ele não chegou a procurar nenhum clube para se iniciar na profissão. Ele disputava um campeonato de subúrbio, vestindo a camisa de um time formado pelo radialista Campos Pereira, quando este último entendeu que a bola do volante era grande demais para ficar escondida.

E então, a partir dessa percepção do radialista é que Gilmar foi levado direto para se integrar à seleção acreana de juniores que disputaria o campeonato brasileiro da categoria em 1979. Ele chegou e já foi logo barrando o então titular da posição, o seu futuro parceiro Edson Izidório.

Depois disso, todos os grandes clubes locais passaram a disputar o futebol daquele jovem ex-pescador. E aí ele passou a ganhar a vida com os pés, adquirindo, ao longo do tempo, fama, emprego e algum dinheiro. Ao voltar do campeonato de seleções, ele já foi direto morar na sede do Galo.

Eu fiquei sabendo dessas coisas todas na minha recente passagem por Rio Branco quando conversei por algumas horas com o Gilmar, na casa de dois andares onde ele mora, em frente à Gameleira. Fiquei sabendo dessas coisas e de muitas outras histórias que ele conta com um sorriso no rosto.

Histórias como a do dia em que ele deu um “cascudo” no goleiro Ilzomar. Eles jogavam no Juventus. Jogo contra o Atlético. E aí, lá pelas tantas, o Ilzomar meteu as mãos na bola fora da área, sem necessidade. Gilmar deu o “cascudo” e disse que depois passou uma semana com medo.

Ou então, a história da comemoração de mais de um mês depois do título pelo Atlético, em 1987. Fazia 19 anos que o Galo não era campeão. Aí o Gilmar se juntou aos irmãos/ponteiros Dim e Ley, botaram o técnico Júlio D’Anzicourt num fusca e saíram tomando todas nos botecos do bairro 15.

E, por último, a história que ele protagonizou em 1998, depois de trabalhar como técnico do Independência. Campeão, ele foi pago com um cheque sem fundo. O cheque bateu e voltou várias vezes na boca do caixa. Gilmar não teve dúvidas: foi lá na sede do clube e sequestrou a taça. Rsrs!

– Junho 2019 –


Francisco Dandão

A vida, todo mundo sabe, é feita de altos e baixos. Dependendo do caso, uns batem e outros apanham. E, às vezes, eventualmente, uns e outros trocam de lugar. Aí os que apanhavam antes passam a ser carrascos daqueles que batiam. Uma sociedade justa está longe do horizonte dos humanos.

O futebol, enquanto espelho da vida, segue o mesmo caminho. Uns batem e outros apanham. Normalmente aqueles que batem são os que não tem intimidade nenhuma com a bola, aqueles que tratam a deusa aos safanões. E os que apanham são os artistas, os caras da supremacia técnica.

Enquanto escrevo, lembro de pelo menos três cracaços do futebol brasileiro que apanharam pra valer dos zagueiros e volantes crueiras durante as suas respectivas carreiras: Pelé (Santos e seleção), o maior de todos; Arthur Zico (Flamengo e seleção); e Reinaldo (Atlético Mineiro e seleção).

Muito cedo os adversários descobriram que só poderiam “tentar” parar Pelé, deus negro de todos os estádios do mundo, se o abatessem na porrada. E foi assim que o rei cansou de ser caçado em campo. A ponto de ser quebrado na Copa de 1966 por um “açougueiro” português chamado Morais.

É bom que se diga, entretanto, que Pelé tinha malícia suficiente para, de vez em quando, mandar um dos seus algozes para o estaleiro. Foi assim, por exemplo, na Copa de 1970, quando o “negão” acertou uma cotovelada no zagueiro uruguaio Dagoberto Fontes. Pelé levava e batia quando podia.

Zico, o Galinho de Quintino, por sua vez, camisa dez da Gávea, ídolo maior de todos os flamenguistas, no auge da carreira sofreu uma entrada criminosa de um zagueiro do Bangu. O Galinho driblava meio mundo quando o “carniceiro” veio e acertou o craque com um pontapé no joelho.

Enquanto isso, no início dos anos 1970, um centroavante surgiu “comendo a bola” no Atlético Mineiro. A bola às vezes é fruto proibido. E, assim, comê-la pode ser considerado crime hediondo. Um dia Reinaldo torceu o joelho. Um outro dia foi quebrado num treino, por um colega.

Agorinha, deixando os exemplos do passado e trazendo os fatos para o tempo presente, outro virtuose da bola tupiniquim serve de alvo para os caçadores de pescoço. Falo de Neymar, que eu considero o maior talento futebolístico surgido no Brasil nos últimos 15 anos. Um craque fora de série!

O Neymar, aqui pra nós, tem levado às raias do absurdo essa coisa do craque que apanha. O cara quase não joga mais de tanto que lhe batem. Só nos últimos dois anos foram três contusões graves, seguidas das respectivas cirurgias. Neymar, pra falar a verdade, agora apanha até fora do campo. Aff!

– Junho de 2019 –


Francisco Dandão

Escrevo na manhã de sexta-feira, algumas horas antes do jogo de abertura da Copa América entre Brasil e Bolívia. Escrevo antes, mas não me passa pela cabeça que os bolivianos poderão impor alguma resistência à seleção brasileira. No meu entender o Brasil tem que golear os “cambas”.

Esse meu entendimento, aliás, é compartilhado por várias pessoas com as quais eu troquei figurinhas nos últimos dias. O meu mano Toinho Bill me disse que “os bolivianos são mais ruins do que sorvete de jiló”. E o Joraí me garantiu que os torneios deles “ainda são disputados com bolas de balata”.

Nas conversas informais, tudo é confiança. Na manhã dessa mesma sexta-feira, quando eu tomava café da manhã numa padaria, ouvi um senhorzinho já passado na casca do alho querendo apostar “quinhentos paus” com um sujeito bem mais jovem. “Dou três gols de vantagem”, dizia o velho.

O jovem estava animado com a proposta do idoso, mas pediu quatro gols de vantagem. “Três gols é pouco. Boliviano é ruim mesmo. E o Brasil está com fome de gols. Os hondurenhos sabem disso muito bem”, disse o jovem. Não vi o final da conversa. Mas acho que eles fecharam a aposta.

Além do mais, o retrospecto histórico é amplamente favorável à seleção brasileira. Desde 1930 até hoje foram 29 partidas disputadas, com 20 vitórias do Brasil, cinco triunfos deles e quatro empates. Detalhe: todas as vezes que eles ganharam a partida foi disputada em La Paz ou Cochabamba.

La Paz e Cochabamba, como se sabe, são cidades perto das nuvens. La Paz está situada a quase quatro mil metros de altitude. E Cochabamba fica a dois mil e quinhentos metros. Alturas impraticáveis para se jogar futebol para quem vive ao nível do mar. A maior arma dos colhas é a altitude.

Sem falar, mas já falando, que houve várias goleadas do Brasil no meio desses 20 triunfos. A maior delas em 1949, no Pacaembu: 10 a 1. Depois teve outras quatro bem expressivas: 8 a 1, em 1953, em Lima; 8 a 0, em 1977, em Cali; 6 a 0, em 1993, em Recife; e 6 a 0, em 2002, em Goiânia.

Ou seja, os bolivianos são fregueses de caderneta da seleção brasileira. E, assim sendo, o Brasil tem obrigação de vencer na estreia dessa Copa América de 2019. Não apenas vencer, como golear. Se não for de goleada, eu vou considerar que a nossa atual seleção também não está com nada.

Enfim, apesar dessa crônica ter sido escrita antes do jogo, eu acredito que não teria melhor adversário do que a Bolívia para a estreia do Brasil nessa Copa América. Depois o Brasil pega a Venezuela, em Salvador, e o Peru, em São Paulo. Um verdadeiro mamão com açúcar esse grupo do Brasil!

– Junho de 2019 –


Francisco Dandão

A Venezuela vive um paradoxo. Enquanto a presidência da República é exercida por um certo “maduro”, os alicerces da sociedade apodrecem. Nas ruas um clima de guerra civil joga irmãos contra irmãos. Não tem comida ou remédios para o povo. E o litro da gasolina custa menos do que o da água.

Quase tudo nesse país sul-americano ruiu em um período muito rápido. Quando eu andei por lá, no final de 2001, apesar de já haver protestos barulhentos contra o então presidente Hugo Chávez (morto em março de 2013), vivia-se muito bem. Nada sinalizava para o caos que viria a seguir.

Era uma época em que o futebol deles andava mais por baixo do que “tapete de porão” (expressão do saudoso cronista carioca Stanislaw Ponte Preta). Quase nenhum venezuelano tinha interesse no jogo dos pontapés. Eles preferiam o beisebol, o boxe, o vôlei, o basquete, o automobilismo…

E talvez justamente por essa falta de interesse dos venezuelanos pelo futebol, tanto os times quanto a seleção de lá viviam pegando goleadas dos seus adversários. Jogar contra a Venezuela era contar com os pontos de maneira adiantada. Perder da Venezuela era tido como verdadeiro vexame.

Desse tempo pra cá, porém, o futebol deles cresceu de maneira exponencial. A popularidade do esporte ainda não é maior do que a do beisebol. Mas já atinge níveis muito próximos. Os venezuelanos aprenderam a jogar bola e não são mais sacos de pancadas de adversários famosos.

O futebol venezuelano melhorou tanto que agora os jogadores nascidos por lá viraram até produto de exportação. Dezenas deles atuam fora do país. Tem gente na Espanha, em Portugal, na Itália, na França, no México, na Inglaterra e até no Brasil (Soteldo, do Santos; e Guerra, do Palmeiras).

Pois é esse renovado e crescente futebol venezuelano que o Brasil vai enfrentar nesta terça-feira (18 de junho), em Salvador, pela Copa América. Eles vem de um empate contra o Peru em 0 a 0, enquanto o Brasil vem de uma vitória “razoável” (3 a 0 é muito pouco) contra os péssimos bolivianos.

A seleção brasileira é melhor, lógico. Nenhuma dúvida quanto a isso. É melhor e deve ganhar com uma boa margem de gols. Mas, para isso, não pode descuidar da concentração e do foco. E precisa jogar mais do que o fez contra a Bolívia. Naquela oportunidade, o Brasil jogou apenas um tempo.

Para completar essa crônica de hoje, quero fazer uma observação sobre as cores da camisa. A dos venezuelanos é deveras bonita. Eles a chamam de “Vino Tinto” (Vinho Tinto). A amarela tradicional do Brasil, como se sabe, é a “Canarinho”. Mas eu gosto mais dessa branca usada contra a Bolívia!

– Junho de 2019 –


Francisco Dandão

Nem tanto ao mar, nem tanto à terra… A seleção brasileira não é o melhor time do planeta quando goleia os hondurenhos da vida. Mas também não se pode dizer que não vale um cocô de gato sob o sol do hemisfério sul quando empata com os conterrâneos de Hugo Chávez e Nicolás Maduro.

A reação da maioria dos analistas e torcedores tende sempre a ser passional. Quase ninguém leva em conta o que foi o jogo em si. O que todo mundo avaliou nesse jogo contra a Venezuela foi o resultado e o fato de que os atacantes do Brasil não conseguiram furar o bloqueio do adversário.

Do meu ponto de vista, eu acho que é preciso considerar tudo. No caso dessa Venezuela com a qual a nossa seleção empatou em zero a zero, na terça-feira passada, deve-se dar algum mérito para eles. Os caras foram muito competentes em fechar a casinha. Escalaram todos os onze na zaga!

Ir ao ataque foi, praticamente, uma ousadia proibida pelo técnico Dudamel. Tinha tanta gente na defesa que uma hora eu pensei que a seleção deles estava jogando com doze. Ferrolho brabo mesmo, daqueles que os zagueiros não tem o menor pudor de mandar a bola para os confins do Judas.

Aliás, pra falar a verdade, o ferrolho dos caras até que foi arrombado, sim senhor. Por três vezes o Brasil chegou às redes da Vinho Tinto (alusão à cor da camisa da seleção venezuelana). Mas aí entrou em cena o tal do VAR (Vídeo Assistent Referee, na sigla em inglês) para anular os gols brasileiros.

Sim, os atacantes brasileiros estavam em impedimento em duas das ocasiões… Questão de centímetros… O francês Michel Foucault deve ter exultado lá no seu escritório celestial (ou nos quintos do inferno, tanto faz). Foi ele quem inventou essa história de vigiar e punir, como faz esse VAR.

Mas então, como eu ia dizendo, os analistas já estão afirmando que a seleção não joga nada e que o senhor Adenor Leonardo Bachi (mais conhecido pela alcunha de Tite) deve ser defenestrado do cargo… Aí, pergunto eu: tira o Tite e põe quem no lugar dele? Põe quem, caras-pálidas?

Ou então, que se deixe o Tite desde que ele troque meia-dúzia dos convocados. Aí, pergunto eu de novo: faz uma limpa nos “pernas-de-pau” e chama quem? Qual é o supercraque que ficou fora da seleção. Só o Neymar. Mas esse tá de molho, por não conseguir ainda jogar só com uma perna.

Eu não acho que a seleção tenha jogado tão mal assim contra a Venezuela. Veja-se que o goleiro brasileiro nem suou. Dizem que ele sequer tomou banho após do jogo. É isso que eu penso. Mas posso mudar de ideia, viu? Se o Peru endurecer, aí eu posso dar a mão à palmatória. Deixa estar!

– Junho de 2019 –


Francisco Dandão

Não tenho muita certeza se esse título aí é o mais adequado para falar de um confronto entre as seleções de futebol do Brasil e do Paraguai. Talvez eu tenha lido muito Drummond de Andrade nos últimos dias… E aí, tudo se encaminha para a ideia daquela pedra do poema, no meio de um caminho

É verdade que os paraguaios costumam engrossar o caldo quando jogam contra os brasileiros. Nos últimos quatro confrontos, foram três empates (0 a 0, em 2011, pela Copa América; 1 a 1, em 2015, também pela Copa América; e 2 a 2, em 2016, pelas Eliminatórias da Copa do Mundo).

A vitória por boa margem só veio em 2017, no returno das mesmas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2018. O jogo foi realizado em São Paulo e a seleção brasileira sapecou clássicos 3 a 0. Naquela oportunidade, ressalte-se, o Brasil já estava voando, sob o comando do senhor Tite.

Recuando-se no histórico das duas seleções, o que as estatísticas demonstram é que os jogos entre os descendentes de Cabral (o Pedro, não o Sérgio, viu?) e de Francisco Solano Lopez sempre foram duríssimos. O Brasil leva vantagem, é claro, mas sempre por placares apertadinhos.

Goleadas, mesmo, foram poucas e, provavelmente, circunstanciais. Teve uma de 5 a 2, em Buenos Aires, na Copa América de 1925; outra de 5 a 0, também em Buenos Aires, na Copa América de 1937; e mais outra de 7 a 0, no Rio de Janeiro, na Copa América de 1949… Não foram muitas não.

Sim, faltou contabilizar duas goleadas do Brasil nesse parágrafo anterior. O Brasil meteu meia dúzia de gols a zero nos exportadores de cigarro, uísque e outras bugigangas (tudo falso, é o que se diz). Ambas as vezes em amistosos: no Rio de Janeiro, em 1979, e em Goiânia, em 1980.

É fato, também, que de vez em quando eles produzem um desses craques acima da média. Alguns vieram, ao longo do tempo, gastar a sua bola no Brasil. Lembro de três enquanto escrevo: Gamarra (Inter, Flamengo e Palmeiras), Arce (Grêmio e Palmeiras) e Romerito (Fluminense).

Nessa seleção que vai enfrentar o Brasil, três paraguaios jogam atualmente no país da “grampolândia” (já não se fere com o “ferro”, mas sim com o “grampo”, dizem os analistas políticos do planalto): Gatito Fernandez (Botafogo), Gustavo Gómez (Palmeiras) e Derlis González (Santos).

Gatito é um goleiro de grande frieza e bons reflexos. Gómez é um zagueiro de pouca técnica, mas de raça excepcional. E González é um atacante meio barro meio tijolo. Mas tudo isso, retrospecto e “brasiguaios”, me parece pouco para ser a pedra lá do título. Cebolinha neles, moçada!

– Junho de 2019 –


Francisco Dandão

Depois de jogado todo um turno no campeonato brasileiro da Série C, o glorioso Atlético Acreano encontra-se na incômoda situação de último lugar no Grupo B da competição. Dos 27 pontos disputados, o Galo Azul do Segundo Distrito de Rio Branco contabilizou apenas e tão somente sete.

A nação atleticana, a essa altura dos fatos, vendo o seu time segurando a lanterna do respectivo grupo, deve estar deveras preocupada. Metade da competição já foi para as calendas, sendo que a cada revés do time sempre se tem esperado que a retomada do bom caminho venha no jogo seguinte.

No cerne da questão, eu diria, reside a incapacidade do Atlético de vencer os seus jogos como mandante. Das quatro partidas em casa, o Galo empatou três (1 a 1 com o Ypiranga-RS, 2 a 2 com o São José-RS e 1 a 1 com o Paysandu-PA) e venceu uma (Tombense-MG, 2 a 1). Pouquíssimo!

Diante do abismo imponderável da metafísica que representa uma partida de futebol no momento em que a bola rola, diria o poeta, o time que não soma três pontos quando joga em casa está seriamente fadado ao fracasso. Em casa é preciso atropelar quem quer que apareça pela frente.

Ao que estar por vir, levando em conta que eu só acredito que tudo está perdido quando não tem mais jeito mesmo, eu penso que esse Atlético agarrado à lanterna de hoje tem tudo para fazer um returno diferente, somar os seus pontinhos e espantar o fantasma do rebaixamento para a Série D.

O ponto da virada, aliás, pode ser já neste final de semana, quando o adversário vai ser o Volta Redonda-RJ. Na primeira rodada, no interior do Rio de Janeiro, num dia de arbitragem mais do que duvidosa, o time carioca levou a melhor e fez 3 a 0. O troco, então, viria numa hora providencial.

Eu acho mesmo que esse Volta Redonda é o adversário perfeito para o Atlético iniciar a sua caminhada para fora da zona do rebaixamento. Afinal, além de ganhar aquele jogo lá da primeira rodada, de maneira um tanto esquisita, o time carioca venceu apenas mais uma vez (2 a 0 no Tombense).

Jogando fora de casa, o Voltaço não ganhou de ninguém: perdeu duas vezes (Remo 2 a 1 e Juventude 1 a 0) e empatou outras duas (1 a 1 Boa Esporte e 1 a 1 Luverdense). Não tem sido até aqui um visitante indigesto não. Não é possível que ele vai querer engrossar o caldo justo agora.

Pois então é isso. Que venha o returno da Série C e que o Galo acreano incorpore a ideia de que no seu terreiro é ele quem deve dar as cartas. Da minha parte, eu tenho a esperança de que a luz dessa lanterna que está nas mãos dos atleticanos em breve poderá ser transferida lá para o fim do túnel!

– Junho de 2019 –


Francisco Dandão

Nada é tão ruim que não possa piorar. Às vezes, quando o sujeito pensa que está no fundo do poço, ainda existem mais alguns metros no rumo de baixo. E a impressão que a criatura tinha de que a descida havia chegado ao fim, e que era hora do movimento mudar para cima, não se confirma.

E então, eis que na situação seguinte as coisas correm da pior maneira possível. Nesse momento, os envolvidos podem seguir dois rumos: alguns se enchem de esperança e brios e garantem que passou da hora de iniciar a escalada, enquanto outros ficam esperando o instante de jogar a toalha.

Essas reflexões me vem à cabeça por conta do desempenho do Atlético Acreano no Campeonato Brasileiro da Série C. O Galo passou o primeiro turno no meio de uma tempestade, vencendo uma única partida das nove disputadas. O início do returno se configurava ideal para uma virada.

O que ocorreu, entretanto, é que atrás daquela tempestade do primeiro turno sobreveio outra tormenta de pior intensidade. E o time celeste, que ainda não havia perdido em casa, sucumbiu frente ao visitante Volta Redonda, time do qual não se pode dizer seja essa Brastemp toda não.

Com a derrota para o Volta Redonda, o Atlético passou para a décima primeira rodada da competição ferrenhamente agarrado à lanterna do Grupo B. O time acreano, a essa altura, soma míseros sete pontos em 30 disputados. Alguém tem que avisar ao Galo que a luz para ser boa tem que vir de cima.

Menos mal que os dois adversários diretos na luta do Atlético contra o rebaixamento à Série D também não conseguiram se distanciar na tabela de classificação: o mineiro Boa Esporte só empatou, em casa, com o Clube do Remo; e o mato-grossense Luverdense perdeu do gaúcho Juventude.

O campeonato do glorioso Atlético Acreano, portanto, daqui pra frente, é basicamente contra esses dois times. É jogar num lugar e ficar de olho na distância, onde ocorrem os confrontos desses adversários. Secar mineiros e mato-grossenses agora é tão importante quanto torcer para o Galo.

Ressalte-se que o Atlético vai pegar Boa Esporte e Luverdense em casa. Jogos de vida ou morte. Ganhar desses dois pode evitar uma descida ao inferno. Combates onde o coração deve ser transplantado do peito para o bico da chuteira. Só a condição técnica agora já não é mais suficiente.

Da minha parte, embora eu tenha consciência de que o brejo da vaca atleticana esteja ali bem à vista, espero que a tempestade uma hora chegue ao fim e que não sobrevenha outra tão imediatamente. Com o tempo seco e o céu de brigadeiro, a tendência é que a lama do brejo desapareça. Oxalá!

– Julho de 2019 –


Francisco Dandão

Diz a sabedoria popular que Peru para ser bom tem que morrer de véspera. Se não morrer na véspera, por esse pensamento, estraga a festa. O bicho, de carne apreciada pelos mais diversos comensais, só pega o tempero apropriado se for abatido 24 horas antes. Só assim fica, digamos, comível!

A sabedoria popular, entretanto, não costuma se aplicar ao futebol. Esse Peru que aí está, eliminando gregos, troianos e chilenos, na Copa América, pode sim endurecer (com perdão do péssimo trocadilho) o jogo contra o Brasil na final da competição deste domingo (7), no Maracanã.

Na última vez que as duas seleções se encontraram, no dia 22 do mês passado, deu Brasil fácil: 5 a 0, com o goleiro dos peruanos fazendo lambanças a torto e a direito. Mas aquele momento já passou e, como diz o outro, não é praxe que a história se repita assim de forma tão reiterada.

Daquela pancada que os peruanos levaram na cabeça no jogo da fase de grupos desta Copa América, o mínimo que o técnico deles deve ter compreendido é que não pode enfrentar a seleção brasileira de peito aberto, indo pra cima. Isso se configura em suicídio, morte anunciada etc. e tal.

As seleções da Venezuela e do Paraguai, por exemplo, que cedo compreenderam a sua inferioridade técnica, enfrentaram o Brasil retrancadinhas, com a população dos respectivos países toda na frente das suas áreas. Não passava nem rato ensebado. E o Brasil não fez gols.

O Brasil, aliás, nas duas vezes que ganhou nessa Copa América (foram três vitórias, mas a Bolívia não conta), enfrentou seleções que se mandaram para o ataque. No caso, esse mesmo Peru, já citado alguns parágrafos atrás, e a Argentina. Perderam pela arrogância e pela total falta de respeito.

É claro que no histórico do confronto entre Brasil e Peru nós levamos ampla vantagem. Foram 44 jogos de 1937 até hoje. Desses, a seleção brasileira venceu 31 vezes, marcando 95 gols. Os peruanos venceram míseras quatro vezes, marcando 29 gols. Mas nada disso entra em campo.

O que deve entrar em campo é foco, vontade de vencer e seriedade. A defesa brasileira está zerada até aqui. É uma característica do Tite (assim como da maioria dos treinadores gaúchos) cuidar primeiro do sistema defensivo. A ideia é a de que ninguém perde se não tomar gol. Tem lógica!

Concluindo: o Brasil não vai ter a mesma facilidade que teve na partida anterior contra o Peru. Não vai ter mesmo. O Peru promete endurecer

(ôpa!). Se isso acontecer, eu espero que pelo menos ele não perca a ternura. Já há muita violência nas ruas. Que endureça, mas que seja com ternura!

– Julho de 2019 –


Francisco Dandão

Há 41 anos, no dia 21 de junho de 1978, a seleção da Argentina carimbou seu passaporte para a final da Copa do Mundo realizada no próprio país, ao golear a seleção do Peru pelo placar de 6 gols a 0. Uma vitória maiúscula, não fossem as suspeitas de suborno ao goleiro dos peruanos.

O Peru tinha uma boa seleção naquele mundial. Tanto que havia passado da fase de grupos em primeiro lugar, superando a Holanda, a Escócia e o Irã. Depois, na segunda fase, eles perderam por 3 a 0 para o Brasil. Aí, a Argentina precisava vencer por quatro gols. Venceu de seis. Improvável!

A Argentina à época vivia um regime de exceção, comandada com mão de ferro por uma penca de generais do exército lá deles. Uma ditadura sangrenta que fazia dezenas de vítimas por dia. Para melhorar a autoestima do povo, então, era vital que a Copa ficasse em casa. Nada diferente disso.

Um detalhe revelador daquele jogo é que o goleiro do Peru, um certo Ramón Quiroga, era argentino de nascimento. Então, somando dois mais dois, concluiu-se que rolou uma mala preta por trás das bombas. O futuro se encarregaria de demonstrar que o goleiro peruano “abriu as pernas” mesmo.

A Argentina, portanto, acabou sagrando-se campeã da Copa de 1978, por conta desse subterfúgio, digamos, pouco esportivo. Aí, oito anos depois, no dia 22 de junho de 1986, na segunda vez em que a Copa foi realizada no México, novamente os argentinos venceram por conta de uma fraude.

Dessa vez, o recurso usado pelos argentinos foi um gol feito com a mão, por ninguém menos do que o famigerado anão Maradona. O tal “gol de mão” aconteceu nas quartas-de-final, contra a Inglaterra. A Argentina ganhou por 2 a 1 e mandou os súditos da rainha mais cedo para Londres.

Pior do que fazer um gol com a mão foi o argumento usado depois pelo autor da malandragem (no mau sentido). Pois o pequenino argentino justificou dizendo que a bola teria entrado no gol da Inglaterra por pura intervenção divina. Segundo o sujeito, aquela teria sido “la mano de Diós”.

Trocando em miúdos, as duas copas vencidas pela Argentina só o foram por conta de fraudes: um goleiro comprado por um punhado de soles (nem deve ter sido tanto assim) e um gol feito com a mão, flagrado pelas câmeras de televisão e visto por bilhões de pessoas ao redor do planeta.

Com todo esse histórico, os caras ainda se atribuem ao direito de chorar pela derrota para o Brasil na Copa América recém concluída, dizendo que foi tudo uma grande armação. Pra mim, a síntese de tudo é a seguinte: o argentinos são desonestos quando podem e chorões quando não podem!

– Julho de 2019 –


Francisco Dandão

Reformado pela Polícia Militar do Acre e atualmente trabalhando na Prefeitura Municipal de Rio Branco, Mário Sales, ex-volante de três grandes clubes acreanos, é uma criatura de memória privilegiada, com a qual se pode passar o dia inteiro conversando sobre o passado do futebol regional.

Pelo menos foi essa a impressão que eu tive quando conversei com ele na minha recente estada na capital acreana, no mês de maio deste ano. Conversamos por umas boas duas horas e ele não hesitou em abrir o seu baú de histórias, bem como de falar sobre fatos da sua vitoriosa carreira.

Histórias, por exemplo, como as dos sacos dinheiro que ele ganhou duas vezes para mudar de clube. Primeiro, em 1985, quando ele trocou a camisa do Rio Branco pela do Atlético Acreano. E depois, no ano seguinte, quando ele deixou o Galo e foi se agregar ao elenco do Independência.

“Eu estava bem no Rio Branco. Tinha sido campeão do Copão da Amazônia de 1984 e ganhava uma quantia razoável. Só poderia sair se a compensação financeira fosse mesmo muito boa. Aí um diretor do Atlético, Máximo Damasceno, acenou com uma proposta irrecusável”, disse Mário.

“Para você ter uma ideia, professor, era tanto dinheiro que me foi entregue num saco desses grandes de padaria. Em peguei a bufunfa, abri o porta-malas do meu Passat, olhei para um lado e para o outro, joguei tudo lá dentro e só fui contar quando cheguei em casa”, explicou o ex-craque.

No ano seguinte, 1986, o dirigente Adalberto Aragão, do Independência, entendeu que Mário era imprescindível no meio de campo do Tricolor do Marinho Monte. E aí, “bem acostumado”, Mário Sales disse-lhe que só iria se ganhasse outro saco de dinheiro. Aragão tratou de pagar.

Outra boa história do Mário foi a de um amistoso contra o Vasco da Gama, do Rio de Janeiro, em 1982, quando ele foi barrado pelo técnico paraense Osvaldo Dahas. Na cabeça da área do Estrelão, no lugar do Mário, estava escalado o promissor Mauricinho, que era destaque no time juvenil.

Mário Sales disse que havia faltado ao treino recreativo e que, por isso, Osvaldo Dahas havia decidido deixa-lo no banco. Mas aí entrou em ação o então diretor Toniquim, cujo entendimento era o de que Mauricinho seria “queimado” num jogo daqueles. Mário jogou e Dahas “pegou o beco”.

Encerramos a conversa com o Mário escalando a sua seleção acreana de todos os tempos. Para ele esse time formaria com: Ilzomar; Paulo Roberto, Chicão, Neórico e Duda; Mário Sales, Carioca, Dadão e Carlinhos Bonamigo; Gil e Paulinho. Técnico: Ticão. Dirigente: Sebastião Alencar.

– Julho de 2019 –


Francisco Dandão

Aos 67 anos de vida, a Associação Desportiva Vasco da Gama, uma das equipes mais tradicionais do futebol acreano, denominada Almirante da Fazendinha, segue singrando os rios da Amazônia com determinação e altivez, alternando águas turbulentas com instantes de alguma calmaria.

Por águas turbulentas entenda-se a penúria financeira dos últimos tempos, que não permite a formação de elencos competitivos para brigar por títulos, além de algumas competições em que o time virou saco de pancadas, a ponto de ser rebaixado para a segunda divisão do campeonato acreano.

Por instantes de calmaria, ressaltem-se os anos em que o time conseguiu chegar ao lugar mais alto do pódio regional, batendo todo mundo que cruzou a sua frente. Casos do campeonato de 1965, ainda na época do amadorismo (marrom), e dos campeonatos profissionais de 1999 e 2001.

Sim, o clube conquistou também o Campeonato Acreano da Segunda Divisão de 2013, depois de haver sido rebaixado em 2011. Quatro títulos no total. Quase nada se comparado com os grandes clubes do futebol acreano. Mas de bom tamanho se consideradas as enormes dificuldades do Almirante.

Fora esses quatro títulos, o clube bateu na trave em pelo menos cinco oportunidades, ficando com o vice-campeonato: 1963 (perdeu a final para Independência), 1964 (derrotado pelo Rio Branco), 1967 (sucumbiu diante do GAS), 2002 (Rio Branco campeão) e 2003 (Rio Branco campeão).

Uma curiosidade: na derrota para o GAS (Grêmio Atlético Sampaio, time criado pelo Exército Brasileiro), segundo o centroavante do Vasco, Danilo Galo, o principal jogador do adversário foi o árbitro, que almoçara no quartel da corporação, a convite dos militares, no dia da decisão. Rsrs!

Ressalte-se que a história desse clube registra o nome de inúmeros jogadores acima da média que um dia vestiram a sua camisa. Enquanto escrevo, lembro pelo menos uns dez deles. Cito-os: Danilo Galo, Messias, Viegas, Gilson, Jersey, Fuzarca, Café, Benevides, Bidu, Bico-Bico…

Esses citados no parágrafo anterior todos do período amador. Enquanto que durante o profissionalismo, são incontáveis os bons jogadores que defenderam o clube. Novamente cito alguns que me ocorrem: Faísca, Evilásio, Ciro, Lelão, Jefferson, Siqueira, Daniego, Pisika… Muitos!

O Almirante da Fazendinha, enfim, por conta da persistência de alguns abnegados, segue um personagem bem vivo da história do futebol acreano. Como na estrofe do hino do estado, não deixa que nenhum estrangeiro ofenda os seus brios e continua na luta “sem recuar, sem cair, sem temer”.

– Julho de 2019 –


Francisco Dandão

O Sul do Brasil é gelado nesse período do ano. Por mais que uma criatura se proteja, sempre vai sobrevir um friozinho na espinha, mesmo que não exista nenhuma dramaticidade no ar. As extremidades do corpo então, caso das mãos e dos pés, costumam se configurar ainda mais frias.

Pois é justamente nessa região do país, mais especificamente em Porto Alegre, a bela e aprazível capital de todos os gaúchos, à margem sudoeste do caudaloso rio Guaíba, que o Atlético vai vivenciar mais uma estação do seu calvário na Série C do Campeonato Brasileiro deste ano de 2019.

Fiz alusão à temperatura por duas razões. Primeira, porque os acreanos vão jogar num clima absolutamente diverso daquele que costumam fazê-lo, uma vez que na maior parte do ano faz um calor enorme no Acre. E segunda porque ninguém do clube pode ser acusado, individualmente, de pé frio.

E fiz depois essa referência à estação de calvário porque me parece ser bem esse o caminho do Galo nessa competição, quando as bordoadas se sucedem a cada novo compromisso. Quando a gente imagina que o Atlético vai se levantar, eis que o destino chega e lhe impõe um novo tropeço.

Em vários jogos, principalmente dentro de casa, o Atlético saiu na frente e depois cedeu ao empate. Em algumas dessas oportunidades, com falhas infantis de atletas que não costumam cometer erros tão bizarros. Mais ou menos como se mãos invisíveis empurrassem o Galo para baixo.

O resultado de todos os tropeços é que o Atlético chega à 13ª rodada com a pior campanha entre todos os 20 participantes. Das 12 partidas jogadas, o Galo venceu apenas umazinha (Tombense-MG). No mais, foram cinco empates e seis derrotas: 8 pontos ganhos. Um desempenho sofrível.

O adversário deste sábado é o São José, que briga pelos primeiros lugares do Grupo B. O time gaúcho venceu quatro e empatou sete dos seus 12 jogos. Só perdeu um, lá na 3ª rodada, contra o conterrâneo Ypiranga. A essa altura, bem na fita, detém o 3º posto, com 19 pontos conquistados.

No confronto do primeiro turno, jogando no Florestão, em Rio Branco, o São José demonstrou força ao ficar duas vezes atrás no marcador e buscar o empate contra o Atlético. Agora, dado tudo o que aconteceu de lá pra cá, é bem favorito para deixar ainda mais acesa a lanterna do time acreano.

O Atlético, de acordo com os sites especializados em probabilidades futebolísticas, tem 98.1% de chances de cair para a Série D. Só um milagre salva o Galo. Estando no Rio Grande do Sul, uma boa providência seria ir a Farroupilha, onde fica o Santuário de Nossa Senhora de Caravaggio.

– Julho de 2019 –


Francisco Dandão

Na crônica passada, antes do jogo contra o São José-RS, pelo Campeonato Brasileiro da Série C, levando em conta que as probabilidades estabeleciam 98.1% de chances do Atlético Acreano cair para a Série D, eu aconselhei o time a visitar o santuário de Nossa Senhora de Caravaggio.

É que o jogo do Atlético estava marcado para Porto Alegre e o santuário fica em Farroupilha. Meros 110 Km separam uma cidade da outra. Não custava nada dar um pulinho na cidade vizinha e pedir um milagre. Afinal de contas, como diz a canção, “a fé não costuma falhar”.

Provavelmente ninguém do Atlético deu ouvidos ao meu conselho. Veio o jogo e o Galo celeste levou três a zero no lombo. Perdeu fácil. Não chegou nem a engrossar o caldo contra os gaúchos. Subiu para sete o número de derrotas na competição. E a chance de cair aumentou para 98.9%.

Enquanto escrevo, me ocorre outra possibilidade. A de que algum representante do Atlético até foi a Farroupilha pedir um milagre a Nossa Senhora de Caravaggio, mas não teria tido sucesso porque do lado do adversário estava justamente São José. Aí os santos não quiseram se meter.

Independentemente de qualquer intervenção divina, porém, o certo é que o fio que prende o Atlético à Série C está a cada dia mais frágil. O buraco do Galo parece não ter fundo e a luz da lanterna vai ficando mais intensa a cada partida. Oito pontos ganhos em 13 rodadas são quase nada.

A coisa ficou de tal modo dramática que nem uma eventual vitória do Atlético no próximo sábado, contra o Remo, no Florestão, tira o time acreano dessa lanterna. É que quatro pontos separam o Atlético do vice lanterna, que é o Luverdense. O Galo é azul, mas a coisa tá ficando deveras preta.

Será que alguém ainda acredita que o Atlético pode sair dessa enrascada? Ou será que a melhor estratégia, a essa altura do campeonato, é fazer o que dá, se despedir com honra e começar a planejar o ano de 2020, quando tudo pode ser diferente, a partir da disputa de outra Série D?

Aí eu acho que depende do ponto de vista. Os otimistas certamente vão se apoiar na matemática, fazer contas, falar em esperança etc. e tal. Já o resto da galera, principalmente aqueles da turma do “quanto pior, melhor”, pra esses o Galo ficou tão magrinho que não dá mais nem uma canja.

De qualquer forma, caindo para a Série D ou permanecendo na C, o que me parece ser mais importante é que o Atlético passou esses dois últimos anos levando o nome do esporte acreano para todas as regiões do país. Subir degraus no futebol brasileiro é uma tarefa hercúlea para um time do Acre!

– Julho de 2019 –


Francisco Dandão

Por alguns dias considerei a possibilidade de ir a Lima para assistir in loco a edição 2019 dos Jogos Pan-Americanos. Se eu tivesse levado o plano adiante, teria matado dois coelhos com uma única cacetada: revisitaria o belo país dos incas e ainda veria de perto o desempenho dos atletas brasileiros.

Digo “revisitaria” porque eu já estive em território peruano várias vezes. Iñapari, Puerto Maldonado, Cusco, Ollantaytambo, Águas Calientes, Machu Picchu… Todos esses e mais outros locais já ouviram o som dos meus passos e registraram a passagem da minha sombra por aquelas bandas.

É sempre interessante ir ao Peru. Além da magia que emana daquelas montanhas que a gente vê por lá, as pessoas são extremamente simpáticas, a gastronomia faz qualquer um sonhar com banquetes divinos e, ainda, pra quem gosta, se pode tentar “la buena suerte” nos cassinos de cada esquina.

Falar nisso, na última vez em que estive em Lima, em dezembro de 2014, de passagem para o México, resolvi tentar a sorte numa dessas atrativas casas de jogatina. E aí, me apropriei de uma máquina caça-níqueis lá deles, daquelas do tipo que você põe uma ficha e puxa uma alavanca.

Na base da tentativa, erro e acerto, descobri que a máquina sempre te deixa ganhar nas primeiras rodadas. Depois te toma todas as fichas. E entendendo que a sorte pode voltar a qualquer momento, a tendência é que a gente compre mais fichas. Recuperar o perdido é tudo para um apostador.

Quando percebi o mecanismo do jogo, eu passei a mudar de máquina todas as vezes que começava a perder. A minha estratégia deu certo. Não sei se dá certo sempre. Com medo de me viciar, não voltei no dia seguinte para repetir. Mas naquela dita noite jantei com o dinheiro do cassino peruano.

Voltando, porém, à ideia inicial destas mal traçadas de hoje, acabei desistindo da viagem para assistir ao Pan-Americano de Lima por duas razões. Primeira: pesquisei o desempenho do Brasil na competição e vi que o país jamais ficou em primeiro lugar. Segunda: resolvi fazer um curso.

No que diz respeito ao desempenho do Brasil nos Jogos Pan-Americanos, a melhor colocação obtida pelos nossos atletas foi o 3º lugar no quadro de medalhas. Nas últimas três edições (Rio de Janeiro, 2007; Guadalajara, 2011; e Toronto, 2015) foi assim. O Brasil não saiu do canto.

E quanto ao curso, isso era um segredo que eu só ia revelar quando o tivesse concluído e com o certificado na mão. Mas já que eu ensaiei dizer, vá lá que seja. Começo nesse fim de semana um curso intensivo para aprender a fritar hambúrguer. Como já falo inglês e espanhol, então…

– Julho de 2019 –


Francisco Dandão

Já vai longe o tempo em que os grandes craques do futebol, tanto do Brasil quanto de outros lugares do mundo, eram vistos somente nas páginas dedicadas ao noticiário esportivo. Agora os caras costumam aparecer também nas colunas sociais e, pior de tudo, nas nefastas notas policiais.

Tudo isso porque a bola, de certa forma, virou um elemento secundário da vida dos referidos personagens. Se duvidar, as estrelas “futeboleiras” dos dias atuais passam mais tempo se produzindo para ir ao próximo evento festivo do que, necessariamente, em campo aprimorando a sua técnica.

É preciso manter o cabelo impecavelmente cortado e, naturalmente, mudar de corte toda a semana. É preciso manter os pés sem calosidades e as unhas cuidadosamente aparadas. É preciso exalar o último perfume saído dos laboratórios mais sofisticados. É preciso sair bem nas milhares de fotos…

Jogar bola? Sim, claro… Mas com moderação, que ninguém é de ferro. Uma jogadinha de efeito aqui outra ali, um passe de trivela olhando para o outro lado que não seja o da direção dada à bola, um driblezinho de vez em quando e, se possível, um golzinho por mês, e tudo fica de bom tamanho.

São reflexões que me ocorrem por conta de um jornal dessa terça-feira (30) que me caiu às mãos. São cinco as manchetes de capa: a prisão de um policial que matou um adolescente; a execução de um empresário; a exibição de uma funkeira seminua; e duas de futebolistas às voltas com a justiça.

O primeiro dos futebolistas é justamente Neymar. A manchete diz respeito à decisão da polícia de não indiciá-lo pela acusação de estupro contra aquela “modelo” que foi a Paris dar-lhe uns sarrafos para ele “deixar de ser besta”. Parece, felizmente, que ele vai se sair bem dessa confusão.

Para sorte de Neymar, a Maria Chuteira “perdeu” o celular com as “imagens comprobatórias” do vilipêndio alegado, foi representada por “advogados incompetentes” e foi atendida por policiais “comprados” (versões da dita). Paranoia e mitomania até o último fio de cabelo (lá dela)!

O outro futebolista da manchete policial da terça-feira que caiu nas minhas mãos é Ronaldinho Gaúcho. Segundo a matéria, o cara deve até o elástico da cueca. E quase todos os seus bens patrimoniais, por conta disso, encontram-se indisponíveis. Um gênio aprisionado dentro da própria garrafa.

Como eu disse lá no primeiro parágrafo, já vai longe o tempo em que os craques eram destaques apenas nas páginas esportivas. Oxalá, pelo menos, a bola lhes siga fiel enquanto eles permaneçam em campo (no caso só Neymar, que o Ronaldinho já pendurou as chuteiras). É isso. Ponto final.

– Julho de 2019 –


Francisco Dandão

Depois de cinco anos de inaugurada, finalmente eu tive o prazer de conhecer a Arena da Amazônia. Na Copa do Mundo de 2014, quando o belo palco abriu suas portas para o público, eu acabei assistindo partidas só em outras cidades. E depois fui meio que adiando o inevitável encontro.

A noite dessa última sexta-feira, porém, de passagem por Manaus, em pleno exercício do meu ofício preferido, que é bater pernas pelas mais variadas regiões do planeta, o meu encontro com a Arena se consumou. E se consumou em alto estilo, já que eu assisti um jogo na beira do campo.

Na beira do campo, apesar de ser um privilégio para poucos, é bem mais emocionante assistir a um jogo de futebol, uma vez que a gente pode ver os mínimos detalhes da reação dos personagens da festa. Desde as caretas de dor dos atletas até aos berros coléricos dos distintos treinadores.

Além do mais, em Manaus é como se a gente estivesse em casa. Primeiro, pelo calor humano natural dos amazonenses, que recebem os visitantes sempre com um enorme sorriso no rosto. E segundo por que, no meu caso, eu sempre tenho a oportunidade de encontrar antigos amigos.

Lá mesmo à beira do gramado, nessa noite de sexta-feira, por exemplo, eu encontrei o velho amigo Dudu Monteiro de Paula, militante da crônica esportiva manauara desde sei lá quando. Nos conhecemos há um bom tempo e graças a essa paixão comum pelo futebol de vez em quando nos revemos.

Sim, antes que você aí na frente dessas mal traçadas pergunte o que eu estava fazendo à beira do gramado da Arena da Amazônia, eu já trato de me explicar. Eu estava exercitando outra das minhas paixões: a arte da fotografia. Tentando, ao meu modo tosco, eternizar cenas do espetáculo.

Quanto ao jogo, embora eu preferisse pular essa parte, infelizmente não deu para o Humaitá, um dos representantes do Acre na Copa Verde deste ano de 2019. É que depois de segurar o Nacional durante o primeiro tempo, o time acreano viu sua meta ser vazada duas vezes na etapa complementar.

Independentemente da desclassificação, porém, eu penso que deve-se louvar a participação do Humaitá. Além de ser a estreia do time de Porto Acre em competições regionais, a derrota não veio assim de forma tão fácil. Eu diria que foram dois bons duelos com o tradicionalíssimo Nacional.

É por aí, meus caros amigos. Tá acabando meu espaço por hoje. Outro dia eu conto como foi o meu périplo pelas peixadas manauaras. Mas enquanto esse outro dia não vem, eu já posso ir adiantando que comi um escabeche de pirarucu de matar um padre de inveja. Manjar dos deuses!

– Agosto de 2019 –


Francisco Dandão

Vive-se um clima de euforia no futebol amazonense pela ascensão do Manaus à Série C do Campeonato Brasileiro. O referido time, depois de bater o baiano Jacuipense, sábado passado, por 1 a 0, na Arena da Amazônia, ganhou o direito de jogar a final da Série D contra o catarinense Brusque.

Fundado em maio de 2013, e apelidado Gavião do Norte, o Manaus é o time profissional mais jovem do Amazonas. Mais jovem e, talvez por isso mesmo, o que demonstra mais organização fora do campo. A sua passagem de série não é mera coincidência. O time é bom e o clube é organizado.

Na Série D deste ano, o time venceu nove e empatou três das 14 partidas jogadas até aqui. Só perdeu duas vezes, ambas jogando na casa dos adversários: 1 a 0 para o São Raimundo-PA, em Santarém, nas oitavas de final; e 1 a 0 para o Caxias, em Caxias do Sul, nas quartas de final.

Com as vitórias que o time vem acumulando desde a sua fundação já reúne um bom número de torcedores. Nesses últimos dias, a camisa verde não para nos varais improvisados dos camelôs, esparramados no centro da capital das amazonas. Todo mundo quer ter uma camisa do time da moda.

O resultado de tudo isso, entre outras coisas, são tardes de Arena da Amazônia cheia, tirando, de certa forma, a fama de elefante branco do belo estádio. A lógica é de uma transparência absoluta: a torcida comparece ao estádio quando o seu time tem a perspectiva de vencer. Simples assim.

Se o Manaus vai ser campeão brasileiro da Série D, isso a gente só vai saber depois dos 180 minutos. Mas ser campeão, eu diria, é uma espécie de bônus. O principal objetivo já foi cumprido. Em 2020 o time vai ter um calendário cheio e levar o nome do estado para todos os cantos do Brasil.

Enquanto isso, no vizinho Acre, o Atlético vive o seu inferno astral. Depois de subir para a Série C em 2017, e de fazer uma ótima campanha nesse patamar em 2018, o time alviceleste do 2º distrito de Rio Branco cai pelas tabelas. Venceu uma vez em 15 oportunidades. Já está rebaixado.

Em sentido diametralmente oposto ao que acontece em Manaus, mas de acordo com a mesma lógica de que o torcedor só se interessa pelo time que tem a perspectiva de vencer, o público abandonou os jogos do Atlético na Série C deste ano. Só algumas testemunhas é que ainda vão aos estádios.

Com a queda do Atlético, a região Norte perde a oportunidade de encorpar a sua representação na Série C do Campeonato Brasileiro de Futebol. Caso Remo e Paysandu não consigam subir para a Série B, seriam quatro os representantes do Norte. Mas isso não acontecerá. Lamentável!

– Agosto de 2019 –


Francisco Dandão

Alguma coisa que eu ainda não consigo compreender está em curso na economia do futebol brasileiro. É que mesmo o país não indo tão bem das pernas no que diz respeito à sua moeda, os clubes desandaram a repatriar jogadores e, mais do que isso, a contratar europeus para vestir suas camisas.

São muitos os nomes que deram o seu rolê pelos gramados estrangeiros e que resolveram voltar para dar os seus chutes em gramados nacionais. Alguns passaram tanto tempo por lá que já falam português com sotaque. Outros, é certo, não chegaram a esquentar o lugar por onde andaram.

Enquanto escrevo, lembro de pelo menos uma dúzia dessas criaturas que foram, viram e voltaram. Casos, por exemplo, de Vagner Love, Paulo Henrique Ganso, Rodriguinho, Diego Tardelli, Hernanes, Alexandre Pato, Gil, Júnior Urso, Pedro Rocha, Tchê Tchê, Vítor Bueno, Rafinha…

Alguns, como Rafinha (Flamengo), que trocou o frio da Alemanha pelo calor do Rio de Janeiro, e Hernanes (São Paulo), que talvez não aguentasse mais a culinária chinesa, provavelmente voltaram mesmo só para encaminhar o encerramento das suas vitoriosas carreiras em solo pátrio.

Mas outros, como o atacante Alexandre Pato (São Paulo), repatriado da China (Tianjin Tianhai), o meia Vítor Bueno (São Paulo), repatriado da Ucrânia (Dínamo de Kiev), e o lateral Jorge (Santos), repatriado da França (Monaco), ainda tem muito suor para encharcar as respectivas camisas.

De propósito não inseri na lista o lateral Daniel Alves. Não o citei porque o considero um ponto fora da curva, por tudo que ele conquistou na sua carreira e pelo que ele representa para a seleção brasileira de futebol. O cara, simplesmente, é o jogador mais vitorioso da história desse esporte.

São 40 títulos no currículo desse baiano de Juazeiro, desde que ele vestiu a sua primeira camisa como jogador profissional, a do Bahia, em 2001. Quarenta títulos e um giro pelo mundo, na defesa de clubes como o Sevilha (Espanha), o Barcelona (Espanha), o Juventus (Itália) e o PSG (França).

Aos 36 anos, eleito o melhor jogador da recém finda Copa América, o lateral-direito (mas também meia), correndo como se tivesse uma idade inferior, candidatíssimo a titular da seleção brasileira na Copa de 2022, eu diria que foi a maior contratação do futebol nacional dos últimos tempos.

O futebol brasileiro está trazendo de volta jogadores de técnica acima da média, apesar da economia meia boca. E eu, que não compreendo bem essa história, a única coisa que me resta é me apegar com o mito de Epimeteu, aquele que só compreendia as coisas depois que elas aconteciam… Putz!

– Agosto de 2019


Francisco Dandão

A gente se acostuma bem e rápido com as vitórias. Somos tomados por um sentimento de euforia quando o nosso time está vencendo, triturando os adversários, conquistando pontos nas diversas tabelas de classificação. E os sorrisos nos rostos praticamente juntam o espaço entre as nossas orelhas.

Ao contrário disso tudo, quando o time da gente entra numa maré de azar (ou de incompetência, ou de falta de dinheiro) e os bons resultados entram pelo ralo, os sorrisos viram caretas de dor. Ninguém (ou quase) vai mais ao estádio acompanhar as pancadas. E as cores do mundo desaparecem.

Guardadas as proporções, foi mais ou menos isso o que aconteceu nas últimas três temporadas dos times do futebol acreano. Em 2017, o Atlético saiu atropelando no Campeonato Brasileiro da Série D, o que acarretou a sua ascensão para a Série C. E em 218, o Galo passeou bonito no novo patamar.

Com as boas campanhas do time azul do Segundo Distrito de Rio Branco, ainda que os estádios acreanos nunca tenham ficado completamente lotados, é certo que muita gente dedicava os seus finais de semana para ver o Atlético bater em times tradicionais do futebol brasileiro. Uma festa.

Já nesse ano da Graça de 2019, quando o Atlético desde o início da competição demonstrou que não tinha time à altura do tamanho do desafio em que estava metido, empatando jogos que deveria vencer, a galera desconfiou que nada poderia ser como antes e deixou de ir ao estádio.

Da mesma forma, os sofríveis desempenhos do Rio Branco e do Galvez na Série D espantaram os torcedores das arquibancadas da Arena da Floresta e do Florestão. Caindo aos pedaços, o Estrelão chegou até a levar algumas goleadas. E o Galvez jamais demonstrou algum tipo de firmeza.

E pra completar, o Galvez e o Humaitá mal botaram o pé na disputa da Copa Verde. O Imperador perdeu na ida e na volta para o mediano União ABC, do Mato Grosso do Sul. E o Humaitá, apesar de engrossar o caldo no primeiro confronto, não foi páreo em Manaus para o glorioso Nacional.

No que diz respeito ao Humaitá é preciso abrir um parênteses, levando-se em conta que foi a primeira vez que esse clube disputou uma competição regional, além do que só entrou pela desistência de outros. Não estava no seu radar a disputa. E, assim, teve que formar um time às pressas.

Independentemente das circunstâncias, considerando que só o dono do calo é que sabe onde o sapato aperta, o certo é que foi um ano péssimo para o futebol acreano. Derrotas pra dar e vender (ou para todos os desgostos). Urge alguma providência para que 2020 não seja um ano tão sofrido!

– Agosto de 2019 –


Francisco Dandão

Durante mais de 40 anos (de 1941 a 1983) as mulheres foram proibidas de jogar futebol no Brasil. A proibição foi criada num dos governos de Getúlio Vargas, numa época registrada na história do Brasil como Estado Novo. Uma ditadura caracterizada pelo nacionalismo e pelo anticomunismo.

“Às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompatíveis com as condições de sua natureza, devendo, para este efeito, o Conselho Nacional de Desportos baixar as necessárias instruções às entidades desportivas do país”. Este é o trecho do decreto que estabelecia a proibição.

Não havia no texto da lei uma referência explícita ao futebol. Mas a proibição estava latente. Na cabeça dos legisladores da época, as mulheres foram feitas (ou criadas, tanto faz) para se vestir de rosa, dedicar-se às atividades do lar, fabricar bebês etc. Brincadeiras só mesmo com bonecas.

Do passar dos dias, porém, ninguém (ou nada) escapa. E então, felizmente, chegou o momento de as mulheres soltarem suas belas pernas num campo de futebol e mostrarem suas habilidades com uma bola nos pés, com uma bandeira nas mãos ou com um apito nos lábios pintados de batom.

As mulheres brasileiras perderam um tempo enorme por conta do decreto do ditador da década de 1940. Eu penso nisso e fico imaginando quanto mal a atitude do sujeito causou ao esporte brasileiro e quantas jogadoras de técnica apurada o Brasil deixou de ver surgir nesse período.

O ditador do nefasto decreto meteu uma bala o peito em 1954. Surgiram outros ditadores. Afinal, o poder é um incomparável afrodisíaco. Mas uns e outros, a essa altura, foram parar na lata do lixo da história. E as mulheres, essas agora desfilam sua graça em busca de infinitos gols.

Essas reflexões todas anteriores me ocorreram por conta da notícia que eu li nas redes da escalação de uma mulher para arbitrar a final da Série D, neste domingo, na Arena da Amazônia, entre os times profissionais masculinos do Manaus-AM e do Brusque-SC. Edina Batista é o nome dela.

Paranaense de Goioerê, pertencente ao quadro de árbitros da FIFA, Edina Batista é a primeira mulher a apitar uma final de Campeonato Brasileiro. Ela, que dirigiu a semifinal da Copa do Mundo de Futebol Feminino deste ano, na França, acrescenta mais esse feito ao seu currículo.

É isso, meus caros amigos. Embora tardiamente, as mulheres brasileiras chegaram para ficar no mundo do futebol nativo. Muitas já conseguem viver exclusivamente da prática desse esporte. Algumas até se tornaram cidadãs do planeta por conta disso. A rainha Marta que o diga!

– Agosto de 2019 –


Francisco Dandão

Apesar de todo o insucesso dos times acreanos nas competições regionais e nacionais neste ano de 2019, quando o Rio Branco e o Galvez foram eliminados na primeira fase da Série D do Campeonato Brasileiro, e quando o Atlético foi rebaixado precocemente da Série C, a vida continua.

E como a vida continua, o Atlético tem nesta quarta-feira (21), no gramado do Florestão, a oportunidade de diminuir o seu calvário e dar alguma alegria à sua torcida. Para que isso aconteça, basta vencer o amapaense Ypiranga, no jogo de volta das oitavas de final da Copa Verde.

No jogo de ida, terça-feira da semana passada, lá no meio do mundo, onde se localiza o Estádio Zerão, na bela e aprazível Macapá, o Atlético não tomou conhecimento do adversário. Fez clássicos dois gols a zero e bem que poderia ter feito mais. Foi uma vitória tranquila, sem maiores sustos.

Naturalmente, sendo uma decisão de 180 minutos, não se pode dizer que a fatura esteja liquidada. Esse Ypiranga, que agora se encontra mais pra lá do que pra cá, eliminou o amazonense Fast na primeira fase dessa mesma Copa Verde. E pode sim se portar de forma diferente no jogo da volta.

Particularmente, eu não acredito em reviravolta. A possibilidade de o Ypiranga ser feliz existe sim, mas só pelo fato de o futebol ser um esporte profundamente ligado à questão do imponderável. Um esporte onde não existe vitória de véspera. Mas pela mais absoluta lógica, deve dar Atlético.

Passar pelo Ypiranga, aliás, dá mais algumas semanas de atividade para os jogadores do Atlético. Já que o último jogo pela Série C acontecerá no próximo domingo, restará ao Galo acreano tentar ser protagonista na Copa Verde. O sucesso nessa competição deixaria o céu do Galo menos escuro.

Fora isso, encerrada a temporada, chegará a hora dos dirigentes atleticanos sentarem numa mesa para analisarem tudo o que deu errado em 2019 e traçarem os rumos do clube para o ano que vem. Se já sabem o que deu errado, ótimo, fica muito mais fácil projetar as ações vindouras.

Esse planejamento é uma providência que se faz mais do que urgente. Afinal de contas, o tempo jamais para e o futuro chega a todo instante. A gente pisca os olhos e já é depois de amanhã. Não custa lembrar que logo nos primeiros anos de 2020 o time encara uma importante Copa do Brasil.

Usei “Olhar para frente” como título dessa crônica, mas devo esclarecer que a expressão diz respeito apenas ao fato de que o leite derramado não pode ser recolhido da poeira. Para se planejar bem o futuro, porém, é preciso utilizar dois olhares: um para frente e outro para trás!

– Agosto de 2019 –


Francisco Dandão

Sempre que passo uns dias no Acre, meu estado de origem, e estendo horas de conversas com ex-boleiros do futebol local, saio com o meu baú de histórias pra lá de recheado. Foi o caso da minha passagem pela terra de Galvez, Plácido, Chico e assemelhados no primeiro semestre deste ano.

A conversa com o ex-artilheiro Danilo Galo, por exemplo, me rendeu uma historieta da decisão do campeonato acreano de 1967, quando se defrontaram no campo o Vasco da Gama (time do Danilo) e o Grêmio Atlético Sampaio (GAS), criado por oficiais da 4ª Companhia de Fronteira.

Na década de 1960, o Vasco da Gama, sob o comando do professor Almada Brito, formava equipes fortíssimas. Tanto que chegou a ser finalista do campeonato em quatro oportunidades: 1963 (vice para o Independência), 1964 (vice para o Rio Branco), 1965 (campeão) e 1967 (vice para o GAS).

Enquanto isso, o GAS, fundado em 1964, por acaso (ou não) no ano do golpe militar que extinguiu as liberdades democráticas no país, alinhava todos os jogadores que serviam na unidade. Era prática comum, inclusive, incorporar à citada 4ª Companhia quem pudesse vestir a camisa da equipe.

Tratava-se de dois timaços, como se pode constatar nos registros da época. No GAS destacavam-se nomes como o goleiro Monteiro, o lateral Chico Alab, e os zagueiros Viana e Palheta. Já pelo lado do Vasco, eram companheiros do Danilo, entre outros, os atacantes Damásio e Jersey.

Jogo duríssimo, como em toda decisão que se preze. O GAS abriu dois a zero ainda no primeiro tempo. Mas o Vasco partiu para o tudo ou nada na segunda etapa, conseguindo o empate antes dos 20 minutos. E aí veio o gol da vitória do GAS, já perto do final da partida. GAS campeão, 3 a 2.

Até essa altura dos fatos, nada de novo. Tudo isso que eu disse até aqui está nos registros históricos. O detalhe que me foi contado agora pelo Danilo Galo diz respeito ao fato de o árbitro daquela final ter almoçado um “cozidão” horas antes do jogo no quartel da 4ª Companhia de Fronteira.

“Fizeram uma covardia com o nosso time. Levaram o juiz para almoçar no quartel. Não posso afirmar que deram alguma coisa pra ele. Mas só o fato de leva-lo para almoçar já o tornou suspeito. O certo é que ele não nos deixou jogar. Tudo era falta a favor dos caras”, disse o Danilo Galo.

O Grêmio Atlético Sampaio teve vida efêmera. Disputou competições entre 1964 e 1968. O único título conquistado foi esse de 1967. O Vasco, por sua vez, do qual não se pode dizer ter levado algum dia um árbitro para almoçar na Fazendinha, está vivo até hoje. E até já foi campeão profissional!

– Agosto de 2019 –


Francisco Dandão

Danou-se! A Amazônia arde em chamas! Mais ou menos como em todos os anos por essa época. Sei bem como é isso. Nesse momento não estou na região, por força de um exílio voluntário no litoral nordestino. Mas já respirei muita fumaça nos meses de agosto e setembro de anos anteriores.

A tragédia até me lembra situações que eu vivi. Numa delas, o avião em que eu estava quase se espatifou no solo. O piloto precisou arremeter ao ver que a aeronave estava descendo fora da pista. Na outra, uma autoridade local, apesar do fogo a olhos vistos, dizia que a fumaça vinha da Bolívia.

Na atual conjuntura, porém, que parece mais grave do que em todos os anos anteriores, levando-se em conta as notícias que a gente vê na mídia, o que se configura mais inusitado é a troca de agressões verbais entre políticos brasileiros e franceses. Cada um querendo ser mais macho do que o outro!

Do bate-boca surreal, o que me ocorre é que todos, de um lado e outro, vão sair um tantinho chamuscados (para usar uma expressão saída do fogo). Diz a sabedoria popular que roupa suja de cinzas deve ser lavada em casa. Jamais em público. A sabedoria popular não disse isso? Pois deveria ter dito.

As atitudes dos políticos franceses, inclusive, de acordo com um vizinho meu oriundo da pátria do herói Asterix, são parte de um pacote lá deles para intervir no espaço territorial brasileiro. A ideia seria transformar o Brasil num “país sério”, como queria o famoso general Charles de Gaulle.

O meu vizinho, que se chama Napoleão, mas que garante jamais ter frequentado um hospício, nem daqui nem de alhures, me confidenciou que o fogo na Amazônia é só o mais recente episódio da pendenga. Mas a história, segundo ele, é mais antiga do que se imagina. E já chegou até ao futebol.

Ao futebol? Ao meu questionamento, Napoleão suspirou, demonstrando uma certa impaciência, de certa forma me chamando de burro (ou alienado), e tratou de responder com outra pergunta: “Você acha, meu caro professor, que essa briga do Neymar com o PSG é mera coincidência?”

Fiquei sem saber o que pensar. E aí o Napoleão aproveitou para continuar a sua argumentação. Falou que aquela contusão no pé do craque

brasileiro foi obra de uma trama do serviço secreto lá do país deles. E que aquela convulsão do Ronaldo na final da Copa de 1998 também teria sido.

Me vendo cada vez mais incrédulo, o meu vizinho Napoleão ficou agitado, gesticulando muito e com os olhos esbugalhados. Aí ele começou a misturar os idiomas e eu passei a entender muito pouco. Só entendi quando ele disse que os franceses também vão tentar mudar o nome do Botafogo. Ih!

– Agosto de 2019 –


Francisco Dandão

A Seleção Brasileira de Futebol Feminino massacrou a Argentina por 5 a 0, quinta-feira passada, no Pacaembu, pelo Torneio Uber. Ganhar é sempre muito bom e faz um bem danado para a saúde dos torcedores. Se a vitória for de goleada e sobre a Argentina, a felicidade se multiplica.

Embora a seleção feminina da Argentina seja mais fraca do que caldo de piaba, eu tive a impressão de que as meninas do Brasil estavam mais desenvoltas dentro do campo. Se isso for verdade, provavelmente já se trata do trabalho da nova treinadora, a sueca recém contratada pela CBF.

A nova treinadora se chama Pia Marianne Sundhage e tem um histórico vencedor. Só à frente da seleção dos Estados Unidos, essa sueca de 59 anos (ela nasceu no dia 13 de fevereiro de 1960) ganhou duas medalhas de ouro olímpicas (2008, em Pequim; e 2012, em Londres). Apenas isso!

Depois que deixou o comando da seleção americana, em 2012, Pia Sundhage assumiu a direção da seleção do seu país. E aí realizou outro trabalho vencedor que culminou com a medalha de prata nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. Só perdeu a final para o time da Alemanha.

Além do mais, independentemente de qualquer coisa, o fato de ter nascido na Suécia já torna Pia Sundhage especialmente simpática aos meus olhos. Pátria do “amor livre”, desde um remoto passado, a Suécia é um dos países de melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do planeta.

O amor na Suécia é tão livre e há tantos anos que o Garrincha teve até tempo de fazer um filho por lá, no espaço de uma noite, em 1959, quando o Botafogo excursionou por aquelas bandas. Uma escapadinha da concentração e o genial ponteiro deitou a sua semente em solo fértil.

No que diz respeito ao IDH, a Suécia encontra-se hoje entre os oito melhores países, perdendo apenas para, pela ordem, Noruega (1º), Suíça (2º), Austrália (3º), Irlanda (4º), Alemanha (5º), Islândia (6º) e Hong Kong (7º). O Brasil, como o perdão da comparação, encontra-se em 79º lugar.

Mas voltando ao fio da meada, que é o novo momento do futebol feminino no Brasil, para além de uma vitória sobre as argentinas e do trabalho de uma técnica vencedora, o que parece ser mais interessante é a disposição da CBF para dar estrutura às praticantes do referido esporte.

Durante muito tempo proibidas de jogar futebol, durante outro tanto de tempo sem qualquer apoio de quem quer que fosse, as mulheres veem aos poucos uma nova aurora surgindo no horizonte. A mídia já lhes dá generosos espaços e os torcedores já correm aos estádios para vê-las. Ave, deusas!

– Agosto de 2019 –


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